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Sofrimento psíquico em estudantes universitários : um estudo exploratório

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Academic year: 2017

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Sueli Pereira Caixeta

Sofrimento Psíquico em Estudantes Universitários:

um estudo exploratório

Dissertação apresentada ao Programa de Pós Graduação Stricto Sensu em Psicologia, da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do Título de Mestre em Psicologia.

Orientadora: Sandra Francesca Conte de Almeida

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2

7,5cm

C138s Caixeta, Sueli Pereira

Sofrimento psíquico em estudantes universitários: um estudo de exploratório.

106f. ; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2011. Orientação: Sandra Francesca Conte de Almeida

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5 Agradecimentos

A Deus, pela oportunidade de viver e amar;

À minha querida orientadora e amiga Sandra Francesca Conte de Almeida, por sua alegre e desafiadora companhia na construção deste trabalho;

Ao meu amado Adriano, por sua amorosa presença, apoio, incentivo e paciência;

Ao meu filho Eduardo, por me fazer viver a experiência encantadora e maravilhosa da maternidade construída no cotidiano;

Ao meu pai, que lamentavelmente partiu durante esse tempo, mas que até o último minuto me ensinou que vale a pena lutar pela vida;

A todos os familiares: irmã, irmãos, cunhados, sogros e sobrinhos, por compreenderem minha ausência e oferecerem seu apoio;

Às estudantes que participaram da construção desta dissertação, oferecendo subsídios de sua subjetividade, para o entendimento do fenômeno do sofrimento psíquico em estudantes universitários;

À Universidade Católica de Brasília, pelo desafio do trabalho;

Aos professores do Programa de Pós Graduação em Psicologia - Mestrado, pelo saber compartilhado;

Às professoras Deise Amparo, Kátia Brasil e Carmem Jansen, pela rica contribuição no processo de qualificação do projeto e pela disposição de atenciosamente avaliarem esta dissertação;

Aos colegas, pelas angústias e desafios partilhados;

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Você Aprende

Depois de algum tempo, você aprende a diferença, a sutil diferença, entre dar a mão e acorrentar uma alma. E você aprende que amar não significa apoiar-se, e que companhia nem sempre significa segurança. E começa a aprender que beijos não são contratos e presentes não são promessas.

E começa a aceitar suas derrotas com a cabeça erguida e olhos adiante, com a graça de um adulto e não com a tristeza de uma criança.

E aprende a construir todas as suas estradas no hoje, porque o terreno do amanhã é incerto demais para os planos, e o futuro tem o costume de cair em meio ao vão.

Depois de um tempo você aprende que o sol queima se ficar exposto por muito tempo.

E aprende que não importa o quanto você se importe, algumas pessoas simplesmente não se importam... E aceita que não importa quão boa seja uma pessoa, ela vai feri-lo de vez em quando e você precisa perdoá-la, por isso. Aprende que falar pode aliviar dores emocionais.

Descobre que se levam anos para se construir confiança e apenas segundos para destruí-la, e que você pode fazer coisas em um instante das quais se arrependerá pelo resto da vida.

Aprende que verdadeiras amizades continuam a crescer mesmo a longas distâncias. E o que importa não é o que você tem na vida, mas quem você tem na vida. E que bons amigos são a família que nos permitiram escolher.

Aprende que não temos que mudar de amigos se compreendemos que os amigos mudam, percebe que seu melhor amigo e você podem fazer qualquer coisa, ou nada, e terem bons momentos juntos.

Descobre que as pessoas com quem você mais se importa na vida são tomadas de você muito depressa, por isso sempre devemos deixar as pessoas que amamos com palavras amorosas, pode ser a última vez que as vejamos. Aprende que as circunstâncias e os ambientes tem influência sobre nós, mas nós somos responsáveis por nós mesmos.

Começa a aprender que não se deve comparar com os outros, mas com o melhor que pode ser. Descobre que se leva muito tempo para se tornar a pessoa que quer ser, e que o tempo é curto.

Aprende que não importa onde já chegou, mas onde está indo, mas se você não sabe para onde está indo, qualquer lugar serve.

Aprende que, ou você controla seus atos ou eles o controlarão, e que ser flexível não significa ser fraco ou não ter personalidade, pois não importa quão delicada e frágil seja uma situação, sempre existem dois lados. Aprende que heróis são pessoas que fizeram o que era necessário fazer, enfrentando as conseqüências. Aprende que paciência requer muita prática.

Descobre que algumas vezes a pessoa que você espera que o chute quando você cai é uma das poucas que o ajudam a levantar-se.

Aprende que maturidade tem mais a ver com os tipos de experiência que se teve e o que você aprendeu com elas do que com quantos aniversários você celebrou.

Aprende que há mais dos seus pais em você do que você supunha.

Aprende que nunca se deve dizer a uma criança que sonhos são bobagens, poucas coisas são tão humilhantes e seria uma tragédia se ela acreditasse nisso.

Aprende que quando está com raiva tem o direito de estar com raiva, mas isso não lhe dá o direito de ser cruel. Descobre que só porque alguém não o ama do jeito que você quer que ame, não significa que esse alguém não o ama, contudo o que pode, pois existem pessoas que nos amam, mas simplesmente não sabem como demonstrar ou viver isso.

Aprende que nem sempre é suficiente ser perdoado por alguém, algumas vezes você tem que aprender a perdoar-se a si mesmo.

Aprende que com a mesma severidade com que julga, você será em algum momento condenado.

Aprende que não importa em quantos pedaços seu coração foi partido, o mundo não pára para que você o conserte.

Aprende que o tempo não é algo que possa voltar para trás.

Portanto... plante seu jardim e decore sua alma, ao invés de esperar que alguém lhe traga flores.

E você aprende que realmente pode suportar... que realmente é forte, e que pode ir muito mais longe depois de pensar que não se pode mais.

E que realmente a vida tem valor e que você tem valor diante da vida!

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7 Resumo

A pesquisa teve por objetivo investigar o sofrimento psíquico em estudantes universitários. Visou, ainda, contribuir para um melhor entendimento acerca dos sintomas que apontam para o fenômeno estudado, identificando-os e discutindo como afetam a vida acadêmica e social dos graduandos. Buscou-se entender, de outra parte, em que medida a história de vida, as condições subjetivas, as expectativas e os ideais pessoais, parentais e acadêmicos se articulam na produção do sofrimento psíquico dos sujeitos em questão. Adotou-se, como base teórica neste trabalho de investigação, a psicanálise e suas conexões com a educação. Tal escolha possibilitou compreender que os processos psíquicos inconscientes, descobertos por Freud, oferecem elementos importantes e peculiares para pensar sobre o sujeito em sua relação com a sociedade e a cultura. Foram considerados alguns conceitos psicanalíticos - como inconsciente, desamparo, narcisismo, desejo e sintoma - para apreender os sentidos do sofrimento psíquico do sujeito na universidade. A pesquisa foi de natureza qualitativa, com o método de estudo de caso. Foram utilizados, como instrumentos de coleta e construção dos dados, a narrativa de história de vida e a entrevista clínica. Participaram voluntariamente dessa investigação duas estudantes de graduação de uma instituição de ensino superior privada do Distrito Federal. Na análise dos dados recorreu-se à construção de núcleos de significação como meio para apreensão da constituição dos sentidos expressos pelos sujeitos na sua narrativa escrita e oral acerca de seu sofrimento psíquico. São discutidos os seguintes núcleos de significação: a experiência de sofrimento das estudantes; os sintomas do sofrimento psíquico; a exposição diante do Outro; a avaliação do desempenho acadêmico; os efeitos subjetivos do sofrimento psíquico; as estratégias de enfrentamento do sofrimento psíquico e a acolhida e a intervenção dos professores e dos pares. São consideradas as vivências dos sujeitos, ligadas à história de vida pessoal e acadêmica, que desencadeiam e/ou reeditam sofrimento. Identificam-se e discutem-se, também, os principais sintomas que indicam a situação de sofrimento dos sujeitos e os relacionam à demanda de amor e de reconhecimento, endereçada ao Outro, simbolicamente representado pelo professor e atualizado na relação transferencial professor-aluno. Os resultados apontam, ainda, as estratégias encontradas pelas estudantes como forma de enfrentamento e de superação do sofrimento psíquico. Conclui-se que o caminho percorrido, em coerência com as bases epistemológicas e metodológicas de uma pesquisa qualitativa, ao investigar a questão do sofrimento psíquico em estudantes universitários, não teve a intenção de que essa investigação seja generalizada para outros sujeitos e espaços acadêmicos, embora o problema, em si, não deva ser ignorado e mereça novas investigações e estudos que complementem e aprofundem as questões, os problemas e os resultados aqui apresentados e discutidos.

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8 Abstract

This research aimed to investigate the psychological distress in college students. It also aimed to contribute to a better understanding of the symptoms that indicates the studied phenomenon, identifying and discussing how they affect the academic and social life of undergraduates. We tried to understand, on the other hand, to what extent the history of life, the subjective conditions, expectations and personal ideals, parents and academics are articulated in the production of psychological distress of these characters. It was adopted as the theoretical basis in this research work, psychoanalysis and its connections with education. This choice made it possible to understand the unconscious mental processes, which Freud had found out, offered unique and important elements to think about the character in its relation with society and culture. There were considered some psychoanalytic concepts as unconscious, helpless, narcissism, desire and symptom to grasp the senses of psychological distress of the character from university. The research was qualitative in nature, and used the method of case study. There were used, as instruments of collection and construction of data, the narrative of the life story and clinical interview. Voluntarily participated in this investigation two undergraduates from a private institution of higher education in the Federal District. In analyzing the data it was used to build cores of meaning as means of understanding the constitution of the senses expressed by the characters in their written and spoken narrative about their psychological distress. In the discussion of the results are considered the experiences of characters related to the personal and academic history, which trigger and / or revive the suffering. This article also identifies and discuss about the main symptoms that indicate the suffering situation of the characters and related to the demand of love and recognition, addressed to the Other, symbolically represented by the teacher and updated in the transference relationship teacher-student. The results also indicate the strategies encountered by students as a way of coping and overcoming mental suffering. We conclude that the way we have walked, consistent with the epistemological and methodological foundations of a qualitative research, through the investigation of the issue of psychological distress in college students, did not intend that this research be generalized to other characters and academic areas, although the problem in itself should not be ignored and deserves further investigations and studies that complement and deepen the issues, problems and results presented and discussed here.

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9 SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO...12

INTRODUÇÃO AO PROBLEMA E JUSTICATIVA...14

CAPÍTULO 1. PSICANÁLISE E EDUCAÇÃO: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS ACERCA DO SOFRIMENTO PSÍQUICO EM ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS...19

1.1Freud e a Psicanálise...20

1.2Inconsciente...21

1.3Narcisismo e Desamparo no sujeito Moderno...24

1.4Desejo, Sofrimento e Sintoma...28

1.5A Universidade como Espaço de Expressão do Sujeito...36

CAPÍTULO 2. MÉTODO...43

2.1Objetivos...43

2.2Metodologia e Instrumentos Utilizados...43

2.3Sujeitos...50

2.4Contexto da Produção de Dados...51

2.5Procedimentos de coleta de Dados...51

2.6Procedimentos de Análise dos Dados...52

3 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS...53

3.1Identificação dos sujeitos...54

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3.2.1 A experiência de sofrimento dos estudantes...56

3.2.2 Os sintomas de sofrimento psíquico...59

3.2.3 A exposição diante do Outro...62

3.2.4 A avaliação de desempenho acadêmico. O que o Outro quer de mim?...65

3.2.5 Os efeitos subjetivos do sofrimento psíquico...68

3.2.6 As estratégias de enfrentamento do sofrimento psíquico...70

3.2.7 A acolhida e a intervenção dos professores e dos pares...74

CONSIDERAÇÕES FINAIS...77

REFERÊNCIAS BIBLOGRÁFICAS...81

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11 APRESENTAÇÃO

Este trabalho de pesquisa, descrito nas páginas que se seguem, é produto do processo de Mestrado em Psicologia e uma forma de apreender como o estudante, com sua subjetividade, sua história de vida e sua existência socialmente determinada, vivencia o sofrimento psíquico no contexto da vida acadêmica. Um dos lugares possíveis do sujeito como ser social é a universidade; esta não se constitui, portanto, uma exceção nas vivências e produção de experiências de sofrimento humano. Instrumento por excelência de formação pessoal e profissional, de inserção na sociedade, de constituição e expressão da subjetividade, a universidade é também alvo de investimento de afetos.

Este escrito inicia-se com uma breve apresentação e uma introdução ao problema de pesquisa e sua justificativa. A formulação da questão-problema parte da análise de várias pesquisas que apontam para a presença de algum tipo de mal estar durante o tempo em que o estudante permanece na universidade. Considera, ainda, questões vinculadas aos sofrimentos que são desencadeados no processo ensino-aprendizagem e outras que, por adversidades da vida, ou por condições subjetivas, têm interferência na vida acadêmica do sujeito.

Pretende-se, desse modo, contribuir para um melhor entendimento acerca dos sintomas que apontam o sofrimento psíquico, identificando e discutindo como estes sintomas afetam a vida acadêmica dos estudantes. Buscar-se-á entender em que medida a história de vida e as condições subjetivas, as expectativas e os ideais pessoais, parentais e acadêmicos se articulam na produção do sofrimento psíquico de estudantes universitários.

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12 A relevância da relação entre psicanálise e educação na compreensão da subjetividade de alunos e professores, vem sendo discutida por muitos educadores psicanalistas. Considerando as potencialidades e limites dessa relação, Almeida (2002) considera que as ideias de Freud e os escritos psicanalíticos posteriores, sobre a psicanálise e a educação, possibilitam compreender que a descoberta dos processos psíquicos inconscientes oferece elementos importantes e peculiares para se pensar o sujeito inserido na cultura.

O caminho escolhido para a construção da pesquisa segue as orientações gerais de uma investigação qualitativa. No segundo capítulo, esse percurso será detalhado por meio da descrição dos objetivos, dos procedimentos metodológicos do estudo de caso e da justificativa do uso dos instrumentos de história de vida e entrevista clínica na construção dos dados. A análise e a construção dos dados foram realizadas tendo como referência a elaboração dos núcleos de significação e de sentido, conforme Aguiar e Ozella (2006).

No capítulo terceiro, considerando a experiência de sofrimento dos estudantes, a discussão dos dados apoiou-se na psicanálise e suas conexões com a educação. Foram estabelecidos e analisados núcleos de significação elaborados a partir dos relatos da história de vida e entrevista clínica com os sujeitos.

Espera-se, com esse trabalho, contribuir para a discussão acerca da qualidade da educação nas instituições de ensino superior.

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13 INTRODUÇÃO AO PROBLEMA E JUSTIFICATIVA

A intenção de investigar o sofrimento psíquico em estudantes universitários nasceu da atuação em serviço de atendimento psicológico, em uma instituição de ensino superior do Distrito Federal, onde foi possível identificar uma relação entre as queixas apresentadas pelos estudantes em atendimentos e certas características da demanda do ensino universitário. Tal intenção amadureceu na experiência como docente, em sala de aula, onde este sofrimento comparece e de alguma forma interfere no desempenho acadêmico do estudante. Pretende-se com esta dissertação contribuir para um melhor entendimento acerca dos sintomas que apontam o sofrimento psíquico, identificando e discutindo como estes sintomas afetam a vida acadêmica dos estudantes. Buscando, dessa forma, entender em que medida a história de vida e as condições subjetivas, expectativas e ideais acadêmicos, se articulam na produção de sofrimento psíquico de estudantes universitários.

O interesse pelo sofrimento psíquico e saúde mental em alunos universitários é uma questão que vem sendo discutida e pesquisada há algumas décadas. Inicialmente os estudos se concentraram na Europa e nos Estados Unidos, no início do século XX, justificados pelo número de universidades presentes nestes países. No Brasil, com a expansão universitária, sobretudo na segunda metade do século XX, o interesse por este tema tem ganhado adeptos. E os pioneiros nestes estudos no Brasil são: Fortes (1972), Albuquerque (1973) e Loreto (1985). Todos eles chamam a atenção para a necessidade de um atendimento formal aos estudantes, no que diz respeito aos aspectos psíquicos e de saúde mental dos mesmos.

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14 A presente pesquisa está amparada em estudos que indicam uma grande prevalência de algum tipo de sofrimento durante a vida acadêmica em curso superior. Rimmer, Halikas e Schuckit (1982, apud CERCHIARI et al, 2005), em investigações relativas a estudantes universitários, apontam que de 14% a 19% dos estudantes apresentam problemas psíquicos surgidos em algum momento da vida acadêmica, e que um quarto dos alunos diagnosticados com algum tipo de doença psiquiátrica procurou atendimento em serviço de saúde mental, sendo a manifestação predominante a depressão. Niemi (1988, apud CERCHIARI et al, 2005), em uma pesquisa realizada na Finlândia, sobre o perfil dos estudantes atendidos no serviço de saúde universitário, percebeu que ansiedade e medo somam 35% dos sintomas; depressão e solidão, 21% e dificuldades nas relações sociais, 18%. Este estudo demonstra, ainda, que a freqüência de distúrbios psiquiátricos na população universitária varia de 6% a 29%.

Cerchiari et al (2005), em estudo intitulado “utilização do serviço de saúde mental em uma universidade pública” indicam que a maioria das pessoas que procuram o serviço de atendimento de saúde mental são mulheres entre 18 e 20 anos de idade e que apresentam quadro de sofrimento psíquico e não problemas psiquiátricos.

Segundo os mesmos autores, no Brasil, além da escassez de estudos epidemiológicos sobre o transtorno psiquiátrico em estudantes universitários, há carência de rigor metodológico e estatístico. Os estudos nacionais publicados nas ultimas décadas podem ser classificados em três grupos: levantamento dos índices de utilização dos serviços em saúde das instituições; estudos epidemiológicos de problemas específicos utilizando amostras representativas de distúrbios não psicóticos, tais como: abuso de anfetaminas; pensamento suicida e tentativas de suicídio; uso de bebidas alcoólicas; dificuldades no processo ensino-aprendizagem e saúde mental do estudante de medicina e, por fim, o terceiro grupo abrange um número relativamente grande de estudos com características específicas, todos direcionados à investigações realizadas com estudantes da área da saúde. No entanto, é importante destacar que a maioria das pesquisas se concentra no primeiro grupo, ou seja, levantamentos dos índices de utilização dos serviços de saúde mental oferecidos pelas universidades.

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15 outras menos relevantes e circunstancias como, por exemplo, dificuldade de adaptação à nova cidade. Na maioria das vezes, tais queixas sugerem, a princípio, que os sujeitos estão sendo supostamente acometidos por um sofrimento psíquico "leve" e denotam, consequentemente, a existência de uma demanda de escuta e acolhimento.

O mesmo estudo aponta que a maioria dos usuários, que apresentam demanda dessa natureza, tendem a não direcionar seus questionamentos para si próprios, ou seja, não se implicam em seus sintomas. Em muitos casos, o estudante explicita que procurara o serviço, na realidade, apenas para "desabafar" e que não tem interesse em dar início a um processo psicoterapêutico, logo, não passa da primeira sessão. No entanto, o autor do estudo destaca que, também com frequência, alguns estudantes apresentam queixas que exigem um pouco mais de cuidado e encaminhamentos para tratamento psiquiátrico ou psicoterápico. Neste caso, os sintomas em geral estão relacionados à tentativa de suicídio e uso excessivo de álcool e drogas.

Peres (2003) aponta que pesquisas sobre este tipo de atendimento psicológico institucionalizado, sobretudo em clínicas escola, é relevante e tem sido atualizado com avaliações e constantes inovações em sua forma intervenção. A maioria das pesquisas neste campo se dedica a estudar as características da clientela e a descrição dos serviços oferecidos e, com um pouco menos de prevalência, os estudos focam e problematizam as dificuldades inerentes ao trabalho clínico institucional bem como propõe novas formas de intervenção.

Xavier, Nunes e Santos (2008), em uma pesquisa intitulada: “Subjetividade e sofrimento psíquico na formação do sujeito na universidade”, destaca a importância de estudos que considerem o sofrimento dos sujeitos enquanto estudantes, tendo em vista que o espaço universitário é extremamente desafiante, pois mobiliza aspectos cognitivos, sociais, físicos e, sobretudo, emocionais, por um período relativamente longo na vida do sujeito.

Segundo as mesmas autoras, a universidade propõe e impõe situações que ocasionam sofrimento psíquico “e que se manifestam mediante diferentes sintomas: absenteísmo, depressão, dependência química, melancolia, isolamento” (p. 2), dentre outros.

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16 Educação Superior de 2005, só no ano em referência foram oferecidas 2.435.897 vagas nas Instituições de Ensino Superior (IES), de todo o País, o que representa um crescimento de 5% em relação ao ano anterior. Embora o número de vagas tenha aumentado, o censo aponta também que aumentou a demanda, pois um número de concorrentes por vagas também cresceu em torno de 0,14%.

De acordo com os relatórios apresentados anualmente pelo INEP, a Educação superior registrou uma aceleração entre os anos de 1997 e 2007 com um crescente aumento de IES em todo País. Porém, em 2008 essa realidade começa a mudar. O Censo da Educação Superior de 2008 aponta que não só não houve crescimento, como houve redução de tais instituições. O Censo registrou a participação de 2.252 IES no País, representando uma diminuição de 29 instituições em relação ao ano de 2007. Essa desaceleração pode ser verificada, sobretudo, nas universidades públicas federais. De acordo com o Censo 2008: “Tal diminuição pode ser explicada pela integração de instituições, por fusão ou compra, observada nos últimos anos. De fato, a criação dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, em muitos casos, se deu a partir da fusão de Centros Federais de Educação Tecnológica” (p. 8).

Na região Nordeste, no entanto, ao contrário das demais regiões do País, a realidade continua sendo de crescimento, com 10 IES a mais do que em 2007. “Cabe ressaltar que o declínio no número das IES, assim como em 2007, não se refletiu na oferta de vagas, número de ingressos, matrículas e concluintes, que mantiveram um crescimento semelhante aos dos anos anteriores” (MEC/INEP, 2008 p. 9).

Esses dados parecem apontar que o ensino superior está mais acessível, no entanto é importante perceber que o percentual de alunos concluintes não variou em escala proporcional aos ingressos. Com isso, podemos inferir que, embora o acesso seja mais fácil, é ainda muito difícil se manter na universidade, e a evasão tem índices bem expressivos.

Oliveira (2007), em uma pesquisa realizada em uma universidade pública do Distrito Federal, aponta como sendo uma das causas relevantes para o trancamento geral de matrícula o adoecimento. Segundo essa autora, além das dificuldades financeiras para custear um curso superior, outros fatores ligados à experiência, vulnerabilidades pessoais, conflitos relacionais e relação de trabalho são importantes na evasão universitária.

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17 diante do novo que se apresenta num curso de graduação, dificuldades de relacionamento com colegas e professores, e ainda problema na estrutura curricular que impossibilita, sobretudo, na universidade pública, o estudante conciliar a atividade acadêmica com outra atividade, como trabalho, por exemplo. Aponta ainda que os serviços de atendimento e apoio aos estudantes são precários diante da demanda.

Campos (2006) indica que é cada vez mais frequente a criação de centros de apoio ao estudante nas instituições de ensino superior, e que sua abrangência tem sido ampliada para além da preocupação com a saúde mental, voltando atenção e envolvimento com o processo de adaptação pedagógica e social do estudante ao espaço universitário. Segundo a autora esses centros nascem com o objetivo de oferecer apoio à aprendizagem e ao desenvolvimento do estudante, auxiliando-o na adaptação, no processo de ensino aprendizagem, na interação, nos relacionamentos e nos conflitos enfrentados.

Os centros de atendimentos visam contribuir para a promoção da qualidade de vida dos estudantes em seus aspectos psicológicos, pedagógicos, psicopedagógicos e sociais, implicados diretamente no desempenho acadêmico, por isso, sua equipe deve ser também multidisciplinar. Nesta perspectiva apontada por Campos (2006) muda-se o foco do serviço de saúde mental para um atendimento mais integral, mas não muda a relevância de seu existir.

Neste trabalho, no entanto, se buscou entender, a partir do relato dos estudantes, como o sofrimento psíquico pode estar relacionado às atividades acadêmicas. Para isso, a questão norteadora em torno da qual a dissertação foi construída é a seguinte: considerando a história de vida, as condições subjetivas e a realidade acadêmica do sujeito estudante, cabe investigar acerca do sofrimento que vivem tais sujeitos no âmbito da universidade. Tal problema desdobrou-se em algumas questões:

1. As exigências acadêmicas configuram-se em fator desencadeante para o sofrimento psíquico e para o adoecimento do estudante?

2. Em que medida os ideais educativos em torno da formação profissional desencadeia sofrimento?

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18 Ao elaborar e indagar as questões aqui apresentadas teve-se presente o que diz Vieira (2008) quando afirma que formular um problema é mais que simplesmente proferir perguntas, trata-se de tirar essa pergunta do lugar comum de entendimento “perguntar sobre algo só é possível por um conhecimento de algo sobre o que se pergunta” (p. 31). Dessa forma, para responder a essa inquietação e tirar o problema do lugar comum, buscou-se entendê-lo a partir dos pressupostos psicanalíticos, referência primeira proposta nesta pesquisa.

CAPÍTULO 1 – PSICANÁLISE E EDUCAÇÃO: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

TEÓRICAS ACERCA DO SOFRIMENTO PSÍQUICO EM ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS

Uma conexão possível entre psicanálise e educação vem sendo discutida por muitos educadores psicanalistas. Almeida (2002) aponta as possibilidades e limites da relação entre a psicanálise e a educação. De acordo com a autora, os escritos de Freud e os escritos psicanalíticos posteriores, sobre a psicanálise e a educação, possibilitam compreender que a descoberta dos processos psíquicos inconscientes, cunhada por Freud, oferece elementos importantes e peculiares para pensar o sujeito inserido na cultura.

Não se trata, obviamente, de aplicar a psicanálise ao campo social, mas de utilizar o saber oriundo da teoria e da experiência psicanalíticas para construir algumas observações e hipóteses em torno de algumas questões fundamentais do campo educativo, visando produzir novos conhecimentos sobre este campo, especialmente sobre as posições subjetivas do aluno e do professor frente ao objeto de conhecimento e sua mediação. (ALMEIDA, 2002, p. 2)

Assim, pensar a educação com fundamentos psicanalíticos, não significa uma transposição dos conceitos de um campo ao outro, mas se valer desses conceitos como uma forma de entender os processos educativos, que são inegavelmente parte da constituição e desenvolvimento do sujeito.

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19 significações fálicas; a idealização do ato educativo e seus efeitos na mediação do conhecimento, e por fim, a posição discursiva do educador na transmissão do conhecimento.

Lajonquière (2002) argumenta que não obstante a afirmação freudiana de que educar é uma profissão impossível, é particularmente a educação que nos fornece a possibilidade da filiação simbólica humanizante. “Educação não aperfeiçoa o ser infantil, retirando metodicamente uma lógica já dada no real, mas inocula e alimenta os germes culturais, alojados no campo Outro1 das línguas humanas, ou, se preferirmos, insere e sustenta legalidades próprias dos jogos de linguagem” (p. 07). Dessa forma, a educação é um dos artifícios mais competentes de inserção e manutenção da cultura.

Neste trabalho que busca entender o sofrimento psíquico de estudantes no campo universitário, a fundamentação teórica e a discussão dos resultados se darão sempre nesta interface psicanálise e educação. Por isso, nas páginas seguintes apresentar-se-ão alguns fundamentos pertinentes a este intento.

1.1 Freud e a Psicanálise: breve Contextualização

A Europa, da segunda metade do século XIX, é palco de uma proposta revolucionária no que diz respeito ao estudo e as descobertas da alma humana: a psicanálise. Antes do seu surgimento, porém, já havia estudos da Psicologia (WUND 1832-1920, TITCHENERT 1867-1927, JAMES 1840-1910, DEWEY 1859-1952, WATSON 1878-1959, PAVLOV 1849-1936, WERTHEIMER 1880-1943, KOHLER 1890-1947, KOFKA 1886-1941, LEWIN 1890-1941) com foco nos processos da consciência. Entretanto, desde suas origens, a teoria psicanalítica apóia-se numa perspectiva onde o inconsciente apresenta-se como uma instância psíquica fundamental. Para a psicanálise, o inconsciente é uma estrutura psíquica constituída primordialmente pelas experiências recalcadas. E que de alguma forma, a partir de uma lógica

1 Almeida e Paulo (2010) esclarecem de modo sucinto, em nota de roda pé, a noção de Outro: “o termo é

utilizado por Lacan para designar um lugar simbólico – o significante, a lei, a linguagem, o inconsciente, ou, ainda, Deus – que determina o sujeito, ora de maneira externa a ele, ora de maneira intrassubjetiva em sua relação com o desejo. Primordialmente, essa dimensão de alteridade é encarnada, no real do corpo e do desejo, pela mãe ou por quem a substitui nos cuidados com a criança, formando um par Outo-outro. O Outro, escrito

com letras maiúscula, que se lê ‘grande outro’, distingue-se do outro com letra minúscula, ‘pequeno outro’, que

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20 mesmo do inconsciente esses conteúdos têm influência sobre o sujeito como um todo, sempre. Vale ressaltar que o inconsciente não é todo constituído de experiências recalcadas, mas também por conteúdos latentes não racalcados.

A Viena, do final do século XIX, é herdeira dos fundamentos epistemológicos gregos, da moral cristã e do racionalismo filosófico medieval e moderno. A sociedade deste século vivia a dor da repressão das pulsões e dos afetos mais peculiares do ser humano, e amargava sofrimentos aniquiladores em consequência da manutenção de comportamentos comedidos e socialmente prescritos e vigiados. A manifestação socialmente aceita dessas dores é um mal-estar físico instalado.

O médico, Sigmund Freud, motivado pelo desejo de aliviar o sofrimento de pacientes atormentados pelas neuroses, lança-se numa busca intensa e densa a fim de descobrir respostas e soluções para tais conflitos. Inicialmente, dedica-se ao estudo e tratamento da histeria. A histeria era uma doença basicamente manifesta em mulheres. Vale ressaltar que, neste contexto, as mulheres eram socialmente submissas, sem espaço e alternativa de escuta de seus desejos, moralmente monitoradas pelo controle social e sem autonomia de decisão.

Foi ao longo de uma série de pesquisas, onde utilizava metodologias já conhecidas de abordagem dos conteúdos mais íntimos do humano, como a hipnose e a associação induzida, que Freud foi se dando conta da necessidade de uma forma diferente de escuta do inconsciente e, assim, acessar conteúdos recalcados. Segundo Almeida (2006), enquanto Freud analisava uma de suas pacientes, utilizando-se ainda da associação induzida, verificou a resistência da analisanda em submeter-se ao método. Ao permitir que a mesma falasse livremente, construiu um caminho de acesso aos conteúdos inconscientes, necessários ao processo de cura. Considerou, assim, que este método – a livre associação – seria o mais indicado. Foi da necessidade da escuta, manifesta por esta paciente, que fez Freud iniciar sua pesquisa a partir de um método novo e eficaz.

A psicanálise constitui-se, assim, na manifestação humana de uma necessidade que, ultrapassando os limites do que seja ou não legal e moral numa sociedade, evidencia o direito que o ser humano tem de ser escutado.

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21 tinha uma função controladora a partir da culpa. A escuta analítica se dá por um processo onde se ouve a subjetividade do outro, ou seja, a manifestação do inconsciente através da formação de sintomas, de atos falhos, de sonhos, entre outros.

1.2 Inconsciente

O inconsciente, na forma como é apresentado por Freud, é a grande novidade cunhada pela teoria psicanalítica. Embora este termo já tivesse sido empregado por filósofos, psicólogos e outros pensadores, desde o século XVII, sempre esteve relacionado a processos mentais não conscientes. Para o fundador da psicanálise, entretanto, o inconsciente é uma estrutura psíquica constituída pelo recalcamento de experiências, nas quais os afetos não podem ser anulados, mas a representação, à qual o afeto está vinculado, é recalcada. Para Freud, “A essência do processo de recalcamento não está em por fim, em destruir a idéia que representa uma pulsão mas, em evitar que se torne consciente” (FREUD, 1915, p.171). Para recalcar conteúdos psíquicos precisa-se de uma estrutura psíquica que sirva de “depósito” das experiências vividas no registro do real, do imaginário ou do simbólico. Esta estrutura é, indubitavelmente, o inconsciente. Considerando o exposto, importa ressaltar que o inconsciente, objeto da pesquisa de Freud e da psicanálise, é aquele associado ao recalque.

Para Freud (1915), a discussão sobre o inconsciente é necessária e legítima. Explica que é necessária porque há lacunas frequentes na consciência, que não podem ser explicadas e tão pouco entendidas pela própria consciência, destaca ainda, que essas lacunas acontecem tanto em pessoas saudáveis, como parapraxias e sonhos, quanto em pessoas que estão doentes, como sintomas psíquicos ou obsessões.

Assim como acontece com as lacunas, “...nossa experiência diária mais pessoal nos tem familiarizado com idéias que assomam à nossa mente vindas não sabemos de onde, e com conclusões intelectuais que alcançamos não sabemos como...”(FREUD, 1915, p. 172). Entende-se que uma compreensão mais ampla do significado das coisas é motivo suficiente para ir além da experiência direta, ou seja, para além da consciência, onde há apenas a representação do que está sendo percebido.

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22 estão presentes na consciência. Por outro lado, todas as representações, latentes e recalcadas, que por ventura possam existir na dimensão psíquica serão atribuídas ao inconsciente freudiano.

Em defesa de um estado inconsciente, Freud (1915) afirma que o conteúdo que se é capaz de perceber, ou de ter consciência, é bastante reduzido, de modo que mesmo o conhecimento consciente deve permanecer, por um tempo significativo, num estado que pode ser chamado de latência, ou seja, está psiquicamente inconsciente. Isso posto, e quando todas as nossas lembranças latentes são consideradas, “fica totalmente incompreensível que a existência do inconsciente possa ser negada”. (p. 173).

Além disso, continua Freud, a suposição da existência de um inconsciente é também legítima, pois, ao inferi-la não é necessário negar ou minimizar a existência, função e importância da consciência. No entanto, vale lembrar que a “consciência torna cada um de nós cônscio apenas de seus próprios estados mentais” (p. 173). Um dos argumentos, que pode contribuir no entendimento da legitimidade do inconsciente, é o de que devemos considerar que uma investigação analítica revela alguns processos latentes com características peculiares, que podem ser estranhas a nós e outros com características familiares. E ainda, “a análise revela que os diferentes processos mentais latentes que inferimos desfrutam de alto grau de independência mútua, como se não tivessem ligação um com o outro, e nada soubessem um do outro” (p. 175). Parece obvio concluir com Freud que, em psicanálise, não nos resta outra alternativa senão afirmar que alguns processos mentais acontecem orientados fundamentalmente pelo inconsciente.

Mesmo após as formulações de propostas por Freud sobre o inconsciente, este continua sendo interpretado como o lugar do caos, senão o próprio caos, o mistério, o indizível, o enigmático, o ilógico, sem qualquer inteligibilidade. O inconsciente não é uma instância inferior à consciência, tampouco é um lugar, não há localização anatômica do inconsciente. Mas como tem um funcionamento autônomo é também compreensível que a consciência não consiga alcançá-lo a partir de sua lógica.

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23 própria, com suas próprias leis e regras. “A descoberta freudiana do inconsciente é a de que ele tem leis e comporta desejo, sobre o qual nem sempre o sujeito quer saber” (QUINET, 2002, p. 21). A forma como o Inconsciente é ordenado difere, certamente, do funcionamento do consciente e do pré consciente; mas isso não significa que não haja nenhuma ordem.O que define e distingue consciente e inconsciente não são, pura e simplesmente, seus conteúdos, mas a maneira como eles atuam, conferindo a seus conteúdos determinadas configurações.

O inconsciente abrange tanto conteúdos latentes, temporariamente inconscientes, quanto, processos e conteúdos recalcados. Vale ressaltar que a maioria dos conteúdos recalcados nunca chega a se tornar conscientes, pois o recalque oferece resistência às ações pulsionais. Caso esses conteúdos se tornassem conscientes, por serem submetidos a uma lógica própria do inconsciente, seriam propensos a manifestar-se de forma grosseira e ilegível em relação aos demais processos conscientes.

A manifestação de conteúdos inconscientes recalcados acontece de forma sutil e nem sempre é percebida, reconhecida e interpretada como tal. As formas mais comuns são os lapsos de memória, o esquecimento de nomes, os chistes, as representações oníricas ou sonhos e os sintomas.

Conforme referências anteriores, o inconsciente está estreitamente articulado com o conceito de pulsão, que por vez também é dual: vida e morte. Freud (1920) aponta que há no ser humano duas pulsões fundamentais: Eros e Tanatus. Eros é a pulsão de vida, pulsão sexual, capaz de estabelecer laços e o desejo de manutenção e prolongamento de tudo que possa representar possibilidade de felicidade. Enquanto, Tanatus é a pulsão de morte, que nutre o desejo de romper laços com tudo o que manifesta vida, a pulsão de morte orienta para o gozo do sintoma.

(24)

24 1.3 Narcisismo e Desamparo no sujeito Moderno

Para entender o sujeito do inconsciente é importante que se discutam algumas categorias de sua constituição subjetiva, como o narcisismo e o desamparo. Inicialmente, ao tratar do termo “narcisismo”, Freud (1914) o faz no mesmo sentido que o já usado por outros teóricos e clínicos como Paul Näcke. Refere-se à dimensão ao auto erotismo, às perversões sexuais e à outras perturbações, inclusive de estruturas psicóticas. A partir de sua escuta clínica, entretanto, bem como o avanço da teoria psicanalítica, Freud postula que o narcisismo numa certa medida está presente em todas as pessoas. “O narcisismo neste sentido não seria uma perversão, mas o complemento libidinal do egoísmo do instinto de auto preservação, que, em certa medida, pode ser justificadamente atribuído a toda criatura viva.” (FREUD, 1914, p. 81). É aquilo a que se chama de narcisismo normal.

O narcisismo manifesta-se no momento em que toda libido está voltada para o próprio eu. Segundo Mogradi e Herzog (2006), este instante de concentração libidinal deve ser o ponto de partida para o investimento de interesse em outros sujeitos e objetos. De acordo com as autoras, é “somente através da passagem pelo narcisismo que o eu, com a libido agrupada em torno de si, pode investir nas representações dos objetos” (2006, p. 128). Dessa forma, o investimento libidinal original do sujeito é direcionado para novos investimentos, saindo do universo auto referencial para o reconhecimento de um universo externo. Vale ressaltar que embora Freud (1914) considere o narcisismo um elemento fundamental na constituição do sujeito, sobretudo no processo de socialização, não o idealiza como uma etapa, possível de ser superada, dentro de um desenvolvimento cronológico, pois suas manifestações atingem toda vida libidinal. Ou seja, é um elemento que vai se apresentar na sua mais genuína forma, como amor a si mesmo, durante toda a vida do sujeito.

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25 As escolhas amorosas de base narcísica indicam a relevância do narcisismo na constituição subjetiva, “podemos mesmo dizer que estas escolhas colocam o narcisismo como ponto de balizamento de um modo de subjetivação” (MOGRADI & HERZOG, 2006, p. 131). Nesse sentido, a relação do sujeito com o outro passa a carregar a marca permanente de um narcisismo que é, ele próprio, a condição e possibilidade desta relação. Segundo Freud, "há um investimento libidinal original do eu, parte do qual é posteriormente transmitido a objetos" (1914, p. 83).

Outro elemento, importante da discussão em torno do narcisismo, diz respeito à relação do sujeito com seus progenitores. Considera-se, a partir da psicanálise, que a relação paterno/materna traz a tona uma outra categoria que atravessa o narcisismo e de, alguma forma, lhe faz sombra durante toda a existência do sujeito: o desamparo.

Segundo Freud (1930), o ser humano está condenado à cultura, consequentemente o desamparo é também condição à qual todo humano está submetido. Caso não seja acolhido pelo outro, por um grupo social, não tem condição de sobrevivência. Devido a sua prematuridade, nasce desprovido de capacidade de manutenção da própria vida. Então o desamparo é essa condição de dependência real e absoluta do outro. A dependência biológica de outro sujeito cria no “pequeno humano” uma dependência afetiva, ou psicológica, que também é reeditada durante toda sua existência. Desse modo, o desamparo, é uma questão que perpassa a vida do sujeito desde o nascimento até a sua morte

Para a psicanálise estar a mercê do outro sujeito, condição imposta pelo desamparo, faz do humano um ser social. Pensar o sujeito moderno, a partir desses pressupostos, exige esclarecimentos acerca da constituição e da manutenção desse sujeito na cultura. Segundo Birman (1997), é impossível pensar o sujeito fora do campo da cultura, porque a cultura é o outro no qual o sujeito se constitui. No discurso de Freud (1930) há uma tensão permanente entre o sujeito desejante, em busca do gozo pleno, e os limites estabelecidos pela cultura que, por sua vez, instaura a impossibilidade de alcance do gozo. Logo, a inserção e manutenção do sujeito na cultura são permeadas pelo conflito entre vontade de liberdade e dependência da cultura.

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26 mente o texto elaborado por Freud em 1930, onde a representação cultural era algo que cerceava o indivíduo, impedindo a satisfação das pulsões sexuais e agressivas. Hoje, ao contrario, nota-se uma sociedade que valoriza e estimula a cultura da liberdade individual como valor absoluto e hegemônico, estimulando assim, a busca de prazer constante, o que segundo Mogradi e Herzog (2006) com frequência, e paradoxalmente, resulta em uma experiência de insuficiência e fracasso. Tal situação, em termos psíquicos, comparece como excesso pulsional, e é vivido na forma de angústia.

Se a inquietude de Freud em relação ao desamparo concentrava-se especialmente nas conseqüências subjetivas das restrições à satisfação da pulsão, impostas pela cultura, a preocupação hoje, em função das novas formas de subjetivação, inclui também os efeitos psíquicos da imposição de uma busca de prazer ilimitado, tendo em vista a fragilidade de referências simbólicas na cultura, que possam circunscrever o campo do desejo. Assim, podemos entender que o sofrimento psíquico pode ser motivado mais pela exigência de prazer do que pela restrição ao prazer.

De acordo com Garcia (2004), essa idéia enganosa de prazer absoluto e irrestrito, de possibilidade do livre exercício do desejo, indica que o sujeito contemporâneo não se dá conta de sua submissão às imposições sociais, que mais apontam para um controle disciplinar do que para a liberdade plena.

O desamparo, na forma como é entendido pela psicanálise, apresenta duas faces, por um lado a necessidade de ser acolhido, protegido, amado e cuidado e, por outro o desamparo caracteriza-se justamente pelo fato de estar a mercê de um outro desejante. Segundo Garcia:

falta de amparo, ou ausência de sustentação, só se configura como desamparo, na medida em que evoca no sujeito a experiência subjetiva de estar submetido a uma intensidade pulsional excessiva, que o deixa à mercê do outro; isto é, assujeitado aos caprichos do outro, que pode ou não auxiliá-lo a lidar com esse estado emocional. Nossa suposição é de que o sentir-se agudamente desamparado apresenta-se com intensidade na situação de estar à deriva, sem amarras, errante, que caracteriza a experiência contemporânea. (2004, p. 8).

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27 Birman (2009) afirma que na versão final do discurso freudiano sobre o sujeito, esse jamais sai da sua posição de desamparo primordial. Porém, pensar na irredutibilidade dessa posição, não sugere a compreensão de que o sujeito exista necessariamente tomado por perturbações, sejam elas da ordem da neurose, da psicose ou da perversão. Mas, implica sim em reconhecer que o sujeito deve fazer um trabalho constante de gestão dessa posição, justamente porque o desamparo, originário da subjetividade, é incurável. “O registro psíquico do desamparo é algo de ordem originária, marcando a subjetividade humana para todo sempre de maneira indelével e insofismável” (p. 37). E conclui que sujeito é desamparado por vocação e por condição humana.

Esse desamparo é que, segundo Freud (1930), instaura o mal-estar na modernidade, pois o sujeito está marcado por sua finitude, assinalado por sua incapacidade de sustentação da própria vida, submetido à imprevisibilidade e, sobretudo, subordinado à cultura. Assim, o desamparo indica o modo como a pessoa se movimenta no mundo, comparece nas relações com os outros, com o trabalho, com as coisas e consigo mesma. A gestão, e não a cura, do desamparo provoca e compromete o sujeito em constituir destinos, tanto eróticos quanto sublimatórios para as pulsões, e sua gestão implica e se desdobra nos registros ético e político.

1.4 Desejo, sofrimento e sintoma

O desejo é categoria central na obra de Freud. Como mobilizador da busca de uma experiência primeira, para a psicanálise, nunca mais alcançável. O desejo será aqui brevemente apresentado a fim de se propor uma compreensão da relação entre inconsciente, desejo e sofrimento psíquico com suas manifestações sintomáticas.

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28 O Desejo, tal como é concebido pela teoria psicanalítica, diferencia-se da necessidade. A necessidade está vinculada aos processos biológicos de auto-conservação e pode ser satisfeita com um objeto adequado. O desejo, no entanto, é de natureza psíquica, logo, é da ordem do simbólico. O enigmático desejo, na maioria das vezes, aparece mascarado na forma de sintomas, sonhos e fantasias, que são rudimentos de percepção pelos quais uma experiência de prazer ou desprazer se inscreveu no inconsciente. Segundo Scotti (2005), quando se procura na realidade um objeto para satisfação do desejo, busca-se a partir desses traços inscritos no inconsciente, algo que remete à falta que impede o gozo pleno. Isto determina a dimensão do impossível para a psicanálise; um impossível lógico, já que nunca mais um indivíduo repetirá a experiência primeira do gozo, que busca constantemente.

Almeida (1993) diz que, para a psicanálise, o desejo busca a primeira experiência de satisfação e faz dessa, seu modelo. A origem da experiência está “no reinvestimento psíquico de um traço mnêmico de satisfação ligado à identificação de uma excitação pulsional” (p. 35). Destaca ainda que o reinvestimento psíquico de um traço mnêmico de satisfação é sempre dinâmico, e que esse dinamismo é a essência do desejo.

A psicanálise retira o desejo do campo moral, onde ficava obnubilado por juízos de valor que impediam uma compreensão de sua potencialidade existencial. Ao atribuir um caráter ontológico ao desejo – o ser humano é um ser desejante -, a psicanálise coloca-se não apenas como método clínico, mas como base epistemológica a partir da qual é possível construir inúmeras contribuições para se repensar a condição humana.

De acordo com Gerpe (1998), uma das principais contribuições trazidas pela Psicanálise foi a possibilidade de questionamento do desejo humano. A partir da teoria e da prática analíticas, o desejo passou a constituir a marca da singularidade em cada sujeito.

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29 Se a realização plena do desejo coloca-se na ordem da impossibilidade, instaura-se, também, a condição dessa não possibilidade no sujeito. Tal situação é o sofrimento. A impossibilidade de realização do desejo está diretamente relacionada a perda do objeto desejado e à experiência de gozo proporcionada por esse objeto. Considerando que o ser humano é um ser de desejo e tal não é plenamente realizável, instaurando o sofrimento, o ser humano é, desta forma, um ser de sofrimento.

O sofrimento psíquico é entendido como um conjunto de condições psicológicas, ocasionadas por situações reais ou não, que gera mal-estar, este, por sua vez, ultrapassa o desconforto de ordem fisiológica, sendo seus principais sintomas de ordem emocional e relacional. Segundo Dunker (2004), o sofrimento psíquico foi tematizado de diversas maneiras pela psicanálise, podendo ser entendido em suas expressões mais comuns e frequentes como sintomas, inibições, angústias, distúrbios de caráter e até mesmo compulsões à repetição.

Para Freud (1930), o sofrimento acompanha o sujeito desde seu nascimento perdurando por toda sua existência, apresentando diferenças substanciais em cada fase do desenvolvimento. Há uma busca incessante, ou um desejo inerente, que faz com que o sujeito se mova pelo principio do prazer, dessa forma, afasta-se ou foge de tudo que é fonte de desprazer.

Surge, então, uma tendência a isolar tudo que pode tornar-se fonte de tal desprazer, a lançá-lo para fora e a criar um puro ego em busca de prazer, que sofre o confronto

de um ‘exterior’ estranho e ameaçador. As fronteiras desse primitivo ego em busca

de prazer não podem fugir de uma retificação através da experiência. Entretanto algumas das coisas difíceis de ser abandonadas, por proporcionarem prazer, são, não ego, mas objeto, e certos sofrimento que se procura extirpar mostram-se inseparáveis do ego, por causa de sua origem interna (p. 76).

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30 não há possibilidade alguma de ele ser executado; todas as normas do universo são-lhe contrária. Ficamos inclinados a dizer de que intenção de que o homem seja feliz não se acha incluída no plano da Criação. O que chamamos de felicidade no sentido mais restrito provem da satisfação de necessidades represadas em alto grau, sendo por sua natureza, possível apenas como uma manifestação episódica. (1930, p. 84). Freud aponta que a impossibilidade de felicidade plena está diretamente vinculada a busca de viver em sociedade. Na vida em comunidade, com a inserção na cultura o sujeito abre mão da satisfação pulsional, e é a isso que Freud denomina mal-estar, que é uma tensão constante entre a exigência da cultura e o desejo pulsional. “... Uma pessoa torna-se neurótica porque não pode tolerar a frustração que a sociedade lhe impõe, a serviço de seus ideais culturais...” (1930, p. 94). Essa fonte social de sofrimento é contra a qual mais relutamos, pois reconhecemos que as estruturas criadas por nós como forma de proteção e organização é também o que nos aprisiona, “nossa civilização é em grande parte responsável por nossa desgraça” (FREUD, 1930, p. 93). É indiscutível, no entanto, que todas as nossas buscas de proteção contra o sofrimento fazem parte dessa civilização. A neurose se dá justamente pela frustração imposta ao desejo pelas exigências culturais de nossa civilização, uma vez que o sujeito é constituído no conflito entre a pulsão e a inserção na cultura. Freud nos indaga então se podemos nos livrar do sofrimento, e ser plenamente felizes, voltando às formas primitivas de vida onde haveria uma redução ou abolição das exigências culturais? O mesmo Freud aponta que as tentativas de fuga da civilidade pelo isolamento social fracassaram, e que as leituras de que organizações sociais mais simples aparentavam mais felicidade foram equivocadas.

Birmam (1997) afirma que a “cultura é o outro do sujeito sem a qual é impossível pensar nas condições de possibilidades para a constituição do sujeito” (p. 9). Dessa forma, essa relação, sujeito-cultura, sempre foi e sempre será marcada por esse mal estar, pois a própria inserção do sujeito na cultura é permeada por conflitos e marcada pela impossibilidade de resolução total e absoluta destes conflitos. Não obstante, esse impasse constante entre felicidade e sofrimento, ou seja, o ser humano busca de todas as formas possíveis a felicidade.

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31 primeira, aprendemos a extrair sentido do nosso sofrimento; segunda, criamos satisfações substitutas para aliviar a dor; e por fim, a mais perigosa das medidas, que é o consumo de substâncias que nos tornam insensíveis ao sofrimento. Aqui podemos incluir drogas lícitas e ilícitas, que de alguma forma atuam sobre o gozo do sintoma, este sem dúvida é o mais grosseiro, mas também o mais eficaz dos métodos de fuga do sofrimento, no sentido de que seu efeito, embora breve, seja imediato. Podemos, assim, entender também a dependência e o vício causados pelo uso dessas substâncias.

O sofrimento, ou a infelicidade, parece ser uma experiência comum em contra posição à felicidade. Para a psicanálise, o sofrimento nos ameaça em três dimensões: do nosso próprio corpo, do mundo externo e dos relacionamentos com os outros. Freud acentua ainda que os sofrimentos advindos dos relacionamentos são sempre mais penosos; e uma das estratégias mais comuns e imediatas para fugir desse sofrimento é o “isolamento voluntário”.

A condição de sofrimento do ser humano faz com que ele transforme o desejo de busca incessante do princípio do prazer no “mais modesto” princípio de realidade. Então acostuma-se a moderar as reivindicações de felicidade, chegando a considerar-se feliz apenas por que escapou ou sobreviveu ao sofrimento. O sujeito ocupa-se tanto em evitar o sofrimento que a felicidade é colocada em segundo plano.

Freud (1930) conclui que: “em ultima análise, todo sofrimento nada mais é do que sensação; só existe na medida em que o sentimos, e só o sentimos como consequência de certos modos pelos quais nosso organismo está regulado” (p. 85). Entende-se então que o sofrimento é antes de tudo uma realidade psíquica que incide no real do corpo, para a qual se despende uma carga libidinal significativa.

Toda tentativa de evitar sofrimento, segundo o fundador da psicanálise, em sua totalidade é frustrada. Seja esse tentame por meio de intoxicação, satisfação dos impulsos instintivos, aniquilamento ou controle das pulsões ou por meio da sofisticada técnica de deslocamento da libido. O sofrimento é condição existencial do sujeito.

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32 Um sintoma é um sinal e substituto de uma satisfação pulsional que permaneceu em estado jacente; é uma conseqüência do processo de recalque. O Recalque se processa a partir do ego quando este – pode ser ordem do superego – se recusa a associar-se com uma catexia pulsional que foi provocada no id. O ego é capaz por meio de recalque, de conservar a idéia que é o veiculo do impulso repreensível a partir do tornar-se consciente. (p. 95)

O sintoma existe então como uma formação inconsciente e é destinada a satisfação de uma pulsão.

Em psicanálise, sintoma tem uma diferença conceitual importante daquilo que é entendimento da medicina e das demais áreas da saúde. Quinet (2003) diz que em psicanálise o sintoma não é verdade sobre a doença, pois não aponta necessariamente para algo que seja da ordem do biológico, está sim relacionado com algo que é próprio da subjetividade do sujeito, logo é da ordem do simbólico. “o sintoma, como um derivado do recalcado, é uma formação do inconsciente, ou seja, uma formação substitutiva do significante recalcado, portanto uma metáfora” (p. 48). Não se pode negar, no entanto, que estes sintomas afetam o real do corpo, que sofre e amarga suas dores. O que se quer dizer é que pode não haver uma condição metabólica que justifique determinadas doenças, mas sim uma condição subjetiva.

Há um paradoxo no sintoma que é necessário considerar. Tendo presente as idéias de Freud (1925), a partir das quais afirma-se que ao mesmo tempo em que o sintoma é uma atividade de gozo pulsional é também causador de desprazer, ou seja, sofrimento. Pode-se concluir que o sintoma só se instala por que de alguma forma, predominantemente de modo inconsciente, traz algum beneficio ao sujeito. Porém, aquilo que se pretendia como prazer, em função do processo de repressão, torna-se manifestação de desprazer.

Agrega-se a isso a contribuição de Lacan (1953), que entende o sintoma como sendo uma palavra que é sempre dirigida ao outro. Dessa forma, pode-se compreender que muitas vezes o portador da mensagem do sintoma a ignora tanto quanto o seu destinatário. A teoria lacaniana aponta que o sintoma é um:

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33 O sintoma de alguma forma busca o reconhecimento do outro e por isso é persistente, mas ao mesmo tempo ele não é claro nem para quem o apresenta. Tampouco para quem o percebe em outro sujeito.

Birman (2009) afirma que embora na atualidade haja novas formas de subjetivação, as ciências da saúde de modo geral, e a psiquiatria de modo específico, ainda não conseguem perceber essa peculiaridade. Por isso, na maioria das vezes, tratam o sintoma como ele se apresenta em manifestações comportamentais, sem considerar as questões de ordem subjetivas. Corre-se então o risco de fazer uma escuta do sintoma, tratar o sintoma e não necessariamente o sujeito.

Faz-se necessário entender que a escuta desse sofrimento, de modo particular a que se faz no âmbito da análise, tem um papel fundamental nos processos humanos e, sobretudo, nos processos de educação. Particularmente, na educação superior onde, de modo geral, o foco está nas escolhas profissionais, decisões de vida, e, por tradição, predomina o papel da racionalidade e do cientificismo metódico, minimizando-se a presença e a força das emoções, afetos, sentimentos e energias não conscientes, a escuta se coloca como exigência e urgência

Segundo Almeida (1993), a afetividade e o desejo são temas aos quais se dá pouca atenção em educação, tampouco são teorizados acerca de sua relação com a aprendizagem. A autora destaca ainda que essas dimensões são ignoradas, porque muitas pessoas que se ocupam em pensar a educação entendem a aprendizagem como um processo meramente consciente produto da inteligência. No entanto, há pesquisadores, estudiosos, autores de idéias relevantes, que pensaram o desenvolvimento intelectual e cognitivo (FREUD 1937, PIAGET 1954, WALLON 1957 e VYGOTSKY 1929). Embora de forma distinta, consideraram o afeto uma dimensão importante e necessária para o processo de construção e aquisição do conhecimento.

Então, insiste Almeida (1993), se existe uma ligação dos afetos e emoções com a inteligência e vice versa, e se ensino aprendizagem acontece num processo de relação e de vínculo entre professor e estudante, “necessariamente essa relação terá que levar em consideração, no seu modus operandi, toda variada gama de expressões dos afetos e das

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34 serão capazes de integrar elementos do conjunto simbólico, dos afetos e emoções em suas práticas. Tal postura, por considerar os estudantes como sujeitos em seu processo de aprender, contribui com a mobilização do desejo, tanto do aluno como do professor.

Assim, a consideração e integração da afetividade, no âmbito das práticas educativas, possibilita uma infinidade de interações humanas no espaço e tempo das relações de ensino aprendizagem. Espaço este povoado por subjetividades e também por objetos, proporcionando relações inter subjetivas e com objetos de conhecimento.

Na aprendizagem, há o sujeito aprendiz que busca no Outro a possibilidade de conhecer, e o sujeito que ensina, por que lhe foi conferida culturalmente essa autoridade. Na presença desses sujeitos, comparecem distintas subjetividades com manifestações conscientes e inconscientes.

Almeida (1993) defende que é no campo das relações estabelecidas entre professor e aprendiz que se criam condições para a aprendizagem. Decorre daí que é necessário que este sujeito aprendiz seja reconhecido nesta relação, porém, não pode supor que simplesmente os encontros de subjetividades sejam suficientes para desencadear o processo de aprendizagem. Existem funções específicas nesta relação que precisam ser desempenhadas. O estudante necessita que o professor, de alguma forma, alimente seu desejo de aprender e lhe ofereça a possibilidade de inserção na cultura. Tanto professor quanto estudantes têm funções no processo educativo, e nem um e nem outro pode abdicar do cumprimento desses papeis, caso contrário não há processo educativo.

O que parece-nos essencial na relação ensinar-aprender é que se reconheça a afetividade do aluno como uma dimensão inseparável, indissociável da inteligência, promotora de desenvolvimento, e que o educador tenha, ele mesmo clareza de sua própria afetividade enquanto educador, considerado nas funções de professor ou de pai, ou seja, de seu estatuto de adulto em geral (ALMEIDA, 1993, p. 41).

Aliar subjetividade à prática docente deveras não é uma tarefa simples, via de regra, o professor não tem uma formação acadêmico profissional que se preocupe em lhe preparar para o encontro com subjetividades, tampouco, lhe possibilita reconhecer a sua própria.

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35 aprendiz, convocando-o a posicionar-se e a constituir-se a partir da Lei, a educação se coloca também como um dispositivo de estruturação psíquica, pois auxilia a construção de ideais simbólicos.

1.5 A Universidade como espaço da expressão do sujeito

Pensar a educação a partir da universidade demanda uma reflexão outra, por lidar com um espaço tempo diferenciado no acesso e interferência à subjetividade. Ao propor-se um ideal, a sociedade estabelece condições, estruturas e meios para buscar seu intento. A sociedade moderna, com seu ideal narcísico da racionalidade científica, estabelece a educação como meio de formação de seus indivíduos a fim de alcançarem a meta proposta. A família e a escola são as estruturas, institucionalizadas, para que a educação aconteça. A reflexão psicanalítica, ao problematizar o ideal narcísico da modernidade. Na obra intitulada Mal-Estar

na Civilização, Freud (1930) aponta questões pertinentes para se pensar o espaço escolar e sua

finalidade. Mais do que oferecer ferramentas da racionalidade para que os estudantes possam atuar no sonho de sociedade pretendido, a escola é um espaço e um tempo de constituição do sujeito. A universidade, embora se entenda como um espaço educador de adultos, não se furta a essa tarefa, comparecendo, como suplência do papel paterno, enquanto lugar de expressão do sujeito em seu desenvolvimento permanente.

Um espaço educativo, ao considerar em seu processo questões subjetivas, busca compreender elementos próprios da constituição do sujeito. Nunes (2009) afirma que o inconsciente atravessa todas as ações do sujeito, nada é casual, nem mesmo um esquecimento, uma troca de palavra ou um sonho, por isso não se pode pensar o desenvolvimento na vida adulta, como é o caso dos universitários, sem considerar o percurso do desenvolvimento psicossexual, da mesma forma, não se pode ignorar a presença e força do inconsciente neste processo.

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36 subjetivamente, no destino do desejo de saber do aluno” (p. 7). E ainda que a construção intelectual dependa da sublimação, da idealização e da identificação com o professor. Para que o professor seja cônscio desse processo é importante que considere a constituição do sujeito e reconheça que esse mesmo sujeito é sempre inacabado.

Para isso, de acordo com Almeida (2002), é preciso que o professor ressignifique sua prática pedagógica para assim transformar o cotidiano das relações intersubjetivas professor-aluno e continuamente interrogar-se

sobre o desejo de saber do aluno em sua relação com o desejo de ensinar do professor, implica na compreensão do sujeito humano como um ser de linguagem, efeito dos significantes do Outro e da cultura. Esta concepção permite uma leitura das relações entre a psicanálise e a educação tomando como campo operatório o assujeitamento de ambas às leis do funcionamento da ordem simbólica, ou seja, às leis da linguagem, da palavra, enquanto condição de produção de sujeitos. (p. 3) Ao pensar a constituição do sujeito Freud (1901) propõe a introdução de elementos que faz com que sua teoria seja inicialmente bastante contestada e polêmica, um desses elementos é sem dúvida, a noção de sexualidade infantil, que em princípio se apresenta com um entendimento bastante pulsional e fisiológico, mas com avançar de sua pesquisa passa a ser compreendida como uma energia que perpassa todas as dimensões e acontecimentos da vida do sujeito. A sexualidade infantil é então entendida pela psicanálise de forma distinta da sexualidade adulta, não está voltada o ato sexual e de reprodução, mas são experiências prazerosas vividas pelo corpo e muitas vezes geradas pelo próprio corpo. A libido, energia das pulsões sexuais, é que organiza o desenvolvimento do sujeito. Segundo Dunker (2007), o desenvolvimento do sujeito se dá por um processo lógico que acompanha a criança desde seu nascimento.

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Tabela 1- Organização dos Núcleos de Significação

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