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UNIJUÍ - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL CAMILA CECHET O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA E SUA APLICAÇÃO

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GRANDE DO SUL

CAMILA CECHET

O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA E SUA APLICAÇÃO

Ijuí (RS) 2013

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CAMILA CECHET

O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA E SUA APLICAÇÃO

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso - TC.

UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS- Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientador: Msc. Fernando Antônio Sodré de Oliveira

Ijuí (RS) 2013

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Dedico este trabalho a todos que de alguma forma contribuíram e me auxiliaram ao logo da minha jornada acadêmica, principalmente à minha família, pelo incentivo, apoio e confiança em mim depositados.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, acima de tudo, pela vida, força e coragem.

À minha família pela compreensão e auxílio nos momentos de dificuldade.

Ao meu orientador e a todos que colaboraram de uma maneira ou outra durante a trajetória de construção deste trabalho, meu muito obrigada!

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"Não há nada mais relevante para a vida social que a formação do sentimento da justiça." Rui Barbosa

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O presente trabalho de conclusão de curso faz uma análise acerca do princípio da insignificância como causa excludente de tipicidade no âmbito do Direito Penal, a fim de proporcionar uma investigação referente às possibilidades de sua aplicação. Busca esclarecimento quanto aos requisitos necessários para que se possa recorrer ao princípio, bem como em que caso cabe sua aplicação. Aborda o fato da grande demanda de processos que dão origem a gastos muito maiores do que o prejuízo causado por condutas cujo valor da ação ou do resultado é irrelevante, e que se quer deveriam movimentar e ocupar o judiciário, bem como quando qualquer incidência das sanções penais seria descabida ou exagerada. Analisa, por fim, as hipóteses já reconhecidas pelo STF, assim como o entendimento dos demais Tribunais e o lecionado pelos doutrinadores, tendo como parâmetro o contexto geral da sociedade brasileira. Finaliza concluindo que apesar da grande demanda em pedidos para que se aplique o princípio da insignificância, o infrator de hoje não é mais o mesmo de anos atrás, isso porque comete crimes de pouca relevância, mas causa perigo a sociedade, faz uso da força e ameaça, o que acaba excluindo a possibilidade de ser considerada atípica tal conduta.

Palavras-Chave: Princípio da Insignificância. Excludentes de Tipicidade. Valoração da conduta do agente. Ação ou resultado irrelevante.

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This study course completion is a review about the principle of insignificance as exclusionary because typicality under the Criminal Law, in order to provide an investigation concerning possible applications. Seeking clarification on the necessary requirements so that we can apply the principle, and that if it fits your application. Addresses the fact of the high demand for processes that give rise to much higher spending than the harm caused by conduct whose share value or result is irrelevant, and that they should want to move and occupy the judiciary, as well as any impact of sanctions criminal would be misplaced or exaggerated. Analyzes, finally, hypotheses have been recognized by the Supreme Court as well as the understanding of other Courts and taught by scholars, having as parameter the general context of Brazilian society. Ends concluding that despite the great demand in order to apply the principle of insignificance, the violator of today is no longer the same years ago, because it commits crimes of little relevance, but hazardous society, makes use of force and threat, which ends up excluding the possibility of such conduct be considered atypical.

Keywords: Principle of Insignificance. Exclusive typicality. Valuation of the agent's conduct. Action or result irrelevant.

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INTRODUÇÃO ... 08

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ... 11

1.1 O processo penal e o direito de punir ... 12

1.2 Princípios no direito penal ... 15

1.3 Causas excludentes da tipicidade ... 17

2 APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA ... 20

2.1 Princípio da insignificância: conceito ... 21

2.2 O princípio da insignificância como causa excludente da tipicidade ... 24

2.3 Critérios de reconhecimento e classificação de condutas penalmente insignificantes .. 26

2.4 A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e o princípio da insignificância ... 29

CONCLUSÃO ... 36

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta um estudo acerca da aplicação do princípio da insignificância como causa excludente da tipicidade no âmbito do Direito Penal, visando o esclarecimento de seu conteúdo, com o objetivo de realizar uma pesquisa para melhor entender os requisitos necessários e o que leva ou não a sua aplicação, pois é notório que grande parte dos processos que ocupam prateleiras em nossos Tribunais no Brasil hoje, fazem parte do grupo de ações oriundas de delitos pequenos, ínfimos, insignificantes perante o custo e o tempo perdido em função destes.

O presente estudo se faz necessário pelo fato de buscar saber se, ainda hoje, magistrados não recorrem ao princípio da insignificância quando do julgamento de processos, e acabam assim aplicando penas excessivas que ultrapassam o resultado causado pela ação do acusado ou da lesão sofrida pela vítima.

De outro lado, em decorrência da não utilização correta do princípio da insignificância, quando necessária, a prestação jurisdicional do Estado torna-se morosa em razão da grande demanda existente, o que por sua vez gera insatisfação da coletividade, principalmente com relação ao cumprimento de prazos e, mais ainda com decisões que por diversas vezes não atingem seu objetivo principal, mas o contrário acaba por desviar indivíduos para o lado da delinqüência, isso porque uma sanção imposta erroneamente atinge tão somente a causa aparente e não a real, ou seja, condena o agente pelo fato sem levar em conta as circunstâncias.

Para a efetivação deste trabalho foi necessária a realização de pesquisa bibliográfica e por meio eletrônico, com intuito de desenvolver a coleta de informações e permitir um aprofundamento no estudo do princípio da insignificância como uma das causas excludentes

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da tipicidade, bem como analisar os requisitos e os fundamentos elencados pelo Supremo Tribunal Federal para sua possível aplicação, para assim revelar a importância tanto para o acusado como para o judiciário de sua utilização para solução de demandas oriundas de condutas cujo valor da ação ou do resultado seria irrelevante frente à movimentação do judiciário e das pessoas envolvidas, bem como pelo fato da aplicação de sanções penais descabidas.

Inicialmente, no primeiro capítulo, foi feita uma abordagem genérica acerca dos princípios gerais tidos como alicerces do Direito Penal, os quais dão sentido às normas e orientam o legislador, bem como permitem à doutrina não apenas interpretar e justificar, mas efetivamente compreender os problemas do Direito e proceder com segurança a uma solução.

Os princípios podem estar positivados em lei ou não, fato este que deu ensejo ao estudo de uma forma mais aprofundada quanto ao princípio da insignificância, seguindo uma análise acerca das causas excludentes de tipicidade como formas de limitar a atuação jurisdicional do Estado.

No segundo capítulo é feita uma análise mais aprofundada sobre o princípio da insignificância como causa excludente da tipicidade e requisitos necessários para sua aplicação.

Também são analisados critérios de reconhecimento e classificação de condutas penalmente insignificantes e, ao final, uma explanação da posição dos Tribunais quanto à aplicação do princípio da insignificância em diferentes crimes, considerando que os fundamentos e critérios expostos são considerados bases para a possível aplicação de determinadas medidas.

A partir desse estudo, verifica-se que o princípio da insignificância como causa excludente da tipicidade atua como uma das alternativas corretas e já reconhecidas para solucionar o problema do judiciário com o excessivo número de processos.

Da mesma forma, atua também como forma de pacificar o problema causado pelo próprio judiciário quando da aplicação de penas excessivas ou descabidas. Isso porque, evita que o Estado aplique ao acusado um sofrimento inútil que não agregará em nada,

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considerando que uma boa parte dos processos que ocupam as prateleiras dos tribunais hoje é de ações ínfimas.

Assim, pretende-se demonstrar a necessidade da utilização do princípio da insignificância como uma alternativa a solução pacífica de conflitos e delitos penal e socialmente irrelevantes, eis que quando nos referimos ao Direito Penal, estamos cuidando de delitos cometidos por indivíduos, assim o Direito, na forma de prestação jurisdicional do Estado, deve ser utilizado somente como ultima ratio.

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1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Há muitos anos se fala na necessidade de se eliminar as ninharias do âmbito do ilícito penal, haja vista a sobrecarga do judiciário. Todavia, pouco se fez ou tem sido feito acerca disso, pelo contrário, o problema vem se agravando significativamente, seja por parte da sociedade que recorre ao judiciário buscando a solução de seus problemas, seja pela intervenção pública que cumpre o papel da tutela de bens juridicamente protegidos.

Sob essa ótica é que se passou a dar ênfase ao estudo e aplicação do princípio da insignificância nos casos em que já houve instauração de processo criminal, com o objetivo de justamente desafogar o judiciário, considerando a desnecessidade de se recorrer ao poder máximo para tutelar um bem que se quer fora lesado significativamente, assim como quando a conduta do acusado sequer mereça ser tipificada ou quando o resultado produzido seja irrelevante.

É nesse sentido que o princípio da insignificância vem ganhando cada vez mais valor e, apesar de não estar previsto em lei, é freqüentemente usado pelos tribunais, inclusive pela Suprema Corte, a qual consolidou seus fundamentos, inclusive elegeu requisitos necessários para sua aplicação.

De outra banda, acerca do conceito atribuído a tal princípio, nota-se que dentre os diversos doutrinadores e estudiosos do tema, o conceito é amplo e cada um expressa seu entendimento conforme lhe convir, contudo, a finalidade presente em todos eles é a mesma, ou seja, a incidência do princípio da insignificância tem o condão de atenuar ou excluir a tipicidade do fato socialmente irrelevante.

Portanto, como já reconhecia Roxin (1981), pioneiro no estudo do princípio, a insignificância não era característica do tipo penal, mas sim um auxiliar para sua interpretação, com o objetivo de limitar o teor literal do tipo delitivo, excluindo do âmbito penal condutas formalmente típicas, mas socialmente admissíveis.

Dessa forma, o princípio da insignificância também tem a função de limitador da atuação jurisdicional do Estado, eis que tem como objetivo impedir que se condene um

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indivíduo ao cumprimento de uma pena que gere conseqüências mais graves do que as próprias oriundas de sua ação.

Portanto, é o que se pretende demonstrar no presente estudo, destacando os principais conceitos, requisitos e a real aplicabilidade deste princípio como excludente da tipicidade, com base nos entendimentos doutrinários e jurisprudenciais acerca da matéria.

1.1 O processo penal e o direito de punir

Diante da insatisfação de algum indivíduo com relação a alguma pretensão que não foi, ou que de algum modo não pode ser satisfeita, a Constituição Federal Brasileira deu ao Estado o poder/dever de desempenhar a função jurisdicional, em outras palavras, o poder ou direito de julgar, em cooperação com as partes envolvidas na lide.

Assim, para que tal poder/dever pudesse ser desempenhado com eficácia, eficiência e legalidade, também foram estabelecidas normas adequadas para o exercício efetivo da jurisdição, e “a essa soma de atividades em cooperação e a soma de poderes, faculdades, deveres, ônus e sujeições que impulsionam essa atividade dá-se o nome de processo” (CINTRA, GRINOVER, DINAMARCO, 2011, p. 46).

A partir disso é que surge o então Direito Processual, que nada mais é do que o conjunto de normas e princípios que regem tal método de trabalho, ou seja, o exercício conjunto da jurisdição pelo Estado, na forma de juiz, da ação pelo demandante e da defesa pelo demandado, como ensina Cintra, Grinover e Dinamarco (2011).

Diferente do direito material, o direito processual cuida das relações entre os sujeitos processuais, a posição que cada um adquire no processo e a forma pela qual os atos devem se proceder.

Trazendo a definição de direito processual para o campo do direito penal, apenas acrescentamos que é o complexo de normas e princípios que regem a formação de lides no âmbito do direito penal através da aplicação das normas previstas pelo próprio direito penal.

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É o que ensina Fernando Capez (2011, p. 43) “Direito Processual Penal é o conjunto de princípios e normas que disciplinam a composição das lides penais, por meio da aplicação do Direito Penal objetivo.”

Dessa forma, nota-se que o Estado é o detentor exclusivo do poder soberano que lhe dá o direito de punir, ou então poder-dever de punir, denominado jus puniendi. Esse direito que o Estado tem de punir é impessoal, eis não se dirige exclusivamente contra um único indivíduo, mas sim se dirige à coletividade como um todo.

Trata-se, dessa forma, um pode de punir qualquer um que venha a cometer/praticar algum fato definido em lei como infração penal, o que dará início a lide, sendo de um lado o Estado com a pretensão de punir o transgressor, e do outro o próprio transgressor com intuito de defender-se oferecendo resistência à pretensão. Assim, caracterizada a lide, esta será solucionada pela atuação jurisdicional.

É através da formação da lide que o Estado na forma de juiz, declarará a vontade do ordenamento jurídico no caso concreto, decidindo se o infrator cometeu de fato infração penal suscetível de punição ou não e, no primeiro caso, qual será a proporção da punição.

Assim explica Capez (2011, p. 44):

Tal atuação é a tarefa por que o Estado, substituindo as partes em litígio, através de seus órgãos jurisdicionais, põe fim ai conflito de interesses, declarando a vontade do ordenamento jurídico ao caso concreto. Assim, o Estado-Juiz, no caso da lide penal, deverá dizer se o direito de punir procede ou não, e, no primeiro caso, em que intensidade pode ser satisfeito.

Dessa forma, a prestação jurisdicional é indispensável para a solução dos conflitos no âmbito penal, eis que no nosso ordenamento jurídico não se admite a aplicação de penas por meio da via administrativa, considerando que o processo é um instrumento a serviço da paz social, o que impede também que a população faça justiça com as próprias mãos.

É o que ensina Cintra, Grinover e Dinamarco (2011, p. 47, grifo do autor), quanto à prestação jurisdicional do Estado, ao exercer o poder/dever que lhe foi conferido:

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Seja ao legislar ou ao realizar atos de jurisdição, o Estado exerce o seu poder (poder estatal). E, assim como a jurisdição desempenha uma função instrumental perante a ordem jurídica substancial (para que esta se imponha em casos concretos) – assim também toda atividade jurídica exercida pelo Estado (legislação e jurisdição, consideradas globalmente) visa a um objetivo maior, que é a pacificação social. É antes de tudo para evitar ou eliminar conflitos entre pessoas, fazendo justiça, que o Estado legisla, julga e executa (o escopo social magno do processo e do direito como um todo).

Da mesma forma, Capez (2011, p. 44) trata da prestação jurisdicional no âmbito do processo penal:

Nesse ponto entra o processo penal. A jurisdição só pode atuar e resolver o conflito por meio do processo, que funciona, assim, como garantia de sua legítima atuação, isto é, como instrumento imprescindível ao seu exercício. Sem o processo, não haveria como o Estado satisfazer sua pretensão de punir, nem como o Estado-Jurisdição aplicá-la ou negá-la.

Dessa forma se garante a legalidade da prestação jurisdicional por parte do Estado, bem como garante ao acusado o direito de defender-se das acusações feitas contra si, em outras palavras, o processo é a forma pela qual se garante que o Estado não poderá punir quem é inocente da mesma forma de que possibilita ao acusado provar sua inocência, ou não sendo possível, ainda da a ele a oportunidade de esclarecer os fatos, as circunstâncias e os motivos pelos quais o delito fora cometido.

Assim, imprescindível é a atuação jurisdicional do Estado para que se possam resolver conflitos de ordem penal de forma adequada e satisfatória para ambos os lados que compõe a lide, tanto do lado da acusação, que na maioria das vezes atua como fiscal da lei, como do lado do infrator no exercício de sua defesa.

Por fim, tem-se que, por meio do processo, o acusado e, ao final condenado, terá uma pena equivalente às conseqüências do delito que cometera, isso porque, a atuação jurisdicional do Estado torna-se limitada, não podendo este aplicar penas pela pessoa do acusado, tampouco penas que ultrapassem o previsto em lei. Sendo assim, o processo toma forma de garantia para o acusado.

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1.2 Princípios no direito penal

Os princípios são preceitos fundamentais, alicerces inseparáveis ao ordenamento jurídico, são eles que dão forma e caracterizam os sistemas processuais, sendo alguns desses princípios básicos a todos os sistemas, outros vigoram somente em determinados ordenamentos. Assim, somente analisando os princípios gerais é que se pode qualificá-los em princípios particulares de cada ordenamento e princípios comuns a todos.

Sílvio de Salvo Venosa (2012, p. 25) enfatiza a importância dos princípios gerais reconhecida pelo próprio legislador não só como fonte, mas como normas inspiradoras para a aplicação do Direito, bem como fonte inspiradora da atividade legislativa e administrativa do Estado.

É também, o que ensina José Antônio Paganela Boschi (2004, p. 32), ao afirmar que:

Assim, de um lado, como propõe a hermenêutica tradicional, os princípios seriam enunciados gerais, parâmetros ou diretrizes, destinados a orientar o intérprete ou aplicador da lei na determinação do sentido dos textos legislativos.

Por outro lado, como ressalta Boschi (2004, p. 33), os princípios também podem ser utilizados para solucionar conflito ou colisão de normas, o que hoje é tão freqüente nos ordenamentos jurídicos, devido à expansão dos direitos fundamentais e de outros valores constitucionais relevantes.

Os princípios podem estar previstos em lei ou não. Contudo, são os princípios que dão sentido ao conjunto de normas e orientações ao legislador, e, permitem à doutrina não apenas explicar, mas efetivamente compreender os problemas do Direito e seguir no rumo certo e eficaz para sua solução.

Ada Pellegrini Grinover, Antonio C. A. Cintra e Cândido Rangel Dinamarco (2011, p. 56), sustentam importantes comentários acerca da relevância dos princípios para o processo e para o Direito em geral. Destaca-se o seguinte:

Considerando os escopos sociais e políticos do processo e do direito em geral, além do seu compromisso com a moral e a ética, atribui-se

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extraordinária relevância a certos princípios que não se prendem à técnica ou à dogmática jurídicas, trazendo em si seríssimas conotações éticas, sociais e políticas, valendo como algo externo ao sistema processual e servindo-lhe de sustentáculo legitimador.

Assim, entende-se que os princípios gerais do direito são construídos entre as normas e os valores éticos do direito, a fim de proporcionar meios mais eficazes e rápidos de procurar e descobrir a verdade e evitar erros, fazendo imperar a justiça nas decisões e o máximo de garantia social, assim como o mínimo de sacrifício da liberdade individual.

Nota-se que na atual situação histórica há um excesso de leis e normas que regulamentam o direito, sendo que por vezes, as próprias normas se contradizem causando confusão e divergência entre doutrinadores, magistrados e indivíduos ligados à áreas jurídicas.

Diante disso é que aparecem os princípios, como norteadores do Direito, eis que são fundamentados na ética e moral, e, mais ainda, são adaptados à realidade, ao passo que da mesma forma que se criam novas leis e se modificam as já existentes, os princípios também sofrem as mesmas alterações, com objetivo único de proporcionar uma interpretação e aplicação correta do Direito.

Mas, não só como diretrizes, segundo Boschi (2004, p. 37), os princípios também possuem força normativa, eis que:

Os princípios, em nova concepção hermenêutica, estão sendo na atualidade considerados como espécies de normas, que veiculam valores, impregnados de força normativa, cuja eficácia se volta, à feição das regras, à solução das questões concretas, como conseqüência direta da função construtiva que os caracteriza dinamicamente entre as normas do sistema.

Dessa forma, moralmente, os princípios, assim como as normas, dizem o que deve ser, podendo afastar, modificar ou dar novo sentido às regras positivadas, considerando que são fundados em conotações éticas e morais tanto para aplicação do direito como para sua criação.

De outra banda, considerando que o próprio Direito Penal está em continuo movimento de mudanças e transformações, os princípios também sofrem mudanças e atualizam-se conforme vão surgindo novos posicionamentos jurídicos, discursos políticos, tecnologias e conflitos.

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Assim, todo enunciado dos princípios torna-se provisório e sua elaboração suscetível de mudanças, conforme muda a sociedade e seu pensamento, os princípios à ela vão se adequando, isso porque os princípios são necessários ao Direito.

Segundo Saulo de Carvalho (2003, p. 85), a “regra do jogo” do direito penal nos Estados democráticos de direito reside nos princípios, considerando que a sua gradual incorporação nos textos constitucionais configuram vínculos formais e materiais de validade das normas e decisões.

Diante disso, é notória a força que os princípios exercem sobre o Direito, tanto como limitadores da atuação jurisdicional do Estado assim como norteadores do próprio Direito, e, mais ainda, os princípios assumem a forma de garantia ao Estado, a sociedade como um todo e ao indivíduo quando somente este fizer parte da lide, do Estado pelo poder/dever de julgar e punir que infringiu a lei, da sociedade por ser protegida contra infratores e, por fim, ao infrator, que lhe é garantido à defesa e a dignidade da pessoa.

1.3 Causas excludentes da tipicidade

Para que o Direito possa atingir seu objetivo, bem como para que se tenha certeza de que ele existe e deve ser cumprido, existem predeterminações formais de conduta, ou seja, há no ordenamento jurídico descrições legais de condutas que obrigam determinados comportamentos, tanto positivos como negativos. Isso é o que a doutrina chama de tipicidade.

Há diversos fatos denominados típicos em todos os ordenamentos jurídicos, mas, com mais intensidade no âmbito do Direito Penal, em que as condutas ilícitas, criminosas, defesas pela lei são por ela descritas, cumprindo a regra de que só há crime se houver lei anterior que o defina (VENOSA, 2012, p.7).

O direito penal classifica como típicas somente condutas que tenham certa relevância social, ou seja, há condutas que por alguma razão histórica ou social, não podem ser consideradas como criminosas, assim, não revestem-se de tipicidade.

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Cezar Roberto Bitencourt (2009, p. 5) aduz que a tipicidade penal implica numa seleção de comportamentos com certa valoração, considerando que o fato típico já é penalmente relevante. Mas, destaca que há certos comportamentos em si mesmos típicos que carecem de relevância por serem aceitos por todos no meio social, isso porque, há “um descompasso entre as normas penais incriminadoras e o socialmente permitido ou tolerado”, dessa forma, incompatível seria criminalizar uma conduta somente pelo fato de esta se opor à compreensão de um conjunto de indivíduos ou ao padrão de comportamento vivido em determinados locais.

Dessa forma, resta evidente que uma conduta típica é aquela defesa em lei, ou seja, socialmente proibida que lese o bem juridicamente tutelado.

Nas palavras de Bitencourt (2009, p. 5, grifos do autor) “A tipicidade de um comportamento proibido é enriquecida pelo desvalor da ação e pelo desvalor do resultado, lesando efetivamente o bem juridicamente protegido, constituindo o que se chama de

tipicidade material.”

Assim, para que uma conduta seja típica, tem de haver um desvalor da ação e um desvalor do resultado causado, o que por conseqüência acaba por ser uma conduta socialmente proibida.

Contudo, existem condutas que, apesar de típicas, acabam por ser insignificantes levando em conta o resultado causado. São condutas que não ofendem de maneira grave, ou ainda, nem chegam a ofender o bem jurídico tutelado, tornando o resultado insuficiente para configurar um injusto penal, ou seja, são condutas que podem ser toleradas pela sociedade sem causar danos a ninguém.

A partir disso é que passa a existir uma discussão para que tais condutas socialmente toleradas possam ser eximidas de tipicidade, surgindo então as chamadas causas excludentes de tipicidade, as quais afastam ou eliminam a antijuridicidade de certas condutas típicas.

Isso porque, a tipicidade penal, nas palavras de Bitencourt (2009, p.5, grifo do autor) “exige ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos, pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico.”

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Assim, condutas definidas como ilícitas formalmente, podem, em determinados casos, não apresentar relevância material alguma, e, por conseqüência disso é que se deve afastar de pronto a sua tipicidade, haja vista que tal conduta não chegou a lesar o bem juridicamente protegido.

Nas palavras de Edilson Mougenot Bonfim (2012, p. 44):

As normas de direito material, em geral, visam proteger determinados bens jurídicos e interesses considerados relevantes para a sociedade, estabelecendo sanções aplicáveis a quem pratique certos atos em afronta a esses bens ou interesses. Dito de outra maneira, o Estado, por meio da atividade legislativa, elege certas condutas como passíveis de punição, por julgar que essas condutas lesam (ainda que apenas potencialmente, em alguns casos) os bens e interesses que se deseja proteger.

Dessa forma, o conteúdo das normas que ditam o que é típico para o Direito, deve possuir uma relevância tanto social como moral na sociedade, ou seja, condutas que possam lesar os bens e interesses juridicamente tutelados devem estar previstos nas leis, assim como a sanção oponível caso algum indivíduo venha a infringir a lei.

Nesse sentido, “apenas devem ser incriminadas condutas que violem bens fundamentais de uma comunidade” (BONFIM, 2012, p. 45), ao passo que não devem os tribunais se ocupar em decidir questões com duvidoso relevo social.

Assim, Luiz Flávio Gomes (2009, p. 69) explica que, embora a conduta praticada tenha produzido o resultado naturalístico exigido por alguns tipos penais, que haja nexo de causalidade entre a conduta e esse resultado e, que a conduta esteja devidamente prevista numa formulação típica legal, não é o suficiente para que se configure um fato típico, pois se impõe também a presença da desaprovação da conduta e da desaprovação do resultado.

Portanto, a ação que produza um resultado jurídico insignificante, ou ainda que produza alguma lesão ou perigo de pouca importância ao bem jurídico tutelado, é típica porque há previsão legal proibindo tal conduta, mas lhe falta a presença da desaprovação do resultado jurídico, o que por sua vez caracteriza a exclusão da tipicidade.

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2 APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Os princípios são alicerces do Direito, idéias políticas, sociais e ideológicas, ou seja, um motivo conceitual que da origem às teorias penais e sentido às normas. Em nosso ordenamento jurídico, não há um rol taxativo dos princípios, pois eles assim como a sociedade e o próprio Direito Penal, estão em continuas transformações.

Como anteriormente exposto, o princípio da insignificância, apesar de já reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, não esta previsto em lei alguma no Direito brasileiro, contudo, como com os demais princípios, deve-se recorrer à sua aplicação quando oportuno.

Dessa forma, diante dos fatos históricos e contemporâneos da sociedade em que vivemos, é de suma importância que demos atenção e verdadeira efetivação aos princípios, aqui especificamente ao princípio da insignificância (como causa excludente da tipicidade), para que não só a doutrina e as normas, mas também a sociedade e os responsáveis pela aplicação das normas se adéqüem aos fatos característicos da sociedade atual e andem em harmonia.

Assim, garantindo uma maior inviolabilidade aos direitos dos cidadãos, e também controlando a intervenção punitiva do Estado estabelecendo limites para a punição dos infratores.

Isso porque, com tantos avanços e melhorias no sistema penal brasileiro, não há como continuar ocupando o tempo de servidores e magistrados, bem como não há como continuar superlotando presídios com indivíduos que não mereceriam estar lá, considerando que o enclausuramento e a pena demasiada não agregam em nada na pessoa condenada, mas tão somente lhe encaminham para a vida da delinqüência.

De outra banda, ao falarmos em princípio da insignificância, não basta que somente não haja valor monetário ínfimo ou ainda que não haja resultado lesivo, precisamos estar a par dos critérios e requisitos que devem ser atendidos para que se possa efetivar sua aplicação.

É o que se pretende apresentar com base na doutrina e principalmente apontando o entendimento do Supremo Tribunal de Federal, o qual já reconheceu o princípio da

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insignificância como causa excludente da tipicidade e elencou requisitos necessários para sua aplicação.

2.1 Princípio da insignificância: conceito

No âmbito jurídico-penal, o princípio da insignificância tornou-se notório pela primeira vez por Claus Roxin em 1964, partindo da máxima contida no brocardo mínima nom

curat praetor, e posteriormente reforçado por Claus Tidemann.

A palavra insignificância traduz o que é sem valor, de pouca importância. Nesse sentido, o princípio da insignificância no âmbito do direito penal, traduz uma conduta cujo seu resultado é tão ínfimo que se quer mereça a aplicação de sanção. Em outras palavras, é um comportamento ou um ataque ao bem jurídico tão irrelevante que não requer, ou não necessita da intervenção penal (GOMES, 2009).

Assim, o princípio da insignificância significa, senão, a via dogmática mais apropriada para se alcançar o reconhecimento da irresponsabilidade penal do fato ofensivo ínfimo ou da conduta banal e sem relevância penal (GOMES, 2009).

Carlos Vicos Manãs (1994, p. 81), um dos primeiros doutrinadores no estudo do princípio da insignificância, assim o conceitua:

O princípio da insignificância, portanto, pode ser definido como instrumento de interpretação restritiva, fundado na concepção material do tipo penal, por intermédio do qual é possível alcançar, pela via judicial e sem macular a segurança jurídica do pensamento sistemático, a proposição político-criminal da necessidade de descriminalização de condutas que, embora formalmente típicas, não atingem de forma socialmente relevantes os bens jurídicos protegidos pelo direito penal.

É o que podemos chamar de significado principal deste princípio, pois através dele busca-se excluir das vias judiciais fatos formalmente típicos, mas não materialmente, ou seja, fatos atípicos, o que conseqüentemente consiste na exclusão da responsabilidade penal de fatos ofensivos de pouca importância, pelo fato de não atingirem de forma relevante o bem jurídico protegido.

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Da mesma forma afirma Gomes (2009, p. 46-47):

O princípio da insignificância é o que permite não processar condutas socialmente irrelevantes, assegurando não só que a Justiça esteja mais desafogada, ou bem menos assoberbada, senão permitindo também que fatos nímios não se transformem em uma sorte de estigma para seus autores. Do mesmo modo, abre a porta para uma revalorização do direito constitucional e contribui para que se imponham penas a fatos que merecem ser castigados por seu alto conteúdo criminal, facilitando a redução dos níveis de impunidade. Aplicando-se este princípio a fatos nímios se fortalece a função da Administração da Justiça, porquanto deixa de atender fatos mínimos para cumprir seu verdadeiro papel. Não é um princípio de direito processual, senão Direito Penal.

Assim, não havendo uma conduta que gere uma grave ofensa ao bem jurídico tutelado, não há que se falar em responsabilidade penal dos fatos ofensivos de pouca importância e ínfima lesividade, considerando que as condutas penalmente típicas só devem estar formadas por ações gravemente antijurídicas, é o que o princípio da insignificância significa, ou seja, uma restrição dos tipos penais.

Nota-se que tal princípio tem o condão de excluir, desde logo, da ação penal, danos de ínfima importância, dispensável de pena, uma vez que a incidência da insignificância consiste na exclusão da responsabilidade penal dos fatos ofensivos de pouca importância ou de ínfima lesividade (GOMES, 2009).

Consoante entendimento jurisprudencial, o princípio da insignificância deve ser analisado em conexão com os princípios da fragmentaridade e da intervenção mínima do Estado (em matéria penal), e tem sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material.

É verdade que o princípio da insignificância não tem previsão legal no direito brasileiro, porém, é considerado como princípio auxiliar de determinação da tipicidade, sob a ótica da objetividade jurídica. Assim, se a finalidade do tipo penal é tutelar um bem jurídico quando a lesão, de tão insignificante, torna-se imperceptível, não será possível proceder ao seu enquadramento típico, por absoluta falta de conformidade entre o fato narrado na lei e o comportamento injusto realizado (BONFIM; CAPEZ, 2004).

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Isso porque, no tipo, somente estão descritos os comportamentos capazes de ofender o interesse protegido pela norma jurídica. Por essa razão, os danos de pouca importância devem ser considerados atípicos. É o que aduzem Bonfim e Capez (2004, p. 121-122) em sua obra, quando se referem à atipicidade da conduta:

A tipicidade penal está a reclamar ofensa de certa gravidade exercida sobre os bens jurídicos, pois nem sempre ofensa mínima a um bem ou interesse juridicamente protegido é capaz de se incluir no requerimento reclamado pela tipicidade penal, o qual exige ofensa de alguma magnitude a esse mesmo bem jurídico.

Dessa forma, em condutas manifestamente irrelevantes, desprovidas de reprovabilidade penal, deve, sem sombra de dúvidas, incidirem os efeitos do princípio da insignificância, pois o fato socialmente irrelevante deve ser excluído da tipicidade penal por não atingir os objetivos da tutela jurisdicional.

Por outro lado, temos que a aplicação do princípio da insignificância deve se dar em função da reprovabilidade das sanções penais, eis que tais sanções devem ser a última coisa a se aplicar, devendo o julgador, antes de tudo, analisar, de acordo com a gravidade e lesividade da ação, se o caso não é passível de outras medidas que não sanções penais.

Assim, o princípio da insignificância fundamenta-se nos postulados constitucionais da intervenção mínima do Direito Penal e da proporcionalidade da pena em relação à gravidade e lesividade da conduta ilícita (DELMANTO, 2010).

A propósito, ensina Carlos Vico Mañas (1995, p. 58), o princípio da insignificância é a “ferramenta de interpretação restritiva, por meio do qual se alcança a proposição político-criminal da necessidade de despolítico-criminalização de condutas que, embora formalmente típicas, não atingem de forma relevante os bens jurídicos protegidos pelo direito penal.”

Portanto, entende-se que a insuficiente repercussão, a mínima lesividade e a reduzidíssima reprovação do delito denotam exageradas e desproporcionais resposta penais fornecida pelo Estado, sendo que o mais aconselhado, como já admitido em todos os Tribunais, seja o reconhecimento da atipicidade material da ação, tendo em vista que o agente será criminalizado injustificadamente por uma conduta relativamente ínfima, ou de um resultado irrelevante.

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2.2 O princípio da insignificância como causa excludente da tipicidade

Diferente do princípio da irrelevância penal do fato - pouco usado na jurisprudência brasileira - o princípio da insignificância tem sido aplicado por diversas ocasiões como causa excludente da tipicidade, isso porque, a conduta é formalmente típica, mas não materialmente, ou seja, não há adequação à letra da lei, ou seja, não basta que a conduta tenha produzido o resultado exigido por alguns tipos penais, pois esse lado formal do delito é necessário, mas não suficiente, considerando que à tipicidade formal impõe-se também a presença da tipicidade material.

É o que ensina Carlos Vicos Mañas (1994, pg. 56, grifos do autor), em sua obra O princípio da insignificância como excludente da tipicidade no direito penal:

Ao realizar o trabalho de redação do tipo penal, o legislador apenas tem em mente os prejuízos relevantes que o comportamento incriminado possa causar à ordem jurídica e social. Todavia, não dispõe de meios para evitar que também sejam alcançados os casos leves. O princípio da insignificância surge justamente para evitar situações dessa espécie, atuando como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal, com o significado sistemático e político-criminal de expressão da regra constitucional do nullum crimen sine lege, que nada mais fez do que revelar a natureza subsidiária e fragmentária do direito penal. No que diz respeito à origem, pode-se afirmar que o princípio já vigorava no direito romano, pois o pretor, em regra geral, não se ocupava de causas ou delitos insignificantes, seguindo a máxima contida no brocardo minimis non curat pretor.

Em outras palavras, a tipicidade formal – composta da conduta, resultado naturalístico, nexo de causalidade e adequação do fato à letra da lei – já não esgota completamente a totalidade da tipicidade penal, que ainda requer a dimensão material, ou seja, a desaprovação da conduta e a desaprovação do resultado jurídico (GOMES, 2009). Diz-se então, que a insignificância afasta a tipicidade material do fato.

Dessa forma, aplicação do princípio da insignificância, conforme o qual não há de ser considerado materialmente típico o comportamento que, apesar de guardar coerência formal com o paradigma legal do delito, não seja apto a afetar de forma relevante o bem jurídico tutelado pela norma penal, representa uma das mais emblemáticas hipóteses de resultado concreto dos princípios de exclusiva proteção dos bens jurídicos e da ofensividade com o objetivo de evitar a intervenção ilegítima do Estado (BECHARA, 2011).

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É o que se colhe das jurisprudências da Suprema Corte (Brasil, 2013) disponíveis no próprio site do Supremo Tribunal Federal, quando esta aduz que a verificação da tipicidade penal não pode ser percebida com o exercício abstrato de adequação do fato concreto à norma jurídica, considerando que, além da correspondência formal, a configuração da tipicidade demandaria uma análise materialmente valorativa das circunstâncias do caso concreto, para verificar a ocorrência de alguma lesão grave, incontestável e penalmente relevante do bem jurídico tutelado.

Corroborando tal entendimento, Bitencourt e Prado (1996, p. 87) afirmam acerca da tipicidade “que a tipicidade penal exige uma ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos, pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico”, ou seja, é imperativa uma efetiva proporcionalidade entre gravidade da conduta que se pretende punir e a severidade da intervenção estatal.

Assim, freqüentemente condutas que se amoldam a determinado tipo penal, sob o ponto de vista formal, não apresentam nenhuma relevância material, podendo assim, afastar liminarmente a tipicidade penal, considerando que o bem jurídico não chegou a ser lesado (BITENCOURT; PRADO, 1998).

Contudo, o fato de determinada conduta se enquadrar em uma infração de “menor potencial ofensivo”, não significa que tal conduta mereça ser amparada pelo princípio da insignificância. Isso porque, há delitos que, apesar de serem de “menor potencial ofensivo”, já sofreram valoração por parte do legislador que, atendendo às necessidades sociais e morais dominantes da sociedade, determinou as conseqüências jurídico-penais caso ocorra sua violação. “Assim, a irrelevância ou insignificância de determinada conduta deve ser aferida não apenas em relação à importância do bem juridicamente atingido, mas especialmente pela intensidade, isto é, pelo grau de lesão produzida.” (BITENCOURT; PRADO, 1996, p. 87).

Pode-se inferir, então, que para haver ilicitude penal, além de não estarem presentes as causas que excluam a ilicitude, como a legítima defesa, a conduta formalmente típica, praticada pelo sujeito, deve mostrar-se socialmente danosa, ou seja, materialmente antijurídica (DELMANTO, 2010).

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Assim, é necessário que a conduta típica seja valorada para se saber se ela realmente é contrária ao ordenamento jurídico como um todo, se de fato lesionou um bem jurídico ou efetivamente o colocou em risco.

Todavia, existem tipos penais que possuem elementos objetivos destituídos de qualquer aspecto valorativo, como “alguém”, “menor de 14 anos”, bem como, em vários tipos penais existem os denominados elementos do tipo, como “indevidamente”, os quais no próprio tipo trazem a valoração da ilicitude (DELMANTO, 2010).

Portanto, o fundamento para o reconhecimento da atipicidade material quando da conduta irrelevante é o juízo de desvaloração da conduta, em outras palavras, o fundamento para atipicidade material nos casos de resultados insignificantes, é justamente a exigência de um resultado jurídico relevante (GOMES, 2009).

Assim, a conduta que produz um resultado jurídico irrelevante é formalmente típica, mas não materialmente, justamente porque lhe falta o requisito material, ou seja, a desaprovação do resultado.

Dessa forma, o princípio da insignificância reduz a esfera da proibição aparente da tipicidade legal e, por conseqüência, torna atípico o fato no âmbito penal, apesar de haver lesão ao bem juridicamente tutelado pela norma penal.

2.3 Critérios de reconhecimento e classificação de condutas penalmente insignificantes

A incidência do princípio da insignificância, conforme o qual não há de ser considerada materialmente típica a conduta que, apesar de guardar congruência formal com o paradigma legal do delito, não seja apto a afetar de forma relevante o bem jurídico protegido pela norma penal, “representa uma das mais simbólicas hipóteses de efetividade concreta dos princípios protetores dos bens jurídicos e da ofensividade, os quais objetivam evitar a intervenção desnecessária do Estado.” (BECHARA, 2011, p. 403).

Assim, para que a conduta mereça ser amparada pelo princípio da insignificância, há de se levar em conta alguns critérios definidos pelos Tribunais brasileiros, inclusive pela

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Suprema Corte, que justifiquem a aplicabilidade do princípio a partir da renúncia da punição decorrente dos motivos que objetivam o merecimento da pena.

Nesse sentido, é o que se extrai das decisões prolatadas pela Suprema Corte brasileira, das quais constam critérios de aplicação do princípio da insignificância, quais sejam: mínima ofensividade da conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação, reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada. Assim:

PENAL. HABEAS CORPUS. PACIENTE CONDENADO PELO CRIME DE TENTATIVA DE FURTO DE UM APARELHO CELULAR. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ATIPICIDADE DA CONDUTA DO AGENTE. RECONHECIMENTO. ORDEM CONCEDIDA.

I – A aplicação do princípio da insignificância de modo a tornar a ação atípica exige a satisfação, de forma concomitante, de certos requisitos, quais sejam, conduta minimamente ofensiva, ausência de periculosidade social da ação, reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e lesão jurídica inexpressiva.

II – In casu, tenho por preenchidos os requisitos necessários ao reconhecimento do crime de bagatela. Embora o valor do objeto material da infração não possa ser considerado inexpressivo, pois o aparelho celular foi avaliado em R$ 200,00, deve-se destacar que se trata de tentativa de furto e que o bem foi encontrado pelos policiais e restituído ao seu proprietário, que não experimentou nenhum prejuízo relevante, tampouco a sociedade.

III – Ordem concedida para reconhecer a atipicidade da conduta. (BRASIL, 2013a)

É também o que ensina Luis Flávio Gomes (2009, p. 19) quanto à exigência da atenção a alguns vetores criados pelo STF para que seja acolhida a aplicação da insignificância no caso concreto, assim:

A ausência de periculosidade social da ação, a mínima ofensividade da conduta do agente – mínima idoneidade ofensiva da conduta, a inexpressividade da lesão jurídica causada e a falta de reprovabilidade da conduta.

No mesmo sentido, Delmanto, (2010, p. 114), escreve acerca dos critérios para aferição da insignificância: “(a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada.”

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No entanto, para o reconhecimento do princípio da insignificância deve ser feita uma analise de cada caso concreto, da vítima, das circunstâncias do fato, do local, do valor, entre outros, ao passo que uma conduta em determinada situação possa ser absolutamente insignificante, em outro contexto não o é. Cada caso é um caso.

Isso porque, a pertinência do princípio da insignificância deve ser avaliada considerando não só o valor do bem lesado, mas igualmente outros aspectos relevantes da conduta imputada. É o que se depreende das jurisprudências, em especial as proferidas pelo STF.

Dito isso, nota-se que a falta de qualquer dos requisitos exigidos pelo STF, implica na impossibilidade de aplicação do princípio da insignificância, isso porque, na falta de algum dos requisitos a conduta passaria a ser compreendida na finalidade da norma ou em seu sentido material, o que impede a exclusão da tipicidade.

Dessa forma, os tipos penais, desde uma perspectiva material, devem ser interpretados de acordo com o bem jurídico tutelado, ou seja, somente os ataques intoleráveis aos bens jurídicos de maior relevância é que devem ser punidos penalmente (GOMES, 2009).

O que se depreende dos julgados da Suprema Corte, é que as mínimas ofensas aos bens jurídicos protegidos não justificam a aplicação do Direito Penal, isso porque isto se mostra desproporcional ao impor sanções a condutas que não demonstrem desaprovação social, ou, que sejam manifestamente ínfimas, devendo tal conduta ser tolerada pela sua insignificante lesividade.

Portanto, presentes todos os requisitos exigidos pelo STF para o reconhecimento e aplicação do princípio da insignificância, não há que se falar em condenação pela conduta que se quer produziu reprovação social, tampouco foi capaz de produzir resultado que lesasse gravemente algum bem tutelado.

Há de se ressaltar também, que a falta de algum dos requisitos elencados, principalmente o da periculosidade social da ação e da mínima ofensividade do agente, faz com que a conduta, apesar de insignificante, seja considerada típica.

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2.4 A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e o princípio da insignificância

É de conhecimento geral que o Supremo Tribunal Federal já reconheceu o princípio da insignificância para todas as condutas cujo valor da ação ou do resultado é irrelevante, e que se quer deveriam movimentar e ocupar o judiciário, bem como quando qualquer incidência das sanções penais seria descabida.

A partir disso, a Suprema Corte elencou requisitos necessários que devem ser preenchidos para que se possa caracterizar e efetivar a aplicação da insignificância como causa excludente da tipicidade, julgando e analisando caso a caso, formando assim decisões – acórdãos – que atuam como base para que os magistrados possam aplicá-lo de pronto.

É o que se nota na decisão proferida pela Relatora Ministra Cármen Lúcia (2013) ao julgar o Habeas Corpus 111.518/DF, em 05/02/2013, referente à atividade clandestina de telecomunicação:

HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME DE ATIVIDADE CLANDESTINA DE TELECOMUNICAÇÃO. INVIABILIDADE DA APLICAÇÃO DO

PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA: ALTO GRAU DE

REPROVABILIDADE DA CONDUTA E OFENSA AO BEM JURÍDICO PENALMENTE TUTELADO. ORDEM DENEGADA.

1. A tipicidade penal não pode ser percebida como o trivial exercício de adequação do fato concreto à norma abstrata. Além da correspondência formal, para a configuração da tipicidade, é necessária análise materialmente valorativa das circunstâncias do caso concreto, no sentido de se verificar a ocorrência de lesão grave e penalmente relevante do bem jurídico tutelado. 2. O princípio da insignificância reduz o âmbito de proibição aparente da tipicidade legal, tornando atípico o fato na seara penal, apesar de haver lesão a bem juridicamente tutelado pela norma penal.

3. Para a incidência do princípio da insignificância, devem ser relevados o valor do objeto do crime e os aspectos objetivos do fato, como a mínima ofensividade da conduta do agente, a ausência de periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica causada.

4. O desenvolvimento de atividades clandestinas de telecomunicação, além de ser reprovável, não é minimamente ofensivo.

5. Habeas corpus denegado. (BRASIL, 2013b, grifo nosso)

Da mesma forma, o Relator Ministro Ricardo Lewandowski (2012) ao julgar o Habeas

Corpus 115.729/BA, em 18/12/2012, também referente ao desenvolvimento clandestino de

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HABEAS CORPUS. PENAL. RÁDIO COMUNITÁRIA. OPERAÇÃO SEM AUTORIZAÇÃO DO PODER PÚBLICO. IMPUTAÇÃO AO PACIENTE DA PRÁTICA DO CRIME PREVISTO NO ARTIGO 183 DA

LEI 9.472/1997. BEM JURÍDICO TUTELADO. LESÃO.

INEXPRESSIVIDADE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.

APLICABILIDADE. CRITÉRIOS OBJETIVOS. PRESENÇA.

APURAÇÃO NA ESFERA ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA.

I – Conforme perícia efetuada pela Anatel, o serviço de radiodifusão utilizado pela emissora não possuía capacidade de causar interferência prejudicial aos demais meios de comunicação, o que demonstra que o bem jurídico tutelado pela norma – segurança dos meios de telecomunicações – permaneceu incólume.

II – Rádio comunitária operada com os objetivos de evangelização e prestação de serviços sociais, denotando, assim, a ausência de periculosidade social da ação e o reduzido grau de reprovabilidade da conduta imputada ao paciente.

III - A aplicação do princípio da insignificância deve observar alguns vetores objetivos: (i) conduta minimamente ofensiva do agente; (ii) ausência de risco social da ação; (iii) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e (IV) inexpressividade da lesão jurídica.

IV – Critérios que se fazem presentes, excepcionalmente, na espécie, levando ao reconhecimento do denominado crime de bagatela.

V – Ordem concedida, sem prejuízo da possível apuração dos fatos atribuídos ao paciente na esfera administrativa. (BRASIL, 2012ª, grifo nosso)

Nota-se que em ambos os casos não há discussão acerca de valor monetário como prejuízo oriundo da conduta dos pacientes, mas tão somente quanto ao grau reprovabilidade do comportamento, a mínima ofensividade da conduta do agente, a ausência de periculosidade social da ação e inexpressividade da lesão jurídica. Sendo em que no primeiro caso houve lesão ao bem jurídico tutelado pela norma penal, e no segundo não.

Nesse sentido observa a Ministra Cármen Lúcia que, para a aplicação do princípio da insignificância, não se considera simplesmente o valor material do bem violado, mas os valores ético-jurídicos aproveitados pelo sistema penal para determinar se uma conduta é, ou não, típica para a configuração do delito (HC nº 111.518/BRASIL, 2013).

Quanto aos crimes tentados, ressalta a Ministra Rosa Weber (2012), quando do julgamento do Habeas Corpus 113.476/RS, em 27/11/2012:

HABEAS CORPUS. TENTATIVA DE FURTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. VALOR SIGNIFICATIVO DA RES FURTIVA. INAPLICABILIDADE.

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Não é insignificante crime de furto que tem por objeto bens de valores significativos, superiores ao salário-mínimo da época dos fatos. A pertinência do princípio da insignificância deve ter presente o resultado pretendido pelo agente, já que, do contrário, todo crime tentado seria insignificante pela ausência de lesão consumada ao bem jurídico protegido. Habeas corpus denegado. (BRASIL, 2012b)

Tal posição se justifica pelo fato de que, no caso em tese, mesmo tendo sido o crime tentado, a res furtiva possuía valor significativo, de tal forma que, para o tribunal, a aplicação desse princípio poderia constituir um verdadeiro estímulo à prática destes pequenos furtos, já bastante comuns nos dias atuais, contribuindo assim para aumentar, ainda mais, o clima de insegurança hoje vivido pela sociedade.

Contudo, não é obrigatória a inaplicabilidade da insignificância em todo e qualquer delito tentado. Assim:

Habeas Corpus. Furto tentado. Lesão patrimonial de valor insignificante. Incidência do princípio da insignificância. Atipicidade da conduta. Ordem concedida.

Constatada a irrelevância penal do ato tido por delituoso, principalmente em decorrência da inexpressividade da lesão patrimonial e do reduzido grau de reprovabilidade do comportamento, é de se reconhecer a atipicidade da conduta praticada ante a aplicação do princípio da insignificância.

Ausência, na hipótese, de justa causa para a ação penal. Incidência dos princípios da subsidiariedade, da fragmentariedade, da necessidade e da intervenção mínima que regem o Direito Penal. Inexistência de lesão ao bem jurídico penalmente tutelado.

Ordem concedida para determinar o trancamento da ação penal de origem, por efeito do reconhecimento da atipicidade da conduta. (BRASIL, 2012c) Ocorre que no caso citado, há a inexpressividade da lesão patrimonial bem como reduzido grau de reprovabilidade do comportamento do agente, devendo então ser reconhecida a atipicidade da conduta ante a aplicação do princípio da insignificância. Isso porque, não houve lesão ao bem jurídico penalmente tutelado, de forma que a aplicação de qualquer pena seria excessiva.

Por outro lado, ao falarmos em penas excessivas e abusivas, não podemos deixar de analisar que o fato de delitos que por não resultarem em lesão patrimonial expressiva ou com grau de reprovabilidade da conduta do agente mínimo, passem a ser adotados como meio de vida de delinqüentes. Isso porque, amparados pelo princípio da insignificância estariam

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isentos de responder pelos seus atos. É o que destaca a Relatora Ministra Cármen Lúcia (2012) ao julgar o HC nº 110.841/PR, em 27/11/2012, referente a contrabando de cigarros:

O criminoso contumaz, mesmo que pratique crimes de pequena monta, não pode ser tratado pelo sistema penal como se tivesse praticado condutas irrelevantes, pois crimes considerados ínfimos, quando analisados isoladamente, mas relevantes quando em conjunto, seriam transformados pelo infrator em verdadeiro meio de vida.

6. O princípio da insignificância não pode ser acolhido para resguardar e legitimar constantes condutas desvirtuadas, mas para impedir que desvios de conduta ínfimos, isolados, sejam sancionados pelo direito penal, fazendo-se justiça no caso concreto. Comportamentos contrários à lei penal, mesmo que insignificantes, quando constantes, devido a sua reprovabilidade, perdem a característica da bagatela e devem se submeter ao direito penal.

7. Habeas corpus denegado. (BRASIL, 2012d)

Importantíssimo destacar um breve comentário acerca dos crimes de contrabando estabelecido pela jurisprudência, a qual analisa que, apesar de que para o crime de contrabando ou descaminho haver previsão legal de valor que serve como parâmetro para a incidência do princípio da insignificância, o Supremo Tribunal Federal tem determinado que não deve prevalecer como parâmetro tal valor definido para a incidência do princípio da insignificância no caso de crime de contrabando, uma vez que tal conduta gira em torno de mercadorias estrangeiras submetidas a uma proibição relativa ou absoluta.

Em outras palavras, o objetivo principal dessa tipificação legal é evitar o estímulo de transporte e comercialização de produtos proibidos por lei, por isso, independente do valor apreendido, não deve ser o delito amparado pelo princípio da insignificância.

Ainda com relação ao crime de contrabando que, no ensinamento de Damásio de Jesus (1985, p. 156), no sentido jurídico, a expressão contrabando corresponde a importação ou exportação de mercadorias ou gêneros cuja entrada ou saída do país é proibida.

É de salientar outro ponto importante, não previsto como requisito para aplicação da insignificância, mas não menos importante, eis que também debatido e reconhecido pela Corte Suprema, qual seja: o valor ético-jurídico da conduta.

Isso porque, o objeto jurídico tutelado é o interesse estatal, no que diz respeito ao erário público lesado pelo comportamento do sujeito, que importando ou exportando mercadoria proibida, prejudica não só o poder público, mas também a indústria nacional, a

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moralidade e até mesmo a saúde pública, que pode vir a ser lesada com a entrada de produtos nocivos a ela e, por isso, proibidos.

É o que destaca a Ministra Cármen Lúcia (2012d) em ocasião de julgamento do HC nº110.841:

Dá-se, contudo, que o que se impõe anotar para a aplicação do princípio da insignificância não é simplesmente o valor material do objeto do crime, mas os valores ético-jurídicos aproveitados pelo sistema penal para determinar se determinada conduta é, ou não, típica para a configuração do delito.

Diante disso, há de ser considerada, em cada caso, de forma cautelar e rigorosa, a relevância do bem jurídico tutelado em face da específica situação cuidada em determinada ação penal, para assim concluir pela tipicidade penal ou pela atipicidade.

É o que acontece nos casos de crimes de furto, ou seja, não basta apenas ter como parâmetro o valor do bem lesado, deve ser levado em conta as circunstâncias em que o fato foi praticado, assim como os reflexos causados à sociedade pela conduta do agente.

Assim sustenta o Ministro Luiz Fux (2013c), em julgamento recente do HC nº 113.369/MG, em 26/02/2013:

O princípio da insignificância não há de ter como parâmetro tão só o valor da res furtiva, devendo ser analisadas as circunstâncias do fato e o reflexo da conduta do agente no âmbito da sociedade, para decidir-se sobre seu efetivo enquadramento na hipótese de crime de bagatela.

Pois, apesar da lesão ter sido ínfima ou a res furtiva de pouco valor, a conduta do agente influencia a sociedade, ao passo que se isento de julgamento e condenação sempre que praticar, como no caso, furtos de pequenos valores, o infrator passará a praticar delitos continuamente, eis que amparado pela insignificância.

Dito isso, nota-se que o princípio da insignificância não tem como fim eximir todos os infratores de toda e qualquer conduta insignificante, mas sim, atua como um moderador do poder de punir do Estado frente ao indivíduo que, por diversas vezes, comete infrações motivadas por fatores sociais.

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Logo, se o próprio Estado não deu condições mínimas de convivência ao seu povo, não pode ele puni-lo por infrações oriundas da falta de assistência estatal.

Aqui é que entra o ponto máximo objetivado pelo princípio da insignificância, ou seja, excluir a tipicidade da conduta que se quer lesou algum bem jurídico tutelado, ou, de tão ínfimo valor se quer mereça alguma punição.

Contudo, nenhum indivíduo possui o direito de usar de força ou de meios violentos para suprir a necessidade causada pela falta de assistência estatal. E é essa conduta que, por mais que ínfima, não merece ser amparada pela insignificância.

Nesses termos, fica claro a inviabilidade da aplicação do princípio da insignificância para crimes praticados com violência ou grave ameaça. É o que aponta a jurisprudência, nas palavras da Ministra Rosa Weber (Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 106.30/Brasil, 2012, grifos da autora):

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PENAL. ROUBO

QUALIFICADO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.

INCOMPATIBILIDADE.

É inviável reconhecer a aplicação do princípio da insignificância para crimes praticados com violência ou grave ameaça, incluindo o roubo. Jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal.

Recurso ordinário em habeas corpus não provido. (BRASIL, 2012)

No caso, resta evidente a falta de um dos requisitos para o reconhecimento da insignificância, ou seja, crimes praticados com grave ameaça ou violência obstruem os requisitos da mínima ofensividade da conduta do agente, da ausência de periculosidade social da ação e do reduzido grau de reprovabilidade do comportamento do agente.

Diante disso, incontestável é a forma com que o Supremo Tribunal Federal vem julgando recursos que tenham fundamento no princípio da insignificância, estudando caso a caso e dando o devido fim a cada um.

Assim, ante as decisões prolatadas pelo Supremo Tribunal Federal, entende-se que para a efetiva aplicação do princípio da insignificância, não deve se ter como parâmetro somente o valor do dano causado ao bem juridicamente tutelado, mas também devem ser

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analisadas as circunstâncias em que o fato fora praticado assim como o reflexo que a conduta do agente causou na sociedade, para assim decidir sobre a sua atipicidade.

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CONCLUSÃO

As relações humanas em sociedade mudaram muito. Historicamente, o que se tinha eram relatos de indivíduos fazendo justiça com as próprias mãos, ou, o poder estatal nas mãos de uma única pessoa, a qual julgava conforme queria e pela forma que lhe traria mais benefícios.

Na atualidade, o que se têm são normas que prescrevem direitos e garantias, delimitam a atuação da sociedade, estabelecendo o que é certo e errado e o que se pode ou não fazer, assim como princípios que limitam a atuação estatal e servem de base para a criação e elaboração de leis, assim como para aplicação das normas.

O Estado possui o poder/dever de solucionar conflitos e garantir a paz em sociedade. E é a este poder estatal, denominado jurisdição, que a sociedade recorre toda vez que se acha ameaçada ou que seja lesada por certo indivíduo, para que este possa resolver a lide, de forma justa e eficaz.

O presente estudo tratou sobre o princípio da insignificância e como se da a sua aplicação, ressaltando a sua importância como uma possível forma de solucionar o problema da grande demanda de processos com pouca relevância nos tribunais.

Em seguida, abordou as questões relativas aos requisitos necessários, exigidos e elencados pelo Supremo Tribunal Federal, para que se possa aplicar a insignificância aos casos em que já estão em andamento nos tribunais, e, por fim, deu-se grande destaque as decisões do Supremo Tribunal Federal, enfatizando a sua posição quanto à aplicação do princípio, assim como os efeitos produzidos em decorrência disso.

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O conceito sobre o princípio da insignificância é amplo, e cada doutrinador expressa seu entendimento conforme lhe convir, porém, a finalidade presente em todos eles é a mesma, ou seja, a incidência do princípio da insignificância tem o condão de atenuar ou excluir a tipicidade do fato socialmente irrelevante.

De outra sorte, o princípio da insignificância também assume a função de limitar a atuação jurisdicional do Estado, considerando que, subjetivamente, impede que se condene um indivíduo por uma ação que não tenha gerado desaprovação do resultado jurídico, ou seja, evita que o infrator seja condenado ao cumprimento de uma pena que gere conseqüências mais graves do que as próprias oriundas de sua ação, não pelo lado pessoal, mas sim pelo fato de que tal conduta, embora típica, produziu um resultado juridicamente insignificante.

No plano doutrinário, as primeiras lições sobre este princípio foram escritas por Roxin desde 1970, hoje, vários são os doutrinadores que abordam e estudam o tema. Já no plano jurisprudencial, o Supremo Tribunal Federal, em meados de 2004, reconheceu a incidência no Direito Penal do então princípio da insignificância para a descaracterização da tipicidade penal, em seu aspecto material.

A partir disso é que então foram elencados requisitos necessários para que se possa aplicar a insignificância ao caso concreto, sendo estes requisitos de grande importância para o presente estudo, pois através deles é que se pode chegar a uma conclusão diversa da que se tinha anteriormente.

Assim, embora existam inúmeros processos em andamento que preenchem os requisitos necessários para que se configure a atipicidade, há uma imensa parcela de ações onde não foi possível a aplicação da insignificância considerando que não foram preenchidos todos os requisitos mínimos exigidos para tanto, ou seja, além da conduta ilícita com resultado naturalístico, nexo de causalidade e adequação típica, a ação ou o resultado jurídico de uma forma ou de outra obteve desaprovação social.

Dessa forma, o que se pode extrair das decisões do Supremo Tribunal Federal e que servem de base para decisões de magistrados em primeiro grau, é que para a aplicação do princípio da insignificância não basta apenas considerar simplesmente o valor material do bem lesado, mas, deve se dar grande importância e uma profunda análise quanto aos valores

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