Doenças psiquiátricas na gravidez e no
puerpério
PROGRAMA DE FORMAÇÃO em SAÚDE MATERNA “Atualizações em obstetrícia e neonatologia”
Janeiro/Fevereiro 2017
Auditório do Hospital Pediátrico de Coimbra
Dr. J. M.Pitorra – Serviço de Obstetrícia – MBB / CHUC
Dra. Fabiane Neves Dra. Adriana Santos Dra. Ilda Murta
Epidemiologia
• Prevalência das perturbações psiquiátricas
▫ Subestimada e sub-diagnosticada • Depressão na gravidez :
▫ 7,4% , 12,8% e 12% , por cada trimestre, respetivamente
(Bennett et al., 2004)
▫ Adolescentes entre 16% e 44% (Szigethy e Ruiz, 2001)
▫ 13% no pós-parto (Metanálise 59 estudos, O’Hara e Swain, 1996)
• Psicose puerperal
▫ Incidência de 1,1 a 4 para cada 1.000 nascimentos (Bloch et al., 2003)
• “Maternity blues” (Cantilino, 2003)
• Riscos da gravidez + patologia psiquiátrica não tratada:
▫ Recusa de cuidados pré-natais
▫ Incapacidade para seguir orientações médicas ▫ Cuidado maternal e nutrição deficiente
▫ Abuso e dependência de álcool, tabaco e drogas ilícitas ▫ Risco de suicídio e infanticídio
▫ Dificuldades na interação mãe-bebé
▫ Impacto negativo no desenvolvimento neurológico e comportamental da descendência
▫ Abuso dos serviços de saúde ▫ Complicações obstétricas
▫ Baixo peso ao nascimento
▫ RCIU
•
Riscos associados aos psicofarmacos:
▫ Aborto
▫ Efeitos teratogénicos (2,0 – 2,5% no 1ºtrimestre) ▫ Toxicidade neonatal e o síndrome de
descontinuação (3º trimestre)
▫ Efeitos comportamentais e no desenvolvimento (desenvolvimento psicomotor e QI a longo prazo)
•
Não é possível desenvolver estudos
randomizados com placebo em grávidas
▫ Relatos de caso, casos-controlo ou estudos
epidemiológicos de coorte retrospetivos, com as suas limitações
A grávida tem
QUASE
SEMPRE
uma perceção exagerada dos riscos
teratogénicos
Risco de malformações congénitas na
população geral é de cerca de 1-4%
Classificação do risco teratogénico
• Para classificar o potencial de risco para o embrião ou feto dos fármacos que atravessam a placenta, a FDA (Food and
Drug Administration, USA) estabeleceu 5 categorias.
▫ A - Estudos controlados não mostram risco para seres humanos
▫ B - Sem evidência de risco para seres humanos, mas estudos adequados não foram realizados
▫ C - O risco para seres humanos não pode ser afastado
▫ D - Evidências positivas de risco para seres humanos, os riscos devem ser confrontados com os benefícios
Ac ta obst et G ine col Port ,20 10
Ac ta obst et G ine col Port ,20 10
Antidepressivos
•
4-10% das grávidas nos EUA e Canadá
•
Prevalência do uso de antidepressivos, durante
gravidez, tem
aumentado nos últimos anos
Antidepressivos Tricíclicos
• Nortriptilina (EUA)
• Mais seguros -> menor potencial anticolinérgicos
• Vários estudos mostram ausência de efeito teratogénico
• Sintomas transitórios de toxicidade (abstinência perinatal, na forma de letargia e hipotonia, bem como efeitos anticolinérgicos como obstipação, taquicardia e retenção urinária)
• Sem evidência de alterações comportamentais , QI ou alterações da linguagem a longo prazo (Costa, 2009)
Inibidores seletivos da recaptação da
serotonina
• RR de malformações major (escitalopram,
fluoxetina, fluvoxamina, paroxetina, sertralina) foi de 2,01%
• Sertralina e Citalopram são seguros (risco B)
• Paroxetina – risco teratogénico importante (risco D), |William e Wooltorton ,2005|
• Fluoxetina - melhor estudado na gravidez
▫ Aceitável no 1º trimestre. No 3º trimestre - risco de complicações perinatais (semivida longa)
▫ Estudos mostram que não há alterações, em relação ao desenvolvimento físico, intelectual, social ou de
linguagem em crianças expostas in utero , em idade escolar
Outros antidepressivos
•
A venlafaxina(Efexor® )e a
mirtazapina(Remeron ®) têm classificação C,
sendo o seu uso durante a gravidez cada vez
mais frequente
•
A duloxetina(Cymbalta ®) é um fármaco muito
recente e ainda não tem classificação apropriada
Benzodiazepinas
•
Risco de malformações fetais superior quando o
feto é exposto entre a 2ª e a 8ª semana após a
conceção
•
Uso intermitente de pequenas doses de BZ com
semivida curta poderá ser útil em diversas
etapas da gravidez
Benzodiazepinas
•
Estudos que avaliaram as anormalidades
neurocomportamentais das crianças expostas a
benzodiazepinas in utero, não encontraram
deficits motores, cognitivos e de QI até os quatro
anos de idade.
Estabilizadores de membrana
•
Carbonato de lítio(Priadel ®)
▫ Uma revisão crítica sobre o uso do lítio durante a gravidez, após a análise dos resultados de estudos prospetivos e retrospetivos e um pequeno número de casos clínicos , sugerem que o lítio é um
teratogénico "fraco" em seres humanos
Estabilizadores de membrana
•
Carbonato de lítio
▫ Malformações, em particular cardiovasculares
(Anomalia de Ebstein, risco absoluto de 0,05-0,1% no 1º trimestre) – Ecografia (coração e coluna) as 16-18 semanas
▫ Desaconselhado no 1º trimestre e requer monitorização semanal da litemia
Estabilizadores de membrana
• Carbonato de lítio
• Na fase final da gravidez – “Floppy baby”
• Guidlines de tratamento em sido popostas para melhorar o
bem-estar neonatal quando o lítio é indicado no final da gravidez
• O follow up de crianças (3-3,5 anos) expostas ao lítio durante a gravidez não revelou evidência de problemas comportamentais significativos
• As grávidas tratadas com lítio devem ser informadas e acompanhadas apertadamente, devido a embriologia cardíaca
• Não há nenhuma razão para não tratar uma mulher além da oitava semana de gravidez
Estabilizadores de membrana
•
Carbamazepina(Tegretol ®)
▫ Risco 2-3x superior de malformações cardíacas, especialmente de espinha bífida quando utilizada nos dois primeiros trimestres
▫ Ecocardiografia durante a 16ª e a 18ª semana ▫ Pode causar deficiência de vitamina K no feto (>
risco de hemorragia neonatal)
▫ Aconselha-se administrar folatos e vitamina K
Estabilizadores de membrana
•
Valproato de sódio(Depakine ®)
▫ Risco de malformação fetal está associado à dose utilizada (preferir doses baixas e fracionadas)
▫ Os defeitos do tubo neural são as anomalias mais comuns - 1-2% dos fetos expostos (risco na
população geral - 0,5%)
▫ Deteção de malformação do tubo neural
-doseamentos da alfa fetoproteína e a ecografia (18ª e a 22ª semana)
Estabilizadores de membrana
•
Carbamazepina e Valproato de sódio(Depakine ®)
▫ Pior desenvolvimento da criança – QI baixo ,
autismo, menor capacidade de memória e défice de atenção
Estabilizadores de membrana
•
Lamotrigina(Lamictal ®)
▫ Na América do Norte foi associado a um menor
risco de malformações do que os anti-epiléticos de primeira geração ( Hernández- Diaz et al . , 2012) ▫ No registo Europeu de farmacos anti-epilépticos
durante a gravidez ( Tomson et al. , 2011) , o risco de malformações com lamotrigina foi menor do que naqueles expostos a carbamazepina,
Estabilizadores de membrana
•
Lamotrigina
▫ Utilizar a menor dose eficaz
▫ Aumento do risco de lábio leporino (0,1-0,4%) ▫ Estudos que avaliaram as anormalidades
neurocomportamentais das crianças expostas a lamotrigina in utero, não encontraram deficits motores, cognitivos e de QI
▫ Aumento do risco de cesariana, rotura prematura de membranas, pré- eclampsia e RCIU
Estabilizadores de membrana
•
Topiramato(Topamax ®)
▫ Aumento do risco de RCIU, mas sem aumento de parto prematuro
▫ Aumento de três vezes no risco de malformações em geral, em grande parte devido a um aumento do risco de lábio leporino com ou sem fenda
palatina
▫ Não há informações disponíveis sobre o efeito no QI ou habilidades de aprendizagem.
•
Planear a gravidez
▫ Em doença com gravidade moderada - retirar medicação progressivamente (bruscamente – risco de recaídas)
▫ Se lítio - 3-5 dias após teste de gravidez positivo ▫ Em casos graves, manter a menor dose eficaz
• Dar preferência a farmacos com maior evidência de segurança
• Sempre que possível preferir monoterapia
• Utilizar a menor dose eficaz para controlo dos sintomas
• Monitorizar a concentração sérica dos psicofarmacos quando possível
• Ecocardiografia fetal entre a 10ª e a 14ª semana e entre a 18ª e a 20ª semana
• Avaliação da toxicidade neonatal
• Avaliar possibilidade alterações psiquiátricas no período pós-parto
• Adequar conduta consoante gravidade da doença
•
As consultas pré-natais oferecem uma
oportunidade para identificar sintomas precoces
e aplicar tratamento apropriado
•
Intervenções efetivas durante gravidez podem
prevenir sintomas psiquiátricos durante o
período pós-parto, um período de alto risco para
a exacerbação de distúrbios psiquiátricos
Finalmente…
•
A orientação das grávidas com patologia
psiquiátrica durante a gravidez e o período
pós-parto é um processo dinâmico onde as decisões
sobre a terapêutica dependem do curso
RESUMINDO
Generalização da medicação psicotrópica grande incidência na idade reprodutora habitualmente de longa duração
segurança da maioria dos fármacos em questão
benefícios na estabilidade emocional da grávida
Benefícios nos resultados obstétricos
Melhoria na relação mãe/filho
Avaliações pediátricas sobreponíveis à população
geral
ATITUDES
Avaliação pré concecional como objetivo
•
Direito à maternidade
•
Otimização da decisão
Consulta de psiquiatria de ligação
consulta pré concecional
Unidade de Intervenção Precoce
MBB
Gravidez “acidental” como regra
ambivalência como regra
conceitos errados como regra
•
Normalização de condutas nos cuidados de
saúde
•
Fomento da acessibilidade
Tranquilizar
referenciar precocemente
evitar interrupções terapêuticas abruptas
•
Consulta de referência como norma
Bibliografia
• Kohen D. Psychotropic medication in pregnancy. Advances in Psychiatric Treatment, 2004
• Lund N, Henriksen T. Selective Serotonin Reuptake Inhibitor Exposure In Utero and Pregnancy
Outcomes. Arch pediatr adolesc med, 2009
• Galbally et al. Mood stabilizers in pregnancy: a systematic review. The Royal Australian and New
Zealand College of Psychiatrists, 2010
• Costa C, Reis C e Coelho R. Uso de psicofármacos na gravidez.Use of psychotropic drugs during
pregnancy. Acta obstet Ginecol Port, 2010
• Walfisch A. Maternal depression and perception of teratogenicity. J Popul Ther Clin Pharmacol,
2012
• Holmes L e Hernandez-Diaz S. Newer Anticonvulsants: Lamotrigine, Topiramate and
Gabapentin. Birth Defects Research (Part A): Clinical and Molecular Teratology,2012
• Clark C,.Kein, A, Perel J,Helsel J e Wisner K. Lamotrigine Dosing for Pregnant Patients With
Bipolar Disorder. Am J Psychiatry ,2013
• Vajda F et al. Associations between particular types of fetal malformation and antiepileptic drug