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A exigência do imposto sobre a doação de bens e direitos (ITCD) no caso do doador ser residente ou domiciliado no exterior

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(1)

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU MESTRADO EM DIREITO INTERNACIONAL E ECONÔMICO

JAMES ALBERTO VITORINO DE SOUSA

A EXIGÊNCIA DO IMPOSTO SOBRE A DOAÇÃO DE BENS E DIREITOS (ITCD) NO CASO DO DOADOR SER RESIDENTE OU DOMICILIADO NO EXTERIOR

Brasília

2010

Stricto Sensu em Direito Internacional Econômico

A EXIGÊNCIA DO IMPOSTO SOBRE A DOAÇÃO DE BENS E

DIREITOS (ITCD) NO CASO DO DOADOR SER RESIDENTE OU

DOMICILIADO NO EXTERIOR

Brasília - DF

2010

Autor: James Alberto Vitorino de Sousa

(2)

A EXIGÊNCIA DO IMPOSTO SOBRE A DOAÇÃO DE BENS E DIREITOS (ITCD) NO CASO DO DOADOR SER RESIDENTE OU DOMICILIADO NO EXTERIOR

Projeto de dissertação apresentado ao programa de Pós-graduação “Stricto Sensu” em Direito na Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do Título de Mestre em Direito Internacional Econômico.

Orientador: Prof. Dr. Marcos Aurélio Pereira Valadão

Brasília

(3)

Ficha elaborada pela Biblioteca Pós-Graduação da UCB

30/08/2010

S725e Sousa, James Alberto Vitorino de

A exigência do imposto sobre a doação de bens e direitos (ITCD) no caso do doador ser residente ou domiciliado no exterior. / James Alberto Vitorino de Sousa. – 2010.

245f.; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2010. Orientação: Marcos Aurélio Pereira Valadão

1. Federalismo. 2. Tributação. 3. Imposto de herança e transmissão. I. Valadão, Marcos Aurélio Pereira Valadão, orient. II. Título.

(4)

Dedico esta dissertação à minha esposa Eva e

a meus filhos Igor, Viviane e Giovanna, de

quem subtraí reclamadas horas de minha

presença, que foram destinadas a escrever o

presente trabalho, e, também, ao meu filho

James Almeida, minha nora Luciana, e a meu

neto Eric, que, à distância, torceram pelo meu

(5)

Dedico esta dissertação à minha esposa Eva e

a meus filhos Igor, Viviane e Giovanna, de

quem subtraí reclamadas horas de minha

presença, que foram destinadas a escrever o

presente trabalho, e, também, ao meu filho

James Almeida, minha nora Luciana, e a meu

neto Eric, que, à distância, torceram pelo meu

(6)

Externo ao Professor Marcos Aurélio Pereira Valadão, meu orientador, meu reconhecimento e eterna gratidão pelos conselhos, palavras de incentivos, conhecimentos transmitidos, e pela paciência na condução desse estudo.

Reverencio aos meus Mestres da Universidade Católica de Brasília o meu profundo respeito e admiração, cujas lições enriqueceram este trabalho.

(7)
(8)

A presente dissertação objetiva demonstrar a constitucionalidade da exigência por Estados e Distrito Federal do imposto sobre a doação de bens e direitos – ITCD-doação - no caso do doador ser residente ou domiciliado no exterior, em virtude da maioria desses Entes federativos terem legislado sobre tal tributo mesmo diante da inexistência de lei complementar nacional exigida nos artigos 146 e 155, § 1º, III da Constituição Federal. Verificar-se-á os princípios e características essenciais inerentes ao federalismo e ao Estado Federal brasileiro com foco na descentralização do poder, pluralidade de ordens jurídicas, autonomia das entidades central e periféricas, e repartição de competências legislativas estatuídas no sistema tributário constitucional brasileiro, deferindo-se especial registro aos institutos da lei complementar nacional, ato normativo que, dentre outras importantes funções, visa manter a unidade normativa tributária em todo o território nacional. Será destacado o embasamento teórico existentes nos institutos do contrato de doação previstos no Código Civil brasileiro e nas normas das vinte sete leis do ITCD-doação editadas pelos Estados-membros. Dedicar-se-á estudo sobre a necessidade de celebração de tratado internacional com o escopo de evitar a bitributação do tributo em foco. Concluir-se-á que, com exceção de alguns dispositivos legais constantes da legislação de alguns Estados-membros, passíveis de ocasionar conflitos de competência entre as Unidades federativas brasileiras, são constitucionais as demais normas dos Estados e do Distrito Federal que instituem o ITCD-doação.

(9)

This dissertation aims to demonstrate the constitutionality of States and Federal District to create a tax on the donation of property and other rights – Gift Tax - where the donor is resident or domiciled abroad. Federal Entities have approved this type legislation despite the absence of complementary national law as required in Articles 146 and 155, § 1, III of the Federal Constitution. This work addresses the principles and essential characteristics inherent to Brazilian federalism with focus on power decentralization, the existence of a plurality of legal systems, autonomy of central and peripheral entities, and the distribution of legislative powers provided in the Brazilian constitutional tax system, giving special attention to complementary national law, a type of law which aims to keep tax laws uniform across the country, and to prevent tax conflicts between the States, among other important functions.. The dissertation highlights the theoretical basis of the existing institutes in the donation agreement provided for in the Brazilian Civil Code and the rules of the twenty-seven laws of Gift Tax edited by Member States. It also verifies the necessity of an international treaty with the scope of the tax avoidance and double taxation in Gift Taxes. It comes to the conclusion that, except for some legal provisions contained in the legislation of some Member States, which may raise conflicts between State tax jurisdictions, State laws and those issued by Federal District establishing a Gift Tax are constitutional.

(10)

ADCT: Atos das Disposições Constitucionais Transitórias

ADI: Ação Direta de Inconstitucionalidade

AI: Agravo de Instrumento

AIR: Adicional do Imposto de Renda

CADH: Convenção Americana de Direitos Humanos

CC: Código Civil

CF: Constituição Federal

CIJ: Corte Internacional de Justiça

CONFAZ: Conselho Nacional de Política Fazendária

CTN: Código Tributário Nacional

CVDT: Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados

DI: Direito Internacional

DJ: Diário da Justiça

EC: Emenda Constitucional

H.i: Hipótese de Incidência

ICMS: Imposto incidente sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação

ITCD: Imposto incidente sobre a transmissão causa mortis e doações de quaisquer bens ou direitos

LC: Lei complementar

MERCOSUL: Mercado Comum do Sul

OCDE: Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico

ONU: Organização das Nações Unidas

(11)

RESP: Recurso Especial

STF: Supremo Tribunal Federal

(12)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...15

1 O ESTADO FEDERAL...22

1.1SOCIEDADE – PACTO SOCIAL...22

1.2 O ESTADO...23

1.2.1 Conceito...23

1.2.2 Pressupostos básicos de existência ...25

1.2.3 Formas de Estado...27

1.3 O FEDERALISMO...29

1.3.1 Breve histórico ...29

1.3.2 Conceito e características ...32

1.3.3 Federação e confederação – distinções ...34

1.4 FEDERALISMO E DESCENTRALIZAÇÃO DO PODER...39

1.5 O FEDERALISMO BRASILEIRO ...41

1.6 O FEDERALISMO BRASILEIRO E AUTONOMIA DOS ESTADOS-MEMBROS ...44

1.6.1 O Distrito Federal na Federação brasileira...45

1.6.2 O Município na Federação brasileira ...46

1.7 REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DO ESTADO FEDERAL BRASILEIRO...48

1.7.1 Competência legislativa privativa ...52

1.7.2 Competência legislativa concorrente e suplementar...53

1.8 REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA ...55

1.8.1 Os tributos de competência das Unidades federativas ...57

1.8.1.1 Imposto ...58

1.8.1.2 Taxas ...60

1.8.1.3 Contribuição de melhoria ...60

1.8.1.4 Outras contribuições ...60

2 A LEI COMPLEMENTAR ...62

2.1 HISTÓRICO ...62

(13)

2.3 LEI COMPLEMENTAR E ORDINÁRIA – HIERARQUIA ...70

2.3.1 Análise ...76

2.4 TENSÃO ENTRE AS NORMAS DE LEIS COMPLEMENTARES NACIONAIS E LEIS DA COMPETÊNCIA SUPLEMENTAR ESTADUAL ...77

2.5 LEI FEDERAL E LEI NACIONAL ...80

2.6 LEI COMPLEMENTAR TRIBUTÁRIA ...83

2.6.1 Conflitos de competência...84

2.6.2 Limitações ao poder de tributar...86

2.6.3 Normas gerais de direito tributário ...88

2.6.3.1 Corrente tricotômica...90

2.6.3.2 Corrente dicotômica ...93

2.6.3.3 Posição do autor ...97

3 A DOAÇÃO...102

3.1 CONCEITO ...102

3.2 A DOAÇÃO NO DIREITO COMPARADO...103

3.3 CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS ...104

3.4 CAPACIDADE DAS PARTES ...107

3.4.1 Capacidade ativa ...107

3.4.1.1 Pessoas absoluta ou relativamente incapazes ...108

3.4.1.2 Cônjuges ...108

3.4.1.3 Mandatário ...109

3.4.1.4 Pessoa jurídica e falido ...109

3.4.1.5 Ascendentes e descendentes ...110

3.4.2 Capacidade passiva...111

3.5 A DOAÇÃO PURA ...111

3.6 INVALIDADE DO CONTRATO DE DOAÇÃO ...112

3.7 REVOGAÇÃO DA DOAÇÃO...113

3.7.1 Revogação da doação por ingratidão do donatário...114

3.7.1.1 Atentado contra a vida do doador ou cometimento crime de homicídio doloso ...115

3.7.1.2 Ofensa física ...116

3.7.1.3 Injuria grave ou calunia ...116

(14)

3.7.1.5 Revogação e o direito de terceiros...118

3.7.2 Revogação da doação por inexecução do encargo ...118

4 TRIBUTAÇÃO DA DOAÇÃO ...120

4.1 HISTÓRICO ...120

4.2 A TRIBUTAÇÃO DA DOAÇÃO NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 ...122

4.3 A TRIBUTAÇÃO DA DOAÇÃO NO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL ...123

4.4 TRIBUTAÇÃO DA DOAÇÃO POR ESTADOS E DISTRITO FEDERAL ...125

4.4.1 Aspectos da hipótese de incidência do ITCD-doação...126

4.4.1.1 Aspecto material da hipótese de incidência do ITCD-doação...127

4.4.1.1.1 O termo “transmissão”...128

4.4.1.1.2 O vocábulo “doação” ...129

4.4.1.1.3 Os vocábulos “quaisquer” e “bens” ...130

4.4.1.1.4 O vocábulo “direitos” ...132

4.4.1.2 Hipótese de incidência do ITCD-doação constante da legislação tributária ...133

4.4.1.3. O domicílio fiscal ...134

4.4.1.4 Aspecto pessoal da hipótese de incidência do ITCD-doação ...138

4.4.1.4.1 Sujeito ativo do ITCD-doação ...138

4.4.1.4.2 Sujeito Passivo do ITCD-doação ...141

4.4.1.5 Aspecto espacial da hipótese de incidência do ITCD-doação...145

4.4.1.5.1 Aspecto espacial da hipótese de incidência do ITCD-doação incidente sobre bens imóveis e direitos a eles relativos ...145

4.4.1.5.2 Aspecto espacial da hipótese de incidência do ITCD-doação incidente sobre bens móveis e quaisquer direitos – doador com domicílio no Brasil ou no exterior ...147

4.4.1.6 Aspecto temporal da hipótese de incidência do ITCD-doação...149

4.4.1.7 Aspecto quantitativo da hipótese de incidência do ITCD-doação ...150

4.4.1.7.1 Base de Cálculo ...151

4.4.1.7.2 Alíquota ...151

4.5 A TRIBUTAÇÃO DA DOAÇÃO SEM A EDIÇÃO DE LEI COMPLEMENTAR NACIONAL – COTEJO COM A HIPÓTESE DO PROBLEMA ...153

4.5.1 Entendimentos doutrinários...153

4.5.2 Entendimento do Supremo Tribunal Federal...158

4.5.3 Opinião do autor...164

(15)

4.5.3.2 Da Constitucionalidade dos dispositivos das Leis estaduais sobre o ITCD-doação de bens imóveis – doador domiciliado ou residente no Brasil ou no

exterior ...167

4.5.3.3 Da Constitucionalidade das Leis estaduais do ITCD-doação que incidem sobre bens móveis e quaisquer direitos – doador domiciliado ou residente no Brasil ...168

4.5.3.4 Da Constitucionalidade das Leis estaduais do ITCD-doação que incidem sobre de bens móveis e direitos – doador domiciliado ou residente no exterior .169 4.5.3.4.1 Da inconstitucionalidade de dispositivos das Leis do Estado do Mato Grosso e Estado de São Paulo ...170

5 TRATADOS INTERNACIONAIS E DUPLA TRIBUTAÇÃO DAS DOAÇÕES.175 5.1 CONCEITO ...176

5.2 CLASSIFICAÇÃO ...178

5.3 CELEBRAÇÃO...181

5.4 INCORPORAÇÃO DE UM TRATADO NO DIREITO INTERNO ...186

5.4.1 Incorporação de um tratado no direito interno brasileiro ...190

5.4.2 A hierarquia dos tratados internacionais em face do direito interno...195

5.4.2.1 A hierarquia dos tratados internacionais de direitos humanos...199

5.4.2.2 A hierarquia dos tratados internacionais de matéria tributária ...201

5.4.2.3 Conflito entre tratado e lei complementar...206

5.4.2.4 Conflito entre tratado e leis das Unidades Federativas...207

5.2 TRATADOS PARA EVITAR A DUPLA TRIBUTAÇÃO...209

5.2.1 Definição de dupla tributação...209

5.2.2 Caracterização da dupla tributação...211

5.2.3 Classificação da dupla tributação...214

5.2.4 Delimitação da competência tributária internacional ...216

5.2.5 Medidas unilaterais para evitar a dupla tributação ...221

5.2.6 Tratados para evitar a dupla tributação do ITCD-doação ...224

CONSIDERAÇÕES FINAIS...227

REFERÊNCIAS ...234

REFERÊNCIAS DA INTERNET...239

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL...241

(16)

ANEXOS...244

ANEXO I - RELAÇÃO DAS LEIS ESTADUAIS DO ITCD ...244

(17)

A presente dissertação possui como foco o estudo do imposto incidente sobre a doação de quaisquer bens e direitos no caso do doador ser residente ou domiciliado no exterior.

Objetiva-se concluir pela necessidade, ou não, de prévia edição de lei complementar nacional exigida pela Carta da República, tendo como contraponto outro dispositivo constitucional que estabelece a competência concorrente e suplementar dos Estados e Distrito Federal, permitindo a eles editarem suas leis quando ocorrer a omissão do legislador federal na aprovação de leis complementares de normas gerais.

Pretende-se também demonstrar a necessidade, ou não, de celebração de tratado internacional do Brasil com outros Estados visando a diminuir ou eliminar os efeitos da dupla tributação do imposto incidente sobre a transmissão de bens e quaisquer direitos.

Por pertinente temática serão também analisados outros aspectos da incidência do imposto sobre doação nos casos de potencial conflito federativo em decorrência da pluralidade de leis estaduais e do DF que disciplinam o tema.

O referido tributo, previsto no artigo 155, I, da Constituição Federal de 1988, denominado de “imposto incidente sobre a transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos”, encontra-se na competência dos Estados-membros e do Distrito Federal. No Distrito Federal ele é intitulado de ITCD, e é por essa sigla que doravante será designado.

O ITCD é também conhecido como imposto sobre herança e doações, consoante ensina Hugo de Brito Machado1, uma vez que incide sobre a transmissão

de quaisquer bens ou direitos a ele inerentes em virtude da morte, bem como por ato não-oneroso inter vivos, no caso, a doação.

De fato, nos termos do artigo 155, inciso I da Constituição, o ITCD possui ampla hipótese de incidência sobre a transmissão de quaisquer bens ou direitos havidos por sucessão decorrente da morte, ou havidos por doações, alcançando as transmissões nas quais os bens e os sujeitos envolvidos na relação jurídica –

1 Machado. Hugo de Brito. Curso De Direito Tributário

(18)

herdeiro, doador, donatário – estejam localizados, residentes ou domiciliados no território do Distrito Federal, em outra unidade da Federação ou, ainda, no exterior.

No entanto, na presente dissertação o tema será recortado de forma a ficar delimitado somente no que diz respeito à incidência do ITCD sobre a transmissão efetivada por ato inter vivos (doação), e, ainda, tão somente sobre a denominada doação pura.

A doação pura, consoante escólio de Orlando Gomes, é entendida como aquela que se faz por espírito de liberalidade, sem que esteja subordinada a qualquer acontecimento futuro e incerto, ou a cumprimento de encargo ou considerações de mérito, ou a reconhecimento de serviços prestados.2

E a razão principal do foco estar direcionado à essa espécie de transmissão é o fato dela se configurar como a mais simples e mais comum espécie de doação. Com efeito, a doação pura é a que contém o espírito pleno de liberalidade, o que quer dizer que ela não transfere qualquer encargo ou limitação ao direito do donatário e sequer existe motivo especial para sua determinação.

Desse modo, o presente trabalho não discorrerá sobre o ITCD incidente sobe a transmissão causa mortis e outras decorrentes do direito de sucessão, tais como atos de última vontade (testamento), cessões de direitos hereditários, e, também, sobre a denominada renúncia translativa, ou imprópria, que é aquela em que o herdeiro renuncia favorecendo determinada pessoa.3

Portanto, ao longo desta dissertação, no mais das vezes, tal tributo será designado simplesmente por ITCD-doação.

O estudo busca demonstrar, em última instância, a constitucionalidade das leis editadas por Estados-membros para a instituição do ITCD-doação em face da ausência de leis complementares previstas na Constituição Federal, ainda não aprovadas pelo Congresso Nacional.

Serão levadas em conta as regras de competências que possibilitam aos Estados e ao Distrito Federal exigir o ITCD-doação em seus territórios, normas que estão elencadas no § 1º do artigo 155, I, da Carta Maior, verbis:

155. (...)

2 GOMES. Orlando. Contratos

.Atualizada e notas de Humberto Theodoro Júnior. 15ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995. p. 215.

3 AMORIM. Sebastião; OLIVEIRA, Euclides. Inventários e Sucessões: Direito das Sucessões –

Teoria e Prática.16ª ed. rev. e atual. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 2003. p.

(19)

§ 1.º O imposto previsto no inciso I:

I - relativamente a bens imóveis e respectivos direitos, compete ao Estado da situação do bem, ou ao Distrito Federal;

II - relativamente a bens móveis, títulos e créditos, compete ao Estado onde se processar o inventário ou arrolamento, ou tiver domicílio o doador, ou ao Distrito Federal;

Ainda no artigo 155, a Constituição prevê a necessidade de lei complementar destinada a regular as situações relativas ao domicílio ou residência do de cujus ou doador, quando elas estiverem localizadas no exterior, a teor do inciso III, verbis:

155. (...)

§ 1.º O imposto previsto no inciso I: (...)

III - terá competência para sua instituição regulada por lei complementar: a) se o doador tiver domicilio ou residência no exterior;

b) se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário processado no exterior; (grifou-se)

Vale referir, ainda, ao § 3º do artigo 34 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT – segundo o qual “promulgada a Constituição, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão editar as leis necessárias à aplicação do sistema tributário nacional nela previsto”.

A dissertação será norteada pelas leis dos Estados e do Distrito Federal que, munidos de autorização constitucional, aprovaram tais atos normativos como condição necessária para a exigência do ITCD-doação incidentes sobre os fatos geradores ocorridos no âmbito de seus territórios.

Assim, a título de ilustração, o fez Minas Gerais, com a edição da Lei nº 14.941, de 29.12.2003;4 o Rio de Janeiro, por meio da Lei n.º 1.427, de 13.02.1989;5

o Rio Grande do Sul, por intermédio da Lei nº 8.821, de 27.02.1989;6 e São Paulo,

com a aprovação da Lei nº 10.705 de 28.12.2000.7 No Distrito Federal o

ITCD-doação foi instituído por meio da Lei Distrital nº 10, de 29.12.1988, e atualmente se encontra disciplinado na Lei Distrital nº 3.804, de 08.02.2006.8

Não obstante terem os Estados-membros aprovados atos normativos com vistas à exigência do ITCD-doação, a Carta de 1988 prevê no artigo 146 a edição de lei complementar para dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; para regular as

4Disponível em <http://www.fazenda.mg.gov.br/empresas/legislacao_tributaria/leis/l14941_2003.htm> Acesso em 08.03.2009.

5 Disponível em <http://alerjln1.alerj.rj.gov.br/contlei.nsf/PageLeisOrdinarias?OpenPage> Acesso em 08.03.2009.

6 Disponível em <http://www.legislacao.sefaz.rs.gov.br> Acesso em 08.03.2009. 7 Disponível em <http://info.fazenda.sp.gov.br> Acesso em 08.03.2009.

(20)

limitações constitucionais ao poder de tributar; e para estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, nos casos especificados no inciso III do desse dispositivo legal.

Além disso, o Texto Constitucional estabelece no artigo 155, § 1º, III, a aprovação de lei complementar específica quando o doador tiver domicilio ou residência no exterior.

No entanto, passados mais de vinte anos da promulgação da Carta de 1988, tanto a lei complementar prevista no artigo 155, § 1º, III, quanto a do artigo 146, ainda não foram editadas pelo legislador nacional.

De outro lado, o artigo 24 da Constituição estabelece a competência concorrente e suplementar de Estados e Distrito Federal, permitindo a estes Entes legislarem em virtude da omissão do legislador federal. Veja-se:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

I - direito tributário; (...)

§ 2º - A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.

§ 3º - Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.

Dessa forma, as referidas normas constitucionais e aquelas que embasam o direito internacional, especificamente no que se refere ao direito dos tratados, nortearão esse estudo com vistas à resolução do problema formulado e das hipóteses enunciadas.

Na lição de Manoel Macedo “o método científico inicia com um problema, ao qual se oferece uma solução provisória, uma teoria tentativa, passando-se depois a crítica, a solução, com vista à eliminação do erro e o surgimento de novos problemas (...).” Já a hipótese, na lição do Autor, tem por papel fundamental sugerir explicações para os fatos. Essas sugestões podem ser a solução para o problema. È a “declaração de como o pesquisador acha que o mundo é. É um enunciado conjectural entre duas ou mais variáveis”, arremata o Autor.”9

O problema da presente dissertação ficou consignado nas seguintes indagações:

(21)

I) é constitucional a exigência pelos Estados e Distrito Federal do imposto sobre a doação de bens e direitos, quando o doador residir ou ser domiciliado no exterior, ante a inexistência das leis complementares previstas no artigo 146 e artigo 155, § 1º, inciso III da Constituição?

II) é necessária a celebração de tratado internacional do Brasil com outros Estados visando a diminuir ou eliminar os efeitos da dupla tributação do ITCD-doação incidente sobre a transmissão de bens e quaisquer direitos?

Com o escopo de responder à questão do problema, levou-se em conta o princípio geral do direito de que as leis nascem com a presunção de constitucionalidade, assim como a base doutrinária, jurisprudencial e o conjunto normativo levantado no referencial teórico. Assim, enunciou-se as seguintes hipóteses, como verdade provisória do problema:

I) é constitucional a exigência pelos Estados e Distrito Federal do imposto sobre doação de bens e direitos no caso do doador ser residente ou domiciliado no exterior, mesmo inexistindo as leis complementares previstas no artigo 146 e artigo 155, § 1º, inciso III da Constituição.

II) existe a necessidade de celebração de tratado internacional do Brasil com outros Estados com vistas à diminuição ou eliminação dos efeitos da dupla tributação do ITCD-doação incidente sobre a transmissão de bens e quaisquer direitos.

Utilizou-se nessa dissertação pesquisa exploratória-bibliográfica-explicativa objetivando alcançar número suficiente de informações sobre o tema em estudo, com vista a delimitar, facilitar e aprimorar a resposta ao problema.

Procurou-se explicar o assunto buscando, reunindo e cotejando idéias e conceitos dos defensores das teorias doutrinárias existentes sobre o problema formulado, destacando o entendimento adotado nas decisões do Supremo Tribunal Federal, com vistas a proceder ao registro, análise e interpretação das teses estudadas, de modo a identificar as causas que justificam a exigência do ITCD-doação pelos Estados-membros.

(22)

especializados na internet, consulta à jurisprudência disponível em material impresso e nos portais eletrônicos dos Tribunais.

Ao final, a conclusão do estudo resultou na reunião de grandes temas, cujas áreas de interesse guardam conexões e similitudes entre si, que foram distribuídos em cinco capítulos que, a propósito, resume-se a seguir.

No Capítulo 1 analisam-se os elementos e características essenciais do federalismo, acentuando o fenômeno da descentralização estatal, com foco nos processos e princípios que embasam a repartição de competências que justificam a autonomia político-administrativo-legislativa, principalmente a tributária, das entidades jurídicas que formam o Estado Federal.

O Capítulo 2 abordará os principais aspectos da Lei Complementar nacional, destacando-se a questão da superioridade hierárquica e a importância ímpar que essa espécie normativa figura na complexa estrutura do federalismo brasileiro, mormente no que tange à suas funções de estabelecer normais, dispor sobre os conflitos de competências entres a Unidades federativas, e regular as limitações ao poder de tributar na ordem jurídica tributária nacional.

No Capítulo 3 faz-se estudo, com inserção pelo direito comparado, sobre o instituto jurídico da doação, definida como “contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra”, a teor do artigo 538 do Código Civil Brasileiro. Nesse ponto, o CCB configura-se como importante fonte do legislador tributário, donde se retira os fundamentos para normatizar o suporte material da hipótese de incidência do ITCD-doação.

No Capítulo 4 disserta-se sobre a tributação da doação a partir de um levantamento histórico, procedendo-se a uma abordagem conjunta da tributação causa mortis e inter vivos, contextualizando a exação na Constituição de 1988, no Código Tributário Nacional e nas leis dos Estados-membros. Nesse tópico serão destacados os vários aspectos da hipótese de incidência do ITCD-doação – material, pessoal, espacial, temporal, quantitativo – analisando a exigência do tributo em face do domicílio fiscal do doador no país e no exterior.

(23)

constantes das Leis estaduais que dispõem sobre o ITCD-doação incidente na transmissão de bens e quaisquer direitos, quando o doador for domiciliado ou residente no Brasil ou no exterior.

O Capítulo 5 aborda o estudo das principais características relativas aos tratados internacionais, considerado como a mais importante e democrática fonte do Direito internacional, com o fim específico de verificar a necessidade de sua celebração entre o Brasil e outros Estados soberanos para evitar a bitributação da doação, quando o doador for domiciliado ou residente no exterior.

Ao final, apresenta-se as conclusões extraídas do presente estudo esperando-se, com singela pretensão, que elas possam contribuir com o aperfeiçoamento da legislação tributária brasileira.

(24)

A forma mais importante e complexa de associação política construída pelo homem com seus semelhantes, fruto da evolução que se desenvolveu ao longo do progresso da cultura humana por meio de consensos, dissensos, pactos e guerras, sem sombra de dúvida é a figura que o mundo atual denomina de “Estado”.

O Estado, conforme se verá, evoluiu ao conceito que é hodiernamente conhecido, sobretudo pela necessidade nata do homem de viver em sociedade e da consciência de ser imprescindível uma entidade dotada de poder superior às vontades individuais que fizesse prevalecer, à todos, regras de condutas.

Os diversos desdobramentos advindos da conjugação dos elementos constitutivos do Estado – povo, território, governo soberano – redundou, ao longo da história, na formação e organização de diversos tipos de Estados, conforme é atualmente ensinada pela Teoria Geral do Estado, a exemplo do Estado unitário, Estado federal, Estado confederado, Estado Simples ou Estado Composto.

O federalismo, princípio intrínseco do Estado Federal ou federação de Estados, objeto de estudo deste tópico, corresponde a uma sofisticada forma de se organizar o poder, que encontrou grande receptividade nos dois últimos séculos e que deu origem à estrutura estatal de diversos países do mundo contemporâneo.

Por certo que não se pretende esgotar o tema “Federalismo”, posto que, devido à sua magnitude e amplitude, evidentemente não comportaria nos estreitos limites deste capítulo. Em verdade, objetiva-se elencar suas características e elementos mais importantes de modo a dar suporte teórico à investigação do problema que ora se propõe.

1.1 SOCIEDADE – PACTO SOCIAL

“O homem é naturalmente um animal político”, já o disse o filósofo grego Aristóteles no século IV a.C,10 o que em palavras atuais quer significar que “o

homem é um ser social por natureza”, dado que possui tendência a se associar a seu semelhante.

(25)

Esta tendência associativa, num primeiro momento, movido essencialmente pelo instinto da sobrevivência, é explicada hodiernamente, conforme lição de Reis Friede,11à luz da teoria do impulso associativo natural, como um conjunto básico de

vinculações naturais, que se transmudam, posteriormente, em vinculações sociais, originando as sociedades.

Segundo ditames da teoria contratualista,12 a partir da aceitação de um pacto

pelo grupo, há o rompimento da prevalência do individual em nome do coletivo, concebendo-se um poder abstrato supremo e superior denominado soberania, que se ultima no mais avançado estágio de agregação humana: o Estado.

Nesse estágio, é imperativa a necessidade da adesão dos indivíduos ao pacto social de concessão ou autorização, que permitirá a construção de um poder coletivo, e este restará prevalente sobre a vontade individual originaria e inerente ao ser humano.

1.2 O ESTADO

1.2.1 Conceito

O conceito de Estado evoluiu com o tempo. Na Grécia era designado pelo termo polis, que deu origem ao termo política, ou seja, a arte ou ciência de governar a cidade. Em Roma, o Estado era designado por civitas, significando a comunidade dos habitantes ou a res publica, isto é, a coisa comum a todos.

Foi Nicolau Maquiavel (1469-1527), durante a idade média, no ano de 1513, quem introduziu o termo Estado na literatura político/científica, através da publicação de sua obra, até hoje celebrizada: O Príncipe.

De acordo com Aderson de Menezes, a palavra Estado, no sentido que é hoje entendida, começou a ter curso na Itália, nas eras medieval/moderna, concluindo que, do século XVI em diante, o termo italiano “stato se incorpora à linguagem

11FRIEDE. Reis. Curso de Teoria Geral do Estado: Teoria Constitucional e Relações

Internacionais. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000. p. 4.

12 Teoria desenvolvida sobretudo por Jean Jacques Rousseau, segundo a qual o fundamento da sociedade é a vontade humana direcionada a conseguir uma força coletiva maior para que o homem supere os obstáculos à sua sobrevivência, o que só seria obtida a partir da soma das forças

(26)

correta, adquire foros de universidade e se generaliza, para designar a todo Estado, na tradução correspondente a qualquer língua.” 13

Importante registrar o alerta de Sahid Maluf, segundo o qual “não pode haver uma definição de Estado que seja geralmente aceita. As definições são pontos de vista de cada doutrina, de cada autor. Em cada definição se espelha uma doutrina.”14

Sem embargo, o Estado, numa conceituação simplificada, pode ser entendido como toda associação ou grupo de pessoas fixadas sobre um determinado território, dotado de um governo com poder soberano.

O conceito de Estado pode adquirir outras acepções ao se levar em consideração correntes doutrinárias que estudam o assunto.

Nesse contexto, considerando o aspecto sociólogo, Estado é um fenômeno social onde existe uma integração de forças/estratos sociais. Sob o prisma da filosofia, é um fenômeno cultural/político. Na concepção Jurídica, uma entidade geradora de direito positivo. Sob o aspecto político, é considerado uma Nação politicamente organizada.15

Consoante Sahid Maluf, vários os conceitos são oferecidos por autores estadunidenses: “O Estado é uma parte especial da humanidade considerada como unidade organizada” (John W. Burgess); “O Estado é uma sociedade de homens unidos para o fim de promover o seu interesse e segurança mútua, por meio da conjugação de todas as forças” (Thomaz M. Cooley); “O Estado é uma associação que, atuando através da lei promulgada por um governo investido, para esse fim, de poder coercitivo, mantém, dentro de uma comunidade delimitada, as condições da ordem social” (R. M. Mac Iver).16

Para Clóvis Beviláqua “é um agrupamento humano, estabelecido em determinado território e submetido a um poder soberano que lhe dá unidade orgânica.” 17

Sahid Maluf o entende singelamente como o “órgão executor da soberania nacional,”18 pressupondo esta como uma autoridade superior, que não pode ser

limitada por nenhum outro poder.

13MENEZES. Aderson de. Teoria Geral do Estado. 4ª ed. rev. e atual. por José Lindoso. Rio de Janeiro: Forense, 1984. pp. 42-43.

14 MALUF. Sahid. Teoria Geral do Estado

. 25ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 19.

15Cf. Sahid MALUF,Idem, p. 8.

16 Op. cit., p. 20.

(27)

Carvalho Filho define Estado como um ente personalizado, apresentando-se não apenas exteriormente, nas relações internacionais, como internamente, neste caso como pessoa jurídica de direito público, capaz de adquirir direitos e obrigações na ordem jurídica.19

Aderson de Menezes registra que “é uma sociedade de homens, fixada em território próprio e submetida a um governo, que lhe é originário.” 20

Portanto, o Estado pode ser entendido como organização político-jurídica de um determinado grupo social que ocupa um território fixo, onde os componentes – povo - estão submetidos a um governo que age em nome de todos por uma vontade superior denominada de soberania.

1.2.2 Pressupostos básicos de existência

A doutrina tradicional distingue três pressupostos de existência do Estado, também conhecidos como elementos essenciais, ou constitutivos, a saber: o povo como elemento humano; o território como elemento físico; e a soberania como elemento subjetivo. Na ótica de Hans Kelsen,21 tais elementos são povo, território e

poder, preferindo Marcelo Caetano22 denominar o terceiro elemento de “poder

político”.

Na visão de Dalmo de Abreu Dallari, a maioria dos autores indica três elementos que são peculiares ao Estado, embora haja divergência quanto a eles. Registra o doutrinador que, de maneira geral, costuma-se mencionar a existência de dois elementos materiais, o território e o povo, havendo grande variedade de opiniões sobre o terceiro elemento, que muitos denominam de formal. Relata que o mais comum é a identificação desse ultimo elemento com “o poder ou alguma de suas expressões, como autoridade, governo ou soberania.”23

Povo é o conjunto de indivíduos constituídos em comunidade para a realização de interesses comuns. É a soma de todos os cidadãos do Estado

19 CARVALHO FILHO. José dos Santos. Manual de Direito Administrativo

. 9ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2002, p. 1.

20 Op. cit., p. 48.

21 KELSEN. Hans. Teoria Geral do Direito e do Estado. Tradução de Luis Carlos Borges. 3ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 299.

(28)

presentes no território pátrio ou no exterior, ou seja, o conjunto de nacionais independentemente de sua localização espaço-temporal.24

O território representa a base física, o âmbito geográfico, a zona espacial em que ocorre a validez da ordem jurídica.25 No ensinamento de Hans Kelsen, é da

essência do Estado ocupar certo território delimitado e, reportando-se a Willoughby, assevera que a sua existência depende do direito a um espaço territorial próprio.26

Não diverge desse pensamento Marcelo Caetano, consoante suas palavras:

(...) hoje as grandes sociedades políticas a que chamamos Estados implicam necessariamente a existência de um território onde o povo seja senhor de se reger segundo suas leis, executadas por autoridade própria com exclusão da intervenção de outros povos. A coletividade organizada em Estado exerce, assim, sobre o território um senhorio, que se traduz no poder de jurisdição (imperium) quanto às pessoas e às coisas que nele se encontrem e no domínio das partes não individualmente apropriadas que sejam imprescindíveis à utilidade pública. 27 (grifos do autor)

Para Duguit e Le Fur, o território não é elemento essencial à existência de um Estado, invocando esses autores o direito internacional, que tem reconhecido a existência de Estados sem território, a exemplo do Vaticano, depois da unificação italiana; do Grão Priorado de Malta, da Abissínia e de todos os governos que se refugiaram em Londres, em conseqüência das invasões do Eixo Roma-Berlim durante a Segunda Guerra Mundial.28

Porém, preleciona Queiroz de Lima, citado por Sahid Maluf, que o Estado moderno é rigorosamente territorial, posto que esse elemento físico é indispensável à sua configuração, segundo as concepções pretérita e atual do direito público.29

No que tange ao conceito de soberania, tem-se as mais variadas conceituações. Vulgarmente ela é caracterizada como um poder supremo, incontestável do Estado, do qual nenhum outro poder se encontra.

Colhe-se da doutrina diversos conceitos:30 “É a causa formal do Estado”

(Machado Paupério); é “um poder de dominação” (Gerber); trata-se da “plenitude do poder público, a suprema postestas” (Orban); “a soberania é qualificada como fonte

24 Cf. Reis FRIEDE, op. cit., p. 23. 25 Aderson de MENEZES, op. cit., p. 138. 26 Op. cit., p. 299.

27 Op. cit., p. 162.

28 Apud Sahid MALUF, op. cit., p. 25. 29 Idem.

(29)

da capacidade jurídica do Estado” (Chimienti); É, ainda, “uma autoridade superior, que não pode ser limitada por nenhum outro poder.”31

Com rara clareza, Marcelo Caetano define soberania como a plenitude do poder político supremo e independente, tanto no ordenamento interno, quanto no internacional:

A soberania (...) significa, portanto, um poder político supremo e independente, entendendo-se por poder supremo aquele que não está limitado por nenhum outro na ordem interna e por poder independente aquele que na sociedade internacional, não tem de acatar regras que não sejam voluntariamente aceites e está em pé de igualdade com os poderes supremos dos outros povos.32 (grifos do autor)

Para Sahid Maluf, o governo, ao invés da soberania, é que seria o terceiro pressuposto do Estado. Segundo o Autor, o governo é uma delegação da soberania nacional; é a própria soberania posta em ação; a soberania seria um simples elemento qualificador do próprio governo. 33

Sahid Maluf não coaduna com a tese que inclui a soberania como quarto elemento constitutivo do Estado ao lado do povo, território e governo. Explica ele que a soberania é exatamente a força geradora e justificadora do elemento governo. Este pressupõe a soberania, sendo seu requisito essencial a independência, tanto na ordem interna como na ordem externa.34

1.2.3 Formas de Estado

Considerando as variações típicas e combinações dos elementos que formam o Estado – povo, território, soberania ou o governo - podem surgir diversas classificações do Estado. Embora haja divergências, a maior parte dos doutrinadores classifica as formas de Estado em dois ou três tipos básicos, relativamente ao grau de centralização política e administrativa que possa existir no âmbito operativo da sociedade política.

Consoante Paulino Jacques, existem duas formas de Estado: o Simples e o Composto. No Estado simples, ocorre a centralização política e administrativa, às vezes mitigada, a exemplo da França, Espanha, Portugal, Uruguai, Bolívia. O Estado

31 Cf. Sahid MALUF, op. cit., p. 29. 32 Op. cit., p. 169.

(30)

composto se caracteriza por ser uma liga de Estados com fins políticos, econômicos ou militares, com cada membro conservando sua soberania. São exemplos a União Pessoal: Hanôver de 1714 a 1838; a União Real : Suécia e Noruega de 1815 a 1905; a União Incorporadora: Reino Unido de 1800 a 1922; a confederação: Suíça de 1418 a 1788; a federação: EUA desde 1787; o Império: Inglaterra desde 1838. 35

Na lição de José Afonso da Silva existem dois tipos de Estado: o unitário e o federal. O Estado unitário caracteriza-se pela existência de unidade de poder sobre o território, pessoas e bens. O Estado federal, também denominado de federação de Estados, se caracteriza pela repartição do poder no âmbito do espaço territorial, gerando uma multiplicidade de organizações governamentais distribuídas regionalmente.36

Marcelo Caetano defende a existência de três formas de Estado: unitário ou simples, unitário descentralizado e federal ou complexo. No Estado simples existe um só poder político para todo o território. No Estado unitário descentralizado há províncias ou regiões que exercem poderes delegados ou atribuídos pela Constituição do Estado, que é uma só e sua elaboração cabe a um órgão comum e sem a participação das províncias. Já o Estado federal é um Estado complexo, formado por outros Estados, ficando o poder dividido entre a autoridade federal, que em certas matérias decidem sem qualquer dependência do Estado federal. Os cidadãos, assim, ficam sujeitos a dois governos, simultaneamente, o local e o federal (da união). 37

Ainda segundo Marcelo Caetano, o Estado federal pode ser perfeito, quando os próprios integrantes, por resolução própria, formam a federação, que são exemplos o EUA e a Suíça. Diz-se imperfeito, quando a criação da federação se faz por imposição de um poder central, que transforma regiões ou províncias já existentes em estados federados, a exemplo do Brasil. 38

35 JACQUES. Paulino. Curso de Direito Constitucional. 9ª ed. Rio de janeiro: Forense, 1983. p. 143.

36 Apud Reis FRIEDE, op.cit., p. 102. 37 Op. cit., p. 171-173.

(31)

1.3 O FEDERALISMO

O termo federalismo está intrinsecamente relacionado com a forma peculiar e complexa de Estado denominada de federação ou Estado federal, onde a Constituição divide as competências legislativas e administrativas entre a Ordem Jurídica Central e as Ordens Jurídicas parciais ou locais, na definição dada por Kelsen.39

1.3.1 Breve histórico

Consoante José Afonso da Silva, o federalismo, como expressão do Direito Constitucional, surgiu concomitantemente com o nascimento da Constituição estadunidense de 1787.40

Em realidade, a federação tem por berço outra espécie mais antiga de Estado composto denominado de confederação, surgido da associação de 13 Colônias estadunidenses, que se encontravam no meio de um processo de unificação.

Relata J.R. Franco da Fonseca que o modelo da Confederação estadunidense começou a ser elaborado desde o primeiro Congresso Continental das Colônias, ocorrido em Filadélfia, em 1774, até o segundo Congresso ocorrido em 1775, também naquela cidade, quando houve a declaração de guerra à Inglaterra.41

No Congresso Continental de 1776 foi enunciada uma Declaração afirmando a soberania dos novos Estados independentes, tendo os mesmos agrupados sob a forma de confederação em 1777.

Somente em 1787, em Filadélfia, foi realizada reunião dos Estados confederados com o fito de revisar os artigos da convenção. Foi elaborado um texto convencional com proposta da instituição de um Estado federal, em substituição à

39 “A ordem jurídica central que constituiu a comunidade jurídica central forma, juntamente com as ordens jurídicas locais que constituem as comunidades jurídicas locais, a ordem jurídica total ou nacional que constitui a comunidade jurídica total, o Estado.” Op. cit., p. 434.

40 SILVA. José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 16ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1999. p. 103.

41 FONSECA J.R. Franco da. Federalismo na Argentina e no Brasil. In: Fernando Augusto

(32)

confederação, o que foi ratificado transformando-se no que é hoje a Constituição estadunidense.42

No que atine à Federação brasileira, ela surgiu com a proclamação da República em 1889, quando o governo provisório editou o Decreto nº 1, de 15.11.1889.

As províncias do país, até então submetidas ao governo central da corte imperial, constituíram os Estados Unidos do Brasil, passando à condição de Estados-membros, quando então passariam a exercer sua “soberania”,43 aprovando

cada qual sua constituição definitiva e elegendo seus corpos deliberantes e os seus governos.

A forma do Estado federal brasileiro foi consolidada na Constituição de 1891 e mantida nas demais Constituições supervenientes.

Assim, a Federação brasileira surgiu, num movimento de direção centrífuga, da desagregação do Estado imperial unitário, onde as diversas províncias, que se encontravam controladas pelo poder da Coroa situada no Rio de Janeiro, transformaram-se em Estados-membros, com a adoção do modelo federativo após a proclamação da república em 1889.

Ao contrário, a formação dos Estados Unidos, que são sempre lembrados como o modelo puro, perfeito e original de Estado federado, se deu num movimento centrípeto, que ocorreu em virtude da agregação de Estados coloniais pré-existentes, considerados, primitivamente, soberanos e independentes.

Na atualidade, além dos Estados Unidos e Brasil, são vários os países que adotam a forma federativa de Estado (entre outros, México, Canadá, Argentina, Venezuela, Austrália, Alemanha, Rússia), sendo possível encontrar vários modelos de Estado federado, cuja estrutura dependerá de diversos fatores que passam pela origem histórica que influenciou a formação de cada Estado, assim como pela decisão política de divisão do poder entre o Estado central e os periféricos estabelecida pela Constituição.

Ilustremos com o processo de formação da Federação Argentina. Após a proclamação formal da independência das Províncias Unidas do rio Prata pelo

42 Franco da FONSECA J.R., op. cit., p. 73.

43 Embora a redação do artigo 3º do Decreto nº 1/1889 se refira à

soberania dos Estados, deve se entender que esteja se referindo, em realidade, à autonomia. Cf. ROCHA, Carmem Lúcia Antunes.

República e Federação no Brasil: Traços constitucionais da organização política brasileira.

(33)

Congresso de Tucumã, em 1816, e com a aprovação da nova Constituição, em 1819, gerou-se um conflito civil entre as oligarquias do interior, que desejavam um Estado federalista, com os defensores do unionismo que proclamavam um governo central sediando em Buenos Aires.44

A dissensão termina em 1881 com uma solução conciliatória que foi a construção de um Estado federativo, como era o plano no início do conflito, tornando a cidade de Bueno Aires a capital federal e, também, a capital da província de La Plata.45

Vale destacar a complexa construção da Federação alemã, onde houve um predomínio hegemônico da Prússia após a 1ª reunificação dos Estados alemães (1870/71), e até mesmo durante a República de Weimar (1919), culminando com a completa perda de autonomia dos Estados-membros (länder), que se tornaram simples províncias subordinadas ao poder central durante o período em que perdurou o III Reich (1933/45).46

Após o término da Segunda Guerra Mundial as forças aliadas restabeleceram o sistema federativo na parte ocidental da Alemanha com base nos pré-existentes länder, o que foi formalizado na Lei Fundamental de Bonn (1949). Importante etapa da evolução da Federação germânica ocorreu com o Tratado de Unificação das duas Alemanhas assinado em 1990.47

Atualmente a federação, como lembra Celso Bastos, apresenta-se como a forma mais sofisticada de se organizar o poder dentro de um Estado, pois implica uma repartição delicada de competências entre o órgão do poder central, denominado de “União”, e as expressões das organizações regionais.48

Lembra o Autor que o federalismo é ainda em nossos dias a forma de estado que encontra grande receptividade e ressonância na vida de muitos países, que não se desatualizou, posto que soube encontrar novos fundamentos em substituição àqueles que lhe deram origem.49

44 Franco da FONSECA, op. cit., p. 74. 45 Idem.

46 VIEIRA. José Ribas. Os Pontos Conflitivos no Conceito de Federalismo. In: Fernando Augusto Albuquerque Mourão et. al. (org.). O federalismo Mundial e Perspectiva do Federalismo no Brasil. São Paulo: Conselho Brasileiro de Relações Internacionais, 1997. pp. 55-56.

47 Idem.

(34)

1.3.2 Conceito e características

José Afonso da Silva ensina que o Estado Federal pode ser conceituado como a “união de coletividades públicas dotadas de autonomia político-constitucional, autonomia federativa.”50

Estado federal, na doutrina de Reis Friede, é

aquele no qual está assegurada, pela Constituição, autonomia político-administrativa às partes descentralizadas – Estados-membros, Províncias, Territórios etc. - sendo, nesse sentido, reputado, pela quase unanimidade dos autores com a mais moderna forma de Estado.51

O Profº Pinto Ferreira trilha pelo mesmo caminho expondo o seguinte pensamento:

O Estado federal é uma organização formada sob a base de uma repartição de competências entre o governo nacional e os governos estaduais, de sorte que a União tenha supremacia sobre os Estados-membros e estes sejam entidades dotadas de autonomia constitucional perante a mesma união.52

Assim, a característica fundamental do Estado federal ou federação é a atuação simultânea de mais um governo, ou mais de uma ordem jurídica, sobre os mesmos indivíduos em uma determinada circunscrição territorial: governo ou ordem jurídica central – comumente denominado de União; os Estados-membros ou províncias, e, a exemplo do Brasil, os Municípios, intitulados ordens jurídicas parciais.

É importante colacionar a pertinente ponderação de Roque Carrazza ao afirmar que os autores não entram em acordo ao apontar os traços característicos do Estado federal. 53

Afirma o renomado doutrinador que se poderia com facilidade compor um grande mosaico com todas as definições da lavra de renomados juristas e, ainda assim, não se chegaria a contento a uma conclusão definitiva sobre a natureza jurídica do Estado federal. 54 E assim explica a razão:

50 Op. cit., p. 103.

51 Op. cit., p. 119.

52 FERREIRA. Luis Pinto. Princípios Gerais do Direito Constitucional Moderno. 6ª ed.São Paulo: Saraiva, 1983. p. 909.

53 CARRAZZA. Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário

(35)

Em primeiro lugar indubitavelmente porque, no mundo infinito e ondeante do pensamento, cada autor acaba por captar uma peculiaridade que escapou à argúcia dos demais. Mas, acima de tudo, porque cada Federação tem uma fisionomia própria: a que lhe imprime o ordenamento jurídico local.55

Enfatiza Roque Carrazzaque se enganam aqueles que almejam um conceito definitivo, universal e inalterável de federação, na suposição de que ela tem forma única, geométrica e recortada de acordo com um molde inflexível. Desse modo, acrescenta:

Olvidam-se de que a Federação é apenas uma forma de Estado, um sistema de composição de forças, interesses e objetivos que podem variar, no tempo e no espaço, de acordo com as características, as necessidades e os sentimentos de cada povo.56

Nessa ótica, arremata o digno doutrinador:

É por isto (e não por outras razões) que a Federação norte-americana difere da argentina; a venezuelana da austríaca; a mexicana da brasileira; e assim por diante. Debalde delas alguém conseguirá extrair os traços comuns. 57

Ao final, Roque Carrazza define a federação da seguinte maneira:

(...) é uma associação, uma união institucional de Estados, que dá lugar a um novo Estado (o Estado Federal), diverso dos que dele participam (os Estados-membros). Nela, os Estados Federados, sem perderem suas personalidades jurídicas, despem-se de algumas tantas prerrogativas, em benefício da União. A mais relevante delas é a soberania. 58

Sem embargo, é possível traçar características comuns e principais ao Estado federal, a exemplo daquelas estabelecidas pelo constitucionalista americano, Bernard Schwartz, a saber:

• a união de certo número de entidades políticas autônomas (os estados) para finalidades comuns.

• a divisão dos poderes legislativos entre o Governo Federal e os estados componentes, divisão regida pelo princípio de que o primeiro é um “Governo de poderes enumerados”, enquanto os últimos são governos de “poderes residuais”.

• a operação direta, na maior parte, de cada um desses centros de governo, dentro de sua esfera específica, sobre todas as pessoas e propriedades compreendidas nos seus limites territoriais.

• a provisão de cada centro com o completo aparelhamento de execução da lei, quer por parte do Executivo, quer do Judiciário.

55 Cf. Roque CARRAZZA. Curso de Direito..., op. cit., p. 136. 56 Idem.

(36)

• a supremacia do Governo Federal, dentro de sua esfera específica, sobre qualquer ponto discutível, do poder estadual.59

Na mesma toada sobressai o magistério de Raul Machado Horta, prelecionando que na adoção da federação como forma de Estado é imprescindível a existência de princípios e instrumentos operacionais mínimos, que assim foram por ele elencados:

• a decisão constituinte criadora do Estado Federal e de suas partes indissociáveis, a Federação ou União, e os Estados-membros;

• a repartição de competências entre a Federação e os Estados-membros;

• poder de auto-organização constitucional dos Estados-membros atribuindo-lhes autonomia constitucional;

• a intervenção federal, instrumento para restabelecer o equilíbrio federativo, em casos constitucionalmente definidos;

• a Câmara dos Estados, como órgão do Poder Legislativo Federal, para permitir a participação do Estado-membro na formação da legislação federal;

• a titularidade dos estados-membros, através de suas Assembléias Legislativas, em número qualificado, para propor emenda à Constituição Federal;

• a criação de novo Estado ou modificação territorial de Estado existente dependendo da aquiescência da população do Estado afetado;

• a existência no Poder Judiciário Federal de um Supremo Tribunal ou Corte Suprema, par interpretar e proteger a Constituição Federal, e dirimir litígios ou conflitos entre a União, os Estados, outras pessoas jurídicas de direito interno, e as questões relativas à aplicação ou vigência da lei federal. 60

1.3.3 Federação e confederação – distinções

José Afonso da Silva61 ensina que na federação há que se distinguirem os

conceitos de soberania e autonomia e seus respectivos titulares. Diz o Autor que já houve muita discussão sobre a natureza jurídica do Estado federal, mas que atualmente já está definido que é pessoa reconhecida pelo Direito Internacional, único titular da soberania, considerada como o poder supremo consistente na capacidade de autodeterminação.

59 SCHWART. Bernard. Direito Constitucional Americano. Tradução de Carlos Nayfeld. Rio de Janeiro: Forense, 1966. p. 49.

60 HORTA. Raul Machado. Direito Constitucional

. 2ª ed. rev., atual. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey. 1999. p. 305.

(37)

Os Estados-membros federados são titulares tão somente de autonomia, assim compreendida como governo próprio dentro do círculo de competências traçadas pela Constituição Federal.

Celso Ribeiro Bastos leciona que a soberania é a qualidade conferida ao poder do Estado que lhe atribui capacidade jurídica que o permite se situar num patamar de igualdade perante outros Estados na esfera internacional e de superioridade no âmbito interno. A seu turno, a autonomia se refere a uma margem discricionária de direitos que as entidades internas possuem para impulsionar suas competências e que são circunscritas e delimitadas pelo direito interno.62

Quanto ao conceito de soberania, acrescenta Celso Ribeiro Bastos:

Um Estado não deve obediência jurídica a nenhum outro Estado. Isto o coloca, pois, numa posição de coordenação com os demais integrantes da cena internacional e de superioridade dentro de seu próprio território, daí ser possível dizer da soberania que é um poder que não encontra nenhum outro acima dela na arena internacional e nenhum outro que lhe esteja nem mesmo em igual nível na ordem interna.63

No que respeita ao conceito de autonomia, preleciona o Autor:

(...) é a margem de discrição de que uma pessoa goza para decidir sobre os seu próprios negócios mas sempre delimitada essa margem pelo próprio Direito. (...) não é uma amplitude incondicionada ou ilimitada de atuação na ordem jurídica, mas, tão-somente, a disponibilidade sobre certas matérias, respeitados, sempre, princípios fixados na Constituição.

Nessa esteira é a visão de Sahid Maluf para quem a “soberania é uma autoridade superior que não pode ser limitada por nenhum outro poder” e que “não pode sofrer restrições de qualquer tipo, salvo, naturalmente, as que decorrem dos imperativos de convivência pacífica das nações soberanas no plano do direito internacional”.64

No que tange à autonomia, aponta Sahid Maluf que é “o poder de autodeterminação dos Estados-Membros”, possuídos eles somente personalidade juridica de direito público interno. Para o Autor, os Estados membros de uma Federação não possuem soberania, posto que o próprio qualificativo “membro” afasta tal idéia.65

62A Federação..., op. cit., p. 8. 63 Idem.

(38)

Portanto, quem detém a soberania é a Ordem Jurídica Total, o Estado Total, o Estado Federal, que a expressa na ordem internacional ou interna através dos órgãos do Poder Central (União); a autonomia, por sua vez, corresponde a um poder jurídico interno deferido às ordens central e periféricas (no caso do Brasil: a própria União, Estados, Distrito Federal e Municípios), cuja margem de atuação é delimitada e expressa na Constituição Federal.

Na confederação, ao revés, segundo ensinamento de Jellinek,66 tem-se uma

reunião permanente e contratual de Estados independentes que se ligam para fins de defesa externa e paz interna. Nessa situação, os Estados não sofrem qualquer restrição à sua soberania, nem perde a personalidade jurídica de direito público internacional. Preservam, assim, a soberania e a autonomia.

Além dos Estados Unidos, o sistema confederativo experimentou associações políticas em outras partes do mundo, a exemplo da Confederação Germânica, Confederação Suíça.

Celso Bastos67 registra que a confederação já era conhecida na antiguidade

clássica, relatando que na Grécia frequentemente se formavam ligas, onde várias cidades se uniam por vínculos de colaboração recíproca, sob a supremacia de determinada cidade.

Muitos consideram que a confederação se apresenta apenas como uma referência histórica, porquanto sua trajetória no domínio da organização de Estados já foi encerrada.68

Tema importante e atual inerente à forma de Estado diz respeito à União Européia. De fato, muito se tem debatido no seio da doutrina sobre a verdadeira natureza jurídica dessa Comunidade, buscando os estudiosos definir se a sua configuração política-jurídica-social se comporta como uma federação, confederação ou outra forma de estado.

Vale referir que o sonho de integração e de unidade européia é antigo,69 mas

somente após o término da segunda guerra mundial, com a celebração de uma série

66 Apud Sahid MALUF, op. cit., p. 160. 67A Federação..., op. cit., p. 11.

68 Cf. Raul Machado HORTA, op. cit., p. 303.

69 João Mota de Campos aponta que foi por obra de Roma que “a comunidade de cultura e civilização e a unidade espiritual em que a Europa viria a exprimir-se, superando a sua falta de unidade

(39)

de “tratados comunitários”70 é que a União Européia adquiriu os contornos políticos,

jurídicos, sociais e econômicos hodiernamente conhecidos.71

Ives Gandra da Silva Martins afirma que a União Européia é “uma Federação de nações, em que o Parlamento Europeu, o Tribunal de Luxemburgo e o Banco Central da Europa impõem políticas comunitárias a todos os países signatários, podendo, tais diretivas e diretrizes, superar a força do direito local.”72

Por sua vez Sérgio Ferrari sustenta que a União Européia é exemplo de integração regional, assim como o MERCOSUL, que evoluiu a uma nova forma de associação entre Estados, que não se assimila ao conceito dogmático de confederação e nem representa uma forma federativa de Estado.73

A seu turno, preleciona João Mota de Campos que as características distintivas da União Européia não permitem incluí-las em nenhuma das categorias preestabelecidas, estando ela situada a meio caminho entre as organizações de simples cooperação e os sistemas federais.74 Conclui o Autor:

(...) as Comunidades Européias não devem ser consideradas como entidades soberanas – antes como meras organizações interestaduais em proveito das quais os Estados operaram não a transferência (irreversível) de uma parcela da soberania nacional mas, mais singelamente, uma simples delegação do exercício de competências estaduais, limitada a certos domínios específicos; delegação esta que a todo o tempo poderá ser retirada, embora com o alto custo que representaria, para um Estado-membro, a sua inevitável separação da Comunidade Européia.75 (grifos do autor)

José Souto Maior Borges afirma que a União Européia não reveste integralmente o modelo estrutural das confederações nem o das federações, explicando que o ordenamento jurídico europeu se caracteriza pela sua originalidade, especificidade e novidade, e que não se configura como uma

70“O direito comunitário, também denominado direito da integração, está contido no ordenamento jurídico-comunitário, que não se estrutura e desenvolve no território de determinado país, porém no espaço de integração, o âmbito territorial de validade das normas comunitárias, que é regionalizado (...). Cf. BORGES. José Souto Maior. Curso de Direito Comunitário: Instituições de Direito

Comunitário Comparado: União Européia e MERCOSUL. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 55.

71 Tem-se no Tratado de Paris, acordo de integração econômica que criou a CECA - Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, assinado em 18 de Abril de 1951 por Alemanha, a Bélgica, a França, a Itália, o Luxemburgo e os Países Baixos, o embrião que alavancou a Europa rumo à almejada integração. O Tratado da União Europeia (TUE), conhecido também como Tratado de Maastricht, assinado em 07.02.1992 na cidade Holandesa de mesmo nome, substituiu o nome “Comunidade Europeia” para “União Europeia”. Atualmente a União Européia possui vinte e sete Estados-membros. 72 AMARAL. Antonio Carlos Rodrigues do [et. al.] O Direito Tributário no MERCOSUL. Ives Gandra da Silva Martins (Coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 239.

73 FERRARI. Sérgio. Constituição Estadual e Federação. Rio de Janeiro: Lumen Juris: 2003. p. 57. 74 Op.cit., p. 249.

Referências

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