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A REVISTA EDUCAÇÃO PHYSICA ( ): CIRCULAÇÃO DE SABERES PEDAGÓGICOS E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA

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A REVISTA EDUCAÇÃO PHYSICA (1932-1945):

CIRCULAÇÃO DE SABERES PEDAGÓGICOS E A FORMAÇÃO DO

PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA

Omar Schneider1 Mestrando em Educação: História, Política, Sociedade Pesquisador no Projeto Americanismo e Educação: a fabricação

do homem novo, coordenado pela Professora Doutora Mirian Jorge Warde

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

Resumo: o estudo debruça-se sobre a revista Educação Physica e caracteriza-se por projetar a formação do professor de Educação Física ocorrendo não só por meio das instituições formadoras, mas também pelo consumo de literaturas de destinação pedagógica. Busca estudar como o periódico é utilizado pelos seus diretores para se apresentarem como a voz autorizada da Educação Física brasileira, ao mesmo tempo em que procuram fazer circular um modelo de professor e os saberes necessários à sua formação.

Apresentação

A revista Educação Physica é o primeiro periódico comercial sobre Educação Física lançado no Brasil. Foi produzida no Rio de Janeiro, por iniciativa de dois professores de Educação Física, Paulo Lotufo e Oswaldo M. Resende, os quais foram seus primeiros diretores. Posteriormente a esses dois, soma-se outro, Roland de Souza, que, após exercer a função de tesoureiro em 1936, é incorporado à direção do projeto.

Nos treze anos em que o periódico circulou, foram lançadas 88 revistas. Dessas, dois exemplares foram publicados em edições conjugadas em um mesmo volume, a de número 28/29 e a de número 79/80. Por meio de um o banco de dados produzido no Microsoft Access sobre a revista, foi possível catalogar 3.5092 matérias, das quais 1.566 foram assinadas por 805 autores.

No primeiro editorial da revista Educação Physica, seus organizadores escrevem sobre os objetivos do periódico. Para eles, a revista funcionaria como um meio para o desenvolvimento esportivo no Brasil, “...cuidando, mui especialmente, do seu apuro technico e refinamento educacional” (Educação Physica, 1932, n. 1, p. 3). A revista tinha ainda o objetivo de ser

...uma força nova nos domínios da educação physica [e esperava] reunir todos os elementos mais representativos e de maior autoridade e competencia, no justo

1 Membro pesquisador do PROTEORIA, Instituto de Educação e Educação Física (http://www.proteoria.net). 2 Nesse total, estão incluídas todas as matérias que foram publicadas, não sendo discriminadas: as seções, os

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desejo de tornar um bloco único e indissoluvel todas as pequenas e grandes parcellas de verdadeiros valores que se acham esparsas (Educação Physica, 1932, n. 1, p. 3).

Conforme os diretores, a necessidade de lançar um periódico direcionado para a Educação Física, nesse período, ocorria por perceberem que “...os grandes educadores têm proclamado com eloquencia, com profunda verdade, a complexidade e o alcance da verdadeira e moderna educação” (Educação Physica, 1932, n. 4, p. 11).

Para os diretores, a circulação de um periódico especializado sobre Educação Física objetivaria “...crear o homem integral, o homem forte physica, moral e intellectualmente” (Educação Physica, 1932, n. 4, p. 11). Desse modo, a partir da veiculação da revista, pela circulação de novos modelos, pelas indicações sobre novas práticas corporais, e pela produção de novos hábitos “...homens novos, homens mais fortes, homens melhores vão surgir” (Educação Physica, 1932, n. 4, p. 11).

A partir do lançamento do segundo número, a revista começa a publicar uma série de princípios que a acompanham durante todo o período em que esteve em circulação. Eles são impressos sempre nas páginas iniciais, ou junto ao sumário (acima ou ao lado esquerdo) ou na página que o antecede, com especial destaque. De acordo com os diretores, a revista manifesta seus objetivos:

Vulgarizando os princípios scientíficos que servem de base á educação physica; Favorecendo o surto dos esportes, como factor de aperfeiçoamento da raça; Incentivando a formação de technicos especialistas;

Propagando os fins moraes e sociais das actividades physicas;

Despertando a attenção publica para esses aspecto do problema educativo;

Coadjuvando o governo e instituições particulares na execução de seus programmas

de educação physica;

Promovendo a união entre individuos e entidades que propugnam pelo progresso da

educação physica (Revista Educação Physica, 1932, n. 2, p. 3).

Na revista número quatro, o princípio que se relacionava com a promoção da união entre indivíduos e entidades para o progresso da Educação Física deixa de fazer parte da lista e não é substituído por outro. Assim, a partir do quarto número lançado, ela trabalha com seis objetivos, os quais serão veiculados, procurando fazer com que se tornem o fio condutor do projeto.

Considerações iniciais

O estudo debruça-se sobre a revista Educação Physica tomando-a como objeto e fonte. Busca, por meio do exame, compreender as prescrições em relação aos saberes

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necessários à formação do professor de Educação Física. O recorte temporal está circunscrito ao período em que o periódico foi produzido, ou seja, os anos de 1932 a 1945.

O núcleo de discussão do estudo articula o conceito de representação e o conceito de

estratégia (Chartier, 1990) na investigação, pois eles permitem que se evidenciem os

dispositivos de imposição de saberes e normatização de práticas (Carvalho, 1998). Mobilizar tais conceitos permite que se opere com o periódico prestando atenção aos usos prescritos e aos destinatários visados pela revista, sua configuração de dispositivo em que bens culturais são produzidos, postos em circulação e apropriados.

Visualizar o material impresso como estratégia permite observá-lo como representação, mas representação que não está envolta por uma aura de neutralidade, pois, segundo Chartier (1991), é preciso que se observe que essas representações são coletivas, o que pressupõe que estejam sempre em concorrência e em competição, fazendo com que se considere que são “...matrizes de práticas construtoras do próprio mundo social” (Chartier, 1991, p. 183).

Autores e prescrições

Nos treze anos em que a revista Educação Physica circulou, algumas seções estão presentes em quase todo o seu ciclo de vida. Uma delas, designada Lição de Educação Física, foi veiculada do número 35 (1938) ao 62 (1942). A seção Lição de Educação Física organizava-se como um receituário, local em que os professores tinham prescritas todas as atividades que deveriam ser realizadas na condução de sua aula. Essas seções abarcavam todos os graus de ensino e forneciam aos professores um itinerário de como deveriam ser estruturadas as aulas de Educação Física. Essas prescrições sobre como desenvolver uma aula considerada exemplar são veiculadas no periódico como uma tentativa de produzir a unidade de doutrina, uma organização que passava pela preparação do professor. Tal estratégia foi implementada de acordo com os princípios veiculados no periódico. Desse modo, a seção, constituía-se em um receituário prescritivo que abarcava nos mínimos detalhes os passos do professor, indicando a idade em que o indivíduo poderia ser submetida àquele tipo de exercitação, o tempo a ser dedicado a cada sessão, os gestos que deveriam ser realizados, formas de combinações possíveis entre cada gesto. Enfim, um modo de organização que colocava em cena modelos a serem imitados que, na visão dos diretores, efetivamente serviriam de ferramenta para a intervenção.

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Se produzir as lições que deveriam ser empregadas nas escolas não dava conta de determinar quais características o professor deveria desenvolver, a revista faz veicular representações sobre as qualidades que ele deveria cultivar para ser considerado um bom professor. Entre os textos publicados, encontram-se o produzido por Fernando de Azevedo (Educação Physica, 1936, n. 8, p. 15-17), intitulado: O papel do professor moderno de

Educação Physica, e o escrito por Hollanda Loyola (Educação Física, 1940, n. 42, p. 9), com

o título de O professor de Educação Física. Esses artigos marcam por serem prescritivos, no sentido de especificar um perfil desejável para o professor. Como exemplo da discussão que é conduzida na revista sobre a formação do professor de Educação Física, Hollanda Loyola faz o seguinte comentário:

...no conceito atual da verdadeira educação – a educação integral – êle [o professor] já não é mais o simples “mestre de ginástica”, o homem dos músculos hipertrofiados e das acrobacias sensacionais, o gigante da fôrça bruta, uma espécie de domador que as crianças temiam, e os rapazes respeitavam mais pelo mêdo do que pela consideração que se deve dispensar ao professor (Educação Física, 1940, n. 42, p. 9).

Contra essa forma de perceber a atuação do professor de Educação Física, busca-se produzir uma outra, em que ele passa a ser percebido como um educador. Nas palavras de Hollanda Loyola: “Hoje ele [o professor] é por excelência o educador a quem incube tornar o homem um valor positivo, uma parcela útil dentro da coletividade humana através do preparo físico e da formação moral da mocidade” (Educação Física, 1940, n. 42, p. 9).

Mas, para ser considerado um educador formado dentro dos princípios veiculados pelo periódico e tornar-se um modelo a ser seguido, esse professor deveria aperfeiçoar algumas qualidades. Essa formação, de acordo com Hollanda Loyola, obedecia a alguns critérios, entre as quais figuravam:

Desenvoltura intelectual, preparo técnico, conhecimento de humanidades, linguagem apurada, conduta exemplar, atitudes dignificantes, fôrça de vontade, senso de justiça, noção do dever, amor à Pátria, personalidade, idealismo, renuncia, convicção, disciplina, bondade e energia (Educação Física, 1940, n. 42, p. 9).

Para Hollanda Loyola (Educação Física, 1940, n. 42, p. 9), essa “...deve ser a mentalidade do moderno professor de educação física, o princípio que deve nortear a realização dos seus objetivos, as normas de sua conduta na escola e sociedade”. Desse modo, ele será “...por excelência o educador [...] [que] a mocidade seguirá, entusiasta e bela, forte e sobranceira, elevando a Pátria” (Educação Física, 1940, n. 42, p. 9).

Percebe-se nas palavras de Hollanda Loyola o embate entre duas formas de se representar o professor de Educação Física. De um lado, aquela que desacredita no seu papel

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educativo dentro da escola. De acordo com Lhote (1945), os professores dessa disciplina eram “...olhados como ginástas, profissionais de exibicionismo [...] [e a Educação Física como] imoral e corruptora de costumes” (Educação Física, 1945, n. 86, p. 86). Do outro lado, passa a ser veiculado pela revista um modelo de comportamento que apresenta o professor dessa disciplina como um educador, um homem preparado para formar física, intelectual e moralmente a mocidade brasileira.

Relacionados com os saberes considerados prioritários para a formação do professor de Educação Física, os diretores fazem circular, por meio da revista, conhecimento sobre as regras, sobre o domínio técnico dos esportes, sobre as modalidades de ginástica, da dança e das estratégias dos jogos. Nesse rol de conhecimentos, encontram-se também aqueles que buscam fundamentar os professores para discutir a Educação Física em outros domínios. Entre estes estão: os conhecimentos relacionados com a Fisiologia Humana, a Higiene e Puericultura, a Pedagogia e a História da Educação Física e dos Esportes. Também fazem saber aos leitores quais foram as grandes personalidades da Educação Física, os grandes propagadores dessa disciplina no Brasil e em outros países, os fatos que marcaram sua história e a relação dos clássicos do pensamento filosófico/educacional com a Educação Física.

Na tentativa que é realizada para tornar o periódico a voz autorizada da Educação Física brasileira, investe-se em discussões que tornem essa disciplina matéria obrigatória nas escolas. Nesse sentido os dirigentes incitam os professores a discutirem o lugar da Educação Física em uma reforma educacional. O tema é encaminhado deste modo:

Mudam-se e remudam-se os programas e os processos de ensino. Agora, está em elaboração, mais uma reforma do ensino. Cumpre que a educação physica seja devidamente considerada, que a sua pratica se torne obrigatoria. É inadmissivel que se pense em desenvolver apenas o cerebro, em detrimento do restante do organismo, deixando atrophiar-se, ademais disso, não seria possível ministrar, com effciencia, amplos ensinamentos intellectuaes, a indivíduos doentes, torturados por soffrimentos physicos (Educação Physica, Rio de Janeiro, 1937, n. 10, p. 6).

Auxiliar a Educação Física a ser reconhecida como disciplina escolar obrigatória é uma meta que a revista estabelece para si e para os professores. Instigando-os a requisitarem o seu lugar no sistema educacional, acrescentam:

A educação physica deve fazer parte dos programas de ensino, mas não com o caracter de facultativa, deve ser obrigatoria. De que nos servirá ter milhões de doutores que representem milhões de doentes? [...] [desse modo, os] os estabelecimentos de ensino secundário deverão possuir gymnasios, os seus alunos deverão obrigatoriamente praticar exercícios physicos (Educação Physica, Rio de Janeiro, 1937, n. 10, p. 6).

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Outro debate que a revista instiga diz respeito à aposentadoria do professor. Para os diretores era inconcebível que a aposentadoria do professor de Educação Física fosse regida pelas mesmas leis dos outros profissionais da educação. Para o professor de Educação Física reclamam um tempo menor para se aposentar. Acreditam que:

...o limite de sessenta anos fixado para a aposentadoria do professor de letras, em geral, é perfeitamente razoável, o mesmo, no entretanto, não se dá com o professor de Educação Física. com essa idade dificilmente [...] poderá exercer esse magistério especializado, que requer flexibilidade e dextreza, força e resistência, saúde e vitalidade, predicados físicos esses que, só excepcionalmente, se encontram na velhice. [Desse modo] [...] a lei da aposentadoria requer uma exceção para o professor de Educação Física. Sua aposentadoria não pode exceder dos cinqüenta anos (Educação Física, 1942, n. 69, p. 11).

Ao mesmo tempo em que os diretores apresentam um modelo que deve ser seguido pelo professor, no qual devem estar presentes qualidades como: vitalidade, virilidade e resistência física, não deixam de indicar que essas são insuficientes, pois, nesse novo modelo, deve estar presente a desenvoltura intelectual e o conhecimento de humanidades. Mas essas capacidades, de acordo com os diretores, não deveriam desenvolver-se sem linguagem apurada, conduta exemplar, atitude dignificante, força de vontade, senso de justiça, noção do dever, amor à Pátria, personalidade, idealismo, renuncia, convicção, disciplina e bondade.O que de acordo com os diretores, faria com que a Educação Física fosse reconhecida como atividade necessária ao bom desenvolvimento da sociedade brasileira, do mesmo modo, garantindo-lhe legitimidade como disciplina escolar.

Para concretizar esses objetivos, muitos autores se mobilizam ou são mobilizados, autores que escrevem para a revista, produzindo ou traduzindo e se empenhando em congregar para a causa da Educação Física intelectuais e autoridades do meio social, vivos ou falecidos, nacionais e estrangeiros.

Em uma seção chamada Educação, veiculada a partir do número 24 (1938), a estratégia de mobilizar autores que, de alguma maneira, contribuíssem para o discurso da Educação Física como prática educacional começa a ser realizada. Nessa seção, utilizam-se obras de autores de renome, vivos ou falecidos, do pensamento educacional. Expõe-se aos leitores o que grandes educadores/estadistas nacionais e internacionais disseram ou dizem sobre a Educação Física. Desse modo, recorrem ao pensamento de Manoel Bomfim, Everaldo Backheuver, Gustavo Capanema, Émile Durkheim, Jean Jacques Rousseau, Pestalozzi, John Dewey, Édouard Claparède, Maria Montessori, Priedrich Froebel entre outros, enfatizando suas prescrições sobre a necessidade de incorporar a Educação Física em um plano educacional.

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A seção Educação é estrategicamente colocada na segunda página do periódico, ao lado dos nomes dos responsáveis pela revista e seus representantes, assim, que as idéias expressas nesse espaço fossem compartilhadas por todos. Essa seção é extinta no número 72 (1943) e não é substituída por outra, apesar de o artifício de veicular textos de autoridades continuar a acontecer, como no caso da série de discursos que Rui Barbosa realiza sobre o

Conceito e importância da educação física, publicados nos números 42, 43, e 44 (1940).

Nesses seus treze anos de existência, a revista recebe contribuições de diferentes personalidades e, ao mesmo tempo, faz conhecer quais são. Se, desde a sua criação, a revista esporadicamente veicula imagens de pessoas consideradas importantes para a Educação Física nacional, a partir do número 47 (1940), essa estratégia passa a ser utilizada com mais freqüência. O espaço que é empregado para essa finalidade chama a atenção tanto pela localização dentro do corpo do periódico como pelo destaque que a ele é dado. Geralmente ele vem na terceira página da revista, ocupando-a na sua totalidade. É divulgada nesse espaço a imagem daqueles que os diretores compreendem como os líderes da Educação Física no Brasil. Por esse espaço são apresentados aos leitores os diretores dos clubes esportivos, grandes atletas do momento, recordistas e ganhadores de medalhas em esportes no Brasil e no exterior, dirigentes da Educação Física no Ministério da Educação e Saúde e outros órgãos educacionais, professores comprometidos com a área e militares envolvidos com a Educação Física.

É produzida uma rede de relações que mobiliza para a Educação Physica autoridades que dão credibilidade à causa, ao mesmo tempo em que buscam mostrar o crescimento dessa área nos países da Europa e nos Estados Unidos. A estratégia de fazer saber ao público leitor o grau de desenvolvimento da Educação Física em outros países, tanto serve para demonstrar que todos os países considerados modernos preocupavam-se com a Educação Física da sua população, como também para indicar aqueles que intecionavam entrar na modernidade. Se o Brasil tinha a intenção de ser reconhecido como um país moderno, desenvolvido e com uma população sadia, tinha de copiar o exemplo dos outros e investir na melhoria das condições de vida do seu povo, a qual ocorreria por meio da introdução de novas práticas e novos hábitos na sociedade, desse modo, produzindo uma nova mentalidade.

Durante o ciclo de vida do periódico, além de distribuir matérias que buscassem indicar uma conduta exemplar ao professor, os diretores também se empenham em apresentar obras tanto relacionadas diretamente com a Educação Física, como com outras áreas. Mesmo alguns dos diretores tiveram suas obras apresentadas pela revista. Assim, pode-se considerar que ela apresenta-se como dispositivo em que a veiculação de prescrições sobre os

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conhecimentos necessários aos professores de Educação Física se desdobra na difusão de leituras que completassem essa formação. São livros preocupados com o ensino dos esportes, jogos infantis, metodologia da ginástica, modalidades de lutas e saúde.

De acordo com diretores, a revista se constituía em uma enciclopédia em que os interessados na Educação Física, nos esportes e nos problemas de saúde encontrariam uma completa coletânea de artigos técnicos, doutrinários e científicos.3

No ano final de seu ciclo de vida, em editorial, os diretores gabam-se do trabalho realizado, afirmando que, com satisfação, percebem os progressos da Educação Física no Brasil. De acordo com eles, nesse momento, abandonam a

...peculiar modéstia [...] [e ] arrogamos o direito de falar em nome de todos que dedicam a esse mister na certeza de que a cada um cabe uma folhinha da corôa de louros conquistada [...] podemos afirmar, com convicção que a vitória foi estrondosa. Temos sob os nossos pés o poderoso inimigo que se nos fazia frente, – a incompreensão – suas casamatas e ninhos de raposa, uma após outra, foram totalmente conquistadas; estamos senhores absolutos do terreno (Educação Física, 1944, n. 86, p. 9).

Perceber o periódico como estratégia permite compreender o discurso como prática que pressupõe um lugar de poder e, ao mesmo tempo, um dispositivo de imposição de saberes e normatização de práticas escolares e não escolares. Nesse sentido, os discursos dos diretores investem na produção de um lugar de autoridade e ao mesmo tempo buscam imprimir nos leitores o sentimento de que esse lugar já havia sido conquistado e que eles faziam parte dessa vitória. No final do seu ciclo de vida da revista a Educação Física já havia sido incorporada ao sistema educacional como disciplina obrigatória. Seus diretores dão a perceber que as discussões encaminhadas no periódico foram vitais para mudar a percepção da sociedade em relação à Educação Física. Comentado sobre esse propósito assim se expressam:

‘Educação Física’ pode orgulhar-se de haver colaborado eficientemente numa das mais importantes causas nacionais [...] a Educação Física do povo brasileiro, já divulgando conhecimentos técnicos, já preparando a mentalidade daqueles que amanhã governarão os destinos do país (Educação Física, 1944, n. 79/80, p. 5).

3

Em nota na revista, os diretores informam que o educador que quisesse ser considerado um bom professor, deviria “...estar sempre em dia com os múltiplos aspectos do seu magistério [...] para isso é necessário comprar todos os livros que forem publicados nos mais variados idiomas [...], [e fazer] assinatura de revistas” (Educação Physica, 1943, n. 72, p. 6). Mas como nem todos os professores tinham essas condições, propõem que todos assinem a revista Educação Physica, pois essa se apresenta como uma “...síntese e uma seleção de tudo que há de mais moderno sobre educação física e depostos no Brasil e no mundo. É, pois, um dever de cultura e de honestidade profissional para o professor de educação assinar e ler ‘Educação Physica’” (Educação Physica, 1943, n. 72, p. 6).

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Conclusões

Deslocar o foco dos grandes recortes temáticos e centrar atenção na especificidade de um objeto é uma das proposições da História Cultural. Tomar o impresso como objeto, não apenas como fonte, é um dos caminhos possíveis para se produzir uma História da Educação e da Educação Física preocupada com a materialidade das práticas culturais.

A revista Educação Physica no período em que foi produzida, tornou-se responsável pela veiculação de variados temas ligados à Educação Física. Com o mapeamento da revista, percebe-se um grande número de artigos que intencionavam prescrever aos professores modos de agir não só no clube, mas também na escola. A revista funcionava como um verdadeiro repertório de saberes, estratégias que buscavam aproximar a Educação Física de vários campos do conhecimento, como a Antropologia, e sua relação com a área, do mesmo modo procedendo com a Sociologia, a Filosofia, a Fisiologia e a Psicologia.

Tratar a revista Educação Physica como estratégia de conformação de práticas e dispositivo de produção de sentidos permite algumas conclusões. Uma delas diz respeito à tendência de creditar ao Estado o posto de grande agente das modificações que se processaram a respeito da Educação e Educação Física no Brasil.

Visualizar as literaturas de destinação pedagógica como estratégia, permite que elas sejam observadas como dispositivos doutrinários, de produção e conformação do campo pedagógico e a mobilização, organização do professorado em torno de objetivos comuns.

O estudo da revista Educação Physica revela as representações que se produziram a respeito do professor dessa disciplina e mesmo sobre os saberes e as práticas necessárias à sua atuação na escola e em outros setores da sociedade, indicando quais estratégias foram organizadas pelos diretores da revista para interferir nas reformas educacionais ou para requisitar que reformas fossem realizadas. Percebe-se que essas visavam a produzir um conjunto de vozes autorizadas, consideradas capazes de definir quais saberes deveriam ser mobilizados pelo professor na condução das aulas e também expressavam a tentativa de se educar não só os professores de Educação Física, mas também o Estado a respeito de um modelo exemplar de professor, ou seja, um investimento na produção cultural, objetivando finalidades políticas.

Referências

AZEVEDO, Fernando. O papel do professor moderno de educação physica. Educação Physica, Rio de Janeiro, n. 8, p. 15-17, fev. 1936.

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CARVALHO, Marta Maria Chagas de. Pedagogia e usos escolares do impresso: uma incursão nos domínios da história cultural,1998. (mimeogra.).

CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel,1990.

EDITORIAL. Educação Physica, Rio de Janeiro, n. 1, p. 3, mar. 1932. ________. Educação Physica, Rio de Janeiro, n. 4, p. 11, mar. 1934.

DOZE anos de luta e perseverança. Educação Physica, Rio de Janeiro, n. 79/80, p. 5, maio/jun. 1944.

LHOTE. Um ano mais. Educação Physica, Rio de Janeiro, n. 86, p. 9, maio/jun. 1945.

LOYOLA, Hollanda. O professor de educação física. Educação Physica, Rio de Janeiro, n. 42, p. 9, maio 1940.

________. Aposentadoria na educação física. Educação Physica, Rio de Janeiro, n. 69, p. 11, out. 1942.

Contato

E-mail: omaratom@proteoria.net Home Page: http://www.proteoria.net

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