Mar-mulher
Um navio negro rompe os mares
gelados. A noite invade o tombadilho.
A noite é um grito sobre as ondas enraivecidas. As vergas rangem. O tempo assusta.
Os homens rezam. Em toda parte cai o frio. Minhas mãos se aquecem no teu corpo
moreno. Tua carne afunda ao toque do meu desejo. Teus seios de repente se encrespam, como as ondas lá fora. Teus seios apontam para o alto,
como duas estrelas negras, onde brotam, macias, duas rosas
de carne quente.
A noite avança. O navio mergulha nas sombras. Ele vai como um cego, buscando horizontes invisíveis. Batem os panos sob o vento. As ondas se chocam no costado. Respinga o mar salgado no convés. Timoneiros e vigias em vigília. Os homens dormem. O frio continua. Beijo tua boca desesperadamente.
Sinto a primeira saliva tua, o gosto de mar-mulher. Um cheiro de chuva
que vem dos teus cabelos lava meu rosto cansado. Nossas línguas se tocam,
ardentes, serpenteando os espaços.
Nossos lábios se cruzam, se buscam,se mordem. Lá fora, a noite é vadia. Ninguém mais
se aventura ao frio. Todos partiram para sonhos distantes.
Somente o navio está desperto. O navio e eu.
O navio e nós.
Somos dois transeuntes entre luzes
escondidas. Nenhuma estrela, nem a lua, nem céu. Somente a bruma e a noite. Somente o mar e o frio.
Navego em ti. Navego em tuas ancas morenas, em tua carne quente.
a pervagar tua noite.
Meu navio te procura, insone, e submerge nos teus ais.
Buscando o fundo dos teus abismos, naufraguei-naufragaste-naufragamos, enfim livres, pássaros...
by Lucimar Luciano de Oliveira "MarMulher" (Poesia)