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PROBLEMATIZACÕES DAS IDENTIDADES CULTURAIS NO CINEMA E NA LITERATURA CYBERPUNK: UMA ANÁLISE DOS FILMES DIVERGENTE E INSURGENTE

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Academic year: 2021

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PROBLEMATIZACÕES DAS IDENTIDADES CULTURAIS NO CINEMA E NA LITERATURA CYBERPUNK: UMA ANÁLISE DOS FILMES DIVERGENTE E INSURGENTE

Alessandra da Rosa Trindade Camilo1

RESUMO: O presente estudo propõe uma discussão sobre as identidades que estão sendo introduzidas pelo cinema e que problematizam, interferem e (re)constroem o sujeito contemporâneo, inspirado pelos estudos de Duarte (2002) que tratam do carácter eminentemente pedagógico do cinema e inspirado pelos estudos de Kellner (2001) que abordam as representações culturais que o gênero literário/fílmico cyberpunk vem apresentando. Para a análise proposta, dois filmes de ficção científica cyberpunk foram selecionados, quais sejam: Divergente, lançado em 2014 sob direção de Neil Burger, e Insurgente, lançado em 2015 sob direção de Robert Schwentke, ambos baseados nos livros homônimos de Veronica Roth, lançados em 2011 e 2012. O referencial teórico dessa pesquisa também encontra aporte nos estudos de Sibilia (2014), sobre o homem pós-orgânico, e Hall (2003), sobre a identidade cultural na pós-modernidade, pensando a alquimia entre corpo e tecnologia.

PALAVRAS-CHAVE: Cinema. Ficção Cyberpunk. Identidades Culturais. 1. A literatura e o cinema cyberpunk

O cyberpunk indica uma corrente ou um movimento da ficção científica dos anos 80 que se faz presente – embora nem sempre preservado em suas características originais – ainda hoje em inúmeras obras de ficção científica, tanto no contexto da literatura quanto do cinema. O gênero literário cyberpunk ganhou as vitrines mundiais, inspirado por obras do gênero de ficção científica, apresentando como característica principal a hibridação entre corpo e máquina.

William Gibson consagrou o gênero, antes visto como um subgênero Sci-fi2, através do

clássico literário Neuromancer, lançado em 1984, onde apresentou a distopia cyberpunk na mescla entre orgânico e tecnológico tratando das possibilidades e conflitos nas identidades dos sujeitos, presentes na narrativa, interferidos por essa fusão. Gibson contribui com romances, participações em produções fílmicas e contos, como os da coleção Burning Chrome, publicada em 1982.

Desde o surgimento do gênero cyberpunk três décadas se passaram e foram, assim, interferidas por variadas influências da literatura que ganharam as telas do cinema e que passaram a lançar representações sobre os tempos “líquidos” em que vivemos, como diria Bauman (2001). Contudo, no decorrer desse período, dos anos 80 aos dias que seguem, pouco se é falado sobre essa estética que cada vez mais se aproxima do estado atual em que vivemos: o cyberpunk.

O cinema, enquanto ferramenta pedagógica disseminadora de representações sobre variados assuntos, desempenha um papel fundamental sobre a composição nas identidades dos

1Possui graduação em Letras Inglês e Literaturas pela Universidade Luterana do Brasil, mestrado em Educação e Estudos Culturais pela mesma Universidade. Atualmente é doutoranda em Letras pela pelo Programa de Pós Graduação da Laureate University – UniRitter e professora no curso de Letras na mesma instuição. E-mail: alessandratrindadecamilo@gmail.com

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sujeitos e como a tecnologia vem desempenhando o papel de facilitadora em nossas ações e pensamentos. Refletir a convergência humano-tecnológico na transição do gênero literário cyberpunk para o cinema é o que propõe este estudo, considerando modos de circulação e recepção dessas obras em comunidades específicas de leitores.

Os artefatos em análise são os filmes de ficção científica cyberpunk: Divergente, lançado em 2014 sob direção de Neil Burger, e Insurgente, lançado em 2015 sob direção de Robert Schwentke, ambos baseados nos livros homônimos de Veronica Roth, lançados em 2011 e 2012. A vinculação do filme com a estética cyberpunk pode ser percebida através de vários elementos ao longo do filme, como o na figura 1, onde o modo como a comunidade apresentada na narrativa é interferida pela tecnologia que desempenha o papel de ferramenta de controle constante e organização da rotina diária daquelas pessoas.

Figura 1 – A interferência e controle dos sujeitos pela tecnolog

Fonte: http://globosatplay.globo.com/telecine/v/3835775/

O enredo de Divergente se passa no final do século XXI, quando uma guerra global química levou o planeta Terra a muito próximo de se tornar inabitável, dando origem, assim, a comunidades isoladas umas das outras. Nesses vilarejos, as pessoas eram dividas em subgrupos, nomeados por características que unificavam as identidades de cada associação, determinando assim, que os escolhidos para morar em um dos espaços teriam pensamentos e atitudes lineares ao nome da sua facção, sendo elas, dois espaços ainda habitáveis: amizade, audácia, abnegação, erudição e franqueza, conforme a figura 2 exemplifica.

Figura 2- As facções e a tentativa de igualar o impossível: a subjetividade de cada um.

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Ambos os filmes, Divergente e Insurgente, apresentam a luta de uma adolescente contra a imposição de ser igual aos demais, quando sua vontade é contrariada por uma personalidade que representa sua subjetividade e que atravessa a narrativa com a tentativa incansável de mostrar que todos devem e tem o direito de ser divergente. A protagonista Triz, codinome escolhido pela personagem que se chama Beatriz, encontra seu primeiro conflito ao passar por uma cerimônia que a obrigada a escolher um dos grupos como simbolismo de passagem da fase juvenil para a fase adulta de sua vida.

Triz luta para não deixar sua família, que pertence a facção da amizade, mas não consegue aceitar o fato de ser sempre prestativa aos demais, deixar suas vaidades de lado e pensar somente em como cultivar laços de bondade entre os demais grupos, como a facção amizade era designada. A protagonista escolhe então a facção audácia, onde passa a ser prepara para outra postura e construção de uma nova identidade. A personagem é obrigada a se desfazer de todas as características do antigo grupo, bem como, não pode mais manter contato com sua família para não ser influenciada por ser sentimentos, que também estavam sendo regulados e observados.

A narrativa intensa do filme, ainda que alinhada ao gênero de ficção científica, também traz elementos da estética cyberpunk, por mostrar o conflito de identidades da protagonista, que passa a ser regida e interferida por uma comunidade controlada pela tecnologia, através do ciberespaço utilizado pela facção da erudição, que representa na história, o cérebro pensante dos subgrupos da grande comunidade. Além disso, ambos os filmes, tratam da forma como as ferramentas tecnológicas apoderam e transformam os sujeitos sem precisar da mescla visível e material, anteriormente apresentada pelo gênero cyberpunk, de corpos misturados à máquina.

Hall, ao tratar da composição das identidades dos sujeitos contemporâneos, afirma que o cinema desempenha papel de disseminador sobre essas novas formas de “ser” e “viver” em tempos pós-modernos. O autor coloca a identidade

[...] como constituída, não fora, mas dentro da representação, e, portanto, do cinema, não como um espelho de segunda ordem erguido para refletir o que já existe, mas como a forma de representação que é capaz de constituir-nos como novos tipos de sujeitos, e, assim, permitir-nos descobrir quem somos. (HALL, 2009, p.714)

Para Hall, essas representações lançadas pelo cinema aos sujeitos vêm apresentando não somente discussões pertinentes mas também interferindo na forma como esses indivíduos se percebem como parte da sociedade em que vivem. Ao encontro das reflexões do autor também está o gênero cyberpunk que, através do cinema, convida-nos a pensar no que nos constitui enquanto, no que estamos nos transformando e que mundo estamos construindo.

2. O caráter pedagógico do gênero cyberpunk e representações sobre “ser” pós-moderno O caráter pedagógico do cyberpunk é abordado por autores como Kellner (2001) que guia esse estudo e que esclarece precisamente como o gênero literário cyberpunk vem atuando e inspirando o cinema. Kellner também enfatiza como essas releituras fílmicas representam, através da estética cyberpunk, a condição pós-moderna em que vivemos. O autor chama a atenção para o

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“[...]caráter pedagógico que esse gênero adquire na propagação de conceitos e valores ligados ao que se tem denominado, de modo amplo e genérico, de pós-modernidade: “No cyberpunk, a visão pós-moderna encontra a sua expressão literária paradigmática e dissemina as suas visões para a cultura contemporânea da qual extraiu energia e agudeza”. Kellner (2001, p.381)

Alinhado aos pensamentos de Kellner, faz-se importante esclarecer que a intenção dessa análise sobre o gênero literário e cinematográfico cyberpunk, guia-se à luz dos Estudos Culturais e Educação, por entender que, juntamente com outros artefatos culturais contemporâneos, as narrativas cyberpunk têm produzido representações e discursos que circulam e operam pedagogicamente na composição de identidades pós-modernas. Assim sendo, será uma breve análise que visa compreender de que modo o gênero literário/cinematográfico cyberpunk atua como uma pedagogia cultural que dissemina representações sobre um sujeito pós-moderno marcado pela hibridação do ser humano com o universo das novas tecnologias digitais.

No que diz respeito especificamente à relação do filme com os postulados do pós-modernismo, a principal questão abordada ao longo do enredo trata da identidade do protagonista Triz que enfrenta um cenário de mundos distópicos, divididos em facções, característica essa do cyberpunk. Na busca por entender porque as pessoas de sua comunidade deveriam ter apenas uma identidade, Triz encontra aliados na luta por defesa da do direito de ser diferente e de cada um possuir sua própria subjetividade, podendo assim, assumir identidades variadas de acordo com as ideologias de cada um.

Nesse contexto, ambos os filmes dialogam e representam sujeitos que sem hibridam como um composto entre digital e humano, sendo que o fio narrativo das obras funcionam como metáforas produtivas para discutir questões levantadas no âmbito das teorias do pós-modernismo sobre o sujeito contemporâneo. Nas palavras de Amaral (2003, p. 3),

São várias as origens filosóficas que desembocaram nas chamadas teorias pós-modernas para alguns, teorias da contemporaneidade para outros; e as controvérsias continuam no centro dos debates acadêmicos. Não cabe aqui esse debate e sim, apenas apresentar a pós-modernidade como um dos elementos que dá sustentação teórica à ficção científica e mais precisamente ao cyberpunk. (AMARAL, 2003, p. 3)

Essa sustentação teórica também está presente nos filmes Divergentes e Insurgente como um problematizador na condição da personagem Triz que se depara com a difícil escolha, de ser apenas um indivíduo definido por uma palavra que nomeia sua futura comunidade, ou facção. A personagem é condicionada a limitar suas atitudes e pensamentos às características engessadas de um determinado grupo, onde passará a fazer parte.

Pensando nas nomenclaturas dessas facções, Triz é atraída pela que lhe permite ser mais livre e ao mesmo tempo desafiada enquanto sujeito. Ela escolha o grupo audácia, onde conhece alguns divergentes como ela, dentre eles o personagem Quatro. Nessa comunidade, Triz passa a vestir somente preto, diferentemente da facção amizade onde vestia somente tons claros, além de receber treinamento pesado para a proteção dos demais grupos, pois, a audácia tinha como missão principal exercer o papel de guarda armada e exercito de defesa dos demais.

A dúvida encontrada pela personagem Triz é o desconforto de ver sua identidade fragmentada e delimitado a ser apenas o estabelecido por sua comunidade. Além disso, ela passa a ser um ser cyberpunk por estar sendo constantemente regida por um controle de vigilância digital comandado pela facção erudição. A mescla não é visível aos olhos, mas todos os habitantes

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das facções passam a ser, de certa forma, parte orgânico parte tecnológicos, porém, através de uma hibridação sem presença de fronteiras material e visíveis aos olhos, o que não modifica o estado desses indivíduos enquanto humanos interferidos pela tecnologia.

A mescla mencionada pode ser vista na figura 3, quando Triz está sendo utilizada como um estudo de caso para o controle dos demais sujeitos que se rebelarem contra o sistema de controle desenvolvido pela facção erudição. Nessa imagem, a personagem aparece conectada a cabos que se conectam à sua corrente sanguinea e que analizam a forma como ela reage a situações diferentes e à estimulos controlados por meio do ciberespaço.

Figura 3: A mescla invisível. Quando o cyberpunk deixa de ser uma hibridação material.

Fonte: http://globosatplay.globo.com/telecine/v/3835775/

As obras fílmicas apresentam a transição da personagem Triz, que carrega não somente a aparência humana, mas também, vontades, anseios e o desejo pelo livre arbítrio, misturados ao poder de interferência da tecnologia sobre as escolhas do homem. Os filmes Divergente e Insurgente interpelam o espectador para que reconheça a necessidade de lutar por justiça social. A tecnologia, nesse contexto, não é o verdadeiro protagonista, mas o próprio sujeito, mesmo que se trate de um sujeito marcado pela hibridação entre o orgânico e o invisível, a interferência inorgânica do ciberespaço. Nesse contexto, uma das principais mensagens produzidas pelo filme é de que a identidade do indivíduo contemporâneo não possui um fundamento absoluto e imutável e que cada vez mais, nos encontramos em uma condição cyberpunk pela forma como nos relacionamos com a tecnologia, bem como, como passamos a fazer escolhas que nos constituem enquanto sujeitos.

Referências

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Filmes Referidos

Divergente, 2014 – Direção de Neil Burger Insurgente, 2015 – Direção de Robert Schwentke

Figuras

Retiradas do filme Divergente, disponíveis no link

http://globosatplay.globo.com/telecine/v/3835775/

Retiradas do filme Insurgente, disponíveis no link http://megafilmeshd20.org/a-serie-divergente-insurgente/

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