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Academic year: 2021

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“What is that?”

Camila Alkmim Bianco

Ruth Gelehrter da Costa Lopes

Sinopse

Pai e filho estão sentados em um banco. De repente um pardal se aproxima

deles e o pai pergunta insistentemente ao filho “O que é isso?”. A reação do

filho diante desta insistente pergunta, e a surpreendente atitude do pai

exemplificam, claramente, o descompasso intergeracional e o poder de

resposta dos mais velhos.

Entrevista

Realizada por e-mail a F., psicóloga e professora, entre 45-55 anos.

O que é envelhecer?

O envelhecimento é um processo natural que ocorre na última etapa do ciclo

vital, caracterizado por mudanças físicas, psicológicas e sociais. Neste

momento o equilíbrio entre perdas e ganhos torna-se negativo e, portanto, a

otimização de recursos como compensação das primeiras é fundamental para

que o envelhecer ocorra de maneira saudável.

Deve-se considerar a inter-relação entre o tempo vital cronológico – que se

manifesta pelo embranquecimento dos cabelos, perdas auditivas e visuais,

diminuição da imunidade, maior tempo de reação às mudanças do ambiente e

também às psicológicas, etc.; o social - referente às expectativas sociais para

este momento do desenvolvimento.

Na nossa sociedade o idoso é visto de forma negativa, como não produtivo,

descartável, inútil, sendo marginalizado; entretanto, também há associações

positivas, como as relativas à sabedoria, integridade e experiência; - e o tempo

histórico, referente aos eventos sociais, econômicos, políticos, etc. A geração

atual de idosos testemunhou e participou de muitas mudanças nesse âmbito,

referentes à aceleração histórica.

É muito recorrente/comum o descaso, a impaciência, o preconceito e os

maltratos (físicos e/ou verbais) por conta da idade do idoso e de suas

limitações?

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Sim, e também porque o idoso remete ao nosso próprio envelhecimento e

morte. Muitas vezes precisam ser cuidados, o que nem sempre ocorre de

maneira positiva.

Os idosos usualmente sentem-se injustiçados ao comparar o tratamento

que deram aos filhos (quando pequenos e ao longo da vida, de modo

geral) e o tratamento que recebem dos seus filhos atualmente?

Não sei se usualmente, mas o cuidado dispensado ao idoso pode ter vários

sentidos, entre eles: retribuição, favor, peso, retaliação, privilégio, etc.

A sensação de ser um estorvo, estar atrapalhando, é comum? O que a

maioria dos idosos diz a respeito?

Sim. É uma necessidade de o idoso ter espaço - físico, emocional e social -

para envelhecer, o que frequentemente não ocorre. No passado as mulheres

eram as cuidadoras dos filhos, do marido, da casa, dos doentes e idosos. Com

sua entrada em massa para o mercado de trabalho na segunda metade do

século XX e mudanças relativas aos valores, como a busca de harmonização

da autonomia e do cuidado com o outro para homens e mulheres,

apresentou-se uma questão fundamental: quem cuida dos idosos? A manutenção do

agenciamento e de uma rede social poderia minorar as sensações descritas.

A maior parte dos idosos dá à velhice uma conotação boa e/ou ruim? Por

quê?

A conotação negativa dada por muitos idosos à velhice muitas vezes deve-se

às crenças sociais relativas ao envelhecer, que os associam a fardo,

inutilidade, problemas, etc., e às perdas frequentemente superpostas: viuvez,

morte de amigos e parentes, aposentadoria com perda da identidade

profissional, do reconhecimento e da validação. Além disso, da redução dos

rendimentos, adoecimento, que levam à vivência de muitas rupturas, nem

sempre bem elaboradas.

Por outro lado há idosos que validam não só seu ciclo vital, como também seu

presente, conservando e reavaliando metas e objetivos futuros. Compensam as

perdas desenvolvendo novos ou ativando recursos já existentes, desfrutando

das mudanças positivas no seu desenvolvimento, como uma relação de maior

cumplicidade e intimidade com o(a) cônjuge, a relação mais livre com filhos e

netos, a sabedoria e a integridade, no sentido de uma percepção de seu ciclo

vital como único e válido.

Como você vê o diálogo entre o envelhecer, enquanto possibilidade de

retomada de dependências, e a relação com os filhos: se eles cogitam

trazer os pais idosos para morarem junto, se visitam com frequência

estes pais, o contato que tem com eles, o tratamento e respeito que dão,

se os idosos cogitam voltar a morar com seus filhos, etc.?

Na verdade a dependência, emocional ou instrumental, não é uma inversão da

hierarquia, pois os pais são mais velhos, tem maior experiência e vivência do

que seus filhos. Portanto, a ideia de que “o velho volta a ser criança” é falsa,

embora frequente. É um desafio para esta e as próximas gerações lidarem com

o envelhecimento da população mundial, devido, entre outros fatores, à queda

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da natalidade e aumento da longevidade. Associam-se a isto a falta de

cuidadores, dificuldades econômicas, físicas e psicológicas que podem cercar

o envelhecimento. Tem-se neste momento do ciclo vital familiar três crises

alinhadas: a dos jovens em sua crise de identidade, a geração do meio vivendo

a crise da meia-idade e os idosos, as vicissitudes do envelhecimento. Esta fase

pode representar risco ou oportunidade de crescimento para a família e seus

membros.

Mais algum comentário sobre o vídeo?

O vídeo instiga a reflexão sobre o envelhecimento e as relações entre as

gerações, com beleza e simplicidade.

Análise do filme

Segundo Bertamoni (2009), a antropologia mostra que as noções de tempo e de temporalidade comportam grandes variações, alterando-se muito entre culturas distintas e no movimento histórico ao qual cada uma delas está inserida. O tema de tempo e temporalidade está estreitamente ligado a existência humana e, fortemente presentes há muito tempo, no imaginário social, no pensamento filosófico e na ciência.

A ideia de tempo envolve uma multiplicidade de conceitos: tempo físico, biológico, subjetivo, cultural, etc. Por essa razão, temos inúmeras dificuldades na definição da temporalidade, que em última analise, são causadas pela polissemia da palavra tempo (BASTOS citado por BERTAMONI, 2009).

A temporalidade, antes fluida e cambiante, transformou-se, na modernidade, em linearidade, em temporalidade rápida, fugaz e passageira bem como “espacializada”. Neste sentido, o tempo é entendido como um continuum rígido e delimitado preenchido por “coisas” (ALMEIDA citado por BERTAMONI, 2009). É importante ressaltar que o lugar da velhice na sociedade moderna é comumente desconfortável. O modo de produção da contemporaneidade exige agilidade e vigor físico, características próprias a idades que antecedem a velhice. Por outro lado o sistema produtivo exige, cada vez mais, atualizações e conhecimentos frequentemente desconhecidos e estranhos a idades mais avançadas. Neste sentido

[...] a marginalização dos velhos em uma época em que a marcha da história está cada vez mais acelerada é um dado de fato que é impossível ignorar. Nas sociedades tradicionais e estáticas, que evoluem lentamente, o velho reúne em si o patrimônio cultural da comunidade, destacando-se em relação a todos os outros membros do grupo. [...] Nas sociedades evoluídas, as transformações cada vez mais rápidas, quer dos costumes, quer das artes, viraram de cabeça para baixo o relacionamento entre quem sabe e quem não sabe. Cada vez mais, o velho passa a ser aquele que não sabe em relação aos jovens que sabem, e

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estes sabem, entre outras razões, porque tem mais facilidade para aprender (BOBBIO, 1997: 20).

Para Bianchi citado por Aleotti (2004) envelhecer é construir um caminho próprio e, deste modo, a urgência da vida é entendida como presente em qualquer idade. A empreitada principal é a de se manter vivo e encontrar vias de expressão ajustadas às exigências de um desejo ilimitado que deve ser cerceado. No final da vida o indivíduo deve renunciar, de alguma forma, a continuidade biológica, e criar formas substitutivas, uma vez que ele se depara com o aspecto da conservação de um sentido dado à própria vida e, ao mesmo tempo, com a prova de realidade da finitude desta vida.

A sociedade industrial é maléfica para a velhice [...]. (Ela) rejeita o velho, não oferece nenhuma sobrevivência à sua obra. Perdendo a força de trabalho, ele já não éprodutor nem reprodutor. Se a posse e a propriedade constituem, segundo Sartre, uma defesa contra o outro, o velho de uma classe favorecida defende-se pela acumulação de bens. Suas propriedades o defendem da desvalorização de sua pessoa. O velho não participa da produção, não faz nada; deve ser tutelado, como um menor. Quando as pessoas absorvem tais ideias da classe dominante, agem como loucas, porque delineiam seu próprio futuro (BOSI, apud BERTAMONI, 2009).

Os problemas dessa fase da vida, para Bianchi citado por Aleotti (2004), não podem ser cindidos da evolução integral do sujeito. O envelhecer faz parte do desenvolvimento, bem como a identidade deve ser vista como uma sucessão de remanejamentos, pelos quais um indivíduo passa ao longo da vida, de modo que se faça possível compreender as atitudes, os conflitos e exigências próprios aos idosos.

Segundo Pollock, citado por Aleotti (2004), a velhice pode ser compreendida psicologicamente como uma época, ciclo ou estágio específico do desenvolvimento. Nas transições entre idades cronológicas emergem novas estruturas ausentes nos períodos anteriores e, deste modo, é possível notar mudanças e reorganizações em todo o curso do desenvolvimento, tendo na velhice, como qualquer outra fase, preocupações, problemas e recompensas próprias.

Na velhice, qualquer que seja a estrutura (do sujeito), há sempre modificações das relações entre as instâncias, o que significa praticamente uma redefinição do sujeito psíquico. (BIANCHI citado por ALEOTTI, 2004)

Aleotti (2004) relata, a esse respeito, que o investimento defensivo de determinados conteúdos e as representações inconscientes para o narcisismo retomam a um tempo em que o velho sentiu-se amado e protegido. Deste modo, há uma busca de uma eternidade impossível, podendo haver também uma busca de manter trocas, de uma porosidade entre o Eu e o Id que mantenha as trocas. Bianchi citado por Aleotti (2004) ressalta que o envelhecer psíquico implica em uma cisão entre o Eu e o Id, considerado como fonte de mudança possível.

Ao lado da velhice censitária ou cronológica e da velhice burocrática, existe também a velhice psicológica ou subjetiva. Biologicamente, considero que minha

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velhice começou no limiar dos oitenta anos. No entanto, psicologicamente sempre me considerei um pouco velho, mesmo quando jovem. Fui velho quando era jovem e quando velho ainda me considerava jovem até há poucos anos. Agora penso ser mesmo velho-velho. (BOBBIO, 1997: 18)

Bianchi citado por Aleotti (2004) ainda adverte que o aparelho psíquico tem a função de manter a própria continuidade e esta só é garantida pela troca com o exterior. Para isto o indivíduo deve realizar um trabalho de luto da continuidade da existência em que o Eu admite que a continuidade esteja fadada ao rompimento, assim como a morte não é algo a que se pode adaptar. Atualmente a referência temporal do “melhor tempo” da vida é referido à juventude, e à sua eterna busca. A juventude é cultuada em diversos meios de comunicação e difundida na sociedade contemporânea.

No filme “What is that?” (2007) o tratamento à velhice é difundido mediante a relação de impaciência do filho para com seu pai, já idoso. O pai, sentado ao lado do filho que esta a ler um livro, pergunta diversas vezes “o que é isso?” ao ver um passarinho. O filho responde calmamente, nas poucas primeiras vezes, perdendo logo a paciência para com o pai e gritando com ele. É possível notar, neste sentido, uma reversão, de certo modo, nos papéis exercidos entre eles. O filho assume uma postura de quem sabe e de quem ensina, contudo de maneira limitada (ensina apenas uma vez), enquanto o pai passa a ser visto como maluco ou mesmo como caduco ao fazer a mesma pergunta consecutivamente, aquele que esqueceu e que deve, portanto, (re) aprender.

O pai está, por sua vez, está realizando uma tentativa de manutenção de sua própria continuidade, ao relacionar-se com o externo (filho), e testando o filho em relação ao comportamento que ele teria na situação anteriormente vivenciada quando este era criança e perguntava por muitas vezes ao pai “o que é isso?” ao ver o passarinho. O pai percebe, então, que o comportamento do filho é diferente do que o que ele, como pai, teve quando a situação era inversa. Sente-se injustiçado e tem a necessidade de mostrar ao filho o carinho que teve e tem por ele. Traz o livro (espécie de diário) em que relata o episódio vivenciado com o filho enquanto criança e diz “Eu o abracei a cada vez que ele me fazia a mesma pergunta, de novo e de novo, sem me zangar, sentindo carinho pelo meu inocente garotinho”. Em seguida, é exibido o semblante de alívio do pai, que se sente com a consciência tranqüila de ter feito e sido o melhor pai que lhe era possível.

Neste sentido, ele retoma uma situação do passado visando repeti-la em um contexto contrário no qual é ele quem está mais frágil, necessitado de carinho, de atenção, de paciência e de respeito. O filho, por sua vez, trata o pai de modo a desvalorizar a velhice e o próprio pai, enquanto idoso, reproduzindo a noção comumente divulgada na sociedade contemporânea de que a velhice é um período ruim em que a pessoa já não “serve” para nada e é desprezada. O filho, então, após o relato do pai, toma consciência do tratamento que deu a ele, naquela situação, redimindo-se em um abraço.

Este abraço é bastante significativo para o desfecho da história uma vez que ilustra a retomada do vínculo e apego entre pai e filho. Além disso, ilustra uma ampliação da consciência do filho em reconhecer a importância, valor e amor pelo pai. Neste sentido, o filho passa a enxergar seu pai, enquanto indivíduo, e não

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como uma personificação da velhice e, de certo modo, “purifica” seu olhar perante aquele que está sentado ao seu lado aproximando-se dele. A partir desse momento, ele passa a enxergar o indivíduo, reconhece o seu pai de sempre, e o trata como tal.

Ficha Técnica

Título: What is that?

Título original: Τι είναι αυτό

Gênero: drama

Duração: 5’31’’

Ano de lançamento: 2007 (Grécia)

Produzido por: Películas MovieTeller

Direção: Constantin Pilavios

Roteiro: Nikos & Constantin Pilavios

Fotografia: Zoe Manta

Música: Christos Triantafillou

Som: Teo Babouris

Mixado: Kostas Varibobiotis

Referências

ALEOTTI, Renata. Disfunção erétil e sua teia de significados. Excerto da

Dissertação (Doutorado em Psicologia Clínica), Pontifícia Universidade

Católica, São Paulo, 2004.

BERTAMONI, Hélia Fraga Gomes. Entre Cronos e Kairós: a auto-percepcao da idade na velhice. Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade Católica, São Paulo, 2009.

BOBBIO, Norberto. O tempo da memória – de senectude e outros escritos autobiográficos. Rio de Janeiro: Campus, 1997.

WHAT is that? Direção: Constantin Pilavios. Produção: Películas MovieTeller.

Grécia, 2007. Cor, Dolby digital. 5 min.

What is that? (2007). Disponível em

Referências

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