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As mulheres na migração internacional:As diferenças nas estratégias de homens e mulheres ao longo da trajetória migratória

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As mulheres na migração internacional:As diferenças nas

estratégias de homens e mulheres ao longo da trajetória

migratória

Roberta Guimarães Peres

Palavras Chave: Migração Internacional, Gênero, Estados Unidos, Japão

Resumo

Desde meados do século XX, o papel do Brasil no panorama migratório mundial tem sofrido uma transformação. Até então, a característica principal do país era justamente a recepção de migrantes que chegavam pelos mais diversos motivos, desde refugiados de guerra àqueles que sonhavam construir grandes riquezas.

O que se tem observado nas últimas décadas, no entanto, é uma inversão desse papel: pouco a pouco o Brasil vem se estabelecendo como exportador de mão-de-obra para países do primeiro mundo, como Estados Unidos e Japão. Esses dois países já concentram, segundo dados do Ministério das Relações Exteriores, o primeiro e o terceiro maiores grupos de brasileiros no exterior, respectivamente (Sales, 1999). O trabalho idealizado nesse resumo, procura estabelecer novas hipóteses acerca desse maior grupo de brasileiros fora de seu país natal, tratando especialmente da questão da entrada das mulheres nos fluxos migratórios Brasil – Estados Unidos e Brasil – Japão, sob a perspectiva da feminização dos deslocamentos populacionais, com a pretensão de trazer o gênero para o primeiro plano das análises, observando desde o uso das redes sociais até a inserção no mercado de trabalho, que se dão de formas específicas e diferenciadas para homens e mulheres.

Trabalho apresentado no XIV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em Caxambu – MG – Brasil, de 20 – 24 de setembro de 2004

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As mulheres na migração internacional:As diferenças nas

estratégias de homens e mulheres ao longo da trajetória migratória∗

Roberta Guimarães Peres

Introdução

Para este trabalho, foi escolhido como tema a análise da migração internacional sobre uma perspectiva específica: a variável gênero. Os anos 90 constituíram um momento de legitimação do gênero como categoria de análise acadêmica, e como referencial para o diagnóstico das desigualdades existentes entre os sexos no âmbito dos fenômenos sociais. Para tanto, o objeto a ser observado está dividido em dois fluxos migratórios distintos: o que parte da cidade de Criciúma – SC principalmente para os Estados Unidos e o que tem origem na cidade de Maringá – PR para o Japão. Se compararmos gênero a outras variáveis explicativas, podemos constatar que o fenômeno migratório tem sido, exceto em alguns casos, observado, justificado e analisado sob uma perspectiva econômica, deixando de lado outras variáveis que podem não somente descrever, mas explicar o fenômeno de modo mais detalhado, refinado, preenchendo lacunas deixadas por aquela forma primeira de análise.

O Brasil exerceu o papel de país receptor de imigrantes até a década de 60 do século XX, para a partir daí passar a exportar mão de obra para principalmente Estados Unidos e Japão, além de alguns países da Europa, dentro de um novo contexto social, político e cultural (Patarra & Baeninger, 1996).

Dois dos principais fluxos de trabalhadores brasileiros para o exterior serão objeto de estudo deste trabalho, a saber, Brasil – Estados Unidos e Brasil – Japão. Essas correntes, que têm em comum o fato de serem recentes e de serem constituídas basicamente por

pessoas em idade ativa que deixam seu país de origem em busca de ascensão social, apresentam características particulares que os diferenciam entre si e que, junto com a combinação de uma série de outras variáveis, definem suas configurações.

Passaremos a uma discussão teórica sobre o gênero na migração internacional, para depois descrevermos os dois fluxos a serem tratados neste trabalho, e um breve histórico das cidades. A partir dessas informações, analisaremos os dados.

O gênero na migração internacional

Dadas essas descrições gerais sobre os dois fluxos a serem analisados nesse trabalho, passaremos a uma percorrida teórica sobre a migração internacional, para justificar a análise dos dados dos surveys de Criciúma e Maringá a partir da perspectiva de gênero.

O fenômeno migratório teve sua primeira análise constituída em teoria por representantes do que ficou conhecido por teoria neoclássica, cujo maior expoente na atualidade é Borjas (1990), que descreve a migração como um “jogo de mercado” : a mão de obra se mobiliza ao efeito dos estímulos salariais. Nessa perspectiva, a migração de brasileiros pode ser justificada apenas pela crise dos anos 80 já descrita anteriormente. Na teoria neoclássica, a renda é a variável chave explicativa do fenômeno, uma vez que os indivíduos economicamente racionais se movimentam buscando melhores condições de vida.

Trabalho apresentado no XIV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em Caxambu – MG – Brasil, de 20 – 24 de setembro de 2004

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Esses teóricos assumem ainda uma igualdade entre o mercado de trabalho e o mercado de mercadorias compradas e vendidas livre e regularmente (Sales, 1999).

Avançando na análise do fenômeno migratório, a teoria histórico-estrutural busca explicações de outra natureza para as migrações internacionais. Uma das vertentes dessa teoria tem como principais representantes Piore (1979) e Portes (1981), que partem de uma teoria anterior sobre a segmentação do mercado de trabalho (Piore & Doeringer, 1971). Num diálogo claro com a teoria neoclássica, Piore critica a justificativa da migração através da variável renda: caso aumentasse a renda dos migrantes nos países de origem os fluxos continuariam existindo. Por isso, segundo ele, os fatores explicativos devem ser procurados antes nos contextos dos países de destino do que nos de origem. O exemplo dado são as migrações de áreas subdesenvolvidas para desenvolvidas iniciadas através do recrutamento ativo por parte dos empregadores, como no caso do Guest Workers na Europa dos anos 50 e 60 ou o Bracero Program no pós guerra nos Estados Unidos (Piore, 1979).

A outra vertente histórico-estrutural tem como principal representante Saskia Sassen, que dá continuidade à teoria de Piore e Portes associando migração de pessoas e de capitais. Para Sassen (1988), é a mobilidade do capital que cria um espaço transnacional em que o fluxo de trabalhadores é mais um entre outros, como o de informação, por exemplo. É

nesse espaço transnacional que o trabalho encontra condições para se mobilizar: a variável explicativa fundamental para os fluxos migratórios atuais seria o investimento estrangeiro.

Como dissemos anteriormente, as discussões teóricas que vêm se ocupando da migração internacional têm se voltado para variáveis e aspectos de cunho econômico, não procurando uma outra explicação para o fenômeno. Da mesma forma que o fluxo de brasileiros para os Estados Unidos não pode ser explicado pela crise econômica dos anos 80 no Brasil e pelo desenvolvimento norte-americano sem que se fale das redes sociais que ligam esses dois países, outras lacunas permanecem abertas quando não olhamos para variáveis e fatores deixados de lado até então. Uma dessas variáveis é o gênero.

Para Pessar (1999), as teorias que tratam da migração internacional são inadequadas desde o primeiro momento, quando se referem a “indivíduos migrantes” como homens ou simplesmente não abordam a perspectiva de gênero. Num outro artigo, ela afirma que até bem pouco tempo, o termo “migrante” tinha uma conotação sexual masculina não

especificada. Essa concepção de que o “verdadeiro” migrante é homem limitou as possibilidades da pesquisa empírica e produziu premissas teóricas equivocadas. Essas pesquisas, que datam das décadas de 50, 60 e início dos anos 70, segundo a autora, tendem a negligenciar a contribuição das mulheres à economia, política e vida social (Pessar, 1986).

A importância da inclusão da variável gênero às análises é afirmada por Pessar mais de dez anos depois desse primeiro artigo. A autora enuncia rede social, domicílio e gênero como “unidades mediadoras”, que ajudam os pesquisadores a entenderem as etapas do processo migratório, bem como suas causas e conseqüências (Pessar, 1999). Ela considera ainda o gênero como a principal dessas “unidades mediadoras”, já que, para ela, trata-se do fator central na organização da vida social e cultural que inclui domicílios, redes sociais e a própria migração. Quando o gênero é trazido para o primeiro plano dos estudos migratórios, então, uma série de outros temas significativos vêm à tona: como e por que homens e mulheres têm diferentes experiências migratórias e como esse contraste afeta todo o processo, desde a decisão por migrar até a decisão (ou não) pelo retorno? (Pessar, 1999). Essas são algumas das perguntas deixadas de lado quando a análise não sofre um corte de gênero. Uma pesquisa mais refinada, que incorpore a variável, poderá dar margem à

observação das múltiplas maneiras como a migração simultaneamente reforça e desafia o patriarcalismo em suas variadas formas.

A reconfiguração das relações familiares é a principal lacuna explicativa do fenômeno migratório que só pode ser explicada se atravessada por gênero. A partir de um estudo de

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caso de migrantes dominicanos em Nova York, Pessar (1999) afirma que homens e mulheres sofrem de forma distinta os impactos da migração. Enquanto os homens (que, segundo a autora, têm tido cada vez menos oportunidades no mercado de trabalho) perdem autonomia e desejam retornar à origem para o restabelecimento da antiga configuração familiar, as mulheres passam por um processo de empoderamento: ganham autonomia pessoal e independência financeira, passam a contribuir com o sustento do domicílio, a lidar com o controle dos gastos domiciliares e a participar das tomadas de decisão familiares. Essa mudança de status é refletida no desejo das mulheres de permanecerem no destino, uma vez que nos países de origem eram submissas e dependentes. A mobilidade e o acesso a recursos sociais e econômicos dessas mulheres faz com que a esfera doméstica mude de posições. Ou seja, o processo migratório muda a forma patriarcal tradicional de organização social para homens e mulheres.

Essa mudança de status de homens e mulheres também é analisada por Boyd (1998), num campo que ela define como “estágio pós-migratório”, que diz respeito aos fatores que influenciam a adaptação e integração de homens e mulheres na sociedade receptora. Dentre esses fatores estão desde os mais abrangentes, como a estratificação do mercado de trabalho, até os mais individuais, como a mudança de status causada pela migração. Sobre essa mudança, há duas perspectivas de análise. A primeira diz respeito às mulheres para quem a migração significa mobilidade social, independência financeira e autonomia em relação à família na origem e/ou no destino. Para essas mulheres, inseridas nesse novo mercado de trabalho, as novas responsabilidades econômicas e sociais representam

mudanças na distribuição de poder e autoridade entre a família, além de maior participação nas tomadas de decisão dentro do domicílio. É esse, novamente definido por outra autora em outro tempo e através de outro objeto, justamente, o processo de empoderamento das mulheres migrantes, como já visto nas análises de Pessar (1999). Para Boyd (1998), no entanto, só passam por esse processo de empoderamento aquelas mulheres que sofrem o impacto positivo da migração. Em alguns casos, a migração transfere a autoridade patriarcal da sociedade de origem para a de destino, mantendo intactas as relações de gênero na família. Para as mulheres dessas famílias, a migração tem um impacto neutro no status domiciliar, uma vez que a estrutura familiar apenas sofre um deslocamento geográfico. Um último grupo de mulheres definido por Boyd (1998) sofre um impacto negativo com o processo migratório: perdem o pouco de autonomia que tinham nos países de origem.

A principal crítica de Boyd, no entanto, é teórica. Os termos “genderless” e “gender

insensitive” são usados pela autora para definir e criticar as teorias de migração, que, segundo

ela, ignoram diferenças existentes nas atividades e no potencial migrante de homens e mulheres. O trabalho doméstico e as responsabilidades com a educação dos filhos, por exemplo, são fatores que interferem na decisão de migrar das mulheres. Não se pode, portanto, partindo das mesmas variáveis, analisar a decisão individual ou domiciliar de migrar sem diferenciar por sexo os indivíduos envolvidos.

Para este trabalho, então, analisaremos os dados coletados nos dois surveys realizados nas cidades de Criciúma – SC e Maringá – PR, para a observação dos dois principais fluxos de brasileiros para o exterior da atualidade: Brasil – Estados Unidos e Brasil – Japão. Cruzar a variável sexo com as demais do banco de dados poderá iluminar as análises e dar outras ou mais completas informações a respeito dos fluxos.

Conexão Brasil – Estados Unidos

O fluxo Brasil – Estados Unidos constitui a principal corrente migratória de trabalhadores brasileiros, como visto no caso dos mineiros de Governador Valadares, que já têm uma história de 30 anos de movimento migratório (Fusco, 2000). No caso da cidade de Criciúma, o fluxo tem seu início em meados nos anos 80 e ganha força a partir de 1990, como

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em Governador Valadares (Fusco, 2000; Assis, 1999; Scudeler, 1999). Ao contrário do ocorrido com o Bracero Program, que na década de 50 atraiu um grande contingente de mexicanos para os Estados Unidos (Fusco, 2000), ou mesmo do movimento dekassegui, que descreveremos a seguir, não houve por parte do governo americano qualquer incentivo atraindo migrantes brasileiros, o que também diferencia o fluxo. O que marca principalmente o fluxo de brasileiros em direção aos Estados Unidos, no entanto, é a condição ilegal dos migrantes, que disputam com outros imigrantes um lugar no mercado de trabalho secundário americano (Scudeler, 1999). Essa condição de ilegalidade passa a reger a vida desses migrantes, que, como veremos adiante, passarão por um processo seletivo dado pelo próprio projeto migratório, e, uma vez no destino, terão que se adaptar a uma vida completamente diferente da que levavam no Brasil.

Como já dito, o fluxo migratório que parte da cidade de Criciúma para os Estados Unidos se intensifica e ganha força a partir da década de 90. Segundo Sales (1999), na gênese de qualquer fluxo migratório existem os acasos, os pioneiros das migrações. Com a ida desses primeiros grupos, estabelecem-se as redes sociais de parentesco e amizade que ligam esses dois países, e que acabam por se fortalecer na medida em que o tempo passa e o fluxo ganha força. No caso Brasil – Estados Unidos, como em qualquer outro fluxo de trabalhadores clandestinos, a corrente migratória só ganha força se forem desenvolvidas essas redes sociais que acabam por sustentar os fluxos. São, portanto, as redes sociais as principais mantenedoras de todo o processo, no que se refere desde à programação da viagem, passando pela ajuda num primeiro momento no país de destino até o fornecimento de informações sobre hospedagem e emprego (Sales, 1999; Fusco, 2000).

Homens e mulheres, no entanto, têm diferentes papéis nesse contexto migratório, como veremos mais adiante. O uso das redes sociais de parentesco e amizade é diferenciado entre os sexos. Podemos dizer, então, que as análises, quando atravessadas por gênero, revelam detalhes que uma simples observação quantitativa não traria à tona. Um exemplo: quando questionado sobre preferências no momento de contratação de funcionários, um gerente norte-americano respondeu que procura três características: se é mulher, pequena e estrangeira. Ele ainda acrescenta que se forem preenchidos esses três quesitos, ele terá automaticamente garantida a certeza de que contratou a melhor espécie de mão de obra (Hossfeld, 1994:65, apud Espiritu, 1997 in Pessar, 1999). A absorção da mão de obra feminina tem se mostrado superior à masculina não apenas na economia brasileira, mas em todos os setores da economia mundial. Entre os migrantes, não haveria de ser diferente. Pessar (1999), como veremos mais adiante, dá detalhes sobre essa nova característica do mercado de trabalho entre os migrantes nos Estados Unidos e quais as suas conseqüências na (re)configuração familiar.

O fluxo Brasil – Estados Unidos é cheio de especificidades e particularidades que poderemos observar melhor em contato com os dados mais adiante.

Conexão Brasil – Japão

O movimento de brasileiros em direção ao Japão, conhecido como dekassegui (termo que define os descendentes de japoneses que vão trabalhar naquele país, a princípio temporariamente, em busca de melhorias salariais, executando trabalhos de baixa qualificação), constitui o terceiro maior grupo de brasileiros no exterior (Sasaki, 1999). Da mesma forma como no fluxo Brasil – Estados Unidos, a corrente é recente, tendo início na segunda metade da década de 80 do século XX, atingindo seu ápice em 1990, após a Reforma da Lei de Imigração Japonesa, promulgada em junho desse mesmo ano, que concede um status legal de permanência àqueles que possuem relacionamento sangüíneo com pessoas de nacionalidade japonesa (Sasaki, 1999). O movimento tem início num momento em que ambos os países passam por profundas transformações nas áreas política, econômica e social.

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A década de 80 no Brasil, conhecida por “década perdida”, ficou marcada como um período de fortes frustrações no campo econômico e profunda instabilidade. Seguidas tentativas de segurar a inflação, com os planos Cruzado, Cruzado II e Verão, acabaram provocando uma forte diminuição real dos salários dos brasileiros e elevando a inflação à casa dos 5 dígitos, deteriorando, assim, o poder aquisitivo e as

condições de vida de grande parte da população (Kawamura, 1999; Sales, 1999). Em contrapartida, o Japão vivia um momento pleno de desenvolvimento e crescimento econômico acelerado, o que implicava uma demanda de mão de obra para atingir altos índices de produtividade. Uma série de fatores sociais e culturais associados acabaram, no entanto, resultando em escassez de mão de obra no Japão, como o envelhecimento da população, baixas taxas de natalidade, pequena participação das mulheres japonesas no mercado de trabalho e um certo preconceito dos jovens em relação a empregos de baixa qualificação (kawamura, 1999; Sasaki, 1999).

Assim, de forma muito diferente, é que se constitui a corrente migratória de brasileiros em direção ao Japão. Incentivados pela economia japonesa em pleno desenvolvimento, os descendentes voltam à terra dos ancestrais recrutados por agências especializadas para preencher postos de trabalho conhecidos como 5 Ks: pesado (kitsui), perigoso (kiken), sujo (kitanai), exigente (kibishii) e indesejável (kirai) (Kawamura, 1999).

É preciso que se faça uma observação: optamos por citar as condições econômicas brasileiras na década de 80 na descrição do fluxo Brasil – Japão e não na descrição do fluxo Brasil – Estados Unidos por ser o primeiro aquele que mais acompanha o ritmo da economia do país de destino. É claro que a crise brasileira serviu de trampolim também para os migrantes que se dirigiram aos Estados Unidos. Teresa Sales descreve a inflação como “principal vilã da nossa história emigratória” (Sales, 1999: 31). No entanto, por se tratar de um fluxo legal de descendentes, a corrente Brasil – Japão mostra mais claramente esse acompanhamento do ritmo econômico dos dois países. Os migrantes têm muito mais segurança, pois sabem que a qualquer momento podem voltar. Se a economia japonesa sofre desaceleração, a corrente perde força e vice-versa. Já no caso dos brasileiros nos Estados Unidos, uma série de outros fatores acaba influenciando a intensidade da corrente. A condição clandestina de grande parte desses migrantes é o principal desses fatores: uma vez no destino, seria muito arriscado voltar ao Brasil. As redes sociais têm um papel fundamental de apoio nesses momentos de crise no país de destino. Pode-se dizer, então, que o fluxo migratório de brasileiros para os Estados Unidos não acompanha, pelo menos na mesma medida, o ritmo econômico como no caso dos brasileiros no Japão. Ao mesmo tempo, podemos dizer que as redes sociais de parentesco e amizade são muito mais presentes no fluxo Brasil – Estados Unidos, uma vez que os migrantes dependem dessas

relações para conseguirem entrar com mais segurança e se manter no país de destino em condição clandestina. A condição legal dos migrantes japoneses não fortalece tanto essas redes, já que todo o apoio para recursos financeiros para a viagem, hospedagem e emprego é fornecido, na grande maioria dos casos, por essas agências de recrutamento.

A corrente migratória que parte de Maringá em direção ao Japão conta, também, com fatores característicos que acabam por definir suas configurações. Os dados vêm, mais adiante, mostrar em números algumas dessas particularidades para que possamos traçar diferentes perfis para homens e mulheres, bem como diferenciá-los de outros migrantes que compõem outras correntes migratórias, como o caso de Brasil – Estados Unidos.

Criciúma e Maringá: dois pontos de partida de brasileiros para o exterior

Como já dissemos anteriormente, até a década de 60 do século XX, o Brasil exerceu o papel de receptor de mão de obra estrangeira. O Sul do país, particularmente, foi destino de um grande contingente europeu, principalmente alemães e italianos. O Estado de Santa

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Catarina foi o que mais recebeu famílias italianas, que a princípio instalaram-se nas colônias fundadas pelos alemães, e, mais tarde, dirigiram-se para o sul do Estado, onde fundaram outras colônias, que prosperaram através de atividades ligadas à agricultura, e mais tarde tornaram-se cidades. Uma dessas colônias foi Criciúma.

Todo esse processo se estendeu até o início da segunda década do século XX, quando foi descoberto o carvão, fato que mudaria completamente a vida econômica da região. A partir de 1913, a exploração do carvão fez com que a cidade crescesse e se tornasse centro urbano de referência no sul do Estado. A mineração, então, passa a fazer parte da história da cidade e já em meados dos anos 20 era base do desenvolvimento não só da cidade de Criciúma, mas de toda a região.

Essa fase próspera seguiu até meados dos anos 80, quando o setor carbonífero dava sinais de uma crise que se agravaria junto com todos os outros setores da economia brasileira até o governo Collor, já nos anos 90. Assim, com a associação dessas duas crises, a região pára de crescer, o desemprego aumenta, o poder aquisitivo diminui. Pode-se começar a justificar o fenômeno migratório a partir daí.

Durante toda essa crise, a migração representou uma saída para uma parcela significativa da população. O consulado italiano recebeu inúmeros pedidos de dupla cidadania de descendentes que, com o passaporte em mãos, arriscaram-se no projeto migratório, em busca não somente de um reencontro com o passado, mas de um futuro melhor. A partir de um determinado momento, no entanto, esses migrantes começaram a usar a cidadania européia para entrar com mais facilidade e segurança nos Estados Unidos, onde o dólar, moeda forte, tinha uma melhor cotação em relação às moedas européias, mas principalmente em relação ao real.

Esses migrantes, mesmo entrando nos Estados Unidos com o passaporte italiano, permaneceram no país, ilegalmente, depois do prazo de expiração de seus vistos de entrada. Tem início, então, o processo que resultaria no fluxo que observamos atualmente na cidade. As redes sociais começam a ser tecidas por esse grupo que se arriscou num primeiro momento e que serve de referência para os migrantes do fim do século XX (Assis, 1995).

A contextualização da cidade de Maringá e de seu fluxo migratório em direção ao Japão é um tanto diferente do que observamos em Criciúma. Com a expansão da produção do café, que contou com grande participação de mão de obra de migrantes, entre esses os japoneses, fazendeiros paulistas deram início à colonização da região norte do Paraná. A presença de japoneses no norte do Estado tem seu primeiro registro em 1914, mas foi a partir de 1925 que se intensificou a vinda de japoneses para a região.

O planejamento urbano fez parte da história da colonização da área, que contou desde o primeiro momento com a construção de eixos ferroviários que facilitariam a chegada a novas áreas e, acima de tudo, aceleraria o escoamento da produção até o porto de Santos. Superado o ciclo do café, a produção na região se diversificou, com destaque para o plantio de soja, algodão e milho. Essa diversificação da exploração agrícola impulsionou o crescimento da cidade de Maringá, que atraiu um grande contingente populacional e consequentemente, investimentos, principalmente no que dizia respeito à manutenção dessa população.

O gradativo processo de mecanização no campo e seguidas geadas provocaram, no entanto, um forte êxodo rural. As cidades não suportaram uma população tão grande e a crise se agravou, já no final dos anos 70. A economia brasileira nos anos seguintes, como já dissemos anteriormente, não dava sinais de recuperação e a crise se estendeu pelas décadas seguintes. No início dos anos 90 é promulgada a Lei de Migração no Japão, que permite a entrada legal de descendentes de japoneses. Associando a crise no Brasil a mais esse fator, as portas da migração se abriram a todos os nipo-brasileiros, tendo início, então, o fluxo migratório que dá origem ao terceiro maior grupo de brasileiros no exterior (Sasaki, 1999).

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Essas breves observações sobre um trecho da história dessas cidades serve para que se possa identificar a gênese do fenômeno a ser analisado. Quem são, quantos são e por que migram são três perguntas fundamentais para se observar grupos migrantes. E só se obtém respostas a essas perguntas através de uma contextualização, que indica possíveis caminhos para a explicação dos fluxos.

Resultados

Serão apresentados, a partir de agora, alguns dos principais resultados relacionados à população migrante das cidades de Criciúma e Maringá. As tabelas foram divididas em itens: as primeiras dizem respeito à caracterização dessa população de um modo geral; depois, o caráter de legalidade é um dos cortes da análise e por fim, o uso das redes sociais. É importante que se lembre, no entanto, que nosso objetivo é procurar traçar as diferenças existentes entre as trajetórias migratórias de homens e mulheres.

A tabela 1 apresenta a condição de presença da população amostrada. A variável condição de presença está dividida em duas categorias: retornado (já residiu em outro país mas estava no Brasil na época do survey); e ausente (residia no exterior no momento do

survey).

Tabela 1

População migrante segundo condição de presença. Criciúma e Maringá, 2001 Condição de Presença Criciúma Maringá N % N % Retornado 149 26.3 473 61,1 Ausente 417 73.7 301 38,9 Total 566 100.0 774 100.0

Fonte: pesquisa amostral; Casos Válidos: Criciúma: 566; Maringá: 774 Total de Criciúma: 566, Maringá: 774

No caso de Criciúma, pode-se observar que 26,3% são retornados, enquanto que 73,7% correspondem a ausentes. Em Maringá encontra-se a situação inversa: a maior parte da população de migrantes é de retornados, com 61,1% e os ausentes aparecem com 38,9%. A maior proporção de retornados, quando comparados não apenas à população migrante, mas também ao fluxo originário de Governador Valadares (Fusco, 2000), reflete o contexto atual da migração de brasileiros para o Japão, devido à desaceleração de sua economia e seu impacto no mercado de trabalho (Sasaki, 2000).

A entrada e permanência no país de destino pode ser ou não legal. A tabela 2, a seguir, mostra como foram declarados os migrantes que partiram de Criciúma e Maringá.

A condição de entrada do migrante de Criciúma no país de destino apresenta duas faces. Num primeiro momento ele entra, geralmente, de maneira legal, mas o período de seu visto expira em poucos meses tornando sua condição ilegal. Cerca de 87,1% dos migrantes criciumenses encontram-se neste caso, e apenas 12,9% têm sua permanência legalizada. Deve-se considerar ainda a resistência natural a se declarar a ilegalidade, o que nos leva a concluir que o índice de ilegais pode ser ainda maior.

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Tabela 2

Migrante segundo condição de entrada e permanência no país de destino

Criciúma, 2001 Condição de entrada e permanência Criciúma Maringá N % N % Legal 70 12,9 690 94,9 Ilegal 472 87,1 37 5,1 Total 542 100,0 720 100,0

Fonte: pesquisa amostral; Casos válidos: Criciúma: 542; Maringá: 720 Total para Criciúma: 566; Maringá: 774

Essa tabela, bem como a anterior, tem como objetivo apenas traçar um perfil geral da população migrante, para a partir daí passarmos a uma observação mais específica, no nosso caso, cruzando as demais variáveis com gênero.

Os migrantes que partem de Maringá, em sua grande maioria, para o Japão, encontram uma realidade totalmente diferente da enfrentada pelo grupo que se desloca aos

Estados Unidos, originários tanto de Criciúma como de Governador Valadares (Fusco, 2000). Uma série de facilidades para descendentes oferecidas pelo governo japonês mantém a grande maioria do grupo (94,9%) de forma legal no país.

Outro dado explorado por Fusco (2000) no seu estudo de caso de Governador Valadares é baseado em cruzamento do período da viagem segundo o sexo do migrante, que também é apresentado a seguir para Criciúma e Maringá, respectivamente.

Tabela 3

Ano da primeira viagem segundo sexo Criciúma, 2001

Ano Migração Sexo (%) Total

M F Até 1989 6,2 4,0 5,4 1990 a 1993 12,1 10,0 11,2 1994 a 1997 21,4 21,5 21,4 1998 a 2001 60,3 64,5 62,0 Total % 100,0 100,0 100,0 Total 341 200 541

Fonte: pesquisa amostral Casos válidos: 541 Total: 566

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Gráfico 1

Ano da primeira viagem ao exterior segundo o sexo Criciúma, 2001 0 10 20 30 40 50 60 70 80 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 Ano N. de migrantes masculino feminino

Fonte: pesquisa amostral Casos válidos: 541 Total: 566

De acordo com o gráfico 1, acima, podemos observar a dimensão temporal do movimento de forma contínua da migração que parte de Criciúma: o fluxo toma força a partir da década de 90, com seu ápice entre 1998 e 2000.

Analisando o caso de Criciúma, em números absolutos, os migrantes do sexo masculino são predominantes. Ao analisarmos a proporção de migrantes do mesmo sexo em função do período da primeira viagem, podemos abordar a dinâmica do processo por outra perspectiva. Pelos dados da tabela 3, observamos que aproximadamente 39,7% dos homens migrou até 1997, contra cerca de 35,5% das mulheres. Assim, proporcionalmente, os homens aparecem mais nos períodos iniciais, e as mulheres predominam no período mais recente. Esse dado remete à condição de legalidade do migrante: os homens, devido ao risco do projeto, se arriscam mais num primeiro momento; as mulheres migram num segundo momento, quando as redes sociais já estão mais consolidadas, pois a viagem se dá depois do estabelecimento dos homens no país de destino.

Essa diferença no período da primeira viagem é um indicador que remete não somente à condição de (i)legalidade dos migrantes, mas às diferentes estratégias utilizadas por homens e mulheres, o que confirma o que já dissemos anteriormente: ao observarmos as variáveis através de um corte de gênero, surgem novas hipóteses, como a de que os homens viajam primeiro devido ao risco da empreitada. As mulheres viajam posteriormente, quando já estão estabelecidas redes sociais que facilitem o processo.

No caso de Maringá, o período em que o fluxo foi mais intenso entre 1990 e 1992, tanto para homens como para mulheres, como apontam a tabela 4 e o gráfico 2. Novamente, não percebemos uma grande diferença para o período de primeira saída segundo o sexo do migrante, o que provavelmente está relacionado ao caráter legal da migração para o Japão, que diminui o risco da migração e favorece o equilíbrio entre os sexos. Alguns indicadores condicionam as diferenças entre os sexos no processo migratório. Certamente, a condição de legalidade é um deles, uma vez que o momento em que se dá a viagem, se olharmos as diferenças entre os sexos, é diretamente relacionado a essa condição. O gráfico 2 mostra ainda que o maior índice registrado foi entre 1990 e 1992, e encontra-se estabilizado, com

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diferenças bem menores entre os sexos, se compararmos ao caso de Criciúma, fluxo em grande parte de clandestinos, que apresenta risco permanente aos migrantes.

Tabela 4

Ano da primeira viagem segundo sexo Maringá, 2001

Ano Migração Sexo (%) Total

M F Até 1989 10,7 10,4 10,6 1990 a 1993 45,6 43,8 44,9 1994 a 1997 26,9 27,9 27,3 1998 a 2001 16,8 17,9 17,2 Total % 100,0 100,0 100,0 Total 408 308 716

Fonte: pesquisa amostral Casos válidos: 716 Total: 774

Gráfico 2

Ano da primeira viagem ao exterior segundo o sexo Maringá, 2001 0 10 20 30 40 50 60 70 80 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 Ano N. de migrantes masculino feminino

Fonte: pesquisa amostral Casos válidos: 716 Total: 774

Os motivos que levam alguém a migrar estão expostos na tabela 5, que indica que 83,7% dos migrantes de Criciúma alegaram que o principal motivo para migrar foi econômico, declarado por 88,9% dos homens e 73,9% das mulheres. Outro motivo que influenciou na decisão de migrar foi acompanhar os familiares ou juntar-se a eles, que corresponde a 16,3% da amostra. O mais interessante no caso de Criciúma, no entanto, é reparar a grande diferença existente entre homens e mulheres que migram para acompanhar

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familiares. Mais que o dobro de mulheres viajam para se juntar, em grande parte, a maridos e filhos que se arriscaram num primeiro momento, se estabeleceram no destino e já podem receber o resto da família. Não significa dizer, porém, que essas mulheres migraram com intuito apenas de se juntar à família. Muito provavelmente, grande parte delas acabou também arrumando um emprego. Mas o intuito primeiro foi juntar-se aos familiares. Neste caso, a proporção de migrantes do sexo feminino atinge 26,1% contra 11,1% do sexo masculino.

Tabela 5

Motivo da migração segundo o sexo Criciúma e Maringá, 2001

Criciúma Maringá Motivos para migrar Sexo (%) Total Motivos para migrar Sexo (%) Total

M F M F

Econômicos – p/ trabalhar 88,9 73,9 83,7 Econômicos – p/ trabalhar 94,4 84,0 89,9 Juntar-se/ acompanhar

familiares 11,1 26,1 16,3 Juntar-se/ familiares acompanhar 5,6 16,0 10,1 Total % 100,0 100,0 100,0 Total % 100,0 100,0 100,0

Total 342 184 526 Total 408 308 716

Fonte: pesquisa amostral; Casos Válidos: Criciúma: 526; Maringá: 716 Total:Criciúma: 566; Maringá: 774

O caso de Maringá revela que 94,4% dos homens e 84,0% das mulheres que migraram de Maringá o fizeram para trabalhar, ou por motivos econômicos. A possibilidade de juntar-se à família, que já estaria no exterior tem índice maior entre as mulheres: 16,0%, enquanto que apenas 5,6% dos homens justificaram a migração através de saudades da família. Esses dados confirmam um processo já conhecido, no qual boa parte das mulheres migram para se encontrar com seus parceiros no destino. O caráter legal dessa migração permite uma maior mobilidade ao migrante que pode entrar e sair do Japão sem correr riscos, a qualquer momento. Essa é uma das explicações possíveis para que o número de mulheres que migram com intenção primeira de encontrar a família diminua em relação aos dados observados em Criciúma. Mesmo assim, em relação aos homens do mesmo fluxo, são muito elevados. A grande diferença aqui, no entanto, não se dá entre os dois fluxos, mas entre os sexos: tanto em Criciúma quanto em Maringá as mulheres, em maior proporção que os homens, migram para acompanhar familiares.

Depois dessa primeira caracterização dos fluxos, passamos agora a analisar os fatores que selecionam o grupo migrante. As tabelas 7 e 8 exibem os migrantes, segundo o sexo, classificados por faixas qüinqüenais de idade. Podemos observar para o caso de Criciúma que as primeiras faixas de idade, até 14 anos, apresentam uma distribuição equilibrada entre os sexos. De 15 a 29 anos, a população feminina é proporcionalmente maior, ocorrendo o inverso para as idades superiores a 30 anos. De forma geral, podemos dizer que o migrante homem tem a média de idade superior a da mulher, fato também verificado no fluxo de emigrantes de Governador Valadares (Fusco, 2000). A idade é um fator de seletividade nos movimentos migratórios, nos quais geralmente se inserem os mais jovens (Martes, 1999; Soares, 1999; Assis, 1999; Sales, 1999; Sasaki, 2000; Fusco, 2000). A partir da análise da tabela 7, observamos que o grupo tem idade concentrada na faixa entre os 20 e os 34 anos, o que caracteriza uma população jovem, no auge de sua idade produtiva. O fato da migração

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que parte de Cricíuma ser grande parte ilegal seleciona mais jovens a se arriscarem no projeto. Podemos dizer ainda, observando a tabela 7, que os homens se arriscam mais, e por mais tempo, a exemplo da faixa etária dos 40 aos 44 anos: 13% dos homens migram com essa idade, enquanto que apenas 6% de mulheres, menos da metade em relação aos homens, estão inseridas nessa faixa etária.

Tabela 7

População migrante por grupos de idade segundo sexo Criciúma, 2001

Grupos de idade Sexo (%) Total

M F 0-4 2,5 2,8 2,7 5-9 2,8 2,4 2,7 10-14 2,5 4,2 3,2 15-19 2,3 4,7 3,2 20-24 16,1 19,8 17,5 25-29 19,2 19,3 19,3 30-34 17,0 17,0 17,0 35-39 13,6 12,3 13,1 40-44 13,0 6,1 10,4 45-49 3,7 2,8 3,4 50-54 4,0 3,8 3,9 55-59 0,8 1,9 1,2 60 ou mais 2,2 2,9 2,4 Total % 100,0 100,0 100,0 Total 354 212 566

Fonte: pesquisa amostral Casos válidos: 566 Total: 566

Na tabela 8 também observamos que a maior parte do grupo migrante possui entre 20 e 34 anos, com 40,7% dos migrantes. No caso de Maringá, no entanto, há pouca diferença entre os sexos, uma vez que homens e mulheres podem viajar juntos graças à condição de legalidade. Não podemos dizer, então, no caso do fluxo Maringá – Japão que o cruzamento idade x sexo é um bom indicador de seletividade do grupo migrante.

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Tabela 8

População migrante por grupos de idade segundo sexo Maringá, 2001 Grupos de idade Sexo (%) Total M F 0-4 0,7 0,6 0,6 5-9 1,6 3,2 2,3 10-14 1,6 3,5 2,5 15-19 3,0 2,6 2,8 20-24 12,7 14,1 13,3 25-29 14,3 12,9 13,7 30-34 13,9 13,5 13,7 35-39 11,1 10,0 10,6 40-44 6,9 7,0 7,0 45-49 6,5 6,5 6,5 50-54 8,3 7,9 8,1 55-59 7,1 4,7 6,1 60 ou mais 12,3 13,5 12,8 Total % 100,0 100,0 100,0 Total 433 341 774

Fonte: pesquisa amostral Casos válidos: 774 Total: 774

Ao observarmos a condição do migrante no domicílio na tabela 9, verificamos que, no caso de Criciúma, 22,7% são chefes de domicílio, sendo que 32,3% dos homens estão nesta condição e 6,6% de mulheres. Considerando somente os chefes, temos que aproximadamente 89% são homens e apenas 11% são mulheres. Isto demonstra que a mulher considerada chefe de domicílio tem pouca expressão no contingente de migrantes.

A maior parte dos migrantes que compõem o fluxo originário de Criciúma é formada por filhos e filhas, com 49,2%. Além da maior parte da amostra ser composta de filhos e filhas, mais uma vez, o grupo é selecionado: o risco da migração ilegal impulsiona mais jovens à empreitada.

Já no caso de Maringá, a condição dos migrantes no domicílio segundo o sexo se distribui da seguinte maneira: 40,5% dos homens que migraram são chefes de domicílio, enquanto que 7% das mulheres têm a mesma condição familiar.

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Tabela 9

Condição no domicílio para a população migrante segundo sexo Criciúma e Maringá, 2001

Criciúma Maringá Condição no

domicílio

Sexo (%) Total Condição no domicílio Sexo (%) Total M F M F Chefe 32,3 6,6 22,7 Chefe 40,5 7,0 25,7 Cônjuge 7,9 23,2 13,7 Cônjuge 5,6 33,7 18,0 Filho/a 43,2 59,2 49,2 Filho/a 42,1 41,1 41,7 Irmão/Irmã 3,1 3,9 3,4 Irmão/Irmã 4,6 4,1 4,4 Outros Parentes 13,5 7,1 11,0 Outros Parentes 7,2 14,1 10,2

Total % 100,0 100,0 100,0 Total % 100,0 100,0 100,0

Total 353 211 564 Total 432 341 773

Fonte: pesquisa amostral; Casos válidos: Criciúma: 564; Maringá: 773 Total: Criciúma: 566; Maringá: 774

Os maiores índices, no entanto, são registrados por migrantes que, em relação ao chefe de suas famílias, são caracterizados por filhos e filhas: 42,1% dos homens que migraram estão na condição de filho, contra 41,1% das mulheres que migraram na mesma condição. Comparando as duas cidades, podemos dizer que o número de filhos por domicílio entre migrantes em Criciúma é maior que em Maringá, provavelmente devido ao caráter de legalidade do movimento como apontado acima.

O nível de escolaridade dos migrantes, uma das “ferramentas” mais importantes na busca de emprego em outro país, é apresentado na tabela 10 a seguir.

O nível de escolaridade do migrante de Criciúma concentra-se principalmente no colegial (incompleto/ completo) com 44,5% da amostra; 26,5% atingiram o ginasial (incompleto/ completo). O migrante com nível superior corresponde a 17,9%. Os migrantes que não chegaram ao segundo grau correspondem a 37,6%, sendo que não foram registrados casos de analfabetismo na cidade de Criciúma.

De forma semelhante, Maringá também apresenta a maior parte de seus migrantes com o colegial completo ou incompleto (32,4%). O índice de migrantes com nível superior, completo ou não, é de 29,3%. Esses valores refletem o alto nível de escolaridade dos migrantes maringaenses, se compararmos os dois fluxos.

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Tabela 10

População migrante segundo escolaridade Criciúma e Maringá, 2001

Escolaridade Criciúma Maringá

N % N % Analfabeto - - 8 1,0 Primário incompleto 31 5,7 43 5,6 Primário completo 29 5,4 65 8,5 Ginásio incompleto 75 13,8 61 8,0 Ginásio completo 69 12,7 116 15,2 Colegial incompleto 60 11,1 49 6,4 Colegial completo 181 33,4 199 26,0 Universitário incompleto 54 10,0 97 12,8 Universitário completo 43 7,9 126 16,5 Total 542 100,0 764 100,0

Fonte: pesquisa amostral; Casos válidos: Criciúma: 542 ;Maringá: 764. Total de Criciúma: 566; Maringá: 774

Os estudos que tratam da migração internacional de brasileiros, de forma geral, classificam a escolaridade do migrante como superior à média nacional (Sales, 1999; Fusco, 2000). Esse padrão se confirma em Criciúma e Maringá, tanto para a população migrante, quanto para os integrantes dos domicílios na origem, comparados à média local. Também foi constatado que o nível de escolaridade da amostra de Maringá é superior ao de Criciúma, o que pode estar relacionado com a escolha deliberada de um universo mais restrito da população, neste caso os nipo-brasileiros, na cidade paranaense.

A partir desse momento passaremos à caracterização do uso das redes sociais nos dois fluxos migratórios. Os grupos que partem tanto de Criciúma quanto de Maringá se utilizam desse tipo de relações de forma muito particular, o que muito auxilia na caracterização dos dois fluxos.

A tabela 11, a seguir, refere-se ao acompanhante do migrante em sua primeira viagem ao exterior. No caso de Criciúma, o migrante do sexo masculino viajou sozinho em maior proporção, cerca de 42,7% contra 39,3% do sexo feminino. Os migrantes que viajaram na companhia de algum parente somam 33,6%. Se olharmos separadamente, podemos perceber que 41,8% das mulheres que migraram estavam na companhia de algum parente, contra 28,8% dos homens.

Por outro lado, 24,4% dos homens de Criciúma que migraram estavam em companhia de amigos contra 13,9% das mulheres nas mesmas condições. Já observamos através dos dados anteriores que os homens migram antes, com intuito primeiro de trabalhar. Se as mulheres viajam num segundo momento, sendo que , de acordo com a tabela 5, 26,1% delas o faz para encontrar a família, não é de se admirar que uma quantidade muito maior de homens viaje em companhia de amigos, enquanto que as mulheres viajam acompanhadas de familiares. As particularidades existentes no uso das redes sociais por homens e mulheres são mais um fator de diferenciação das estratégias utilizadas no processo migratório.

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Tabela 11

População migrante segundo acompanhante na primeira viagem por sexo Criciúma e Maringá, 2001

Criciúma Maringá Acompanhante Sexo (%) Total Acompanhante Sexo (%) Total

M F M F

Sozinho 42,7 39,3 41,4 Sozinho 42,4 21,2 33,2

Parentes 28,8 41,8 33,6 Parentes 50,8 71,8 59,9

Amigo/a 24,4 13,9 20,6 Amigo/a 6,3 5,4 5,9

Outros Parentes 4,1 5,0 4,4 Outros Parentes 0,5 1,6 1,0 Total % 100,0 100,0 100,0 Total % 100,0 100,0 100,0

Total 344 201 545 Total 413 312 725

Fonte: pesquisa amostral

Casos válidos para Criciúma: 545; para Maringá: 725 Total para Criciúma: 566; para Maringá: 774

Analisando os que migraram rumo ao Japão, notaremos que os homens de Maringá também viajam sozinhos em maior proporção: 42,4% contra 21,2% de mulheres. Essas, no entanto, apoiam-se mais na companhia de parentes: 71,8% das mulheres que migraram viajaram acompanhadas por alguém da família enquanto que 50,8% (uma proporção bem maior do que o notado em Criciúma) dos homens o fizeram nas mesmas condições. Diferente do que foi visto na tabela 13, não há uma grande diferença entre homens e mulheres que viajaram acompanhados por amigos: 6,3% dos homens contra 5,4% das mulheres.

A diferença entre os fluxos, no caso desse indicador, é que as facilidades de se viajar acompanhado para o Japão faz com que os maringaenses iniciem a trajetória migratória acompanhados, muito mais pela família do que por amigos. Ainda que as agências de recrutamento exercem um papel fundamental durante o projeto, as redes, que não dizem respeito apenas ao país de destino, mas também ao de origem, são muito utilizadas nesse fluxo.

O potencial migrante internacional tem várias possibilidades para executar seu projeto de migrar. Desde antes da viagem, até sua colocação em um emprego, no país de destino, o indivíduo pode recorrer em algum momento à ajuda de parentes e amigos ou a agências especializadas. As tabelas 15 e 16 mostram como procederam os migrantes de Criciúma e Maringá, respectivamente, neste quesito.

O uso das agências de recrutamento é predominante no fluxo Maringá – Japão, em que 70,8% da população migrante recorreram a esse tipo de estratégia. Por outro lado, os migrantes que partem de Criciúma apresentam a situação inversa: 93,8% declararam que não utilizaram as agências de recrutamento em sua primeira viagem.

Há uma série de observações importantes sobre a utilização, ou não, das agências de recrutamento. Uma delas, talvez a mais importante, diz respeito à dispersão no destino. Os migrantes que partem para os Estados Unidos, contam com uma rede social muito desenvolvida, que atende a todas as necessidades dos migrantes num primeiro momento e mesmo quanto este já se encontra estabelecido no destino. Isso facilita muito a formação de comunidades filhas, uma vez que os migrantes, devido a sua condição clandestina, tendem a se concentrarem em lugares específicos, onde mantêm o uso do Português, entre outros costumes brasileiros (Fusco, 2000). Essas comunidades filhas não se formam com a mesma

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facilidade no Japão. Por já saírem do Brasil contratados por agências de recrutamento, que por sua vez têm contato direto com os empregadores japoneses, a dispersão no destino é muito maior, já que os migrantes não se dirigem diretamente para um lugar onde se concentram outros migrantes, mas sim, em direção às indústrias que os contrataram ainda no Brasil.

É possível dizer que a utilização dessas agências tende a diminuir conforme os migrantes se estabelecem no destino e legitimam novas redes sociais? De acordo com o gráfico 2, o fluxo Brasil - Japão teve seu momento de maior intensidade em 1990. Mais de dez anos se passaram e as agências continuam exercendo um importante papel no projeto migratório de nipo-brasileiros, justamente porque o fluxo acompanha mais diretamente as desacelerações da economia japonesa e também porque as comunidades filhas observadas nos Estados Unidos não têm tanta força no Japão.

As tabelas 15 e 16 a seguir caracterizam os dois fluxos migratórios de acordo com a condição de presença e sexo. As variáveis presentes nas tabelas definem a origem da ajuda recebida pelo migrante em sua primeira viagem ao exterior. Ao declarar quem forneceu os recursos financeiros necessários, hospedagem e primeiro emprego, o migrante acaba revelando a teia de relações que liga origem e destino e sustenta os fluxos migratórios: as redes sociais.

As categorias postas em função dessas variáveis indicam se o migrante não recebeu qualquer tipo de auxílio (ninguém), se o fez através de parentes, amigos, agências de recrutamento ou por outras vias. Uma outra característica das redes sociais é a forma como se dá o auxílio. Não necessariamente a ajuda para a hospedagem é direta: se um parente fornece essa ajuda, ele pode hospedar o migrante em sua própria residência ou ainda fornecer informações ou indicações de possíveis locais. O mesmo ocorre para a ajuda na obtenção do primeiro emprego. Essa troca de preciosas informações é fundamental para aqueles que se encontram na situação de clandestino em outro país e/ou sem conhecimento prévio do idioma.

É justamente nesse momento que podemos perceber as diferentes estratégias dos migrantes de Criciúma e Maringá para realizar o projeto migratório.

As variáveis foram dispostas em função do sexo dos migrantes. O uso das redes sociais é claro quando os quesitos analisados são as fontes de recursos financeiros, hospedagem e primeiro emprego no país de destino. Na tabela 15, observamos que, dentre os homens, 46,2% contaram com recursos financeiros disponibilizados por parentes ou amigos contra 60,2% das mulheres; 86,1% hospedaram-se em casas de familiares ou amigos contra 94,8% das mulheres; e 81,0% obtiveram seu primeiro emprego através de parentes ou amigos contra 80,8% das mulheres.

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Tabela 15

Fonte de recursos financeiros, de hospedagem e emprego em sua primeira viagem ao exterior, segundo o sexo

Criciúma, 2001

Fonte Recursos financeiros Hospedagem Emprego

M F M F M F Próprios 50.6 33.8 10.2 6.5 14.8 12.7 Parentes 43.3 54.7 42.2 49.3 31.5 38.0 Amigo/a 2.9 5.5 43.9 35.3 49.5 42.8 Ag. Recrutamento 0.6 1.5 0.6 1.5 0.3 0.5 Outros 2.6 4.5 3.1 7.4 3.9 6.0 Total % 100.0 100.0 100.0 100.0 100.0 100.0 Total 344 201 344 201 311 166

Fonte: pesquisa amostral Casos Válidos: recursos financeiros: 545, hospedagem: 545, emprego: 477

Total: 566

É visível que, num fluxo caracterizado acima de tudo pelo uso intenso das redes sociais, as mulheres recorrem mais a esse tipo de ajuda, principalmente de parentes. Os índices que registram que o migrante não recorreu a qualquer auxílio é sempre mais alto para homens que para mulheres. Os números analisados anteriormente, desde o ano da primeira viagem até o acompanhante, só vem a legitimar mais esses dados da tabela 19:o uso diversificado das redes e o diferente planejamento do projeto migratório entre homens e mulheres.

A tabela 16 referente aos migrantes de Maringá acaba , de certa forma, confirmando que as mulheres realmente utilizam mais o auxílio prestado por familiares.

Prevalece, obviamente, o uso dos serviços prestados pelas agências de recrutamento, mas ele tem sempre maior índice para homens que para mulheres, enquanto que a ajuda de parentes tem sempre maior número registrado entre as mulheres que entre os homens, mesmo num fluxo tão particular como é o caso do Brasil – Japão. Ainda que contando com vantagens exclusivas (a principal delas é a condição legalidade), as nipo-brasileiras se utilizam das redes, além das agências de recrutamento, para um maior apoio durante o processo.

No quesito recursos financeiros, por exemplo, 13,1% dos homens se beneficiaram da ajuda de familiares, enquanto que o fizeram 22,4% das mulheres. Quando se trata da hospedagem, esse diferença é ainda maior: 16,4% dos homens recorrem a parentes ou amigos contra 29,9% das mulheres na mesma condição. Mas o que mais marca o fluxo que parte de Maringá é mesmo a utilização das agências de recrutamento que, no quesito ajuda para o primeiro emprego no destino, atinge seus mais altos índices em ambos os sexos: 74,9% dos homens e 67,2% das mulheres obtiveram esse tipo de auxílio.

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Tabela 16

Fonte de recursos financeiros, de hospedagem e emprego na primeira viagem ao exterior, segundo o sexo

Maringá, 2001

Fonte Recursos financeiros Hospedagem Emprego

M F M F M F Próprios 24.3 20.8 6.5 4.8 5.3 4.0 Parentes 13.1 22.4 16.4 29.9 11.9 20.1 Amigo/a - - 1.9 1.0 3.0 3.6 Ag. Recrutamento 59.7 52.9 69.3 57.6 74.9 67.2 Outros 2.9 3.9 5.9 6.5 4.9 5.1 Total % 100.0 100.0 100.0 100.0 100.0 100.0 Total 437 287 440 287 392 276

Fonte: pesquisa amostral Casos válidos: recursos financeiros: 724, hospedagem: 727, emprego: 668

Total: 774

A tabela 17 indica as remessas de dinheiro para o Brasil, segundo o sexo do migrante. Dentre os migrantes criciumenses do sexo masculino, 33,0% declararam não remeter recursos financeiros para a origem, contra 57,9% das mulheres na mesma condição. O grupo que remete para manter a família corresponde a 35,2% da amostra, sendo que para compor esse grupo os migrantes homens contribuem com 42,9% do total de migrantes e as mulheres com 21,3%, que pode ser considerado um índice alto entre as mulheres, já que uma boa parte delas alega ser encontrar a família o principal motivo da migração.

Tabela 19

Remessas financeiras ao país de origem segundo o sexo do migrante Criciúma e Maringá, 2001

Criciúma Maringá Remessas financeiras Sexo (%) Total Remessas financeiras Sexo (%) Total

M F M F

Não remete 33,0 57,9 41,9 Não remete 35,7 46,7 40,3

Remete p/ manter a família 42,9 21,3 35,2 Remete p/ manter a família 44,0 34,4 39,9 Remete p/ investimento 19,1 14,1 17,3 Remete p/ investimento 19,3 18,6 19,0 Outra finalidade 5,0 6,7 5,6 Outra finalidade 1,0 0,3 0,8

Total % 100,0 100,0 100,0 Total % 100,0 100,0 100,0

Total 319 178 497 Total 398 291 689

Fonte: pesquisa amostral; Casos Válidos: Criciúma: 497; Maringá: 689 Total: Criciúma: 566; Maringá: 774

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Já no caso de Maringá, maioria dos homens, 44,0%, remete dinheiro para manter a família no Brasil e a maior parte das mulheres, 46,7%, não remete nenhum valor.

Esses números estão de acordo com a grande proporção de chefes na amostra, que têm um grau de comprometimento familiar muito maior e cujo projeto está relacionado à manutenção da família na origem.

Considerações Finais

Após a análise dos dados selecionados, já podemos dizer que a hipótese do início do trabalho foi confirmada: homens e mulheres se utilizam de diferentes artifícios de diferentes maneiras para a concretização do projeto migratório.

Após a observação do comportamento de diversas variáveis, todas em cruzamentos com gênero, pudemos definir um perfil geral de cada um dos sexos, inseridos em dois fluxos migratórios distintos, bem como compará-los.

Os migrantes criciumenses que se dirigem aos Estados Unidos, de um modo geral, ainda mantêm a intensidade do movimento, já que a grande maioria estava ausente no momento do survey. Também em relação a todo o grupo pode-se dizer que se trata de uma grande maioria clandestina no país de destino, fator que acabará por ditar uma série de outras condições que definirão as características do fluxo. Podemos dizer ainda que o ápice do movimento se deu em 2000, o que indica ser o fluxo que parte de Criciúma extremamente recente, com muita força ainda nos dias atuais.

As estratégias utilizadas para a migração começam a ser descritas nesse trabalho quando analisamos os motivos alegados para migrar. Homens e mulheres viajam proporcionalmente mais para trabalhar, mas ainda assim uma grande quantidade de mulheres o faz para encontrar a família: mais que o dobro de homens. Esse é um dos fatos condicionados pelo status de ilegalidade, já que, graças ao alto risco da viagem, os homens se aventuram num primeiro momento para, depois de já estabelecidos no destino, receberem os familiares. Outro fator que indica a essa mesma hipótese é a idade dos migrantes: o grupo migrante de um modo geral é muito jovem, revelando a idade um indicador de seletividade migratória. Mas os homens seguem com altos índices até a faixa dos 40 – 44 anos, enquanto que as mulheres dessa faixa etária somam proporcionalmente a metade da quantidade de homens.

A condição no domicílio para a população migrante de Criciúma também aponta na mesma direção: os maiores índices estão registrados entre os filhos e filhas, seguidos de homens em condição de chefes de família e mulheres na condição de cônjuges.

Outros fatores de seletividade do migrante, como escolaridade e conhecimento do idioma no país de destino servem para que possamos observar as ferramentas usadas por eles durante o processo. Saber o idioma do país de destino pode ser um fator decisivo para se conseguir um bom emprego. De qualquer forma, o idioma, no caso da conexão Brasil – Estados Unidos, não seleciona os migrantes, já que, como já dissemos anteriormente, existe a associação dos migrantes em comunidades filhas que acabam mantendo o uso da Língua Portuguesa, não tornando, portanto, um obstáculo para a migração a falta do domínio do Inglês.

O uso dessas redes sociais é que, justamente, acaba por revelar as maiores diferenças de estratégias entre os sexos nos dois fluxos. No caso de Criciúma, a maioria dos homens viaja sozinho, já que o projeto é mais arriscado. As mulheres, em sua maioria, viajam acompanhadas por parentes, já apoiadas diretamente desde o momento da viagem. A ajuda para obtenção de recursos financeiros para a viagem, bem como para hospedagem e primeiro emprego no destino também tem diferenças para homens e mulheres. Os homens que partem de Criciúma, de um modo geral, contam com a ajuda de amigos no destino, uma vez que

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viajam sem a companhia da família. Já as mulheres fazem uso das redes de parentesco, e o auxílio recebido por elas têm origem, em grande maioria, na família.

Assim, podemos dizer, com relação ao fluxo Brasil - Estados Unidos, que são as redes sociais as grandes mantenedoras do processo migratório e que homens e mulheres fazem usos diferentes desses recursos, tornando mais dinâmico o processo migratório e sua análise.

A conexão Brasil – Japão, como vimos ao longo da análise dos dados, tem outras características. O fluxo teve seu ápice em torno de 1990, quando foi promulgada a Lei de Migração. Com a recessão na economia japonesa, grande parte dos dekasseguis voltaram às origens, o que eleva a maioria dos migrantes ao status de retornados, no momento de realização do survey.

O que condicionou muitos aspectos do fluxo Brasil – Estados Unidos foi a condição clandestina dos migrantes. Nesse caso, o que marcará a conexão Brasil – Japão será a condição de legalidade do migrante, que revelará um comportamento muito diferente do que o visto num movimento clandestino. O migrante, com a segurança de poder entrar a qualquer momento no país de destino tem a possibilidade de acompanhar a economia. Isso significa que, se a economia do Japão se ressente e passa a não valer a pena o projeto migratório, o migrante volta ao Brasil e espera um melhor momento. O ápice do fluxo Maringá – Japão, como vimos no gráfico 2 se deu em 1990. Acompanhando o movimento do gráfico, podemos identificar momentos de maior intensidade na corrente, o que provavelmente indica momentos de maior prosperidade da economia no Japão.

Os motivos alegados pelos maringaenses para a migração têm proporções diferentes: a grande maioria também viaja para trabalhar. Mas a quantidade de mulheres que opta por migrar por saudades da família é muito menor que a observada no fluxo que parte de Criciúma. A hipótese é que, num fluxo legal, as mulheres tenham a possibilidade de viajar já com as famílias num primeiro momento, aumentando o peso proporcional das que justificam a viagem exclusivamente através de motivos econômicos.

A idade do grupo migrante que se dirige ao Japão é mais equilibrada do que a observada anteriormente. A maioria dos que investem no projeto é jovem, mas estão mais distribuídos entre as faixas etárias. O conhecimento do idioma do país de destino é um fator que diferencia o fluxo que parte de Maringá, uma vez que basicamente formado por descendentes, muitos têm algum conhecimento prévio da língua do país de destino, o que facilita a adaptação num país onde não se observa a formação de comunidades filhas, como nos Estados Unidos, como já dissemos anteriormente.

As redes sociais também têm um uso específico no fluxo Maringá – Japão. Enquanto que laços de amizade e parentesco ligam o Brasil e os Estados Unidos em redes sociais, são as agências de recrutamento que exercem esse papel na conexão Brasil – Japão. Viajando em grande maioria acompanhados de familiares, as mulheres ainda mais que os homens, os migrantes nipo-brasileiros recebem auxílio para recursos financeiros, hospedagem e principalmente primeiro emprego no destino através dessas agências, que mantêm contato direto com os empregadores das indústrias japonesas e acabam por conectar, de modo muito particular, os dois países. Como já dissemos anteriormente, de acordo com a tabela 16, mais de 70% dos migrantes que partem de Maringá se utilizaram em algum momento das agências de recrutamento.

As diferenças entre esses dois fluxos são claras e muito bem definidas logo numa primeira análise. O que procuramos mostrar nesse trabalho, no entanto, foram as pequenas mas significativas diferenças entre homens e mulheres inseridos nessas duas correntes migratórias, bem como uma comparação entre elas. A análise do grupo migrante apenas de um modo geral, pode vir a comprometer a veracidade das análises produzir falsas impressões a respeito de todo o fenômeno.

(23)

Mais do que tudo isso, o que procuramos com esse trabalho foi um primeiro olhar num banco de dados tão rico e variado de indicadores tendo sempre como foco as diferenças entre homens e mulheres nos fluxos migratórios estudados.

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ANEXOS

Tabela 21

Dados para o Gráfico 1

Ano da primeira viagem segundo o sexo Criciúma, 2001

Ano da primeira viagem de migração sexo Total

M F 1985 4 6 10 1986 4 0 4 1987 4 2 6 1988 3 1 4 1989 8 2 10 1990 9 3 12 1991 6 4 10 1992 7 5 12 1993 19 8 27 1994 23 10 33 1995 16 14 30 1996 17 10 27 1997 17 9 26 1998 35 33 68 1999 54 39 93 2000 67 34 101 2001 50 23 73 Total 343 203 546

Fonte: pesquisa amostral Casos Válidos: 546 Total: 566

(26)

Tabela 24

Dados para o gráfico 2

Ano da primeira viagem segundo o sexo Maringá, 2001

Ano da primeira viagem de migração sexo Total

M F 1985 12 20 32 1986 0 1 1 1987 2 1 3 1988 5 1 6 1989 31 18 49 1990 73 47 120 1991 55 33 88 1992 38 29 67 1993 20 26 46 1994 21 18 39 1995 29 15 44 1996 23 25 48 1997 37 28 65 1998 19 14 33 1999 15 15 30 2000 28 19 47 2001 6 7 13 Total 414 317 731

Fonte: pesquisa amostral Casos Válidos: 731 Total: 774

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