• Nenhum resultado encontrado

CLÁUSULA DE INALIENABILIDADE PERPÉTUA NULIDADE

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2022

Share "CLÁUSULA DE INALIENABILIDADE PERPÉTUA NULIDADE"

Copied!
16
0
0

Texto

(1)

Supremo Tribunal de Justiça

Processo nº 230/08.7TBPNH.P1.S1 Relator: SALAZAR CASANOVA

Sessão: 16 Abril 2013 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: REVISTA

Decisão: CONCEDIDA A REVISTA

CONTRATO DE COMPRA E VENDA AUTORIZAÇÃO

CLÁUSULA DE INALIENABILIDADE PERPÉTUA NULIDADE

ACTO DE DISPOSIÇÃO

Sumário

I - A cláusula oitava do contrato de compra e venda celebrado entre autora e ré de acordo com a qual em caso de alienação das instalações da ré essa alienação “fica obrigatoriamente precedida de autorização da Câmara

Municipal”, entendida com o sentido de que a ré fica para sempre obrigada a obter a autorização da autora querendo vender o imóvel que lhe comprou, configura uma cláusula de inalienabilidade perpétua.

II - Tal cláusula é nula por contrária à lei (art. 280.º do CC) pois introduz num negócio jurídico de disposição de bens uma limitação que fere o princípio da livre disponibilidade dos bens que é inerente ao estatuto real da propriedade (arts. 405.º e 1315.º do CC).

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

1. Município de Pinhel intentou no dia 22-9-2008 ação declarativa com processo ordinário contra AA Lda. que veio a prosseguir contra a massa insolvente da AA Lda. por insolvência daquela conforme sentença de 18-9-2009 deduzindo os seguintes pedidos:

(2)

- 249.398,98€ pelo preço da compra da parcela de terreno onde foi construída a unidade fabril.

- 359.134,52€ pelos juros compensatórios respeitantes àquele preço desde 1990 até 2006.

- 164.315,65€ pelos custos com as obras de terraplanagem e compactação do terreno e outros, levadas a cabo pela A. no ano de 1990.

- 229.413,40€ pelos juros compensatórios respeitantes àquele valor desde 1990 até 2006.

Total de 1.002.262,55€ a que acrescem juros de mora que sobre este capital se forem vencendo , desde a data de propositura da ação até ao seu efetivo e integral pagamento.

2. O fundamento do pedido reside na violação pela ré da segunda parte da cláusula oitava da escritura de compra e venda de terreno celebrada entre A.

e ré no dia 30-11-1990 segundo a qual a " firma AA compromete-se a não destinar as suas instalações e equipamentos para outro fim que não seja o identificado na cláusula quarta. Em caso de alienação (sob qualquer forma) das mesmas, esta fica obrigatoriamente precedida de autorização da Câmara Municipal de Pinhel".

3. Sucede que a ré, embora cumprindo tudo aquilo a que se obrigou nas cláusulas Quarta, Quinta e primeira parte da Oitava, não cumpriu a segunda parte desta cláusula visto que, depois do encerramento das instalações em 2006, procedeu à venda ao grupo empresarial BB, SA do prédio que adquirira à A.

4. Por isso, incorreu a ré na obrigação de pagamento, conforme resulta da cláusula nona, " do preço de aquisição do terreno pago pela A. à firma CC, acrescido dos juros e mais encargos inerentes à aquisição ou transferência da propriedade do terreno".

5. A ação foi julgada improcedente por sentença de 1ª instância, mas foi julgada parcialmente procedente por acórdão da Relação do Porto que condenou a ré a pagar a quantia de 249.398,98€ (custo de aquisição do terreno pela A.) acrescida de juros compensatórios respeitantes ao referido preço desde 1990 até 2006 no montante de 359.34,52€ e ainda os juros desde a propositura da ação até integral pagamento.

(3)

6. Recorre, de revista, a ré que conclui a minuta de recurso nos seguintes termos:

1- Todas as atas de reuniões da Câmara Municipal de Pinhel e da Assembleia Municipal de Pinhel que estão nos autos constituem prova documental que goza de força probatória plena com interesse para a decisão da causa por respeitarem ao assunto versado no processo (artigo 371.º do Código Civil).

2- A decisão do acórdão recorrido de alterar a matéria de facto incluindo nos factos provados apenas o teor da ata de 20-10-2006, não incluindo o teor das outras atas, de 7-4-2006, 20-2-2006, 21-4-2006 e 2-2-2007 não se encontra fundamentada , nem de facto, nem de direito, o que determina a nulidade do acórdão recorrido (artigos 158.º, 668.º/1, alínea b) do C.P.C.).

3- No acórdão recorrido há erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa, derivado da ofensa de disposição expressa da lei que fixa a força probatória dos meios de prova que são as atas de 7-4-2006, 20-2-2006, 21-4-2006, 2-2-2007 (artigo 371.º do Código Civil).

4- Pelo que o Supremo Tribunal de Justiça pode e deve alterar a matéria de facto no sentido de incluir nos factos provados também o teor das atas de 7-4-2006, 20-2-2006, 21-4-2006, 2-2-2007, que gozam de força probatória plena e com interesse para a decisão da causa por respeitarem à questão da venda do prédio em causa nos autos feita pela recorrente (artigos 722.º,n.º2, 729.º,n.º2 do .P.C.).

5- O acórdão recorrido assenta no pressuposto , errado, de que a resposta à matéria do item 4.º da base instrutória foi " não provado" o que não se verifica e, consequentemente, invalida a conclusão feita no mesmo acórdão de que a cláusula oitava se destinava a vigorar enquanto a recorrente fosse proprietária do terreno.

6- O objetivo ou finalidade das " condições pré-negociais" mencionadas na escritura pública de compra e venda feita pelo recorrido à recorrente foi garantir que no prédio vendido esta instalasse uma fábrica de calçado, a mantivesse em laboração e não destinasse o prédio a outro fim, durante 15 anos.

7- As partes fixaram livremente o conteúdo do contrato, em função do referido objetivo ou finalidade, fixando o referido prazo de 15 anos, aceite pelo

recorrido, o que significa que este considerou que o seu investimento

(4)

resultaria suficientemente compensado mediante a laboração da unidade fabril durante 15 anos.

8- Do confronto da cláusula nona com as cláusulas quarta, quinta e oitava resulta que os compromissos obrigacionais assumidos pela recorrente tinham o tempo limite dos 15 anos, pois enquanto o direito à indemnização previsto nas cláusulas quarta e oitava devia manter-se durante 15 anos, no caso da cláusula quinta, haveria uma redução do montante de indemnização em função do número de anos de laboração da fábrica.

9- A cláusula oitava constitui um todo que tem de ser lido e interpretado como tal e o disposto na segunda parte desta cláusula quanto à alienação ser

precedida de autorização teve que ver unicamente com a obrigação da recorrente de não destinar as instalações a outro fim e de permitir ao

recorrido, por via de autorização, fiscalizar o cumprimento de tal obrigação da recorrida durante o período de 15 anos em que esta esteve vinculada ao

cumprimento das condições pré-negociais.

10- Findo o prazo dos 15 anos durante os quais a recorrente cumpriu integralmente as suas obrigações contratuais, estas extinguiram-se.

11- Em face do teor das cláusulas pré-negociais que integram a escritura de compra e venda, numa perspetiva de atuação ética e do agir de boa fé, tendo em conta padrões de objetividade, retidão e proteção dos interesses que o negócio visou regular e salvaguardar, para uma pessoa medianamente sagaz, informada, sensível e prudente o sentido com que deve valer a cláusula

negocial em causa é o de que esta tinha uma vigência de 15 anos.

12- Este sentido tem correspondência no documento porquanto o conjunto das cláusulas pré-negociais que integram o contrato fundam-se no interesse que o recorrido quis garantir e salvaguardar de que a fábrica de calçado devia laborar, durante 15 anos , sendo nessa base o pressuposto temporal de 15 anos que a escritura pública de compra e venda de 30-11-1990 foi celebrada (artigos 236.º e 238.º do Código Civil).

13- O entendimento do acórdão recorrido de que a cláusula oitava seria

vinculativa e válida para além dos 15 anos ao abrigo do princípio da liberdade contratual não tem fundamento legal, porque este princípio não é absoluto e a faculdade de celebrar contratos e de fixar livremente o respetivo conteúdo deve exercer-se "dentro dos limites da lei" ( artigo 405.º,n.º1 do Código Civil).

(5)

14- Decorrido o período de 15 anos e cumprido o objetivo referido na conclusão 6 não existe interesse sério e atendível do recorrido, digno de proteção legal, que justifique a validade do disposto na segunda parte da

cláusula oitava de que a alienação das instalações da recorrente ficasse sujeita a autorização do recorrido, constituindo uma restrição sem limitação

temporal, sem qualquer tipo de justificação merecedora de tutela legal, e limitativa da esfera jurídica e económica da recorrente em termos

insuportáveis, impedindo-se de vender as suas instalações quando a sua situação económico-financeira exigia que as vendesse, como ficou provado (artigo 398.º,n.º2 do Código Civil).

15- A estipulação de restrições de natureza obrigacional ao direito de

propriedade tem sempre de corresponder a interesses sérios e atendíveis das partes, tem de ser temporalmente limitado, não pode limitar em termos

insuportáveis a esfera jurídica e económica do titular do direito de propriedade, o que decorre dos princípios constitucionais da

proporcionalidade ou da proibição do excesso e da defesa dos direitos

patrimoniais , nomeadamente o direito à propriedade privada (artigo 1306.º do Código Civil, artigos 18.º/2 e 62.º/1 da Constituição da República

Portuguesa).

16- Pelo que para além do prazo de 15 anos a cláusula oitava, designadamente a 2.ª parte, tem de ser considerada nula por ser contrária à lei por não

corresponder a interesses sérios e atendíveis das partes ( artigo 280.º do Código Civil).

17- Provado que a venda do prédio pela recorrente foi feita decorrido o prazo de 15 anos e que foi motivada por fatores alheios à vontade da recorrente, esta podia vender o prédio sem autorização do recorrido.

18- A decisão do acórdão de que não se mostra que o recorrido tivesse agido com abuso de direito não se encontra fundamentada, nem de facto, nem de direito, o que determina a nulidade do acórdão recorrido, o que se invoca ( artigos 158.º, 668.º,n.º1, alínea b) do C.P.C.

19- Na escritura pública de compra e venda de 30-11-190 ficou plasmado que o período de 15 anos foi o limite temporal negociado e acordado entre

recorrente e recorrido para a vigência das condições pré-negociais que

contemplavam as obrigações que a recorrente assumiu para com o recorrido.

(6)

20- Ao vir agora invocar que a recorrente não teria dado cumprimento à parte final da cláusula oitava apesar de reconhecer que o prazo de 15 anos foi

cumprido por aquela , quando nada em sentido contrário consta na escritura pública, o recorrido excede manifestamente os limites impostos pela boa fé (artigos 227.º, 334.º, 762.º do Código Civil).

21- E não existe qualquer interesse do recorrido digno de tutela por a recorrente ter vendido as suas instalações sem autorização do recorrido

quando já haviam decorrido os 15 anos em que a recorrente tinha a obrigação de ter em laboração as instalações e de assegurar postos de trabalho e de não dar outro fim ao prédio, únicos interesses que o recorrido tinha legitimidade em acautelar.

22- O fim económico e social que visava a cláusula era o de que durante 15 anos a recorrente mantivesse a fábrica de calçado em laboração , mantendo os postos de trabalho, o que tinha um valor económico e social para o recorrido, pelo que este excede manifestamente o fim social ou económico desse direito ao pretender que a recorrente o indemnize por pretensa violação daquela cláusula quando já decorrera o período de tempo em que a recorrente esteve obrigada a garantir a laboração da fábrica de calçado e não destinar o prédio a outro fim.

23- O recorrido teve conhecimento da intenção da recorrente de proceder à venda do prédio , admitiu que nada mais lhe restava que apresentar uma proposta de compra ou de negociação de uma preferência de compra ao tomar conhecimento da venda feita em 24-2-2007 pela recorrente, concordou com esta venda , pelo que invocar que a recorrente não teria dado cumprimento à parte final da cláusula oitava e pretender uma indemnização são condutas do recorrido manifestamente contraditórias, que constituem uma situação de "

venire contra factum proprium" por parte do recorrido, o que excede manifestamente os limites impostos pela boa fé.

24- Sempre teria que se considerar existir abuso do direito por parte do recorrido ao instaurar a presente ação, o que torna ilegítimo o seu exercício, tudo se passando como se não existisse o direito, e obsta a que a presente ação pudesse proceder( artigo 334.º do Código Civil).

25- Os " juros...inerentes à aquisição" da propriedade do terreno pelo

recorrido previstos na cláusula nona são os juros que, eventualmente, fossem suportados por este com o pagamento em prestações do preço de aquisição do

(7)

terreno à sociedade DD Lda. conforme consta da escritura pública de 22-11-1990.

26- Na cláusula nona não estava previsto o pagamento de quaisquer outros juros ao recorrido, nomeadamente juros compensatórios, nem que houvesse lugar a juros compensatórios desde a data da venda do terreno à recorrente.

27- Pelo que os fundamentos do acórdão recorrido quanto ao que deve ser ressarcido ao recorrido - que referiu ser o preço de aquisição do terreno pago pelo recorrido à firma CC Lda." , acrescido dos juros e mais encargos

inerentes à aquisição ou transferência da propriedade do terreno - estão em oposição com a decisão de condenar a recorrente no pagamento dos juros compensatórios respeitantes ao referido preço de aquisição, desde 1990 até 2006, no montante de 359.134,52€ e ainda os juros desde a propositura da ação até integral pagamento pelo que o acórdão recorrido é nulo, o que se invoca (artigo 668.º, n.º1, alínea c) do C.P.C.).

28- O acórdão recorrido ao condenar a recorrente no pagamento de juros compensatórios desde 1990 até 2006 e desde a proposição da ação até integral pagamento sem justificar porque seriam devidos juros nesses períodos , não se encontra fundamentado, o que determina a nulidade do

acórdão recorrido que se invoca (artigos 158.º , 668.º,n.º1, alínea b) do C.P.C.).

29- Na petição inicial o recorrido não alegou que tivesse suportado juros

inerentes à aquisição do terreno em 22-11-1990 nem ficou provado que tivesse pago qualquer valor de juros inerentes à aquisição à firma CC Lda. pelo que não há fundamento para o acórdão recorrido condenar a recorrente no pagamento de juros (artigo 342.º do Código Civil).

30- Ainda que tivesse havido lugar ao pagamento dos juros inerentes à aquisição do terreno pelo recorrido, seriam no montante de 1.250.000$00 correspondentes a 6234,97€ calculados nos termos previstos na escritura pública de 22-11-1990.

31- Para além dos referidos juros inerentes à aquisição da propriedade do terreno pelo recorrido, na cláusula nona não foi acordado o pagamento pela recorrente de quaisquer outros juros, nomeadamente juros compensatórios, nem desde quando eram devidos os juros compensatórios, nem as respetivas taxas, pelo que não tem fundamento , nem de facto, nem de direito, a

condenação da recorrente no pagamento de juros compensatórios.

(8)

32- Ainda que , por mera hipótese, se admitisse haver lugar ao pagamento de juros, não ficou provado que os juros seriam devidos desde 1996, pelo que só são devidos a partir do momento da interpelação judicial da recorrente para pagar os 249.398,95€, o que ocorreu com a citação desta recorrente ( artigo 805.º,n.º1 do Código Civil).

33- A recorrente invocou a prescrição dos juros vencidos há mais de 5 anos relativamente à data em que ocorreu a citação ( 6-10-2008) pelo que

entendendo-se no acórdão haver lugar ao pagamento de juros pela recorrente tinha de ser apreciada a prescrição invocada pela recorrente , o que não sucedeu.

34- Pelo que o acórdão recorrido é nulo por deixar pronunciar-se sobre a questão da prescrição dos juros que devia apreciar, o que se invoca (artigo 668.º,n.º1, alínea d do C.P.C.

35- A recorrente invocou a prescrição dos juros vencidos até 6-10-2003 pelo que sempre estariam prescritos os juros vencidos há mais de cinco anos relativamente à data em que ocorreu a citação da recorrente ( 6-10-2008) dado que os juros convencionais ou legais prescrevem no prazo de cinco anos (artigo 310.º, alínea d) do Código Civil).

36- O acórdão recorrido viola, designadamente, o disposto nos artigos 227.º, 236.º, 238.º, 280.º, 310.º, alínea d), 334.º, 342.º, n.º1, 398.º,n.º2, 405.º,n.º1, 762.º, 805.º,n.º1, 1306.º do Código Civil, artigo 158.º do Código de Processo Civil, artigos 18.º,n.º2 e 62.º,n.º1 da Constituição da República.

7. Factos provados:

1- Por escritura de compra e venda, realizada no dia 30 de novembro de 1990, na secretaria da Câmara Municipal de Pinhel, perante EE, Chefe da Divisão Administrativa e Financeira e Notário Privativo da mesma edilidade, a autora Município de Pinhel, declarou vender e a ré AA Lda., declarou comprar uma parcela de terreno , com a área de 39.600m2, desanexada do prédio rústico inscrito na respetiva matriz da freguesia de Pinhel sob o artigo 1220.º e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º …, a confrontar do Norte com terreno da sociedade DD Lda. e variante, Sul com herdeiros de FF, Nascente com Estrada Nacional 16 e Poente com GG, omissa na matriz e

descrita na C.R.P. de Pinhel a favor da Câmara Municipal de Pinhel com o número 864, pelo preço de 50$00/m2, nos termos das condições pré-negociais

(9)

constantes da declaração compromissória assinada por autora e ré que são as seguintes:

Primeira: a Câmara Municipal de Pinhel obrigou-se a vender a aludida parcela pelo preço de 50$00/m2.

Segunda: a Câmara Municipal de Pinhel assume a responsabilidade de

proceder às obras de terraplanagem e compactação do terreno assim como de executar as ligações de água à unidade fabril a instalar pela compradora , ora ré.

Terceira: a ré obriga-se com a aquisição de terreno a edificar as construções adequadas à sua atividade industrial de fabricação de calçado e à

implementação da mesma atividade num lapso de tempo não superior a seis meses, ficando bem entendido que a mesma empresa cumprirá as obrigações que assume de acordo com a sua capacidade económica e viabilidade técnica e comercial.

Quarta: a ré assegura que o objeto da sua produção consistirá essencialmente num agrupamento de elementos do produto final (calçado) , não se destinando a sua unidade fabril à produção agora " ex-novo" de qualquer elemento

constitutivo ou potenciador de poluição.

Quinta: a ré garante, dentro dos princípios da boa fé e de acordo com o projeto previamente aprovado que a laboração da fábrica deverá manter-se pelo período mínimo de quinze anos, contados a partir da primeira fase do investimento, em Pinhel, do qual dará conhecimento por escrito à Câmara Municipal de Pinhel.

Sexta: esta obrigação não será exigível se advier caso fortuito ou de força maior a que seja estranha a vontade da ré.

Sétima: esta garante, após o início da laboração e no decurso dos primeiros anos desta, a criação e provimento de 400 postos de trabalho, sendo este efetuado com a mão de obra domiciliada no concelho de Pinhel, caso exista disponível para assegurar a produtividade da empresa.

Oitavo: a ré compromete-se a não destinar as suas instalações e

equipamentos para outro fim que não seja o identificado na cláusula quarta.

Em caso de alienação (sob qualquer forma) das mesmas, esta fica

obrigatoriamente precedida de autorização da Câmara Municipal de Pinhel.

(10)

Nona: se os condicionalismos articulados nas cláusulas quartas, quinta e oitava não forem respeitados, a firma AA responsabiliza-se pelo pagamento à Câmara Municipal de Pinhel do preço de aquisição do terreno por esta pago à firma CC Lda. acrescido dos juros e mais encargos inerentes à aquisição ou transferência da propriedade do terreno. Porém, no que respeita à cláusula quinta, no caso de a fábrica laborar por mais de sete anos, a indemnização será fixada tendo em conta somente o número de anos completos que faltam para o termo do período estabelecido na mesma cláusula , segundo a fórmula I- cinquenta mil a dividir por quinze vezes o número de anos completos.

Décima: em caso de impossibilidade de cumprimento quanto à articulada quantia indemnizatória por parte da ré, a Câmara Municipal tornar-se-á

titular gratuitamente da propriedade plena do terreno e de quaisquer obras ou edificações que aí estejam implantadas como compensação em alternativa pelo incumprimento supra referido (cf. doc. de fls. 17)(A).

2- Por escritura outorgada em 22 de novembro de 1990, no cartório privativo referido em 1, a A. havia comprado à sociedade "DD Lda. a parcela de terreno referida em 1 pelo preço de 249.398.95€ (ao tempo, cinquenta milhões de escudos) tendo as partes declarado que a parcela se destinava à instalação de uma fábrica de calçado (cf. doc. de fls. 18 a 24)(B).

3- Em 2006 a ré decidiu encerrar as suas instalações e atividade (C).

4- A ré por escritura pública outorgada no dia 24-1-2007 procedeu à venda do prédio aludido em 1 ao grupo empresarial BB, SA (doc. de fls. 151 a 154) (D).

5- Por fax datado de 10-2-2006 endereçado ao Exm.º. Senhor Presidente da Câmara Municipal de Pinhel, a ré comunicou à A. que […] vai começar as diligências para fechar a sua fábrica em Pinhel em 30-4-2006 […] ,

atualmente, primeiro a crise internacional , de especial acuidade na

Alemanha, país importador da grande maioria do fabrico da AA, que provocou um decréscimo substancial das encomendas […] a concorrência da China, da Indonésia, da Índia, da mão de obra barata e a oferta de mão de obra

disponível também a menos custo nos países do leste europeu vieram a afetar a indústria de calçado na Europa ocidental e o mercado comum europeu e a colocar-lhe a necessidade de combater a concorrência pela utilização dos mesmos meios de produção (doc. de fls. 62 e 63) (E).

6- Por carta datada de 8-3-2006, o Presidente da Câmara de Pinhel manifestou

(11)

apelou à mesma para que [… repense] todo o seu procedimento e pondere permanecer em Pinhel e ajudar as suas gentes (doc. de fls. 68 e 69) (F).

7- Por carta datada de 19-5-2006, o Exm.º Presidente da Câmara de Pinhel lembrou à ré a escritura celebrada no dia 30-11-1990, o teor das cláusulas 8.ª e 9.ª bem como manifestou […] "o seu interesse na eventual alienação das vossas instalações e, para o efeito, dadas as cordiais relações havidas ao longo dos últimos anos, propor a celebração de um pacto de preferência que vise a prossecução de um tal objetivo" (cf. doc. de fls. 71 e 72) (G).

8- Por fax datado de 19-5-2006, a ré solicitou à A. o envio da decisão da

Câmara Municipal de Pinhel em acionar o direito de opção na compra das suas instalações (cf. doc, de fls. 73) (H).

9- Por fax datado de 25-5-2006 a ré comunicou à A. que pretendia contactar com ela via telefone o que não conseguiu. Mas disse pretender falar da carta datada de 19-5-2006, solicitando a marcação de uma reunião (cf. doc. de fls.

74) (I).

10- Por carta datada de 15-5-2006, a A. voltou a lembrar à ré o teor da

escritura de 30-11-1999 bem como o teor das cláusulas 8.ª e 9:ª bem como o seu interesse na eventual alienação (cf. o doc. de fls. 75 e 76) (J).

11- Por carta datada de 12-6-2006, a ré comunicou à A. que […] em resposta e de acordo com o já enunciado verbalmente voltamos a informar V.Ex.ª da nossa intenção em vender as nossas instalações fabris de Pinhel. Pelo respeito e pelas boas relações existentes agradecemos que, caso esteja interessado na aquisição das nossa instalações fabris, nos enviem uma proposta para análise [cf. doc. de fls. 77]( K).

12- Em obras de terraplanagem e compactação do terreno levadas a cabo pela autora após a data da outorga da escritura, aquela despendeu importância não concretamente apurada (1).

13- A ré não informou previamente a autora de que iria proceder ao concreto negócio de venda aludido em 4 (2).

14- Nem solicitou previamente à autora que este lhe autorizasse a realização do concreto negócio de venda mencionado em 4 (3).

15- A ré informou a A. de que era sua intenção proceder à venda do prédio aludido em 1, tendo-lhe dado a possibilidade de apresentar uma proposta de

(12)

escrito , designadamente por carta datada de 12-6-2006 correspondente ao doc. de fls. 77 (8 e 9).

16- Em notícia publicada no Jornal de Notícias no dia 16-2-2006 foi atribuída ao Sr. Presidente da Câmara de Pinhel, a seguinte declaração: " há 15 anos investimos 100 mil contos (hoje meio milhão de euros para ter a AA no nosso território e agora que o contrato acabou (setembro de 2005) vêm anunciar o encerramento (cf. doc. de fls. 64) (10).

17- Em notícia publicada no Jornal … de … foi atribuída ao Sr. Presidente da Câmara de Pinhel , referindo-se à alegada venda de terreno pela ré: " é claro que vão ganhar dinheiro" (cf. doc. de fls. 66/67) (11).

18- Em 28-3-2006 a ré, representada por HH, reuniu na Câmara Municipal de Pinhel, com o Presidente desta, transmitindo que a ré iria fechar no dia

28-4-2006 e que, a partir dessa data, as instalações iriam ser colocadas à venda e, caso a A. tivesse interesse na aquisição das mesmas, devia

apresentar uma proposta com o valor e condições pretendidas (12).

19- Em notícia publicada no jornal regional de 4-5-2006 foi atribuída ao Sr.

Presidente da Câmara de Pinhel a seguinte declaração: " em reunião da

Câmara de 7-4-2006 o executivo aprovou por unanimidade a não apresentação de qualquer proposta, tendo decidido acionar o direito de opção " (cf. doc. de fls. 70) (13).

20- A A. nunca apresentou qualquer proposta de compra ou opção à ré (14).

21- A ré decidiu fechar e vender a sua fábrica em Pinhel devido à crise

internacional com especial acuidade na Alemanha, país importador da grande maioria do fabrico das AA, que provocou um decréscimo substancial das

encomendas (15).

22- Quer por virtude da concorrência de países como a China, a Indonésia , a Índia, países com grande e menor custo de produção dada a grande oferta de mão de obra barata e ainda os países do leste europeu, também com a oferta de mão de obra a mais baixo custo.

23- Esta situação levou a que a ré se visse forçada a concentrar o fabrico numa só unidade situada na sede da ré, em Santa Maria da Feira, de modo a concentrar e reduzir os custos de produção, nomeadamente energia,

transporte entre fábricas e pessoal e transferir a produção de calçado do exterior para a Roménia, Indonésia e China (1)

(13)

24- A ré já sentia dificuldades económicas antes de atingir o acordado prazo de 15 anos aludido em 1 (18)

Apreciando

8. A questão a decidir no caso em apreço consiste em saber se é válido, e a sê-lo em que termos, o segmento constante da segunda parte da cláusula oitava do contrato de compra e venda celebrado entre A. e ré, segundo o qual a venda pela ré compradora, sob qualquer forma, das instalações e

equipamentos adquiridos " fica obrigatoriamente precedida de autorização"

por parte da vendedora.

9. A Câmara Municipal de Pinhel, ora autora, adquiriu um terreno que vendeu à ré por escritura de compra e venda outorgada no dia 30 de novembro de 1990 tendo em vista a instalação pela ré de indústria de fabrico de calçado.

10. A autora, dado o interesse para a economia de Pinhel que iria beneficiar de um empreendimento que proporcionaria muitos postos de trabalho (ver

cláusula sétima segundo a qual a ré se obrigou a criar 400 postos de trabalho com mão de obra domiciliada no concelho de Pinhel), procurou assegurar todas as condições necessárias à rápida instalação da unidade fabril e

simultaneamente assegurar que essa unidade permaneceria no concelho, não se deslocalizando.

11. Compreende-se, assim, que a compra e venda do terreno tenha sido

efetuada por um preço vantajoso e que a Câmara Municipal tenha assumido a

" responsabilidade de proceder às obras de terraplanagem e compactação do terreno", "assim como executar as ligações de água à unidade fabril a instalar pela compradora" (cláusula segunda) que, por sua vez, se obrigou a

implementar a atividade num período não superior a seis meses.

12. De acordo com a cláusula quinta, a ré assumiu a obrigação de manter " a laboração da fábrica […] pelo período mínimo de 15 anos, contados da

primeira fase do investimento em Pinhel".

13. A cláusula nona prescreve as consequências no caso de incumprimento dos condicionalismos referenciados nas cláusulas quarta ( a indústria a

instalar não seria poluidora), quinta (manutenção da laboração da fábrica por um período de 15 anos) e oitava ("a ré compromete-se a não destinar as suas instalações e equipamentos para outro fim que não seja o identificado na cláusula quarta" e " em caso de alienação […] das mesmas, esta fica

(14)

14. Essas consequências consistem no pagamento à A. do preço de aquisição do terreno por ela adquirido à firma CC Lda. " acrescido dos juros e mais encargos inerentes à aquisição e transferência da propriedade do terreno".

15. Considerou-se, nessa mesma cláusula, que " no caso de a fábrica laborar por mais de sete anos a indemnização será fixada tendo em conta somente o número de anos completos que faltam para o termo do período estabelecido na mesma cláusula , segundo a fórmula I -cinquenta mil a dividir por 15 vezes o número de anos completos".

16. A ré cumpriu todas as suas obrigações , designadamente a manutenção da unidade fabril em laboração pelo período de 15 anos, mas procedeu à venda dessa unidade sem obter autorização da Câmara Municipal de Pinhel.

17. A venda do prédio que a ré adquirira em 1990 à A. realizou-se em 2007 sendo comprador o grupo empresarial " CC,S.A".

18. O entendimento da autora, ora recorrida, é o de que a estipulação

contratual que limita o poder de disposição do proprietário é uma estipulação válida à luz dos artigos 405.º e 280.º do Código Civil - o primeiro dos quais reconhece às partes a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos incluindo neles as cláusulas que lhes aprouver e o segundo que apenas

considera nulo o negócio cujo objeto seja física ou legalmente impossível, contrário à lei ou indeterminável, ou contrário à ordem pública ou ofensivo dos bons costumes - por constituir um " ónus aceitável, uma simples limitação ou restrição ao conteúdo normal do domínio".

19. Sustenta a autora que a referida estipulação assim entendida " este 'ónus' de a ré ter que pedir autorização à A. para a venda dos terrenos sem qualquer espaço temporal, tendo em consideração a natureza do contrato e para o fim para que foi outorgado também ele é um 'ónus' aceitável, uma simples

limitação ao conteúdo normal do domínio" ( ver alínea P) das conclusões de recurso para o Tribunal da Relação).

20. Tal estipulação traduz-se numa cláusula de inalienabilidade perpétua visto que a ré, assim sendo, se obrigou, para sempre, a não vender o imóvel sem autorização prévia da A.

21. Na verdade, uma tal limitação impede a ré, sob pena de violação do contrato e consequente sujeição à prescrita responsabilidade patrimonial, de livremente exercer um dos poderes inerentes ao conteúdo da propriedade que

(15)

22. Ora, no que respeita a este entendimento, " não pode haver a mínima dúvida de que o direito português se revela hostil às cláusulas de

inalienabilidade perpétua. Elas violam, desde logo, o princípio da ordem pública , da livre circulabilidade ou da livre disposição dos bens, a que o legislador subordina o estatuto da propriedade" (" Cláusulas de

Inalienabilidade" por Almeida e Costa, R.L.J., Ano 124.º, pág. 329/333, 356/359, Ano 125.º, 8-10, 43-46).

23. Decorre do artigo 1305.º do Código Civil segundo o qual " o proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas" que " o poder ou faculdade de alienação, sempre que a lei não estabeleça diretamente restrições, faz parte do estatuto da propriedade. E mais: é imprescindível à efetivação de um outro princípio subjacente ao nosso ordenamento jurídico - o princípio da livre

comercialidade ou da livre disponibilidade dos bens. Sabe-se inclusivamente que o regime dos direitos reais se encontra subordinado, entre nós à

semelhança do que sucede no comum dos sistemas jurídicos , não só ao princípio do 'numerus clausus', mas também ao chamado princípio da tipicidade ou da taxatividade do conteúdo (artigo 1306.º do Código Civil).

Daqui resulta que o regime das coisas está fora do campo de intervenção da autonomia privada, apenas ao legislador se tornando possível defini-lo e

introduzir-lhe modificações. A organização da propriedade apresenta-se, deste modo, submetida a regras de ordem pública, por contender com interesses gerais da economia e, consequentemente da coletividade" (Almeida Costa, loc.

cit., Ano 125.º, pág. 8).

24. Conclui o Prof. Almeida e Costa referindo que " em face de tais princípios e atento o preceituado no referido artigo 1305.º, as cláusulas de

inalienabilidade perpétua têm de considerar-se inadmissíveis e nulas , pois eliminam, quando inseridas num negócio jurídico de disposição de bens - contrato ou testamento - uma das características essenciais do regime de propriedade. Só a lei pode estabelecer alguma norma especial que afaste ou atenue a invalidade das disposições em causa".

25. Também o Supremo Tribunal de Justiça no Ac. de 31-3-2004 (rel. Afonso de Melo), revista n.º 670/04 já considerou que as cláusulas de inalienabilidade perpétua são legalmente impossíveis porque contrariam o disposto no artigo 1305.º do Código Civil e o princípio de ordem pública nele subjacente de livre

(16)

26. Importaria analisar se uma tal cláusula pode ser reduzida a uma cláusula temporária com a validade correspondente ao período de laboração da

empresa.

27. No entanto, tal questão , como as demais suscitadas pela recorrente, perde utilidade, pois , ainda que se sustente que tal cláusula podia valer, à luz do acordado pelas partes como cláusula temporária ou que seria redutível de acordo com o disposto no artigo 292.º do Código Civil, o certo é que a ré alienou a sua propriedade já depois de decorridos os mencionados 15 anos de laboração e , por conseguinte, não poderia ser sancionada por um

incumprimento em que não incorreu.

28. Para que a sanção lhe fosse aplicável impunha considerar-se que tal

estipulação era válida, impondo à ré a obrigação de obter o consentimento da autora para alienar o imóvel fosse qual fosse o momento em que pretendesse proceder a tal alienação.

Concluindo:

I- A cláusula oitava do contrato de compra e venda celebrado entre A. e ré de acordo com a qual em caso de alienação das instalações da ré essa alienação

"fica obrigatoriamente precedida de autorização da Câmara Municipal", uma tal cláusula entendida com o sentido de que a ré fica para sempre obrigada a obter a autorização da A. querendo vender o imóvel que lhe comprou, tal cláusula configura uma cláusula de inalienabilidade perpétua.

II - Tal cláusula é nula por contrária à lei (artigo 280.º do Código Civil) pois introduz num negócio jurídico de disposição de bens uma limitação que fere o princípio da livre disponibilidade dos bens que é inerente ao estatuto real da propriedade (artigos 405.º e 1315.º do Código Civil).

Decisão: concede-se a revista, revogando-se o acórdão recorrida, subsistindo a decisão de 1ª instância

Custas pela A. em todas as instâncias Lisboa, 16 de Março de 2013

Salazar Casanova (Relator) Fernandes do Vale

Referências

Documentos relacionados

Em cada horta foram colhidas cinco amostras em pontos diferentes; para cada uma delas fizeram-se duas determinações do NMP/100 ml tanto para bactérias coliformes como para

Essas contramedidas incluem: um estudo de caso envolvendo a redundância e diversidade de caminhos, o qual refere-se à proposta de um escalonador que tem como objetivo equalizar

CLÁUSULA 14ª:: Em caso de falecimento do(a) PROMISSÁRIO(A)/COMPRADOR(A), os sucessores legais submetem-se ao pactuado neste contrato, em não havendo contestação sucessória em até

Perante o que se deixa exposto, em conjugação com a matéria fáctica fixada, não temos dúvidas em precisar que o exercício do direito de invocar a nulidade do contrato de compra

vendas à vista, será formalizada a escritura pública de venda e compra, e nas vendas a prazo, será celebrado o Instrumento Particular de Compra e Venda de Bem Imóvel

das Condições Especícas para os imóveis rurais adiante descritas, nas vendas à vista, será formalizada a escritura pública de venda e compra, e nas vendas a prazo, será

Caso o PRIMEIRO CONTRATANTE não proceda à marcação da escritura pública ou contrato definitivo de compra e venda conforme previsto no número um e dois desta cláusula,

[r]