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PRÁTICAS DE LAZER, ÁGUA, TURISMO E UNIDADES DE PROTEÇÃO: O CASO DA APA DO RIO TINGUÁ IGUAÇU - RJ

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PRÁTICAS DE LAZER, ÁGUA, TURISMO E UNIDADES DE

PROTEÇÃO: O CASO DA APA DO RIO TINGUÁ IGUAÇU - RJ

Fellipe José Silva Ferreira¹ Ana Lúcia Lucas Martins² Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

Resumo: Na pesquisa investigamos a diversidade de formas de apropriação da água nas

práticas sociais de lazer e turismo na Área de Proteção Ambiental (Apa) do Rio Tinguá Iguaçu, uma área de uso sustentável localizada na zona de amortecimento da Reserva Biológica do Tinguá (Rebio Tinguá), situada na Baixada Fluminense do estado do Rio de Janeiro. A água utilizada nas práticas de lazer e turismo é oriunda da Rebio Tinguá, uma área de proteção integral. A partir de dados qualitativos a pesquisa aborda as relações sociais e conflitos decorrentes de um cenário de diferentes usos da água, suas dimensões simbólicas e desigualdades nas formas de apropriação.

Palavras-chave: Água; Lazer e Turismo; Unidades de Conservação

1. INTRODUÇÃO

Na história da origem das unidades de conservação modernas, Diegues(1997) ressalta que existem relações entre a criação das primeiras áreas protegidas e as práticas de lazer e turismo. Segundo este autor(1997), o modelo de preservação de áreas naturais nascido nos Estados Unidos baseia-se na criação de ilhas de vida selvagem para a proteção dos recursos naturais ameaçados, onde não houvesse populações humanas:

A concepção dessas áreas protegidas provém do século passado, tendo sido criada primeiramente nos Estados Unidos, a fim de proteger a vida selvagem

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(wilderness) ameaçada, segundo seus idealizadores, pela civilização urbana industrial, destruidora da natureza. A idéia subjacente é que, mesmo que a biosfera fosse totalmente transformada, domesticada pelo homem, poderiam existir pedaços do mundo natural em seu estado primitivo, anterior à intervenção humana. (...)Para o naturalismo reativo do final do século passado, quando foi criado o primeiro parque nacional em Yellowstone, nos Estados Unido, a única forma de proteger a natureza era afastá-la do homem pelo estabelecimento de ilhas, para que o homem pudesse admirá-la e reverenciá-la. Esses lugares paradisíacos serviram também como locais selvagens, onde o homem pudesse refazer as energias gastas na vida estressante das cidades e no trabalho monótono e alienante. (DIEGUES,1997,p. 86).

Na citação acima, observamos algumas contradições que abarcam o processo de surgimento das unidades de conservação, pois, para o autor(1997), as áreas protegidas são criadas para proteger a “vida selvagem” das ameaças representadas pelos ideais desenvolvimentistas das civilizações urbana industrial do século XIX. A estratégia principal para a proteção da wilderness é afastá-la do homem formando ilhas de conservação, entretanto, o homem é autorizado a utilizar estas áreas para a fruição de um lazer com caráter compensatório dos estresses urbanos e do trabalho mecanizado e monótono.

Desta forma, em meados da década de década de 30 foram criadas as primeiras três unidades de conservação no Brasil, posteriormente, nos anos 40 foram criadas mais quatro unidades de conservação e em 1950 são criadas oito novas UCs, deste modo, no período entre 1930 e 1950 foram criadas a partir de decretos quinze áreas protegidas. Nos anos 60 e 70, observamos o início do processo de expansão das UCs, na década de 60 são constituídas trinta e uma unidades de conservação; e na década seguinte constatamos a criação de outras 38 áreas protegidas. Nestas duas últimas décadas citadas houve um crescimento de 345% em relação ao somatório das três primeiras décadas.

Da década de setenta para a década de oitenta, mais que triplicou o número de decretos de criação de unidades de conservação, pois, nos anos oitenta podemos visualizar a criação de 136 novas UCs em comparação com as 38 da década de 70.

Dos anos oitenta em diante, constatamos que a quantidade de UC apresenta um aumento gradual, visto que entre 1990 e 1999 são criadas mais 202 áreas naturais protegidas. E, finalmente, entre 2000 e abril de 2010 foram criadas mais 270 unidades de conservação.

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DATA DA CRIAÇÃO DAS UCs NO BRASIL ATÉ 2010 3 4 8 31 38 136 202 270 0 50 100 150 200 250 300 30 40 50 60 70 80 90 2010 DÉCADAS Q U ANT ID AD E

Este gráfico é produto da analise pormenorizada dos decretos de criação das atuais 692 unidades de conservação (UC) no Brasil, estes dados são oriundos do Cadastro Nacional de Unidades de Conservação, este banco de dados está disponível no site do Ministério do Meio Ambiente. Neste gráfico foram analisados os decretos de criação das categorias de manejo, segundo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação(2000):

I – Unidades de Proteção Integral

Estação Ecológica – 76; Reserva Biológica – 43; Parque Nacional, Estadual e Municipal –

208; Monumento Natural – 12; Refúgio de Vida Silvestre – 8

II – Unidades de Uso Sustentável

Área de Proteção Ambiental – 156; Área de Relevante Interesse Ecológico – 39; Floresta –

79; Reserva Extrativista – 59; Reserva de Desenvolvimento Sustentável – 12

Estes dados não contemplam as Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) e as Reservas de Fauna.

O histórico de degradação ambiental e as atuais mudanças climáticas formam um quadro de pressão socais pelo desenvolvimento sustentável das práticas de lazer e turismo

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em ambientes naturais que promovam a conservação da biodiversidade cultural e natural das áreas protegidas. Uma função vital do turismo verde é assegurar para as futuras gerações a conservação das áreas e da vida selvagem que nelas se encontra, refletindo os ideais de uso sustentável dos recursos naturais na atividade turística desenvolvidas em unidades de conservação. “O desenvolvimento desse novo turismo nasce do repúdio a aspectos da vida moderna, sobretudoa formas de transporte, energia e produção industrial e agrícola.” (URRY,1996, p.138)

Diante desta expansão da demanda por espaços naturais para a fruição de atividades de lazer e evasão dos centros urbanos, nesta pesquisa, entenderemos o lazer em ambientes naturais como um fenômeno histórico típico das sociedades industriais e pós-industriais.

A demanda das populações urbanas por áreas naturais é atribuída, por um lado, à vida conturbada e estressante das grandes cidades e, por outro, à propagação de conceitos e visões sobre a natureza e o mundo selvagem trazidos por um ideário ambientalista, que estimulou a produção de uma grande quantidade de documentários e programas de televisão sobre ecologia, vida animal, locais distantes, florestas, parques nacionais e, mais recentemente, culturas exóticas. Essa invasão dos meios de comunicação pelo tema ajudou a ampliar e a generalizar de tal forma essa demanda que, hoje, um dos principais problemas das áreas protegidas é lidar com o enorme contingente de turistas que atraem. (DA COSTA; CATÃO; PRADO, 2009,p.185).

Neste contexto, segundo Krippendorf (2000, p.46), “o turismo é uma válvula de escape que permite o relaxamento das tensões, a orientação das vias socialmente inofensivas e das irrealidades”. As tensões e estresses provocados pelo ritmo frenético das metrópoles e o difusão do mundo selvagem [neomitos(DIEGUES,1998)] pelos meios de comunicação são os elementos citados pelos autores(2009) que motivam as pessoas a procurarem os ambientes naturais para práticas sociais de lazer e turismo.

Segundo Elias e Dunning(1992, p.111), “as restrições emocionais do trabalho profissional alagam-se a um hábito de restrições inabalável, incluindo a vida não profissional das pessoas”. Os autores definem as funções específicas das atividades de lazer nas complexas sociedades industriais com uma elevada diferenciação de funções sociais, da seguinte maneira:

Sob a forma de fatos de lazer, em particular das classes mimética, a nossa sociedade satisfaz a necessidade de experimentar em público a explosão de fortes emoções – um tipo de

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excitação que não perturba nem coloca em risco a relativa ordem da vida social, como sucede com as excitações do tipo sério. (ELIAS;DUNNING.1992, p. 112)

O lazer, entendido como uma necessidade social das sociedades complexas e industriais, pode ser considerado uma dimensão da cultura, segundo Gomes (2004, p.125),“constituída pela vivência lúdica de manifestações culturais no tempo/espaço conquistado pelo sujeito ou grupo social, estabelecendo relações dialéticas com as necessidades, os deveres e as obrigações – especialmente com o trabalho produtivo”. Nesta perspectiva, acreditamos que o lazer interfere na construção da personalidade das pessoas e na estrutura social, podendo mediar posturas sustentáveis na relação homem/natureza.

Segundo Coriolano (2002), o turismo pode ser considerado uma atividade de lazer e um fenômeno social, caracterizado pelo deslocamento voluntário e temporário, onde a viagem turística não tem caráter de obrigatoriedade e remete ao retorno a residência habitual. O turismo, segundo a autora (2002) pode ser realizado por uma pessoa ou uma coletividade motivada por diversos elementos na buscas de satisfação, entretanto que compartilhem de momentos de recreação, descanso, recreação, contatos culturais, relações sociais e sociabilidades.

Nos estudos do antropólogo norte-americano, Jafar Jafari (apud BENI, 2001), o turismo: “é o estudo do homem longe de seu local de residência, da indústria que satisfaz suas necessidades, e dos impactos que ambos, ele e a indústria, geram sobre os ambientes físicos, econômicos e sociocultural da área receptora.”Na definição de Jafari, observamos o ser humano fora de seu local de residência e a indústria que o satisfaz como os principais objetos de estudo do turismo, analisando os impactos de ambos sobre os ambientes físicos, econômicos e socioculturais do destino.

Neste prisma, interpretaremos o turismo como uma possibilidade de lazer, todavia, o turismo representa uma atividade de lazer e um fenômeno sócio-cultural, político e ambiental; mas, consecutivamente, uma atividade econômica de relevância global. Chao(2004) visualiza a necessidade de uma educação ambiental integrada a vida e interdisciplinar, onde o lazer e o turismo em ambientes naturais seriam possibilidades de sensibilização ambiental e vivência que abranja o maior conjunto de aspectos inerente ao ecossistema e a realidade local.

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2. RESULTADOS E DISCUSSÕES

Em 23 de maio de 1989, a Reserva Biológica do Tinguá, segundo o Plano de Manejo(2006), foi criada por Decreto Federal nº 97.780. A Rebio-Tinguá como comumente é conhecida tem extensão de 26.136 hectares e sua área abrange o Maciço do Tinguá, Serras da Estrela, do Macuco e do Couto localizado no extremo norte da Baixada Fluminense e envolve uma pequena parte dos municípios de Japeri, Miguel Pereira e Petrópolis e grande porção de Nova Iguaçu e Duque de Caxias.

A Rebio Tinguá tem sua maior extensão territorial nos municípios da Baixada Fluminense. No site do IBAMA(Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis), visualizamos que o objetivo exclusivo da Rebio Tinguá é “proteger amostra representativa da Mata Atlântica e demais recursos naturais, com especial atenção para os recursos hídricos e proporcionar o desenvolvimento das pesquisas científicas e educação ambiental.”

O objetivo específico está em consonância com o Plano de Manejo da Rebio Tinguá(2006), ressaltando a maior atenção para os recursos hídricos, visto que os mananciais desta UC são responsáveis pelo abastecimento de parte do Rio de Janeiro e de quase 80% da Baixada Fluminense. Deste modo, a água pode ser interpretada em suas duas dimensões: elemento natural e recurso natural, respectivamente como recurso essencial para a vida Humana na Terra e produto de grande valor agregado pelo capitalismo na contemporaneidade, contudo, a água pode assumir dimensões simbólicas dentro de um sistema de relações sociais.

Entretanto, no item do site relativo aos usos conflitantes que afetam a unidade e seu entorno, observamos que:

Há grande pressão devido ao uso dos locais de captação de água e das cachoeiras próximas a unidade como área de lazer. Várias piscinas artificiais foram feitas por represamento, ao longo do Rio Tinguá. A caça e extração de palmitos também são muito praticadas na região da unidade.

Estas áreas de lazer ficam localizadas na sua maioria nas Áreas de Proteção Ambientais localizadas na Zona de Amortecimento da Rebio Tinguá, nesta perspectiva, na presente pesquisa, abordaremos o caso da APA Tinguá-Iguaçu.

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No desenvolvimento da pesquisa, conduzimos a seguinte tipologia de usos sociais da água no entorno da Rebio Tinguá: a) Os sítios são equipamentos privado de lazer pago, podem ser alugados por temporadas, estes compartilham de espaço construídos para day use(uso por um dia) e/ou hospedar visitantes; os turistas desfrutam de água tratada nas piscinas, esta água é oriunda da Rebio- Tinguá através de captação dos canos da CEDAE ou rios afluentes do Rio Boa Esperança e do Rio Tinguá; b) Fazendas tem características análogas aos dos sítios por serem equipamentos de lazer onde ocorre a cobrança de entradas, oferecem hospedagem, serviço de alimentação, múltiplas piscinas com água tratada, atividades relacionadas à zona rural, porém com fatores diferenciais como o fluxo intenso de pessoas; c) Os poços são formados devido ao represamento da água da cachoeira por donos de empreendimentos, na maioria bares construídos nas áreas onde deveria existir a mata ciliar. Os bares não contam com infra-estrutura de qualidade, portanto os banheiros são sujos e o lixo produzido pelos visitantes é levado pelas águas da cachoeira; d) E finalmente, as cachoeiras e represas da CEDAE que situam-se no interior da reserva biológica; e) Os moradores do bairro da Biquinha, localizados na margem da Rebio Tinguá, captam água em uma bica improvisada ou constroem poços artesianos de forma desordenada.

Entretanto, na analise da percepção dos residentes do Tinguá sobre o uso da água nas práticas de lazer e turismo nas margens da Rebio Tinguá, podemos identificar na entrevista com a moradora DM alguns indicadores de conflitos entre a população local/sitiante, moradores/visitantes.

DM: Esse pessoal que chegou ai depois [empreendedores], gente que tem condições financeiras. Eles compram sítio onde passa riacho, eles captam esta água, como uma piscina natural. Este fato, foi fazendo que o nível de água para os moradores fosse diminuído. Eles querem usufruir daquilo que eles compraram, mas está prejudicando os moradores. Creio que esta não seria a intenção deles. Porque eu estou pensando seriamente, mesmo sabendo que a comunidade sofre com a falta de água, em fazer um poço artesiano. Mesmo eu tendo esta consciência que eu irei ajudar a prejudicar ainda mais outras pessoas. Eu não tenho condições de comprar água, a dificuldade aqui é muito grande. Nós estudamos, trabalhamos lá embaixo, então isso traz um gasto muito grande para nós.

Nesta parte da entrevista observamos a existência de alguns conflitos entre os grupos de moradores de tinguá – empreendedores e moradores da Biquinha – devido ao

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processo de represamento de água (em forma de piscinas e poços) nas fazendas e sítios existentes na região, fato que segundo a entrevistada DM tende a diminuir a disponibilidade de água para os moradores localizados mais afastados da Rebio Tinguá, como é o caso da Biquinha.

Na percepção dos empreendedores locais, visualizamos uma situação de conflito entre o empreendedor e o segmento evangélico, pois, segundo o entrevistado este público durante as excursões religiosas gera múltiplos impactos negativos sobre o ambiente natural através do desmatamento, utilização da mata para fins de necessidades fisiológicas e produção de lixo.

Ele: Eu acho que a harmonia que existe na região entre a mata, a terra e a água, ela faz essa sincronia da pessoa com o meio ambiente, do homem com o meio ambiente. E isso trouxe esse público para cá, eles começaram a procurar áreas para fazer o retiro, começaram a entrar nas matas, só que também tem seu lado ruim, porque esse segmento, as Igrejas, quando elas vêem que procuram os famosos “montes”, vem com grupo de cinqüenta, sessenta pessoas assim...entra pelas matas, eles acabam causando um impacto que sem querer eles não percebem porque quando você vem sobre pro alto de uma serra dessa, com quarenta, cinqüenta pessoas para fazer um retiro de um feriado, você não vai com uma estrutura mínima, você não vai com banheiro químico, você não vai com água potável, você não vai com nada para lá, aí lá encima, eles usam a mata como banheiro, eles não querem saber que lá tem nascente que abastecem as propriedades embaixo, eles não levam saco para recolher o lixo que eles acabam gerando nessas áreas,então, eles acabam causando um impacto ambiental muito maior, do que quando você coordena essas pessoas numa área aí em baixo. Eles acabam causando desmatamento, abrindo clarera no mato, então isso não é bom, isso não é bom para agente. O turismo, aqui, eu acho muito bom, mas ele tem que ser ordenado, você tem que está ali encima vigiando.

O entrevistado PF cita que o equilíbrio entre mata, terra e água como os elementos que em conjunto polarizam o público evangélico para a região. Outros conflitos na APA do Rio Tinguá Iguaçu são decorrentes de invasões; as propriedades dos fazendeiros para a realização de cultos, batismos e “subidas ao monte”.

Os conflitos nesta localidade são oriundos do choque entre diferentes interesses (moradores, proprietários de fazendas e visitantes) na apropriação e uso da água e do espaço “natural” para fins de uso da água na vida cotidiana; comercialização do espaço para práticas de lazer e manifestações religiosas. Portanto, medidas de proteção da mata silvestre e seus recursos podem obedecer a ideais valorativos e utilitaristas, onde a preservação está diretamente relacionada ao valor de uso e de troca dos elementos constituintes do espaço

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natural.

Neste contexto de antagonismos causados pelo uso público da água e a conservação ambiental, Fracalanza (2005) ressalta a necessidade da mediação dos diferentes interesses dos atores sociais que fazem uso dos recursos em determinado espaço geográfico. Segundo Fracalanza(2005,p.32):

Deve-se observar que a apropriação da água envolve agentes com interesses distintos. Para fins de analise, podem ser considerados os seguintes grupos de agentes: os agentes socais – no caso os usuários da água, que necessitam de água e do espaço geográfico para realização de suas atividades, ou seja, que necessitam da água para viver; os agentes sociais que possuem interesses relacionados à valorização de seu capital e do espaço onde se encontra a água; os agentes governamentais – expressos através dos aparelhos do Estado – que além de promover ações que utilizam a água , implementam políticas que podem privilegiar alguns usos dos recursos hídricos em detrimento de outros usos; e os agentes governamentais responsáveis por disciplinar a atuação dos agentes na apropriação dos recursos disponíveis. Deve-se observar que estes grupos de agentes não são obrigatoriamente excludentes entre si, podendo existir agentes que pertençam a mais de um grupo.

Concordamos com a necessidade de mediação dos diferentes interesses dos atores sociais envolvidos na apropriação dos recursos hídricos para o entendimento e busca de soluções para os conflitos oriundos destas relações sociais influenciadas pela lógica valorativa capitalista. Deste modo, nesta pesquisa identificamos quatro grupos de atores sociais envolvidos nos conflitos na APA do Rio Tinguá Iguaçu: os moradores; os empreendedores locais; representantes do poder publico; e visitantes.

Fracalanza(2005) observa que estas relações sociais são permeadas por diferentes relações de poder dentro do desenvolvimento do processo de produção do social do espaço: “a definição dos usos dos recursos hídricos resultante deste embate que explicita diferentes relações de poder tecidas no processo de produção social do espaço.” (FRACALANZA,2005,p.33).

A autora (2005) conclui que para o sucesso na análise dos conflitos é essencial identificarmos e definirmos os interesses, as formas de atuação frente às possibilidades de uso da água em um cenário onde os antagonismos são fruto da apropriação privada de bens que constitui patrimônio nacional.

Na abordagem da legislação que garante os múltiplos usos da água no Brasil, Couri (2007) constata a instituição da igualdade de direitos de acesso à água, desde que

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obedecendo algumas exceções:

Com o advento da Lei no 9.433 [BRASIL (1997)], o princípio dos usos múltiplos foi instituído como um dos fundamentos da nossa Política Nacional de Recursos Hídricos e os diferentes setores usuários de recursos hídricos passaram a ter igualdade de direito de acesso à água. A única exceção, já estabelecida na própria lei, é que, em situações de escassez, a prioridade de uso da água no Brasil é o abastecimento público e a dessedentação de animais. (COURI,2007,p.159)

Couri (2007) ressalta que para alcançar uma gestão da água que garanta igualdade de acesso se faz necessário o diagnóstico das ameaças e oportunidades dos múltiplos usos nas esferas nacional e regional.

Por isso, tendo em vista que a gestão dos recursos hídricos deve garantir os usos múltiplos das águas, há necessidade de se definir adequadamente as condições de operação dos reservatórios, analisando, para cada situação, os benefícios e os prejuízos locais, regionais e nacionais, compatibilizando, sempre que possível, os diversos usos da água, já que não há ordem de prioridade definida na Lei para nenhum deles. Finalmente, é importante destacar que o setor “Turismo e Lazer” é um potencial gerador de empregos e renda e favorece a inclusão social, podendo ser estratégico, em certas regiões hidrográficas, priorizá-lo para favorecer seu desenvolvimento. (COURI,2007,p.159)

Na citação anterior, a autora (2007) enfatiza que o desenvolvimento estratégico do turismo e lazer nas bacias hidrográficas podem representar agentes geradores de emprego e renda, podendo também favorecer a inclusão social no caminho para o desenvolvimento sustentável.

3. CONCLUSÃO

Deste modo, a água pode ser interpretada em suas duas dimensões: elemento natural e recurso natural, respectivamente como recurso essencial para a vida Humana na Terra e produto de grande valor agregado pelo capitalismo na contemporaneidade, contudo, a água pode assumir dimensões simbólicas dentro de um sistema de relações sociais.

A entrevistada DM, moradora do Tinguá, ressalta que na APA do Rio Tinguá Iguaçu, a água é interpretada como fator de inclusão social, porque, apesar da região ser ponto de captação da CEDAE( Companhia de Estadual de Água e Esgoto), há a carência de água para no abastecimento das comunidades limítrofes da Rebio Tingua. Nesta perspectiva a água é observada pela entrevistada como símbolo de exclusão de um grupo de

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moradores.

Portanto, concluímos que além das três dimensões anteriormente citadas, a água assume mais três dimensões na região do Tinguá: 1 – Bens estar social, através da melhoria da qualidade de vida da população; 2 – Simbólica, pois constitui um mecanismo de inclusão social de grupos sociais; 3 – Política, pois a água é vista como um bem público e objeto de movimentos sociais;

Atualmente, em Tinguá constatamos pressões sociais em prol da recategorização da Reserva Biológica para uma categoria mais flexível de unidade de conservação, a opção mais cogitada seria um Parque Nacional, esta categoria pode maximizar o fluxo turístico neste espaço, tendendo a aumentar os impactos sobre os subsistemas econômico, ambiental e sociocultural. Entretanto, no histórico da apropriação da água para práticas sociais de lazer e turismo no Tinguá diagnosticamos a carência de investimentos públicos em infra-estrutura, a falte de participação dos moradores no planejamento estratégicos, a baixa interação/capacitação do trade e sensibilização ambiental dos visitantes, fatores que somados podem representar obstáculos para um desenvolvimento responsável da localidade.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Referências

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