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O devido processo legal no processo administrativo disciplinar MESTRADO EM DIREITO

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Academic year: 2019

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC–SP

Fernanda Vasconcelos Fontes Piccina

O devido processo legal no processo administrativo disciplinar

MESTRADO EM DIREITO

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC–SP

Fernanda Vasconcelos Fontes Piccina

O devido processo legal no processo administrativo disciplinar

MESTRADO EM DIREITO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito do Estado, sub-área de concentração Direito Administrativo, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação da Profª. Doutora Dinorá Adelaide Musetti Grotti.

(3)

Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta dissertação por processos fotocopiadores ou eletrônicos, desde que citada a fonte.

(4)

Banca Examinadora

____________________________________

____________________________________

(5)

Dedico este trabalho ao meu marido Guilherme, pelo carinho, paciência e incentivo.

(6)

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por iluminar sempre a minha vida; Ao meu pai Paulo, pelo amor e incentivo aos meus estudos;

À minha irmã Daniela, pela amizade e carinho.

À minha mãe Vera Maria (in memoriam), que estará sempre presente no meu coração;

Ao meu marido Guilherme, pela ajuda diária e por não me deixar desistir nunca;

À Gabi, minha filhinha linda, por me fazer tão feliz... À minha orientadora, Professora Dinorá Adelaide Musetti Grotti, por quem possuo enorme admiração, pelo acompanhamento, dedicação, compreensão e atenção;

(7)

RESUMO

O presente trabalho tem por objeto o estudo do devido processo legal e suas implicações no processo administrativo disciplinar. Parte-se da contextualização do Devido Processo Legal no ordenamento jurídico brasileiro e de uma breve descrição histórica do princípio e da sua análise, tomando por base o fenômeno da constitucionalização do Direito.

O estudo do processo administrativo disciplinar é feito, inicialmente, a partir de abordagem geral desse processo na esfera federal, sob a ótica da Lei 8112/90, com a análise de cada uma de suas fases, passando-se, após, ao estudo dos princípios que conferem concretude ao Devido Processo Legal, bem como as consequências da sua incidência no processo em estudo.

O trabalho compreende, assim, o estudo dos princípios concretizadores do Devido Processo Legal, quais sejam: contraditório e ampla defesa, juiz natural, razoabilidade e proporcionalidade e, por fim, a razoável duração do processo.

Nos itens em que os mencionados princípios são estudados, buscou-se conceituá-los e examinar seus fundamentos, sentido e alcance nos processos de aplicação de sanções disciplinares, de modo a constatar a sua incidência nos casos concretos, bem como o entendimento dos Tribunais Superiores sobre a matéria.

Palavras-chave: devido processo legal – processo administrativo disciplinar – servidor público

– Lei 8112/90 – contraditório – ampla defesa – juiz natural – razoável duração do processo –

(8)

ABSTRACT

The present work aims the study of the Due Process of Law and its implications in administrative disciplinary proceedings. It starts with the background of Due Process in the Brazilian legal and a brief historical description of the principle and its analysis, based on the phenomena of constitutionalization of the law.

The study of administrative disciplinary proceedings is made, initially from the general approach of this process at the federal level, from the perspective of Law 8112/90, with the analysis of each of its phases, moving after, the study of principles that give concreteness to the Due Process of Law as well as the consequences of its impact on the process under study.

The work contains, therefore, the study in furtherance of the principles of due process of law, namely: contradictory and full defense, natural judge, reasonableness and proportionality and, finally, a reasonable duration of proceedings.

In items where the above principles are studied, sought to conceptualize them and examine its foundations, scope and direction in the processes of disciplinary sanctions in order to verify their impact in specific cases, as well as the understanding of the Superior Courts on the matter.

(9)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

I O DEVIDO PROCESSO LEGAL...12

1. A constitucionalização do Direito e seus reflexos no Direito Administrativo...13

2. Origem e conteúdo do Devido Processo Legal...16

3. Aspectos processual (formal) e substantivo (material)...19

4. O Devido Processo Legal nos processos administrativos...22

II O PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR 1. Conceito...26

1.1.Princípios Fundamentais...31

1.2.1 Legalidade objetiva...31

1.2.2 Oficialidade...32

1.2.3. Informalismo...32

1.2.4.Publicidade...33

1.2.5. Verdade Material...34

2. Direitos e deveres dos servidores...34

3. As esferas de responsabilidade ...36

4. Ilícitos e penalidades aplicáveis aos servidores...41

5. Sindicância...44

6. As fases do processo administrativo disciplinar na Lei 8112/90...47

6.1.Instauração...47

6.2. Inquérito...49

6.2.1. Instrução...50

6.2.2. Defesa...51

6.2.3. Relatório...53

6.3. Julgamento...54

(10)

1. Os princípios do contraditório e da ampla defesa...56

1.1. Conceito...56

1.2.Instauração...62

1.2.1. A necessidade de Justa Causa para a instauração de processo disciplinar...62

1.2.2. A descrição dos fatos imputados ao acusado e sua tipificação na portaria de instauração...63

1.2.3. Citação prévia do Acusado...65

1.3.Instrução...67

1.3.1. A produção de provas no Processo Administrativo Disciplinar...67

1.3.2. A ampliação da acusação no curso do processo...73

1.4. Defesa...75

1.4.1. A defesa técnica e a súmula vinculante nº 5 do Supremo Tribunal Federal.. 75

1.4.2. O direito ao silêncio...76

1.5. Relatório...78

1.5.1. A descrição de imputação nova no relatório ...78

1.5.2. A apresentação de razões finais no Processo Administrativo Disciplinar...79

1.6.Julgamento...80

1.6.1. Verdade sabida...80

1.7. Recurso...81

1.7.1. A Reformatio in Pejus no processo administrativo disciplinar...82

2. O Princípio do Juiz natural...85

2.1.Origem...85

2.2. Conceito...87

2.3. Elementos...91

2.4. O princípio do juiz natural no processo administrativo disciplinar...93

2.4.1. Instauração...95

2.4.2. Instrução...97

2.4.3.Julgamento...105

3. Os Princípios da Razoabilidade e Proporcionalidade...109

3.1. Origem...109

(11)

3.2.1. O Princípio da Proporcionalidade...111

3.2.2. O Princípio da Razoabilidade...113

3.2.3. A questão da fungibilidade entre os princípios da proporcionalidade e razoabilidade...116

3.3. Os Princípios da Razoabilidade e Proporcionalidade no processo administrativo disciplinar...119

4. O princípio da razoável duração do processo...125

4.1. Origem...125

4.2. Conceito de razoável duração do processo...129

4.3. Do necessário equilíbrio entre a razoável duração do processo e os demais princípios constitucionais...131

4.4. Dos meios destinados a assegurar a celeridade da tramitação do processo...132

4.5. O princípio da razoável duração do processo no processo administrativo disciplinar ...136

CONCLUSÕES...141

(12)

INTRODUÇÃO

O tema do processo administrativo é dos mais importantes no direito brasileiro contemporâneo como instrumento de garantia dos administrados em face das prerrogativas públicas.

A Constituição de 1988 lhe deu respaldo expresso ao constitucionalizar o devido processo legal enquanto princípio (art. 5º, inciso LIV), e determinar expressamente sua aplicação na esfera administrativa (inciso LV). A partir daí, a jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal assimilou uma série de soluções concretas atinentes à incidência do princípio no campo administrativo.

O presente trabalho tem por objeto o processo administrativo disciplinar sob a perspectiva do devido processo legal, cuja incidência lhe traz relevantes consequências, que justificam o exame da matéria.

Apesar de se tratar de tema que vem sendo aperfeiçoado pelo estudo doutrinário e jurisprudencial, é certo que, até mesmo em virtude da sua relevância, muito já se escreveu sobre o devido processo legal. A sua incidência no processo administrativo disciplinar, contudo, foi abordada por poucos trabalhos, o que demonstra a atualidade do assunto.

Iniciaremos o estudo a partir de uma análise histórica do devido processo legal, abordando o posicionamento da doutrina sobre o princípio e contextualizando-o a partir do fenômeno da constitucionalização do Direito. Assim, no primeiro capítulo serão estudados a origem, conteúdo e aspectos formal e substancial do devido processo legal, para, após, examiná-lo nos processos administrativos em geral.

No segundo capítulo, serão abordados o conceito de processo administrativo disciplinar na esfera federal e seus princípios específicos, fazendo uma breve análise da sindicância e de cada uma das fases do processo em estudo, sempre a partir da Lei 8112/90.

No terceiro capítulo serão estudados os princípios concretizadores do Devido Processo Legal, quais sejam: os contraditório e a ampla defesa, o juiz natural, a razoabilidade e a proporcionalidade e, por fim, a razoável duração do processo.

Nesse ponto do estudo, faremos uma análise mais profunda e crítica sobre cada um dos princípios e suas relações com o processo administrativo disciplinar, de forma a solucionar as principais questões envolvendo os casos concretos de servidores acusados de infração disciplinar, além do tratamento conferido pela jurisprudência pátria sobre o tema.

(13)

I O DEVIDO PROCESSO LEGAL

Desde a sua origem, o princípio do devido processo legal tem ocupado papel de destaque na ciência do Direito, tendo sido incorporado pelos textos constitucionais vigentes de diversos países, entre eles o Brasil.1

Inicialmente circunscrito ao processo penal, o devido processo legal estendeu-se, ao longo dos anos, ao processo civil e ao processo administrativo, como forma de garantir às partes envolvidas em todas essas modalidades procedimentais um processo legal e legítimo, plenamente apto, portanto, a culminar numa sentença justa.2

O princípio em comento foi objeto de relevante desenvolvimento pela doutrina e jurisprudência estrangeira e nacional, o que permitiu considerável alargamento de seu sentido e alcance, correspondentes tanto à construção de seu aspecto substantivo, como também à sua incidência nos processos civil e administrativo.

Como se sabe, essa evolução do princípio do devido processo legal é fruto de uma longa trajetória histórica, sobre a qual trataremos, com mais vagar, nos itens subsequentes deste capítulo. Antes disso, porém, cabe enfatizar que o fenômeno da constitucionalização do Direito, ao contribuir para uma nova leitura e interpretação dos dispositivos legais à luz da Constituição, acaba por conferir ao devido processo legal um grau de importância ainda maior do que aquele de outrora.

Diante disso, abordaremos, na sequência, o mencionado fenômeno, sobretudo em relação ao Direito Administrativo, para, a partir dele, analisar especificamente o princípio do devido processo legal.

1 Antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, e já antevendo a previsão expressa do Devido Processo Legal no novo texto constitucional, bem como a sua importância para o ordenamento, Carlos Roberto Siqueira Castro, jurista que acompanhou os trabalhos da Assembléia Nacional Constituinte, elaborou interessante obra a respeito da cláusula, na qual afirmou : “ Permite-se antecipar que a solene e promissora reverência prestada a esse instituto pela vindoura e fecunda Constituição fará com que o mesmo se transmude em breves dias numa garantia nominada e explícita em nosso Direito Constitucional, quiçá a mais importante dentre todas as demais, isto se explorada doravante e com sabedoria e superioridade por toda a classe jurídica responsável

pela afirmação diuturna na supremacia da Lei Maior.” (O Devido Processo Legal e a Razoabilidade das Leis na Nova Constituição do Brasil.Rio de janeiro: Forense, 2005,p. 05)

(14)

1 A constitucionalização do Direito e seus reflexos no Direito Administrativo

De acordo com Luis Roberto Barroso, a idéia de constitucionalização do Direito:

está associada a um efeito expansivo das normas constitucionais, cujo conteúdo material e axiológico se irradia, com força normativa, por todo o sistema jurídico. Os valores, os fins públicos e os comportamentos contemplados nos princípios e regras da Constituição passam a condicionar a validade e o sentido de todas as normas do direito infraconstitucional. Como intuitivo, a constitucionalização repercute sobre a atuação dos três Poderes, inclusive e notadamente nas suas relações com os particulares.3

Com efeito, o fenômeno em análise, originado na Alemanha4 e posteriormente estendido a diversos países, incluindo o Brasil, gerou uma verdadeira mudança de paradigmas no constitucionalismo, desde o seu surgimento no final do século XVIII, tornando-se distinto de todas as experiências constitucionais precedentes, posto que assentado, segundo a doutrina constitucional,5 nas seguintes premissas:

a) mais Constituição do que leis: o texto constitucional deixa de ser um documento de cunho eminentemente político para se tornar a norma suprema e fundamento de validade de todo o ordenamento jurídico;

b) mais juízes do que legisladores: o juiz passa a ser dotado de uma função criadora

do Direito, deixando de ser visto, na acepção de Montesquieu, como a mera ―boca da lei‖, vale dizer, como simples revelador da vontade da lei ou do legislador;

c) mais princípios do que regras: dada a força vinculante atribuída aos princípios, não mais dependentes da mediação do legislador infraconstitucional para produzir efeitos jurídicos;

d) mais ponderação do que subsunção: diante da preponderância acima registrada dos princípios sobre as regras, fazendo com que a ponderação passe a ser utilizada

3Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 351-352.

4 Segundo Luis Roberto Barroso, há razoável consenso de que o marco inicial do processo de constitucionalização do Direito ocorreu na Alemanha, sob o regime da Lei Fundamental de 1949, impulsionado principalmente pela jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal daquele país, o qual assentou que os direitos fundamentais, além de sua dimensão subjetiva, também contemplam um aspecto objetivo, instituindo uma ordem objetiva de valores. Conforme esse entendimento, os direitos fundamentais, além de conferir proteção à esfera subjetiva dos interessados, também correspondem ao interesse geral da sociedade na sua satisfação. Dessa forma, o mencionado Tribunal passou a interpretar todos os ramos do Direito (especialmente o Direito Civil) à luz das normas constitucionais, as quais passaram a vincular os Poderes estatais (Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 354 -355).

(15)

com maior frequência do que a subsunção, especialmente naqueles casos de colisão entre princípios;

e) mais concretização do que interpretação: já que a tarefa do aplicador do Direito não se circunscreveria, apenas, a desvendar o sentido e alcance das normas jurídicas, mas também a buscar, nos princípios previstos na ordem jurídica, a justiça no caso concreto;

Como bem elucida Gustavo Binenbojm, o processo de constitucionalização do direito

não se esgota na mera disciplina, em sede constitucional, de questões outrora reguladas exclusivamente pelo legislador ordinário. Ele implica, mais que isso, no reconhecimento de que toda a legislação infraconstitucional tem de ser interpretada e aplicada à luz da Constituição, que deve tornar-se uma verdadeira bússola, a guiar o intérprete no equacionamento de qualquer questão jurídica. Tal concepção, que vem sendo rotulada como neoconstitucionalismo, impõe aos juristas a tarefa de revisitar os conceitos de suas disciplinas, para submetê-los a uma releitura, a partir da ótica constitucional.6

Em consonância com esse entendimento, Luis Roberto Barroso7 esclarece que, nesse ambiente, a Constituição, situando-se no centro do sistema jurídico, deixa de servir apenas como parâmetro de validade para a ordem infraconstitucional e passa a funcionar também como vetor de interpretação dos demais ramos do Direito, nos quais se inclui, por evidente, o Direito Administrativo objeto de estudo na presente dissertação.

Assim, no que tange especificamente ao Direito Administrativo, o mesmo autor sustenta que a centralidade da dignidade da pessoa humana e a preservação dos direitos fundamentais contribuíram para uma relevante alteração na qualidade da relação entre a Administração Pública e os administrados, repercutindo na superação ou reformulação de alguns paradigmas tradicionais desse ramo do Direito, dos quais podemos destacar, para os fins do presente estudo, a vinculação do administrador à Constituição e não apenas à lei ordinária.8 Haveria, por assim dizer, uma superação do dogma da onipotência da lei administrativa e sua substituição por referências diretas a princípios expressa ou implicitamente consagrados no ordenamento constitucional.9

Nesse sentido, Luis Roberto Barroso leciona:

6 Uma teoria do direito administrativo: direitos fundamentais, democracia e constitucionalização. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 65.

7Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 363.

(16)

supera-se, aqui, a idéia restrita de vinculação positiva do administrador à lei, na leitura convencional do princípio da legalidade, pela qual sua atuação estava pautada por aquilo que o legislador determinasse ou autorizasse. O administrador pode e deve atuar tendo por fundamento direto a Constituição e independentemente, em muitos casos, de qualquer manifestação do legislador ordinário.10

A partir disso, constatamos a grande importância que assume a incidência do princípio do devido processo legal no processo administrativo disciplinar. Em outras palavras, a Administração Pública, enquanto submetida aos ditames do texto constitucional, deverá obedecer ao princípio constitucional em comento e seus consectários (entre eles o direito à ampla defesa e ao contraditório) durante todo o trâmite do processo administrativo destinado à aplicação de uma sanção disciplinar ao acusado. Isso porque, conforme leciona a doutrina sobre a matéria:

toda a sistematização dos poderes e deveres da Administração Pública passa a ser traçada a partir dos lineamentos constitucionais pertinentes, com especial ênfase no sistema de direitos fundamentais e nas normas estruturantes do regime democrático, à vista de sua posição axiológica central e estruturante do Estado democrático de direito.11

Diante desse panorama, passaremos, na sequência, a tratar especificamente do princípio do devido processo legal para, posteriormente, estudar o processo administrativo disciplinar, bem como a estreita ligação entre ambos.

2 Origem e conteúdo do devido processo legal

Certamente, tarefa das mais tormentosas é conceituar o que se deve entender por devido processo legal. A uma, porque não há qualquer consenso, quer na doutrina, quer na jurisprudência. A duas, pois muitos estudiosos questionam a utilidade desse esforço em conceituá-lo, haja vista que, segundo eles, isso poderia contribuir para uma indevida restrição ao amplo sentido e alcance já albergados pelo referido princípio.

Na esteira desse entendimento, assevera Egon Bockmann Moreira:

os estudiosos não alcançam unidade quanto à sua definição, conteúdo e limites. O que, uma vez mais, demonstra a essencial amplitude do

due process of law‟ é a impossibilidade de seu enclaustramento em

10 Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 375.

(17)

uma definição (acadêmica ou de direito positivo) – no que estão a razão de ser da cláusula e o motivo de sua sobrevivência através dos

séculos. Tentar dizer, pontual e exatamente, o que significa o ‗devido processo‘ é tarefa de pouca ou nenhuma utilidade, pois implicaria a

limitação da grandeza da garantia12

Na mesma linha, Carlos Roberto Siqueira Castro afirma, ao relacionar o devido processo legal à razoabilidade e racionalidade das leis, que por

não ser o requisito da ‗razoabilidade‘ das leis um princípio aritmético

ou suscetível de precisão teórica ou jurisprudencial, é forçoso que a

cláusula melhor vocacionada à sua implementação (a do ‗devido processo legal‘) padeça, por igual, de inexatidão e de variações de

conteúdo ao sabor da evolução nem sempre retilínea do sentimento jurídico vigorante em cada tempo e lugar13.

Seguindo o mesmo raciocínio, San Tiago Dantas também ensina que:

o ‗due process of law‟ é um standard, pelo qual se guiam os Tribunais,

e, assim sendo, ‗deve aplicar-se tendo em vista circunstâncias especiais de tempo e de opinião pública em relação ao lugar em que o

ato tem eficácia.‘14Daí não ser possível aprisioná-lo num conceito

teorético, sob pena de se lhe comprometer a elasticidade. Uma definição aproximada há de ser extraída da sucessiva consideração de várias hipóteses, nele incluídas ou dele excluídas pelos pronunciamentos judiciários.

Tido por parcela expressiva da doutrina como um dos mais importantes princípios previstos pela Constituição Federal de 198815, a origem mais conhecida do devido processo legal remonta à Carta Magna inglesa de 1215, associando-se à expressão ―by the law of the land‖ (segundo a lei do lugar) prevista em seu artigo 39, que confere proteção à liberdade e

propriedade nos seguintes termos:

nenhum homem será preso ou detido em prisão ou privado de suas terras ou postos fora da lei ou banido ou de qualquer maneira

12 MOREIRA, Egon Bockmann, Processo Administrativo: princípios constitucionais e a Lei 9.784/99. 4. ed., atual., rev. e aum., São Paulo : Malheiros, 2010,p. 254.

13 CASTRO, Carlos Roberto Siquera. O Devido Processo Legal e a Razoabilidade das Leis na Nova Constituição do Brasil. Rio de Janeiro: Forense, 2005,p. 176 - 177.

14 POUND , Roscoe. The Administrative aplication of legal Standards Catinella, La Corte Suprema federale, Cedam, p. 60, apud DANTAS, San Tiago.Problemas de Direito Positivo. Rio de Janeiro, Forense, 1953. 15 A ponto de Nelson Nery Jr. afirmar, de forma categórica, que: bastaria a Constituição Federal de 1988 ter

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molestado; e não procederemos contra ele, nem o faremos vir a menos que por julgamento legítimo de seus pares e pela lei da terra.16

Nessa época, a aludida garantia destinava-se à proteção dos direitos dos homens livres - barões e proprietários de terra que integravam a nobreza daquele país - em face dos abusos provenientes da Coroa inglesa (Rei João sem Terra), de tal modo que os direitos relativos à vida, liberdade e propriedade daqueles somente poderiam ser suprimidos pelas regras

constantes da ―lei da terra‖ ou do direito costumeiramente aceito.

Já a expressão due process of law (devido processo legal) apareceu pela primeira vez anos depois, com o advento do Statute of Westminster of the Liberties of London de 1354, segundo o qual:

nenhum homem deve ser condenado sem julgamento. Além disso, nenhum homem, de qualquer camada social ou condição, pode ser retirado de sua terra ou propriedade, nem conduzido, nem preso, nem deserdado, nem condenado à morte, sem que seja trazido à responder pelo devido processo legal. (grifo nosso).17

Paralelamente ao desenvolvimento teórico e prático do aludido princípio na Inglaterra, este encontrou ressonância no direito norte-americano, tendo sido positivado na Constituição dos Estados Unidos de 1787 por meio da Emenda V de 1791, segundo a qual: nenhuma pessoa deve [...] ser privada da vida, liberdade ou propriedade sem o devido processo legal..18 A Emenda XIV de 1868, por sua vez, estendeu a aplicação da cláusula, que até então era destinada somente ao governo central, também aos Estados da Federação, ampliando o seu alcance naquele país.

Nesse diapasão, é importante observar que, não obstante a sua origem inglesa, foi nos Estados Unidos que o significado do devido processo legal foi objeto de importantes avanços e desdobramentos, impulsionados principalmente pela jurisprudência norte-americana. Por intermédio dos julgados proferidos pela Suprema Corte desse país, o princípio em análise deixou de ser visto como uma garantia de cunho meramente processual e passou a servir

16 No free man shall be taken, imprisioned, desseised, outlawed, banished, or in any way destroyed, nor will we proceed or send against him, except by the lawful judgement of his peers or by the law of the land

17None shall be condemned without trial. Also, that no man, of what estate or condition that he be, shall be put out of land or tenement, nor taken or imprisoned, nor disinherited, nor put to death, without being brough to answer by due process of law(grifo nosso)

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como um instrumento destinado a coibir todo tipo de arbitrariedade perpetrada pelo Poder Público em geral, inclusive o legislador (aspecto substantivo).19

Depois de ter sido contemplado pela Constituição estadunidense, o princípio do devido processo legal irradiou-se para os textos constitucionais de diversos países, entre eles o Brasil. No caso brasileiro, embora já se admitisse, antes de 1988, a existência tácita do devido processo legal em nosso ordenamento jurídico, foi somente com o advento da Constituição Federal vigente que houve a sua previsão expressa, espancando qualquer dúvida a respeito de sua aplicação ou não ao direito pátrio. Assim, consta no artigo 5º, inciso LIV da Carta Magna brasileira: ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.

Feito esse breve escorço histórico acerca do princípio do devido processo legal, passamos, a seguir, a tratar de seus aspectos.

3 Aspectos processual e substantivo

José Celso de Mello Filho20 elenca as garantias que seriam decorrentes do princípio do devido processo legal em seu aspecto processual, quais sejam:

a) direito à citação e ao conhecimento do teor da peça acusatória; b) direito a um rápido e público julgamento;

c) direito ao arrolamento de testemunhas e à notificação destas para comparecimento perante os tribunais;

d) direito ao procedimento contraditório;

e) direito de não ser processado, julgado ou condenado por alegada infração às leis editadas ex post facto;

f) direito à plena igualdade com a acusação;

g) direito de não ser acusado nem condenado com base em provas ilegalmente obtidas ou ilegitimamente produzidas;

h) direito à assistência judiciária, inclusive gratuita; i) privilégio contra a auto-incriminação;

j) direito de não ser subtraído ao seu juiz natural

Esses seriam, portanto, os pilares necessários à consecução de um processo justo, que respeite, de modo amplo, o direito ao contraditório e à ampla defesa do acusado, enquanto corolários do devido processo legal e positivados no artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal de 1988.

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Contudo, como vimos ao tratar da origem do devido processo legal, a jurisprudência norte-americana não se limitou à análise puramente processual do princípio, avançando o seu exame sobre o seu aspecto substantivo. A razão histórica para tanto é atribuída à aversão das colônias americanas ao controle exercido pelo Parlamento inglês, fato este também responsável pelo desenvolvimento do controle de constitucionalidade das leis nos Estados Unidos.

Em outras palavras, ao contrário do prestígio existente no direito inglês acerca da produção legislativa, havia no direito norte-americano um claro propósito de controlar os atos provenientes do Poder Legislativo. Eis a razão para justificar a criação do aspecto substantivo do devido processo legal, o qual também passou a ser invocado em face do Poder legiferante.

Sintetizando essas idéias, aponta Egon Bockmann Moreira:

o due process of law foi aplicado pelos norte-americanos para defender as liberdades públicas (dos colonos) contra o absolutismo real (da Inglaterra) [...] ao distinguir a garantia da compreensão original inglesa, para ampliar sua proteção qualitativa (aspectos substancial e processual) e quantitativa (em face de todos os Poderes do Estado), a jurisprudência estadunidense conferiu-lhe o status de norma fundamental de todo o sistema.21

Essa constatação, segundo o autor, fez com que as fronteiras do devido processo legal fossem dilatadas, de forma que:

a lei e o ato administrativo podem ser contrários ao devido processo legal não porque violaram a vida, liberdade ou propriedade através da visão autônoma e estrita do fenômeno processo. Mais do que isso, atos estatais podem produzir agressões de fundo ao devido processo legal quando seu conteúdo sobre não guarnecer determinados interesses públicos, atinge direitos protegidos constitucionalmente.22

A concepção substantiva do devido processo legal, portanto, passou a viabilizar o controle jurisdicional sobre os atos do Poder Público, inclusive do legislador, de modo a invalidar todo aquele ato considerado arbitrário, desproporcional ou não condizente com a razoabilidade (reasonableness) ou racionalidade (rationality).

De acordo com Luís Roberto Barroso:

Na primeira fase, a cláusula teve caráter puramente processual (procedural due process), abrigando garantias voltadas, de início, para o processo penal e que incluíam os direitos de citação, ampla defesa, contraditório e recursos. Na segunda fase, o devido processo legal passou a ter um alcance substantivo (substantive due process), por via do qual o Judiciário passou a desempenhar determinados controles de mérito sobre o exercício da

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discricionariedade pelo Legislador e os fins visados, bem como na aferição da legitimidade dos fins.23

Da análise da jurisprudência pátria, verificamos que o Supremo Tribunal Federal, já há algum tempo, tem aplicado, em diversos casos, o princípio do devido processo legal em seu sentido substantivo, inclusive em face do Poder Legislativo. A título de exemplo, citamos o seguinte acórdão:

A norma legal, que concede a servidor inativo gratificação de férias correspondente a um terço (1/3) do valor da remuneração mensal, ofende o critério da razoabilidade que atua, enquanto projeção concretizadora da cláusula do substantive due process of law, como insuperável limitação ao poder normativo do Estado. Incide o legislador comum em desvio ético-jurídico, quando concede a agentes estatais determinada vantagem pecuniária cuja razão de ser se revela absolutamente destituída de causa.24

Como soa evidente, também incide o princípio do devido processo legal substantivo sobre os atos emanados do Poder Executivo, o que se verifica, com mais frequência, em relação àquelas condutas praticadas pelos agentes públicos (ou a ele equiparados) no exercício do poder de polícia. Nessas hipóteses, compete ao Poder Judiciário examinar, sob a ótica da cláusula em comento, se esta teria sido ou não observada no caso concreto.

Sobre o tema, já assentou o Supremo Tribunal Federal:

Sanções políticas no direito tributário. Inadmissibilidade da utilização, pelo poder público, de meios gravosos e indiretos de coerção estatal destinados a compelir o contribuinte inadimplente a pagar o tributo (Súmulas 7025, 32326 e

54727 do STF). Restrições estatais, que, fundadas em exigências que

transgridem os postulados da razoabilidade e da proporcionalidade em sentido estrito, culminam por inviabilizar, sem justo fundamento, o exercício, pelo sujeito passivo da obrigação tributária, de atividade econômica ou profissional lícita. Limitações arbitrárias que não podem ser impostas pelo estado ao contribuinte em débito, sob pena de ofensa ao

substantive due process of Law.28

De se notar que essa faceta do devido processo legal tem realçado o papel conferido ao Poder Judiciário nessa seara, como registra Carlos Roberto Siqueira Castro:

23Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 256.

24 STF, ADI 1.158-MC, rel. Min. Celso de Mello, DJ 26/05/95.

25 Súmula 70, STF: É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo.

26 Súmula 323, STF: É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos.

27 Súmula 547, STF: Ao contribuinte em débito, não é lícito à autoridade proibir que adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais.

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o abandono da visão estritamente processualista da cogitada garantia constitucional (procedural due process) e o início da fase substantiva na evolução desse instituto (substantive due process) retrata a entrada em cena do Poder Judiciário como árbitro autorizado e conclusivo da legalidade e do próprio mérito axiológico das relações do governo com a sociedade civil. Com isso, os Juízes assumiram o papel de protagonistas no seio das instituições governativas, deixando de ser meros coadjuvantes das ações do Executivo e do Legislativo. A dialética do poder e as metafísicas questões do direito público passaram a contar, no plano institucional, com a autoridade dotada de prerrogativa decisória (‗do final enforcing power‟) e revestida das credenciais de intérprete derradeiro do sentido e alcance da Constituição: os órgãos da Justiça29

Diante do acima exposto, resta claro que o princípio do devido processual legal, em seu duplo aspecto (processual e substantivo), detém incomensurável importância para a preservação dos direitos fundamentais dos indivíduos, incidindo tanto nos processos judiciais, como administrativos, conforme veremos a seguir.

4. O devido processo legal nos processos administrativos

O artigo 5º, inciso LV da Constituição brasileira assegura aos litigantes e acusados em geral, em processo judicial ou administrativo, o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Em relação aos servidores públicos estáveis, o texto constitucional também assegura tais direitos no artigo 41, § 1º, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 19/98, prevendo que estes somente perderão o cargo em virtude de sentença judicial transitada em julgado (inciso I), mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa (inciso II) ou mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa (inciso III).

Se isso não bastasse, a Lei 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, estabelece em seu artigo 2º que a Administração Pública obedecerá, entre outros, os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Desta feita, o direito ao contraditório e à ampla defesa, enquanto consectários do princípio do devido processo legal, aplicam-se aos processos administrativos em geral, o que

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tem sido reafirmado pelo Supremo Tribunal Federal, especialmente naquelas hipóteses relativas a punições disciplinares ou mesmo a restrições de direito em geral.30

Assim, embora o devido processo legal assuma grande importância nos processos administrativos disciplinares objeto do presente estudo, dado que envolve a aplicação de sanções disciplinares, a eles não se restringem, também se fazendo incidir nos processos administrativos em geral. Paradigmático, nesse sentido, o voto do Ministro Marco Aurélio no Recurso Extraordinário 199.733 (DJ 30/04/1999), ao consignar:

[...] o vocábulo litigante há de ser compreendido em sentido lato, ou seja, a envolver interesses contrapostos. Destarte, não tem sentido processual de parte, a pressupor uma demanda, uma lide, um conflito de interesses constante de processo judicial. Este enfoque decorre da circunstância de o princípio estar ligado, também, aos processos administrativos. A presunção de legitimidade dos atos administrativos milita não só em favor da pessoa jurídica de direito privado, como também do cidadão que se mostre, de alguma forma, por ele alcançado. Logo, o desfazimento, ainda que sob o ângulo da anulação, deve ocorrer cumprindo-se, de maneira irrestrita, o que se entende como devido processo legal (lato sensu), a que o inciso LV do artigo 5º objetiva preservar. O contraditório e a ampla defesa, assegurados constitucionalmente, não estão restritos apenas àqueles processos de natureza administrativa que se mostrem próprios ao campo disciplinar. O dispositivo constitucional não contempla especificidade [...]

No campo do processo administrativo e tratando do aspecto processual do devido processo legal, vale transcrever, nesse ponto, as lições de Agustín Gordillo:

Sob o ponto de vista adjetivo, o devido process legal se refere ao direito de ser ouvido; em matéria de decisões individuais, trata-se de ma série de requisitos amplamente divulgados, porém nem sempre cumpridos.

É juridicamente necessário poder conhecer as atuações que se referem ao de vista e cópia de um processo, fazer-se assistir ou representar por advogado, oferecer e produzir a prova, fazer alegações sobre ela, apresentar manifestações, etc.

Tudo isso, como questão fundamental, deve poder ser feito antes da decisão que versará sobre os direitos ou interesses que afetam ouo podem afetar a pessoa de que se trata, para que a sua eficácia não se veja diminuída.31

30 Como exemplo, citamos o seguinte trecho do voto exarado pelo Ministro Marco Aurélio no Recurso Extraordinário 158.543, T 2, j. 30/08/1994, DJ 6/10/1995: tratando-se da anulação de ato administrativo cuja formalização haja repercutido no campo de interesses individuais, a anulação não prescinde da observância do contraditório, ou seja, da instauração de processo administrativo que enseja a audição daqueles que terão modificada situação já alcançada.

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Além dessas garantias decorrentes do devido processo legal sob o aspecto processual, o mesmo jurista acrescenta o direito a uma decisão suficientemente motivada, bem como o direito de recorrer a uma instância imparcial e independente (um órgão judicial), com vistas a obter uma revisão suficiente e adequada dos fatos levados em conta pela Administração Pública e do direito aplicável, o que não impediria, segundo o autor, a existência de meios alternativos de solução de conflitos, tais como tribunais administrativos, mediação e arbitragem.32

Em se tratando do princípio do devido processo legal substantivo no Direito Administrativo, compreendido, segundo Agustín Gordillo, como a garantia de razoabilidade dos atos estatais e privados praticados no exercício das funções administrativas públicas, afirma o jurista argentino que, de um modo geral, ele foi inicialmente aplicado às leis, depois às sentenças judiciais e, finalmente, aos regulamentos e atos administrativos. De acordo com suas palavras:

Se transcendente é o lado adjetivo do devido processo (garantia de defesa), tanto mais ainda é o substantivo, como garantía de razoabilidade dos atos estatais e privados praticados no exercício de funções administrativas públicas. No campo de aplicação do principio da razoabilidade em alguns países foi primeiro as leis – no controle de constitucionalidade que todos os juízes realizam, naqueles sistemas concebidos, como o nosso, à semelhança do norteamericano – e daí passou a ser também as sentenças judiciais – toda a construção jurisprudencial sobre a ‗sentença arbitrária‘ -, para chegar, por fim, aos regulamentos e ao ato administrativo. Esta é pelo menos a ordem histórica – já que não a lógica - que o desenvolvimento e aplicação do principio da razoabilidade têm ocorrido no direito argentino.33

Portanto, o princípio do devido processo legal, em sua dupla acepção, deve ser obedecido e resguardado em todo e qualquer processo administrativo, especialmente naqueles

para que su eficacia no se vea disminuida.‖31 (Tratado de derecho administrativo. 7. ed. Belo Horizonte: Del Rey; Fundación de Derecho Administrativo, 2003, p. VI - 32. T.1)

32Tratado de derecho administrativo. 7. ed. Belo Horizonte: Del Rey; Fundación de Derecho Administrativo, 2003, p. VI - 32. T.1.

33 Si trascendente es el lado adjetivo del debido proceso (garantía de defensa), tanto o más aun lo es sustantivo, como garantía de razonabilidad de los actos estatales y privados dictados en ejercicio de funciones administrativas públicas. El campo de aplicación del princípio de razonabilidad en algunos países fue primero

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III O PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR

1. Conceito

O processo administrativo disciplinar pode é definido pelo artigo da Lei 8112/90 como

o instrumento destinado a apurar responsabilidade de servidor por infração praticada no exercício de suas atribuições, ou que tenha relação com as atribuições do cargo em que se encontre investido”.34

Alguns doutrinadores o designam inquérito administrativo. Trata-se, contudo, de denominação imprópria, uma vez que o processo administrativo disciplinar não possui qualquer característica de procedimento inquisitorial; ao contrário, a ampla defesa e o contraditório são de observância obrigatória, conforme preconiza a Constituição Federal.35

O processo administrativo disciplinar tem a sua raiz constitucional nos artigos 5º, inciso LV e 41, parágrafo 1º, da Lei Maior. No plano infraconstitucional e na esfera federal é a Lei 8112/90 que o regula, com aplicação subsidiária da Lei 9784/99.

Diante da autonomia de cada ente da federação para tratar de matéria atinente aos seus servidores e também do que preconiza o art. 24, inciso XI, da Constituição Federal, é certo que Estados e Municípios podem elaborar normas próprias de processo disciplinar.

Com efeito, como vimos acima, o objeto do processo administrativo disciplinar é apuração de infração funcional praticada por servidor, sujeita a um regime diferenciado, que

34 Fabio Medina Osório denomina infrações morais aqueles tipos descritos nos estatutos disciplinares e que sancionam condutas privadas sob a justificativa de proteção do setor público, como é o caso do dever imposto ao servidor no artigo 116, inciso IX, da Lei 8112/90 ‗manter conduta compatível com a moralidade administrativa. Conclui o autor que: “outorgar ao princípio jurídico da moralidade administrativa ou aos

tipos sancionadores de condutas eticamente reprováveis um sentido tão amplo ao ponto de abarcar todo e qualquer ato imoral dos agentes públicos, com a devida vênia de entendimento diverso, equivaleria a liquidar com o Estado Democrático de Direito e seu pilar de legalidade. Se o administrador ou agente publico somente pode agir fundado em lei, a mera inobservância de um preceito moral não poderia acarretar-lhe sanções. Anote-se, nesse terreno movediço, que o próprio administrado ficaria exposto a ações administrativas amparadas na moralidade e não na juridicidade, se acaso resultasse admitida a confusão progressiva entre as

instâncias ”. (Direito administrativo sancionador. 3. ed., rev., atual e ampl. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2009, p. 236).

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possui suas peculiaridades,36 como é o caso do abrandamento da tipicidade.37 A infração é conceituada por Heraldo Garcia Vitta como:

o descumprimento de dever (conduta contrária ao comando da norma) pelo destinatário da norma jurídica, cuja sanção possa ser imposta por autoridade administrativa (no exercício da função administrativa), em virtude de o ordenamento jurídico conferir-lhe tal competência. 38

Constitui objeto do processo administrativo disciplinar a apuração das infrações praticadas pelos servidores públicos e também a aplicação das correspondentes sanções a elas cominadas. É certo, contudo, que nem sempre há aplicação da pena, podendo o processo culminar com a dispensa de aplicação da penalidade.

Trata-se de conquista alcançada pelo Estado de Direito, de observância obrigatória pela Administração Pública39-40-41-42-43 e que visa a reduzir o arbítrio da autoridade administrativa na imposição de sanções, determinando a tramitação de um rito previsto em lei, com o respeito a todas as garantias do servidor acusado, que não poderá ser surpreendido pela instituição casuística de regras pela Administração, voltadas a prejudicar o exercício do seu direito de defesa.

Além de garantia conferida ao agente público, o processo administrativo disciplinar é também instrumento de controle da sua atuação e tem por escopo garantir maior grau de independência e imparcialidade na atuação do servidor, que tem a certeza de não poder ser

36 Segundo Fábio Medina Osório o sistema de punições disciplinares possui suas próprias peculiaridades, apesar de ser inegável que subsiste m regime de princípios gerais do Direito Administrativo Sancionador aplicável também às sanções disciplinares (Osório, Fábio Medina. Direito Administrativo Sancionador. 3ª ed. ver atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 226)

37 VITTA, Heraldo Garcia. A sanção no direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 35. 38VITTA, Heraldo Garcia. A sanção no direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 35.

39 O artigo 41, § 1º, I, da Constituição Federal, com a redação conferida pela EC 19/98 preceitua que: § 1º O servidor público estável só perderá o cargo: I - em virtude de sentença judicial transitada em julgado; II - mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa. Portanto, a Carta Constitucional é expressa ao impor a observância de processo administrativo disciplinar com observância da ampla defesa ou sentença judicial transitada em julgado, quando se trata de imposição de pena de demissão a servidor estável. 40 Sobre o tema é importante transcrever trecho da decisão do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual “é

nula a sanção que não foi precedida de regular procedimento administrativo disciplinar” (Tribunal, RO 7449/MA , T.6, Rel. Min. Anselmo Santiago, DJU 30/03/1998).

41 Preceitua a Súmula nº 20 do STF que: “è necessário processo administrativo, com ampla defesa, para demissão de funcionário admitido por concurso”.

42 Leciona Celso Antonio Bandeira de Mello ser obrigatória a instauração de processo administrativo (ou procedimento, como enuncia) “quando a providência administrativa a ser tomada disser respeito a matéria

que envolva litígio, controvérsia sobre direito do administrado ou implique imposição de sanções

(BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 27. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, p. 511).

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apenado sem a sua observância, na tentativa de evitar perseguições pessoais ou políticas com a imposição de sanções arbitrárias e ao exclusivo critério do superior hierárquico.44

A título de exemplo, citamos o caso do agente público que exerce poderes de fiscalização, do procurador que emite parecer jurídico e até mesmo do servidor que participa de comissão processante. É certo que, em muitas situações, a atividade desses indivíduos interfere em interesses de terceiros, os quais, uma vez sentindo-se prejudicados, poderiam iniciar verdadeira perseguição contra o agente público. O processo administrativo disciplinar tem por escopo, justamente, evitar situações como esta, garantindo que o servidor atue de forma independente e imparcial, sempre na busca do interesse público.

É importante mencionar que, se por um lado, o ordenamento evita a perseguição do servidor pelo superior hierárquico, garantindo a observância do processo administrativo disciplinar, por outro preconiza a obrigatoriedade da sua abertura, caso se verifique a ocorrência da infração. O superior, portanto, tem o dever-poder de apurar as irregularidades praticadas pelos seus agentes, apurando as faltas, fixando a responsabilidade e, sendo o caso, aplicando e executando a sanção.

Nesse sentido, ensina Celso Antônio Bandeira de Mello: ―uma vez identificada a ocorrência de infração administrativa, a autoridade não pode deixar de aplicar a sanção. Com efeito, há um dever de sancionar, e não uma possibilidade discricionária de praticar ou não tal ato‖.45-46

Referida obrigatoriedade também está consignada na Lei 8112/90, que determina, no seu artigo 143:―A autoridade que tiver ciência de irregularidade no serviço público é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante sindicância ou processo administrativo disciplinar, assegurada ao acusado ampla defesa”.

Salientamos que não foi sem razão que adotamos o termo processo e não procedimento ao tratar do tema em estudo, pois os termos designam fenômenos distintos,47-48 a par de já terem sido usados como sinônimos pela doutrina.

45 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 27. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 526.

46 Celso Antônio Bandeira de Mello, tratando do tema em outra ocasião, também observou que:“ A responsabilização dos servidores públicos é dever genérico da Administração e específico de todo chefe, em relação a seus subordinados [...] Assim, cabe concluir que uma vez reconhecida competente que servidor público incorreu em comportamento infracional é obrigatória a aplicação da correspondente sanção” (Discricionariedade, vinculação e sanção aplicável a servidor público. Revista Trimestral de Direito Público, São Paulo, n. 40, p. 182 -185, 2002).

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Com efeito, o processo constitui a sequência concatenada de atos administrativos interligados entre si e tendentes a um ato final a ser exarado pela Administração. Trata-se, pois, de ―atividade contínua, não instantânea, em que os atos e operações se colocam em ordenada sucessão, com a proposta de chegar-se a um fim predeterminado”.49

O procedimento, por sua vez, consiste na forma pela qual esses atos devem ser produzidos, no rito que deve ser observado dentro do processo. Sobre essa distinção, leciona Fabio Medina Osório:

A preferência pelo termo processo não é inútil nem gratuita. Ao contrário, a processualidade das relações punitivas, estejam elas no campo administrativista, estejam no campo penal, é uma das características marcantes do Estado Democrático de Direito. [...] Dentro das relações processuais há procedimentos, ritos e formas ordenadas que conduzem à pretensão punitiva do Estado. 50

Segundo Hector Escola,51 a melhor diferenciação dos conceitos é aquela que leva em conta o conteúdo teleológico do processo, na medida em que o processo tem como característica essencial a busca por um ato final e conclusivo, enquanto o procedimento, despido dessa finalidade, cinge-se à exteriorização das formalidades do processo.

Lucia Valle Figueiredo conceitua o processo em sentido estrito como aquele em que a

litigiosidade ou as ―acusações‖ se encontrarem presentes, obrigando-se à observância do

consistentes em estudos, pareceres, informações, laudos, audiências, enfim, tudo o que for necessário para instruir, preparar e fundamentar o ato final objetivado pela Administração.

O procedimento é o conjunto de formalidades que devem ser observadas para a prática de certos atos administrativos; equivale a rito, a forma de proceder; o procedimento se desenvolve dentro de um processo

administrativo”. (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Dieito Administrativo, 24ª ed, São Paulo: Atlas Editora, 2010, p. 628)

48 Ao tratar dos conceitos de procedimento e processo administrativo, Daniel Muller Martins identifica cinco posições doutrinarias e afirma que se tratam de conceitos distintos, sendo o procedimento uma “sucessão

legalmente condicionada de atos administrativos relativamente autônomos encadeados mediante relação de causalidade e instrumentalmente ordenados à concretização da função administrativa”. Quanto ao processo,

afirma que a sua análise não pode se limitar à doutrina do Direito Administrativo, devendo se estender ao Direito Processual chegando à conclusão que “o processo administrativo é uma instituição jurídica de perfil próprio e deve ser compreendido como conduto jurídico da relação jurídica administrativa mediante a sucessão legalmente condicionada de atos e fatos administrativos relativamente autônomos, encadeados mediante rel.ação de causalidade e instrumentalidade ordenados à concretização participativa da função

administrativa” (Aspectos jurídico-temporais do processo administrativo: uma leitura à luza da garantia constitucional à duração razoável, São Paulo, 2007, p. 73-75)

49 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24. ed. rev. ampl. e atual.Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2010, p. 128.

50 OSÓRIO, Fàbio Medina. Direito administrativo sancionador. 2. ed, rev atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 384.

51Nas palavras do autor: ―Proceso y procedimiento son, em efecto, conceptos juridicos diferentes y que, por tanto, deben ser distinguidos. [...] indubitabelmente, el modo más exacto de diferenciar los conceptos de proceso y procedimiento, es aquél que hace fincar la distinción en la circunstancia de que la idea de proceso esta caracterizada por consistir en una valorización de tipo teleológico, mientras la de procedimiento es

exclusivamente una idea de tipo forma” (Escola, Hector. Tratado General de Procedimiento Administrativo.

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contraditório e da ampla defesa. Para a autora o processo em sentido amplo abarca o procedimento, seja enquanto simples forma de atuação da Administração ou como sequência de atos ordenada à emanação de um ato final, e também o processo em sentido estrito, já definido acima.52

A despeito de, em sua obra, utilizar os termos como se fossem sinônimos, Celso Antonio Bandeira de Mello ressalva:

se fôramos nos prender ao que acreditamos melhor se afine à sua

terminologia técnica, atribuiríamos o nome ‗processo‘ ao fenômeno sub examine, reservando o rótulo ‗procedimento‘ para designar a modalidade

ritual especifica que cada qual possa particularizadamente apresentar.53

No âmbito federal, o processo administrativo disciplinar é conduzido por comissão processante composta por três servidores estáveis designados pela autoridade competente,54-55 a qual indicará, dentre eles, o presidente da comissão, que necessariamente devera ocupar cargo efetivo de mesmo nível ou de nível superior ao do servidor indiciado.

O artigo 149, parágrafo 2º, da Lei 8112/90 prevê hipótese de impedimento para participar da comissão processante ao determinar que o cônjuge, companheiro ou parente do acusado, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral até o terceiro grau, não poderão ser parte da comissão, que deverá exercer suas atividades com independência e imparcialidade. O tema será abordado de forma minuciosa no capítulo IV deste trabalho, quando trataremos do princípio do juiz natural.

O processo disciplinar desenvolve-se em três fases, a instauração, o inquérito e o julgamento e a sua conclusão deverá dar-se no prazo de sessenta dias, admitida a prorrogação, desde que justificada. As peculiaridades de cada uma das fases do processo disciplinar serão estudadas mais a frente neste capítulo, sendo que os pontos controvertidos provenientes da aplicação do devido processo legal serão estudados no Capitulo III, que abordará as fases do processo disciplinar levando em conta a aplicação dos princípios que consideramos concretizadores do devido processo legal.

52 FIGUEIREDO, Lucia Valle. Curso de direito administrativo. 9. ed. rev. ampl. e atual.. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 437

53BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 28. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros: 2010, p. 829.

54 Artigo 149 da Lei 8112/90.

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1.2 Princípios Fundamentais

Como acentua a doutrina, os princípios fundamentais do processo administrativo disciplinar são, substancialmente, os mesmos dos processos administrativos em geral, em que pesem os campos distintos de atuação de cada um deles, ao que já nos referimos no início deste trabalho.

Assim, temos como princípios fundamentais do processo administrativo disciplinar os seguintes: a) princípio da legalidade objetiva; b) princípio da oficialidade; c) princípio do informalismo; d) princípio da publicidade; e) princípio da verdade material; e f) princípio do devido processo legal. A seguir, passamos a tratar de cada um deles de modo específico, salientando que o devido processo legal será objeto de estudo mais aprofundado, nos capítulos que seguem.

1.2.1 Legalidade objetiva

Segundo o Ilustre Professor Hely Lopes Meirelles, o princípio da legalidade objetiva

exige que o processo administrativo seja instaurado com base e para preservação da lei. Daí sustentar Giannini que o processo, como o recurso administrativo, ao mesmo tempo em que ampara o particular, serve também ao interesse público na defesa da norma jurídica objetiva, visando a manter império da legalidade e da justiça no funcionamento da Administração.56

Em outras palavras, o princípio em comento exige que o processo administrativo disciplinar seja fundado numa norma legal específica, sob pena de invalidade. Verifica-se a previsão desse princípio, por exemplo, no artigo 2º, parágrafo único, incisos I e II da Lei 9.784/99 – Lei Federal de Processos Administrativos ( previsão de atuação conforme a lei e o Direito e de atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei).

Importante lembrar que, embora a União possua competência privativa para legislar sobre Direito Processual (artigo 22, inciso I, da CF), a competência legislativa para tratar do processo administrativo é concorrente da União, Estados e Municípios, podendo

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todos os entes da federação editar norma específica sobre a matéria (artigo 24, inciso XI, da CF).

1.2.2 Oficialidade

De acordo com esse princípio (também chamado por alguns doutrinadores como princípio da impulsão), a movimentação do processo administrativo disciplinar compete à Administração Pública, seja nos casos em que aquele é instaurado de ofício (por evidente), seja naqueles em que o seu início dá-se por provocação da parte.

Assim, se, por hipótese, houver algum retardamento indevido no transcurso do processo administrativo disciplinar, os agentes públicos responsáveis pelo seu impulsionamento deverão ser responsabilizados pela ação ou omissão que o resultou, sobretudo diante do recente mandamento constitucional quanto à razoável duração do processo enquanto direito fundamental (art. 5º, inciso LXXVIII da Constituição Federal).

1.2.3 Informalismo

A seu turno, o princípio do informalismo consiste na dispensa de ritos rigorosos e formas solenes para o processo administrativo disciplinar, sendo suficientes as formalidades que assegurem a certeza jurídica, a garantia e a credibilidade do processo.

É importante lembrar que informalismo não significa total ausência de forma. O processo administrativo disciplinar é formal, no sentido de que deve ser documentado, reduzido a escrito; no entanto é informal no sentido de que não está adstrito a normas rígidas, como é o caso do processo penal.

Como lembra a Professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro, só será exigida alguma formalidade específica se a lei a previr, caso em que o seu atendimento será de rigor, sob pena de nulidade.57 A autora salienta também que a maior necessidade de formalidade aparece nos casos em que o processo envolve interesses particulares, como nos processos de licitação,

(33)

disciplinares e tributários. É por isso que grande parte dos entes federativos possui lei que rege os processos disciplinares, a fim de que sejam respeitadas as garantias de ampla defesa e contraditório do servidor.

Interessante notar o ensinamento da Ilustre Professora Lúcia Valle Figueiredo, no sentido de que este preceito somente possui validade a favor do administrado (no caso do processo disciplinar, do acusado) e desde que não se esteja a tratar de processos que envolvam terceiros, como os concorrenciais.58

Tal afirmação justifica-se pelo fato de que a informalidade contra o acusado poderia importar violação ao seu direito à ampla defesa e contraditório e, em última instância, ao devido processo legal. Do mesmo modo, o princípio da informalidade não se aplica aos processos concorrenciais, posto que poderia ensejar o benefício unilateral de uma das partes em detrimento da outra.59

Não se pode confundir informalidade com ―desleixo‖, de modo a não comprometer a

mínima ordenação necessária e desejável a todo e qualquer processo administrativo disciplinar.

1.2.4 Publicidade

Nos termos do artigo 5º, incisos XXXIII e LX da Constituição, deve-se, via de regra, conferir ampla publicidade aos processos administrativos disciplinares, sendo o sigilo medida excepcional, somente admitida por razões de segurança da sociedade e do Estado, bem como na defesa da intimidade ou do interesse social.

Segundo alguns doutrinadores, aliás, a publicidade decorre do preceito do devido processo legal (na sua acepção formal, como veremos adiante), uma vez que, sem a garantia de um processo público, não é possível conferir ao acusado uma ampla possibilidade de defesa dos fatos que lhe são imputados, de forma a não ser possível também assegurar a justiça da pena eventualmente imposta.

58 FIGUEIREDO, Lucia Valle. Curso de direito administrativo. 9. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, 2008.p. 451.

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1.2.5 Verdade Material

De acordo com o princípio da verdade material, deve a Administração Pública utilizar-se de todos os meios de prova lícitos e legítimos de que tenha conhecimento, a fim de apurar as faltas cometidas pelos agentes públicos e embasar eventual aplicação de pena cabível no caso concreto.

Não bastaria, assim, a mera verdade formal, com a qual o processo civil normalmente se contenta. Nesse sentido, percebe-se a estreita relação entre o processo disciplinar e o processo penal, posto que ambos importam na aplicação de sanção ao cidadão.60

2. Direitos e deveres dos servidores

O Título III da Lei 8.112/90, que compreende os artigos 40 a 115, trata dos direitos de titularidade dos servidores públicos federais, discorrendo sobre seus vencimentos, vantagens (indenizações, gratificações e adicionais), férias, licenças, afastamentos, concessões, tempo de serviço e direito de petição.

O artigo 116 da Lei 8.112/90, por sua vez, disciplina em seus incisos todos os deveres a serem cumpridos pelos servidores, sob pena de incorrer nas penalidades previstas no artigo 127 da mesma lei.

A respeito do dever consagrado no artigo 116, inciso VI da Lei 8.112/90 (Art. 116. São deveres do servidor: [...] VI – levar ao conhecimento da autoridade superior as irregularidades de que tiver ciência em razão do cargo), o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que este não confere ao servidor a possibilidade de instaurar sindicância ou processo administrativo disciplinar contra terceiros. Eis o acórdão:

RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. DIREITO Á INSTAURAÇÃO DE SINDICÂNCIA OU PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR CONTRA TERCEIROS. INEXISTÊNCIA.

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