• Nenhum resultado encontrado

Coletânea de artigos Paulo Timm Org. Abril,20/2013

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Coletânea de artigos Paulo Timm Org. Abril,20/2013"

Copied!
117
0
0

Texto

(1)

MIDIA E GOVERNO

Coletânea de artigos – Paulo Timm Org. – Abril,20/2013

Indice

1. A sedução do poder – Raul Pierri

2. Confecom aprova criação de Conselho Federal dos Jornalistas 3. Palestra Marilena Chaui

4. A tirania da comunicação - Ignácio Ramonet

5. Democratização da Comunicação: Venezuela, Argentina, Equador e agora a Bolívia

6. A inquestionável partidarizaçãoda imprensa – Venicio Lima 7. Perigo à vista

8. Liberdade de Expressão e seus 30 novos significados - Washington Araújo

9. Governo Dilma aplica 70% da verba publicitária na imprensa

conservadora e veta jornal independente - Paulo Roberto de Souza 10.Esquerda fracassa na comunicação popular - Beto Almeida

11. O 7D e a hora H de Cristina Kirchner – Leite Filho

12. Globo: os princípios, a credibilidade e a prática – Venício Lima 13. As relações ambíguas do governo com a mídia - Gilberto Maringoni 14.Tarso: grande mídia quer instituir ‘justiça paralela’ no Brasil -. I.Natush 15. "Repensar os conceitos de audiência "!- Publicado no Blog do C.Maia 16. Jornalismo sem jornalistas - Lilia Diniz

17. A comunicação pública e o direito à informação - Paulo Machado 18 . O exercício do jornalismo – Alberto Dines

19 . A regulação da mídia na América Latina – Relatório

20. Entrevista “A América Latina está em ebulição em matéria de regulação dos meios de comunicação”- Bia Barbosa, do Coletivo Intervozes, e Dênis de Moraes, professor de Comunicação na Universidade Federal Fluminense. 21. Entrevista de Noam Chomski - Quem é o dono do mundo? David Barsaniam

(2)

22 .Recuos nas políticas públicas de comunicações – Paulo Kliass

23 – Mídia e Democracia – Diversos – Carta Maior

24.O jornalismo na era das redes sociais - Ana Paula Bessa 25. As verbas públicas de propaganda – Marino Boeira

26 . Bomba! 72% da publicidade do governo na web vai pro PIG

27. Dilma: a ilusão de um acordo com a mídia - Rodrigo Vianna

28 .PEQUENO ENSAIO SOBRE A MÍDIA- MODUS OPERANDI E DOMINÂNCIA - Marcelo Cajueiro

30 . A era da blogosfera – Luiz Nassif 31. Audiência de Vídeos on Line no Brasil

32. O Governo é uma graça Milton Ribeiro

33. Por que o governo deve apoiar a mídia alternativa - Venício Lima

34. Cai confiança do leitor na imprensa tradicional - Blog cidadania

35. O último suspiro de influência da mídia – Paulo Nogueira

(3)

1.A sedução do

poder

por Raúl Pierri, da IPS - 28 junho 2011

Montevidéu, Uruguai, 27/6/2011 – Os governos e os grandes meios privados de comunicação da América Latina travam uma guerra para conquistar a opinião pública, verdadeira legitimadora de poder, e a única solução parece ser uma aliança. “Batalha”, a palavra mais repetida no seminário “Comunicação, Pluralismo e Papel das Novas Tecnologias. O Cenário Latino-Americano: um Olhar sobre o Futuro”, realizado no dia 24, em Montevidéu, pela agência de notícias Inter Press Service (IPS) com apoio do Banco Mundial e do governo do Uruguai.

Ignacio Castañares/IPS

O presidente do Uruguai, José Mujica, fala no seminário organizado pela IPS e o Banco

(4)

Mundial.

Do encontro participaram autoridades de meios de comunicação públicos e estatais da região, jornalistas, representantes da sociedade civil, e especialistas em comunicações. Essa batalha entre governos e mídia privada pelo manejo da informação ficou em primeiro plano nos últimos anos na América Latina, e tem como marco uma onda de administrações de esquerda e seu enfrentamento com determinados monopólios ou oligopólios.

Esses governos tiveram que fazer um pacto de paz com o grande capital, mas também apostaram em uma transformação das comunicações procurando democratizar a mídia, inclusive poe meio de leis, explicou Fábio Zanini, editor internacional da Folha de S.Paulo. Zanini citou o exemplo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que para chegar ao governo “teve de fazer um movimento político estratégico, midiático, para mostrar-se confiável perante os bancos, o grande capital, os latifundiários e, também, para atrair para sua coalizão partidos de direita”.

Em definitivo, os governos de esquerda, e também os de direita, como o de Sebastián Piñera no Chile, reconhecem a importância vital dos meios de comunicação, com os quais “têm uma relação conflitante”, afirmou Zanini. O secretário da Presidência do Uruguai, Alberto Breccia, preferiu qualificar a relação da esquerda com a imprensa de

“esquizofrênica” e pediu aos participantes que propusessem elementos para saná-la. Zanini destacou os esforços dos governos para ampliar os espaços públicos de

comunicação, criando ou renovando canais e rádios, e expressou dúvidas quanto a estes serem realmente imparciais, alertando que podem simplesmente ser usados com fins de propaganda oficialista.

Por sua vez, Alberto Medina, codiretor de notícias da privada Cadeia Caracol TV, da Colômbia, disse que existe “uma guerra pela informação entre os setores público e privado”. E afirmou: “Não estou convencido de que os governos abram suficientemente os canais para um debate entre todos os setores. Sou um pouco descrente desses meios públicos ‘tão democráticos’. Não vejo espaços abertos para a oposição nos canais públicos. São canais que defendem as teses do governo da vez”, acrescentou.

Em meio a este enfrentamento, a missão da mídia comunitária “é poder instalar a luta pela liberdade de expressão como uma demanda geral”, disse à IPS a presidente da Associação Mundial de Rádios Comunitárias, a chilena María Pía Matta. “Nós tampouco queremos que nos transformem em atores do governo da vez. Creio que é preciso

discutir mais sobre as liberdades em geral, sobre a liberdade de expressão e por que o Estado se afasta tanto destas liberdades”, afirmou. Na região, “o Estado sempre foi considerado um predador natural da liberdade de expressão, e isso ficou incrustado”, acrescentou.

No entanto, o diretor do jornal uruguaio de esquerda La República, Federico Fasano Mertens, disse que não são dois lados em batalha, mas três: o Estado, a mídia e a sociedade em geral. “A informação é um bem público, um bem comum, um patrimônio da humanidade. E, embora esteja sujeita à apropriação privada, porque o sistema assim o determina, deve estar na ordem do dia desestimular os monopólios e incentivar o

pluralismo”, acrescentou.

Para Mertens, que também é diretor da Rádio AM Libre e do canal TV Libre, o fato de em um país haver vários meios de comunicação e de diferentes proprietários não significa necessariamente pluralismo. “Se existe apenas um único pensamento hegemônico, apesar de serem veículos diferentes, é quase um monopólio”, ressaltou. O seminário foi acompanhado em tempo real pela internet, e dezenas de pessoas comentaram em um chat os conteúdos e fizeram perguntas aos debatedores. Por ali

(5)

passaram as experiências das redes sociais, como o Twitter, nos levantes árabes e no movimento de descontentamento civil 15M (15 de Maio) na Espanha.

No entanto, o diretor de Comunicação do Governo de El Salvador, David Rivas, defendeu as medidas desse país para controlar a informação e para eliminar programas da mídia estatal que, segundo afirmou, é “nociva para a psique”. Acrescentou que

“retiramos programas que os governos anteriores haviam deixado nos veículos de comunicação do Estado com uma carga ideológica impressionante, onde nos vendiam a sociedade entre ricos e maus, se denegria a imagem da mulher e eram apresentadas coisas que beiravam o crime”.

Rivas também insistiu na necessidade de “perder o medo da regulamentação” dos conteúdos e das leis para “garantir maior acesso da população à mídia”. E ressaltou que

“não existe um direito absoluto, nem mesmo o da liberdade de expressão. Os que nos disseram que ‘a melhor lei é a que existe’ nos enganaram todo esse tempo”, afirmou. Essa frase foi citada durante o seminário e pertence ao orador principal, o presidente do Uruguai, José Mujica, que a utilizou há alguns meses para não aceitar uma proposta de legislar sobre os meios de comunicação deste país que, paradoxalmente, nasceu de um âmbito instalado por seu governo. Mas não foi Mujica quem repetiu essa frase no seminário que, por outro lado, exortou os presentes à “luta permanente” pela liberdade.

“Embora os meios de comunicação modernos e contemporâneos sejam capazes de nos dar recursos inimagináveis para nos comunicarmos, também podem ser os instrumentos mais negadores da liberdade”, afirmou. “Significa que a questão de como se usa e para qual finalidade se usa o progresso tecnológico é uma batalha, é quase desesperador”, acrescentou.

Miguel Wiñazki, secretário de redação do jornal argentino Clarín, decidiu começar por uma definição de opinião pública: “um coletivo que concede poder”, gerador, portanto, de um mecanismo de sedução colocado em prática pelos políticos e pela mídia.

“Percebidas as crenças, os preconceitos e as ideologias dominantes da opinião pública, tanto os governos quanto a corporação política e a mídia privada tendem a exonerar o valor da informação em si para dar à opinião pública a fábula que está escrevendo”, disse Wiñazki. A esse conceito chamou de “notícia desejada”.

Esta notícia desejada, definitivamente, não passa de propaganda. “A ação jornalística propriamente dita é a batalha cotidiana dos trabalhadores da imprensa para impor a informação acima da notícia desejada”, ressaltou Wiñazki. Envolverde/IPS

2.Confecom aprova criação de Conselho Federal dos Jornalistas

A 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) aprovou hoje (16)em Brasília, a proposta de criação do Conselho Federal dos Jornalistas e a necessidade da formação superior específica em Jornalismo - o diploma - para o exercício da profissão. Como as duas propostas foram aprovadas por mais de 80% da plenária, nos dois grupos de

(6)

trabalhos - que reúne sociedade civil, sociedade empresarial e poder público - as propostas estão aprovadas pela Confecom, não necessitando ir à plenária final. Redação

A 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) aprovou hoje (16)em Brasília, a proposta de criação do Conselho Federal dos Jornalistas e a necessidade da formação superior específica em Jornalismo - o diploma - para o exercício da profissão. Como as duas propostas foram aprovadas por mais de 80% da plenária, nos dois grupos de trabalhos - que reúne sociedade civil, sociedade empresarial e poder público - as propostas estão aprovadas pela Confecom, não necessitando ir à plenária final.

Outra proposta aprovada por consenso foi a do fim dos pacotes fechados das TVs por assinatura. A intenção é permitir que os assinantes possam escolher os canais que quiserem.

A proposta da necessidade de diploma em Jornalismo resguarda os espaços para profissionais colaboradores com outras formações, que poderão atuar na área de sua especialidade, assim como as funções atuais de nível médio. A proposta do CFJ foi aprovada no Grupo de Trabalho 11 (regulamentações, regulações) e o diploma foi aprovado no Grupo de Trabalho 13 (órgãos reguladores, classificação indicatória, regulamentações profissionais). As propostas foram aprovadas por acordo entre os três segmentos da Confecom.

Os trabalhos dos GTs terminaram no início da tarde desta quarta-feira. Após, começou a plenária final que votará as 150 propostas prioritárias (dez por GT, sendo quatro da sociedade civil, quatro do empresariado e duas do poder público) e que não passaram direto nos grupos de trabalhos (não obtiveram mais de 80% dos votos qualificados). A 1ª Confecom tem como tema central “Comunicação: meios para a construção de direitos e de cidadania na era digital” e desenvolve-se baseada sobre três eixos temáticos: “Produção de conteúdo”; “Meios de distribuição”; e “Cidadania: direitos e deveres”. Além dos 1.600 delegados que saíram da fase estadual da 1ª Confecom e 130

“observadores livres” de todo o País, que se inscreveram pelo site oficial da 1ª

Confecom, mais de 300 jornalistas de todo o país se credenciaram para cobrir o evento. As propostas aprovadas na 1ª Confecom serão encaminhadas ao Governo Federal para se tornarem políticas de comunicação do País.

3.Marilena Chauí

(7)

Num evento em defesa da liberdade de expressão e por uma Ley de Medios, realizado no Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, nessa segunda feira, a professora Marilena Chauí fez uma palestra antológica.

I. Democracia e autoritarismo social

Estamos acostumados a aceitar a definição liberal da democracia como regime da lei e da ordem para a garantia das liberdades individuais. Visto que o pensamento e a prática liberais identificam a liberdade com a ausência de obstáculos à competição, essa definição da democracia significa, em primeiro lugar, que a liberdade se reduz à competição econômica da chamada “livre iniciativa” e à competição política entre partidos que disputam eleições; em segundo, que embora a democracia apareça

justificada como “valor” ou como “bem”, é encarada, de fato, pelo critério da eficácia, medida no plano do poder executivo pela atividade de uma elite de técnicos

competentes aos quais cabe a direção do Estado. A democracia é, assim, reduzida a um regime político eficaz, baseado na idéia de cidadania organizada em partidos políticos, e se manifesta no processo eleitoral de escolha dos representantes, na rotatividade dos governantes e nas soluções técnicas para os problemas econômicos e sociais.

Ora, há, na prática democrática e nas idéias democráticas, uma profundidade e uma verdade muito maiores e superiores ao que liberalismo percebe e deixa perceber. Podemos, em traços breves e gerais, caracterizar a democracia ultrapassando a simples idéia de um regime político identificado à forma do governo, tomando-a como forma geral de uma sociedade e, assim, considerá-la:

1. forma sócio-política definida pelo princípio da isonomia ( igualdade dos cidadãos perante a lei) e da isegoria (direito de todos para expor em público suas opiniões, vê-las discutidas, aceitas ou recusadas em público), tendo como base a afirmação de que todos são iguais porque livres, isto é, ninguém está sob o poder de um outro porque todos obedecem às mesmas leis das quais todos são autores (autores diretamente, numa democracia participativa; indiretamente, numa democracia representativa). Donde o maior problema da democracia numa sociedade de classes ser o da manutenção de seus princípios – igualdade e liberdade – sob os efeitos da desigualdade real;

2. forma política na qual, ao contrário de todas as outras, o conflito é considerado legítimo e necessário, buscando mediações institucionais para que possa exprimir-se. A democracia não é o regime do consenso, mas do trabalho dos e sobre os conflitos. Donde uma outra dificuldade democrática nas sociedades de classes: como operar com os conflitos quando estes possuem a forma da contradição e não a da mera oposição? 3. forma sócio-política que busca enfrentar as dificuldades acima apontadas conciliando o princípio da igualdade e da liberdade e a existência real das desigualdades, bem como o princípio da legitimidade do conflito e a existência de contradições materiais

introduzindo, para isso, a idéia dos direitos ( econômicos, sociais, políticos e culturais). Graças aos direitos, os desiguais conquistam a igualdade, entrando no espaço político

(8)

para reivindicar a participação nos direitos existentes e sobretudo para criar novos direitos. Estes são novos não simplesmente porque não existiam anteriormente, mas porque são diferentes daqueles que existem, uma vez que fazem surgir, como cidadãos, novos sujeitos políticos que os afirmaram e os fizeram ser reconhecidos por toda a sociedade.

4. graças à idéia e à prática da criação de direitos, a democracia não define a liberdade apenas pela ausência de obstáculos externos à ação, mas a define pela autonomia, isto é, pela capacidade dos sujeitos sociais e políticos darem a si mesmos suas próprias normas e regras de ação. Passa-se, portanto, de uma definição negativa da liberdade – o não obstáculo ou o não-constrangimento externo – a uma definição positiva – dar a si mesmo suas regras e normas de ação. A liberdade possibilita aos cidadãos instituir contra-poderes sociais por meio dos quais interferem diretamente no poder por meio de reivindicações e controle das ações estatais.

5. pela criação dos direitos, a democracia surge como o único regime político realmente aberto às mudanças temporais, uma vez que faz surgir o novo como parte de sua

existência e, conseqüentemente, a temporalidade é constitutiva de seu modo de ser, de maneira que a democracia é a sociedade verdadeiramente histórica, isto é, aberta ao tempo, ao possível, às transformações e ao novo. Com efeito, pela criação de novos direitos e pela existência dos contra-poderes sociais, a sociedade democrática não está fixada numa forma para sempre determinada, pois não cessa de trabalhar suas divisões e diferenças internas, de orientar-se pela possibilidade objetiva de alterar-se pela própria práxis;

6. única forma sócio-política na qual o caráter popular do poder e das lutas tende a evidenciar-se nas sociedades de classes, na medida em que os direitos só ampliam seu alcance ou só surgem como novos pela ação das classes populares contra a cristalização jurídico-política que favorece a classe dominante. Em outras palavras, a marca da democracia moderna, permitindo sua passagem de democracia liberal á democracia social, encontra-se no fato de que somente as classes populares e os excluídos (as

“minorias”) reivindicam direitos e criam novos direitos;

7. forma política na qual a distinção entre o poder e o governante é garantida não só pela presença de leis e pela divisão de várias esferas de autoridade, mas também pela existência das eleições, pois estas ( contrariamente do que afirma a ciência política) não significam mera “alternância no poder”, mas assinalam que o poder está sempre vazio, que seu detentor é a sociedade e que o governante apenas o ocupa por haver recebido um mandato temporário para isto. Em outras palavras, os sujeitos políticos não são simples votantes, mas eleitores. Eleger significa não só exercer o poder, mas manifestar a origem do poder, repondo o princípio afirmado pelos romanos quando inventaram a política: eleger é “dar a alguém aquilo que se possui, porque ninguém pode dar o que não tem”, isto é, eleger é afirmar-se soberano para escolher ocupantes temporários do governo.

(9)

Dizemos, então, que uma sociedade — e não um simples regime de governo — é democrática quando, além de eleições, partidos políticos, divisão dos três poderes da república, respeito à vontade da maioria e da minoria, institui algo mais profundo, que é condição do próprio regime político, ou seja, quando institui direitos e que essa

instituição é uma criação social, de tal maneira que a atividade democrática social realiza-se como uma contra-poder social que determina, dirige, controla e modifica a ação estatal e o poder dos governantes.

Se esses são os principais traços da sociedade democrática, podemos avaliar as enormes dificuldades para instituir a democracia no Brasil. De fato, a sociedade brasileira é estruturalmente violenta, hierárquica, vertical, autoritária e oligárquica e o Estado é patrimonialista e cartorial, organizado segundo a lógica clientelista e burocrática. O clientelismo bloqueia a prática democrática da representação — o representante não é visto como portador de um mandato dos representados, mas como provedor de favores aos eleitores. A burocracia bloqueia a democratização do Estado porque não é uma organização do trabalho e sim uma forma de poder fundada em três princípios opostos aos democráticos: a hierarquia, oposta à igualdade; o segredo, oposto ao direito à informação; e a rotina de procedimentos, oposta à abertura temporal da ação política. Além disso, social e economicamente nossa sociedade está polarizada entre a carência absoluta das camadas populares e o privilégio absoluto das camadas dominantes e dirigentes, bloqueando a instituição e a consolidação da democracia. Um privilégio é, por definição, algo particular que não pode generalizar-se nem universalizar-se sem deixar de ser privilégio. Uma carência é uma falta também particular ou específica que se exprime numa demanda também particular ou específica, não conseguindo

generalizar-se nem universalizar-se. Um direito, ao contrário de carências e privilégios, não é particular e específico, mas geral e universal, seja porque é o mesmo e válido para todos os indivíduos, grupos e classes sociais, seja porque embora diferenciado é reconhecido por todos (como é caso dos chamados direitos das minorias). Assim, a polarização econômico-social entre a carência e o privilégio ergue-se como obstáculo à instituição de direitos, definidora da democracia.

A esses obstáculos, podemos acrescentar ainda aquele decorrente do neoliberalismo, qual seja o encolhimento do espaço público e o alargamento do espaço privado. Economicamente, trata-se da eliminação de direitos econômicos, sociais e políticos garantidos pelo poder público, em proveito dos interesses privados da classe dominante, isto é, em proveito do capital; a economia e a política neoliberais são a decisão de destinar os fundos públicos aos investimentos do capital e de cortar os investimentos públicos destinados aos direitos sociais, transformando-os em serviços definidos pela lógica do mercado, isto é, a privatização dos direitos transformados em serviços, privatização que aumenta a cisão social entre a carência e o privilégio, aumentando todas formas de exclusão. Politicamente o encolhimento do público e o alargamento do privado colocam em evidência o bloqueio a um direito democrático fundamental sem o qual a cidadania, entendida como participação social, política e cultural é impossível, qual seja, o direito à informação.

(10)

II. Os meios de comunicação como exercício de poder

Podemos focalizar o exercício do poder pelos meios de comunicação de massa sob dois aspectos principais: o econômico e o ideológico.

Do ponto de vista econômico, os meios de comunicação fazem parte da indústria cultural. Indústria porque são empresas privadas operando no mercado e que, hoje, sob a ação da chamada globalização, passa por profundas mudanças estruturais, “num processo nunca visto de fusões e aquisições, companhias globais ganharam posições de domínio na mídia.”, como diz o jornalista Caio Túlio Costa. Além da forte concentração (os oligopólios beiram o monopólio), também é significativa a presença, no setor das comunicações, de empresas que não tinham vínculos com ele nem tradição nessa área. O porte dos investimentos e a perspectiva de lucros jamais vistos levaram grupos

proprietários de bancos, indústria metalúrgica, indústria elétrica e eletrônica, fabricantes de armamentos e aviões de combate, indústria de telecomunicações a adquirir, mundo afora, jornais, revistas, serviços de telefonia, rádios e televisões, portais de internet, satélites, etc..

No caso do Brasil, o poderio econômico dos meios é inseparável da forma oligárquica do poder do Estado, produzindo um dos fenômenos mais contrários à democracia, qual seja, o que Alberto Dines chamou de “coronelismo eletrônico”, isto é, a forma

privatizada das concessões públicas de canais de rádio e televisão, concedidos a

parlamentares e lobbies privados, de tal maneira que aqueles que deveriam fiscalizar as concessões públicas se tornam concessionários privados, apropriando-se de um bem público para manter privilégios, monopolizando a comunicação e a informação. Esse privilégio é um poder político que se ergue contra dois direitos democráticos essenciais: a isonomia (a igualdade perante a lei) e a isegoria (o direito à palavra ou o igual direito de todos de expressar-se em público e ter suas opiniões publicamente discutidas e avaliadas). Numa palavra, a cidadania democrática exige que os cidadãos estejam informados para que possam opinar e intervir politicamente e isso lhes é roubado pelo poder econômico dos meios de comunicação.

A isonomia e a isegoria são também ameaçadas e destruídas pelo poder ideológico dos meios de comunicação. De fato, do ponto de vista ideológico, a mídia exerce o poder sob a forma do denominamos a ideologia da competência, cuja peculiaridade está em seu modo de aparecer sob a forma anônima e impessoal do discurso do conhecimento, e cuja eficácia social, política e cultural está fundada na crença na racionalidade técnico- científica.

A ideologia da competência pode ser resumida da seguinte maneira: não é qualquer um que pode em qualquer lugar e em qualquer ocasião dizer qualquer coisa a qualquer outro. O discurso competente determina de antemão quem tem o direito de falar e quem deve ouvir, assim como pré-determina os lugares e as circunstâncias em que é permitido falar e ouvir, e define previamente a forma e o conteúdo do que deve ser dito e precisa

(11)

ser ouvido. Essas distinções têm como fundamento uma distinção principal, aquela que divide socialmente os detentores de um saber ou de um conhecimento (científico, técnico, religioso, político, artístico), que podem falar e têm o direito de mandar e comandar, e os desprovidos de saber, que devem ouvir e obedecer. Numa palavra, a ideologia da competência institui a divisão social entre os competentes, que sabem e por isso mandam, e os incompetentes, que não sabem e por isso obedecem.

Enquanto discurso do conhecimento, essa ideologia opera com a figura do especialista. Os meios de comunicação não só se alimentam dessa figura, mas não cessam de institui- la como sujeito da comunicação. O especialista competente é aquele que, no rádio, na TV, na revista, no jornal ou no multimídia, divulga saberes, falando das últimas descobertas da ciência ou nos ensinando a agir, pensar, sentir e viver. O especialista competente nos ensina a bem fazer sexo, jardinagem, culinária, educação das crianças, decoração da casa, boas maneiras, uso de roupas apropriadas em horas e locais

apropriados, como amar Jesus e ganhar o céu, meditação espiritual, como ter um corpo juvenil e saudável, como ganhar dinheiro e subir na vida. O principal especialista, porém, não se confunde com nenhum dos anteriores, mas é uma espécie de síntese, construída a partir das figuras precedentes: é aquele que explica e interpreta as notícias e os acontecimentos econômicos, sociais, políticos, culturais, religiosos e esportivos, aquele que devassa, eleva e rebaixa entrevistados, zomba, premia e pune calouros — em suma, o chamado “formador de opinião” e o “comunicador”.

Ideologicamente, o poder da comunicação de massa não é um simples inculcação de valores e idéias, pois, dizendo-nos o que devemos pensar, sentir, falar e fazer, o

especialista, o formador de opinião e o comunicados nos dizem que nada sabemos e por isso seu poder se realiza como manipulação e intimidação social e cultural.

Um dos aspectos mais terríveis desse duplo poder dos meios de comunicação se manifesta nos procedimentos midiáticos de produção da culpa e condenação sumária dos indivíduos, por meio de um instrumento psicológico profundo: a suspeição, que pressupõe a presunção de culpa. Ao se referir ao período do Terror, durante a Revolução Francesa, Hegel considerou que uma de suas marcas essenciais é afirmar que, por princípio, todos são suspeitos e que os suspeitos são culpados antes de qualquer prova. Ao praticar o terror, a mídia fere dois direitos constitucionais democráticos, instituídos pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789 (Revolução Francesa) e pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, quais sejam: a presunção de inocência (ninguém pode ser considerado culpado antes da prova da culpa) e a

retratação pública dos atingidos por danos físicos, psíquicos e morais, isto é, atingidos pela infâmia, pela injúria e pela calúnia. É para assegurar esses dois direitos que as sociedades democráticas exigem leis para regulação dos meios de comunicação, pois essa regulação é condição da liberdade e da igualdade que definem a sociedade democrática.

III.

(12)

Faz parte da vida da grande maioria da população brasileira ser espectadora de um tipo de programa de televisão no qual a intimidade das pessoas é o objeto central do

espetáculo: programas de auditório, de entrevistas e de debates com adultos, jovens e crianças contando suas preferências pessoais desde o sexo até o brinquedo, da culinária ao vestuário, da leitura à religiosidade, do ato de escrever ou encenar uma peça teatral, de compor uma música ou um balé até os hábitos de lazer e cuidados corporais. As ondas sonoras do rádio e as transmissões televisivas tornam-se cada vez mais consultórios sentimental, sexual, gastronômico, geriátrico, ginecológico, culinário, de cuidados com o corpo (ginástica, cosméticos, vestuário, medicamentos), de jardinagem, carpintaria, bastidores da criação artística, literária e da vida doméstica. Há programas de entrevista no rádio e na televisão que ou simulam uma cena doméstica – um almoço, um jantar – ou se realizam nas casas dos entrevistados durante o café da manhã, o almoço ou o jantar, nos quais a casa é exibida, os hábitos cotidianos são descritos e comentados, álbuns de família ou a própria são mostrados ao vivo e em cores. Os

entrevistados e debatedores, os competidores dos torneios de auditório, os que aparecem nos noticiários, todos são convidados e mesmo instados com vigor a que falem de suas preferências, indo desde sabores de sorvete até partidos políticos, desde livros e filmes até hábitos sociais. Não é casual que os noticiários, no rádio e na televisão, ao

promoverem entrevistas em que a notícia é intercalada com a fala dos direta ou indiretamente envolvidos no fato, tenham sempre repórteres indagando a alguém: “o que você sentiu/sente com isso?” ou “o que você achou/acha disso?” ou “você gosta? não gosta disso?”. Não se pergunta aos entrevistados o que pensam ou o que julgam dos acontecimentos, mas o que sentem, o que acham, se lhes agrada ou desagrada.

Também tornou-se um hábito nacional jornais e revistas especializarem-se cada vez mais em telefonemas a “personalidades” indagando-lhes sobre o que estão lendo no momento, que filme foram ver na última semana, que roupa usam para dormir, qual a lembrança infantil mais querida que guardam na memória, que música preferiam aos 15 anos de idade, o que sentiram diante de uma catástrofe nuclear ou ecológica, ou diante de um genocídio ou de um resultado eleitoral, qual o sabor do sorvete preferido, qual o restaurante predileto, qual o perfume desejado. Os assuntos se equivalem, todos são questão de gosto ou preferência, todos se reduzem à igual banalidade do “gosto” ou

“não gosto”, do “achei ótimo” ou “achei horrível”.

Todos esses fatos nos conduzem a uma conclusão: a mídia está imersa na cultura do narcisismo.

Como observa Christopher Lash, em A Cultura do Narcisismo, os mass media tornaram irrelevantes as categorias da verdade e da falsidade substituindo-as pelas noções de credibilidade ou plausibilidade e confiabilidade – para que algo seja aceito como real basta que apareça como crível ou plausível, ou como oferecido por alguém confiável Os fatos cedem lugar a declarações de “personalidades autorizadas”, que não transmitem informações, mas preferências e estas se convertem imediatamente em propaganda. Como escreve Lash, “sabendo que um público cultivado é ávido por fatos e cultiva a

(13)

ilusão de estar bem informado, o propagandista moderno evita slogans grandiloqüentes e se atém a ‘fatos’, dando a ilusão de que a propaganda é informação”.

Qual a base de apoio da credibilidade e da confiabilidade? A resposta encontra-se num outro ponto comum aos programas de auditório, às entrevistas, aos debates, às

indagações telefônicas de rádios, revistas e jornais, aos comerciais de propaganda. Trata-se do apelo à intimidade, à personalidade, à vida privada como suporte e garantia da ordem pública. Em outras palavras, os códigos da vida pública passam a ser

determinados e definidos pelos códigos da vida privada, abolindo-se a diferença entre espaço público e espaço privado. Assim, as relações interpessoais, as relações

intersubjetivas e as relações grupais aparecem com a função de ocultar ou de dissimular as relações sociais enquanto sociais e as relações políticas enquanto políticas, uma vez que a marca das relações sociais e políticas é serem determinadas pelas instituições sociais e políticas, ou seja, são relações mediatas, diferentemente das relações pessoais, que são imediatas, isto é, definidas pelo relacionamento direto entre pessoas e por isso mesmo nelas os sentimentos, as emoções, as preferências e os gostos têm um papel decisivo. As relações sociais e políticas, que são mediações referentes a interesses e a direitos regulados pelas instituições, pela divisão social das classes e pela separação entre o social e o poder político, perdem sua especificidade e passam a operar sob a aparência da vida privada, portanto, referidas a preferências, sentimentos, emoções, gostos, agrado e aversão.

Não é casual, mas uma conseqüência necessária dessa privatização do social e do político, a destruição de uma categoria essencial das democracias, qual seja a da opinião pública. Esta, em seus inícios (desde a Revolução Francesa de 1789), era definida como a expressão, no espaço público, de uma reflexão individual ou coletiva sobre uma questão controvertida e concernente ao interesse ou ao direito de uma classe social, de um grupo ou mesmo da maioria. A opinião pública era um juízo emitido em público sobre uma questão relativa à vida política, era uma reflexão feita em público e por isso definia-se como uso público da razão e como direito à liberdade de pensamento e de expressão.

É sintomático que, hoje, se fale em “sondagem de opinião”. Com efeito, a palavra sondagem indica que não se procura a expressão pública racional de interesses ou direitos e sim que se vai buscar um fundo silencioso, um fundo não formulado e não refletido, isto é, que se procura fazer vir à tona o não-pensado, que existe sob a forma de sentimentos e emoções, de preferências, gostos, aversões e predileções, como se os fatos e os acontecimentos da vida social e política pudessem vir a se exprimir pelos

sentimentos pessoais. Em lugar de opinião pública, tem-se a manifestação pública de sentimentos.

Nada mais constrangedor e, ao mesmo tempo, nada mais esclarecedor do que os

instantes em que o noticiário coloca nas ondas sonoras ou na tela os participantes de um acontecimento falando de seus sentimentos, enquanto locutores explicam e interpretam o que se passa, como se os participantes fossem incapazes de pensar e de emitir juízo

(14)

sobre aquilo de que foram testemunhas diretas e partes envolvidas. Constrangedor, porque o rádio e a televisão declaram tacitamente a incompetência dos participantes e envolvidos para compreender e explicar fatos e acontecimentos de que são

protagonistas. Esclarecedor, porque esse procedimento permite, no instante mesmo em que se dão, criar a versão do fato e do acontecimento como se fossem o próprio fato e o próprio acontecimento. Assim, uma partilha é claramente estabelecida: os participantes

“sentem”, portanto, não sabem nem compreendem (não pensam); em contrapartida, o locutor pensa, portanto, sabe e, graças ao seu saber, explica o acontecimento.

É possível perceber três deslocamentos sofridos pela idéia e prática da opinião pública: o primeiro, como salientamos, é a substituição da idéia de uso público da razão para exprimir interesses e direitos de um indivíduo, um grupo ou uma classe social pela idéia de expressão em público de sentimentos, emoções, gostos e preferências individuais; o segundo, como também observamos, é a substituição do direito de cada um e de todos de opinar em público pelo poder de alguns para exercer esse direito, surgindo, assim, a curiosa expressão “formador de opinião”, aplicada a intelectuais, artistas e jornalistas; o terceiro, que ainda não havíamos mencionado, decorre de uma mudança na relação entre s vários meios de comunicação sob os efeitos das tecnologias eletrônica e digital e da formação de oligopólios midiáticos globalizados (alguns autores afirmam que o século XXI começou com a existência de 10 ou 12 conglomerados de mass media de alcance global). Esse terceiro deslocamento se refere à forma de ocupação do espaço da opinião pública pelos profissionais dos meios de comunicação. Esses deslocamentos explicam algo curioso, ocorrido durante as sondagens de intenção de voto nas eleições

presidenciais de 2006: diante dos resultados, uma jornalista do jornal O Globo escreveu que o povo estava contra a opinião pública!

O caso mais interessante é, sem dúvida, o do jornalismo impresso. Em tempos passados, cabia aos jornais a tarefa noticiosa e um jornal era fundamentalmente um órgão de notícias. Sem dúvida, um jornal possuía opiniões e as exprimia: isso era feito, de um lado, pelos editorais e por artigos de não-jornalistas, e, de outro, pelo modo de

apresentação da notícia (escolha das manchetes e do “olho”, determinação da página em que deveria aparecer e na vizinhança de quais outras, do tamanho do texto, da presença ou ausência de fotos, etc.). Ora, com os meios eletrônicos e digitais e a televisão, os fatos tendem a ser noticiados enquanto estão ocorrendo, de maneira que a função noticiosa do jornal é prejudicada, pois a notícia impressa é posterior à sua transmissão pelos meios eletrônicos e pela televisão. Ou na linguagem mais costumeira dos meios de comunicação: no mercado de notícias, o jornalismo impresso vem perdendo competitividade (alguns chamam a isso de progresso; outros, de racionalidade inexorável do mercado!).

O resultado dessa situação foi duplo: de um lado, a notícia é apresentada de forma mínima, rápida e, freqüentemente, inexata – o modelo conhecido como News Letter – e, de outro, deu-se a passagem gradual do jornal como órgão de notícias a órgão de

opinião, ou seja, os jornalistas comentam e interpretam as notícias, opinando sobre elas. Gradualmente desaparece uma figura essencial do jornalismo: o jornalismo

(15)

investigativo, que cede lugar ao jornalismo assertivo ou opinativo. Os jornalista passam, assim, o ocupar o lugar que, tradicionalmente, cabia a grupos e classes sociais e a partidos políticos e, além disso, sua opinião não fica restrita ao meio impresso, mas passa a servir como material para os noticiários de rádio e televisão, ou seja, nesses noticiários, a notícia é interpretada e avaliada graças à referência às colunas dos jornais. Os deslocamentos mencionados e, particularmente, este último, têm conseqüências graves sob dois aspectos principais:

1) uma vez que o jornalista concentra poderes e forma a opinião pública, pode sentir-se tentado a ir além disso e criar a própria realidade, isto é, sua opinião passa a ter o valor de um fato e a ser tomada como um acontecimento real ;

2) os efeitos da concentração do poder econômico midiático. Os meios de comunicação tradicionais (jornal, rádio, cinema, televisão) sempre foram propriedade privada de indivíduos e grupos, não podendo deixar de exprimir seus interesses particulares ou privados, ainda que isso sempre tenha imposto problemas e limitações à liberdade de expressão, que fundamenta a idéia de opinião pública. Hoje, porém, os conglomerados de alcance global controlam não só os meios tradicionais, mas também os novos meios eletrônicos e digitais, e avaliam em termos de custo-benefício as vantagens e

desvantagens do jornalismo escrito ou da imprensa, podendo liquidá-la, se não acompanhar os ares do tempo.

Esses dois aspectos incidem diretamente sobre a transformação da verdade e da falsidade em questão de credibilidade e plausibilidade. Rápido, barato, inexato, partidarista, mescla de informações aleatoriamente obtidas e pouco confiáveis, não investigativo, opinativo ou assertivo, detentor da credibilidade e da plausibilidade, o jornalismo se tornou protagonista da destruição da opinião pública.

De fato, a desinformação é o principal resultado da maioria dos noticiários nos jornais, no rádio e na televisão, pois, de modo geral, as notícias são apresentadas de maneira a impedir que se possa localizá-la no espaço e no tempo.

Ausência de referência espacial ou atopia: as diferenças próprias do espaço percebido (perto, longe, alto, baixo, grande, pequeno) são apagadas; o aparelho de rádio e a tela da televisão tornam-se o único espaço real. As distâncias e proximidades, as diferenças geográficas e territoriais são ignoradas, de tal modo que algo acontecido na China, na Índia, nos Estados Unidos ou em Campina Grande apareça igualmente próximo e igualmente distante.

Ausência de referência temporal ou acronia: os acontecimentos são relatados como se não tivessem causas passadas nem efeitos futuros; surgem como pontos puramente atuais ou presentes, sem continuidade no tempo, sem origem e sem conseqüências; existem enquanto forem objetos de transmissão e deixam de existir se não forem transmitidos. Têm a existência de um espetáculo e só permanecem na consciência dos ouvintes e espectadores enquanto permanecer o espetáculo de sua transmissão.

(16)

Como operam efetivamente os noticiários?

Em primeiro lugar, estabelecem diferenças no conteúdo e na forma das notícias de acordo com o horário da transmissão e o público, rumando para o sensacionalismo e o popularesco nos noticiários diurnos e do início da noite e buscando sofisticação e aumento de fatos nos noticiários de fim de noite. Em segundo, por seleção das notícias, omitindo aquelas que possam desagradar o patrocinador ou os poderes estabelecidos. Em terceiro, pela construção deliberada e sistemática de uma ordem apaziguadora: em seqüência, apresentam, no início, notícias locais, com ênfase nas ocorrências policiais, sinalizando o sentimento de perigo; a seguir, entram as notícias regionais, com ênfase em crises e conflitos políticos e sociais, sinalizando novamente o perigo; passam às notícias internacionais, com ênfase em guerras e cataclismos (maremoto, terremoto, enchentes, furacões), ainda uma vez sinalizando perigo; mas concluem com as notícias nacionais, enfatizando as idéias de ordem e segurança, encarregadas de desfazer o medo produzido pelas demais notícias. E, nos finais de semana, terminam com notícias de eventos artísticos ou sobre animais (nascimento de um ursinho, fuga e retorno de um animal em cativeiro, proteção a espécies ameaçadas de extinção), de maneira a produzir o sentimento de bem-estar no espectador pacificado, sabedor de que, apesar dos pesares, o mundo vai bem, obrigado.

Paradoxalmente, rádio e televisão podem oferecer-nos o mundo inteiro num instante, mas o fazem de tal maneira que o mundo real desaparece, restando apenas retalhos fragmentados de uma realidade desprovida de raiz no espaço e no tempo. Como

desconhecemos as determinações econômico-territoriais (geográficas, geopolíticas, etc.) e como ignoramos os antecedentes temporais e as conseqüências dos fatos noticiados, não podemos compreender seu verdadeiro significado. Essa situação se agrava com a TV a cabo, com emissoras dedicadas exclusivamente a notícias, durante 24 horas, colocando num mesmo espaço e num mesmo tempo (ou seja, na tela) informações de procedência, conteúdo e significado completamente diferentes, mas que se tornam homogêneas pelo modo de sua transmissão. O paradoxo está em que há uma verdadeira saturação de informação, mas, ao fim, nada sabemos, depois de termos tido a ilusão de que fomos informados sobre tudo.

Se não dispomos de recursos que nos permitam avaliar a realidade e a veracidade das imagens transmitidas, somos persuadidos de que efetivamente vemos o mundo quando vemos a TV ou quando navegamos pela internet. Entretanto, como o que vemos são as imagens escolhidas, selecionadas, editadas, comentadas e interpretadas pelo transmissor das notícias, então é preciso reconhecer que a TV é o mundo ou que a internet é o mundo.

A multimídia potencializa o fenômeno da indistinção entre as mensagens e entre os conteúdos. Como todas as mensagens estão integradas num mesmo padrão cognitivo e sensorial, uma vez que educação, notícias e espetáculos são fornecidos pelo mesmo meio, os conteúdos se misturam e se tornam indiscerníveis. No sistema de comunicação multimídia a própria realidade fica totalmente imersa em uma composição de imagens

(17)

virtuais num mundo irreal, no qual as aparências não apenas se encontram na tela comunicadora da experiência, mas se transformam em experiência. Todas as mensagens de todos os tipos são incluídas no meio por que fica tão abrangente, tão diversificado, tão maleável, que absorve no mesmo texto ou no mesmo espaço/tempo toda a

experiência humana, passada, presente e futura, como num ponto único do universo. Se, portanto, levarmos em consideração o monopólio da informação pelas empresas de comunicação de massa, podemos considerar, do ponto de vista da ação política, as redes sociais como ação democratizadora tanto por quebrar esse monopólio, assegurando a produção e a circulação livres da informação, como também por promover

acontecimentos políticos de afirmação do direito democrático à participação. No entanto, os usuários das redes sociais não possuem autonomia em sua ação e isto sob dois aspectos: em primeiro lugar, não possuem o domínio tecnológico da ferramenta que empregam e, em segundo, não detêm qualquer poder sobre a ferramenta empregada, pois este poder é uma estrutura altamente concentrada, a Internet Protocol, com dez servidores nos Estados Unidos e dois no Japão, nos quais estão alojados todos os endereços eletrônicos mundiais, de maneira que, se tais servidores decidirem se desligar, desaparece toda a internet; além disso, a gerência da internet é feita por uma empresa norte-americana em articulação com o Departamento de Comércio dos Estados Unidos, isto é, gere o cadastro da internet mundial. Assim, sob o aspecto

maravilhosamente criativo e anárquico das redes sociais em ação política ocultam-se o controle e a vigilância sobre seus usuários em escala planetária, isto é, sobre toda a massa de informação do planeta.

Na perspectiva da democracia, a questão que se coloca, portanto, é saber quem detêm o controle dessa massa cósmica de informações. Ou seja, o problema é saber quem tem a gestão de toda a massa de informações que controla a sociedade, quem utiliza essas informações, como e para que as utiliza, sobretudo quando se leva em consideração um fato técnico, que define a operação da informática, qual seja, a concentração e

centralização da informação, pois tecnicamente, os sistemas informáticos operam em rede, isto é, com a centralização dos dados e a produção de novos dados pela

combinação dos já coletados.

4.A tirania da comunicação

Ignácio Ramonet

(18)

Ignácio Ramonet não se intimida no texto: “A tirania da comunicação”. Não mede palavras e critica de maneira direta e repetitiva essa maneira ‘inconsciente’ dos meios de comunicação de informar a população. O autor utiliza-se da entrada do digital e da multimídia no sistema de informação para questionar o que o jornalismo se tornou. A televisão foi o grande alvo dos dardos. O primeiro arremesso começa quando é posto em dúvida a maneira como é utilizada a tecnologia para emocionar e não informar. As imagens seriam como uma brincadeira de puro entretenimento e as palavras do

apresentador ou repórter conduziriam o telespectador a uma história de fantasia, passando a ser apenas um passatempo ou uma leitura divertida.

Download do livro:

http://www.4shared.com/file/142412263/10642aff/Igncio_Ramonet_- _A_tirania_da_Comunicao.html

5.Democratização da Comunicação: Venezuela,

Argentina, Equador e agora a Bolívia

No Brasil a “rainha do lar” é a TV. TV aberta, gratuita e analógica. Nestes canais, vistos por mais de 90% da população brasileira segundo o último estudo da SECOM, não há um programa sequer, isto já há décadas, que promova o debate político. A política como um meio viável para se melhorar a vida e o planeta. Os movimentos sociais e os

políticos numa mesma mesa discutindo os nossos problemas e suas soluções.

Nestas TVs, políticos e povo só ganham destaque quando cometem algum

(19)

crime. O cidadão não tem como conhecer os políticos e suas políticas e vem votando pela fé e pelo bolso. Não se sabe o que é esquerda ou direita. Ou até mesmo o que faz um vereador. Uma tragédia. Não se iludam os progressistas porque se esta crise que está lá fora, vier a nos afetar seriamente, a direita volta.

Poucas famílias no Brasil exercem através de concessões públicas, portanto nossas, o direito de se comunicar. Mas este direito é de todos. Um direito humano.

Entenda-se por todos, os partidos de esquerda, os movimentos sociais, as comunidades, os sindicatos e as universidades. Coisa que no nosso país ainda é um sonho. Mas que por exemplo na Venezuela, Argentina ,

Equador e agora na Bolívia é a mais pura realidade. - http://www.bloguedosouza.com/

- BlogueDoSouza.

Reproduzo agora e ainda sobre o mesmo assunto, artigo do Altamiro

Borges publicado no http://altamiroborges.blogspot.com/2011/08/bolivia-aprova-ley-de- medios-e-o-brasil.html

- Blog do Miro:

Bolívia aprova Ley de Medios. E o Brasil?

O Senado da Bolívia aprovou na sexta-feira (29) a nova lei de

telecomunicações do país. O projeto deverá agora ser sancionado pelo presidente Evo Morales. Com isso, mais um país da América Latina avança na regulação da mídia – somando-se a Argentina, Venezuela e Equador. Já o Brasil continua empacado no debate sobre o marco regulatório.

Pelo projeto aprovado, haverá significativas alterações na concessão

(20)

pública de rádio e televisão na nação vizinha. A nova lei reserva 33% das freqüências ao Estado, 33% ao setor privado, 17% ao setor comunitário e 17% aos povos originários e afrobolivianos, o que

representa um passo ousado na democratização dos meios de comunicação. Direito humano à comunicação

O artigo 1º define como objetivo da nova lei garantir “o direito

humano individual e coletivo à comunicação, com respeito à pluralidade econômica, social, jurídica, política e cultural da totalidade das

bolivianas e dos bolivianos, as nações e povos indígenas originários e camponeses, as comunidades interculturais e afrobolivianas do Estado Plurinacional da Bolívia”.

O projeto também reordena o processo das concessões públicas, antes baseado na força dos lobbies empresariais. No caso do setor privado, ele se dará através de licitação pública. Já no setor comunitário e dos povos originários, as concessões ocorrerão mediante concursos de projetos. Já o artigo 65 cria o Programa Nacional de Inclusão Social, destinado ao financiamento de projetos que permitam a expansão da informação com interesse social.

A reação dos barões da mídia

Conforme aponta Idelber Avelar, em artigo na Revista Fórum, o projeto aprovado foi imediatamente rejeitado pelos barões da mídia da Bolívia.

“Nos meios empresariais, a resposta foi a conhecida reclamação de que a ‘liberdade de imprensa’ estava sendo limitada”. A gritaria também já chegou na mídia brasileira, preocupado com seu futuro.

Artigo publicado ontem na Folha afirma que “lei boliviana dá mais poderes a Morales sobre comunicações”. O texto joga na confusão e na desinformação. Diz que “o projeto aprovado pelo Congresso reserva dois

(21)

terços de licenças de rádio e TV para o governo e seus aliados”, confundindo as concessões para o setor estatal e o setor comunitário. Direito privado ou coletivo?

“A lei reserva para o Estado 33% do espectro eletromagnético, outros 33% ao setor privado e 34% para organizações sociais e indígenas, que são aliadas do governo. Segundo os críticos, na prática, Evo Morales vai controlar até 67% das ondas do país, ameaçando as redes privadas”, lamenta a Folha, dando ouvidos aos barões midiáticos bolivianos. Nem mesmo a ação criminosa do império Murdoch, com seus grampos ilegais, subornos e chantagens políticas, faz com que os donos da mídia vacilem diante dos riscos à democracia da monopolização privada do setor. Eles tratam a comunicação como um direito privado e sagrado, inacessível às comunidades e aos movimentos sociais. O projeto

aprovado na Bolívia representa um duro golpe nos interesses econômicos e políticos dos latifundiários da mídia.

Já no Brasil...

Enquanto os nossos vizinhos avançam na democratização da comunicação, o Brasil continua refém dos monopólios privados, que controlam a quase totalidade da radiodifusão no país. As resoluções da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) e o projeto de novo marco regulatório elaborado pelo governo Lula continuam na gaveta. A presidenta Dilma Rousseff ainda trata os barões da mídia como

“aliados”. Num misto de ilusão e pragmatismo, ela mantém o “namorico” com a chamada grande imprensa. Esta, por sua vez, afaga e bate no novo governo, num jogo habilidoso que promove o seu sangramento diário. Desse mato não sai cachorro! A regulação da mídia no Brasil só sairá do papel com muita pressão dos movimentos sociais.

(22)

--

"É preciso transformar desânimos e resignações em esperança combativa."

Você recebeu esta mensagem porque está inscrito no Grupo "Rede MORENA - Círculos bolivarianos" nos Grupos do Google.

lutabolivariana@googlegroups.com

aparelho ideológico 5 GLOBO USA FIM DA NOVELA PARA DOUTRINAÇÃO CAPENGA

Eixo da novela se inspira em obra de Machado de Assis mas autor faz discurso de anunciantes para fortalecer sistema capitalista enquanto cidadania fica por baixo.

Reinaldo Cabral*

Desde algum tempo, a TV Globo usa também suas novelas de grande audiência para promover a doutrinação de suas platéias com um discurso que interessa em abundância aos seus

principais anunciantes.

Isso ficou escancarado no último capítulo da novela Coração Insensato, de Gilberto Braga, encerrado sexta-feira e reapresentado ontem,20.

Vitória, a personagem representada pela excelente atriz Natália Timberg, faz o discurso do sistema, da emissora e dos seus principais anunciantes com o viés da defesa da família. Tudo isso, depois de consumir a maioria dos capítulos massacrando o terceiro setor que,segundo o autor, incapaz de melhor selecionar seus dirigentes, põe Eunice(Débora Eveluyn) como diretora da Liga de Defesa da Família Carioca.E nessa posição mostra Eunice como confusa,interesseira, contraditória,uma puta que põe um chifre tamanho família no marido, mas que, afinal, é expulsa de casa por ele.

TEXTO FINAL CAPENGA

Como a grande platéia das novelas da Globo não sabe, a idéia do eixo central dessa novela é o romance de Machado de Assis, Esaú e Jacó, publicado em 1904,uma obra prima como

romance lírico,o penúltimo do fundador da Academia Brasileira de Letras.

Nele, Machado narra a evolução de uma inimizade infindável entre irmãos gêmeos, Pedro e Paulo, mas não introduz nenhum discurso ideológico final como Gilberto Braga faz,num texto capenga interpretado por Timberg no encerramento da exibição.

DA CHANCHADA À EXPORTAÇÃO

É preciso reconhecer que, das chanchãs das novelas mexicanas do inicio de sua trajetória na década de 60 para hoje a Globo evoluiu muito.

(23)

Primeiro, criando uma escola de autores, atrizes e autores.

Segundo, profissionalizando um setor antes tomado pelo amadorismo com a expansão dos seus negócios para além da fronteira do Brasil.

Com uma produção autônoma, a emissora trocou seu papel de importadora para exportadora da produção intelectual.

É nesse ponto que entra a confusão: até onde o grupo usa esse espaço para a promoção da cidadania?

O tempo todo, o sistema global se porta como um verdadeiro uróboro(ver capítulos anteriores). Dá com uma mão e tira com a outra. Faz o discurso final pró-consolidação do capitalismo num dia e no outro mostra imagens mostrando a diversidade cultural do país(Criança Esperança de ontem,20).

INTRIGA POLÍTICA, A ESPECIALIZAÇÃO GLOBAL

A briga por audiência na televisão brasileira promete continuar por longo tempo. Aos poucos, o governo Dilma Russeff parece tentar se desprender dele e um bom início foi a indicação de uma pessoa desligada do grupo global para o ministério das Comunicações, coisa que não acontecia há alguns anos. O último deles foi o jornalista Franklin Martins.

A ascensão da Globo como manda chuva do governo e do sistema chegou ao desplante de se tentar , da semana passada para cá, colocar o atual ministro das Comunicações,Paulo

Baernardo, ex-ministro do Planejamento e marido da ministra da Casa Civil, senadora Gleisi Hoffmann na linha de colisão com a presidente da República. Questão que parece já superada apesar do mal estar político criado com uma recente declaração dele.

Essa manobra faz parte do jogo de intrigas poli ticas, tarefa para exercer a ual a Globo se especializou desde a ditadura militar de 64.

*É editor do site da AALONG.\\

6.Perigo à vista

2011 chega ao fim com uma notícia nada agradável para a imprensa e os jornalistas. A ONG Repórteres sem Fronteiras revelou, dois dias antes do Natal, que 66 jornalistas morreram e 1.044 foram presos durante o ano, em todo o mundo, enquanto trabalhavam. Os números são alarmantes. Mostram que, de um ano para outro, a violência contra os profissionais de

comunicação cresceu muito além do suportável.

Em relação a 2010, houve 16% mais mortes e 95% mais prisões. Os sequestros aumentaram 39%. Ativistas e blogueiros também sofreram agressões: 31% a mais foram presos e 19% a mais, atacados fisicamente. O número de países com censura cresceu 10%. Essa é uma

realidade que não condiz com o moderno mundo das comunicações. Hoje, quem tem acesso à

(24)

Internet ou a um telefone celular é, em potencial, um repórter. Poderia informar ao mundo o que se passa em sua aldeia, simultaneamente à ocorrência do fato, se não fossem os governos autoritários, que insistem em censurar as informações.

O perigo está sempre à vista. Pronto para atacar. Corre risco de vida o jornalista que acompanha guerras, revoluções, lutas populares pela democracia ou ações contra narcotraficantes e criminosos comuns. Ótimos jornalistas brasileiros, como Joel Silveira, transformaram em livro seus dias no front. Joel saiu fisicamente ileso da Segunda Guerra. Seu relato daqueles dias é simples e emocionante. Vale a pena ler o Inverno da Guerra.

José Hamilton Ribeiro, outro brasileiro a enfrentar a guerra, não teve tanta sorte quanto Joel. Perdeu a perna esquerda na explosão de uma mina terrestre no Vietnã. Recuperou-se, escreveu O Gosto da Guerra e segue até hoje seu trabalho de repórter. Um dos melhores do país.

As histórias de homens e mulheres, que não se deixam intimidar por ditadores,

narcotraficantes, guerrilheiros, radicais que não aceitam o contraditório, nem por tiros, bombas ou minas, estão todos os dias nos jornais. Estão também na Coleção Jornalismo de Guerra, da Editora Objetiva. Um dos publicados pela Objetiva, Jon Lee Anderson relata A Queda de Bagdá. A mesma guerra é retratada por Äsne Seierstad em 101 Dias em Bagdá, da Record. Äsne não tem vergonha de expor o medo que sentiu, as trapaças a que recorreu para permanecer no Iraque, à espera da guerra anunciada.

Repórteres – mesmo com medo – não deixarão de registrar o que se passa no Paquistão, país que registrou o maior número de jornalistas mortos (20), ou na América Latina, onde

morreram 18. Seguirão cobrindo as revoluções no Oriente Médio e o dia a dia de cidades violentas, como o Rio de Janeiro e o México. Muitos se tornarão personagens de livros e filmes. Isso aconteceu, por exemplo, com quatro dos fotógrafos que cobriram o apartheid sul- africano. Greg Marinovich, João Silva, Ken Oosterbroek e Kevin Carter ficaram conhecidos como integrantes do inexistente Clube do Bang Bang, título do livro, transformado no filme Fotógrafos de Guerra.

O que nos resta é esperar por um mundo melhor em 2012, com menos crimes e guerras. Esperar que os jornalistas possam trabalhar em paz, sem registros de prisões, sequestros e mortes. Mas, dificilmente, alguém apostará um tostão que seja na transformação dessa esperança em realidade.

7.

Liberdade de Expressão e seus 30 novos significados

por Washington Araújo - publicado em 12/03/2010

(25)

Cotejando os temas abordados no Millenium e, principalmente, os conferencistas que lá foram vivamente aplaudidos, podemos imaginar novos significados para o verbete

“liberdade de expressão”.

Organizado pelo Instituto Millenium realizou-se em São Paulo no dia 1º de março de 2010 o I Fórum Democracia e Liberdade de Expressão congregando a fina flor do empresariado da comunicação brasileira e acolhendo representantes de grandes grupos de mídia da América Latina, em especial da Venezuela e da Argentina, além renomados nomes do colunismo político que brilham em nossos veículos comerciais. Pretendeu ser um contraponto à I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), cuja etapa nacional ocorreu em Brasília entre os dias 14 a 17 de dezembro de 2009. A Confecom envolveu mais de 20.000 pessoas em todo o país, recepcionou 6.000 propostas

originárias das etapas estaduais e aprovou 500 resoluções.

A Confecom de Brasília trouxe à discussão temas como Produção de Conteúdo, Meios de Distribuição e os Direitos e Deveres da Cidadania, o Fórum de São Paulo propunha a defesa de valores como Democracia, Economia de Mercado e o Individualismo.

Todo cidadão brasileiro era bem-vindo para participar da 1ª Confecom. Para assistir ao Fórum Millenium era indispensável o pagamento de R$ 500,00 a título de inscrição. Na Confecom as seis maiores corporações empresariais de veículos de comunicação do Brasil fizeram questão de marcar sua ausência. No Millenium as ausentes se fizeram presentes. Dentre as quais destaco: Associação Brasileira de Empresas de Rádio e Televisão (Abert) e a Associação Nacional dos Jornais (ANJ), entidades que envolvem a Globo, o SBT, a Record, a Folha de S. Paulo, o Estado de S. Paulo, a RBS, Instituto Liberal, Movimento Endireita Brasil (MEB), e outras empresas que decidiram boicotar a I Conferência Nacional de Comunicação, numa demonstração de forte apreço pela democracia. Se essas entidades desejaram evitar o confronto na Confecom mostraram- se pintadas para guerra no Millenium.

Cotejando os temas abordados no Millenium e, principalmente, os conferencistas que lá foram vivamente aplaudidos, posso imaginar que se pretende agregar novos significados ao verbete “liberdade de expressão”.

São eles:

1. Liberdade de expressão é interditar todo e qualquer debate democrático sobre os meios de comunicação.

2. Liberdade de expressão só pode ser invocada pelos que controlam o monopólio das comunicações no país.

3. Liberdade de expressão é bem supremo estando abaixo apenas do Deus-Mercado. 4. Liberdade de expressão é moeda de troca nas eternas rusgas entre situação e oposição.

(26)

5. Liberdade de expressão é denunciar qualquer debate sobre mecanismos para termos uma imprensa minimamente responsável.

6. Liberdade de expressão é gerar factóides, divulgar informações sabidamente falsas apenas para aproveitar o calor da luta.

7. Liberdade de expressão é deitar falação contra avanços sociais, contra mobilidade social, contra cotas para negros e índios em universidades públicas.

8. Liberdade de expressão é cartelizar a informação e divulgá-la como capítulos de uma mesma novela em variados veículos de comunicação.

9. Liberdade de expressão é não conceder o direito de resposta sem que antes o interessado passe por toda a via crucis de conseguir na justiça valer seu direito.

10. Liberdade de expressão é explorar a boa fé do povo com programas de televisão que manipulam suas emoções e suas carências oferecendo uma casa aqui outro carro ali e assim por diante.

11. Liberdade de expressão é somente aprovar comentários aptos à publicação em sítio/blog da internet se estes referendarem o pensamento do autor e proprietário do sítio/blog.

12. Liberdade de expressão é ser leviano a ponto de chamar a ditadura brasileira de ditabranda e ficar por isso mesmo.

13. Liberdade de expressão é imputar ao presidente da República comportamento imoral tendo como fundamento depoimento fragmentado da memória de um indivíduo acerca de fato relatado quase duas décadas depois.

14. Liberdade de expressão é apresentar imparcialidade jornalística do meio de comunicação mesmo quando os principais jornalistas fazem de sua coluna tribuna eminentemente partidária.

15. Liberdade de expressão é fazer estardalhaço em torno de um sequestro que não ocorreu há quase 40 anos com a clara intenção de tumultuar o processo político atual. 16. Liberdade de expressão é assacar contra a honra de pessoa pública utilizando documentos de autenticidade altamente duvidosa e depois fazer mea culpa na seção

“Erramos”.

17. Liberdade de expressão é submeter decisões editoriais a decisões comerciais de empresas e emissoras de comunicação.

18. Liberdade de expressão é somente dar ampla divulgação a pesquisas de opinião em que os resultados sejam palatáveis ao veículo de comunicação.

(27)

19. Liberdade de expressão é não ter visto “Lula, o filho do Brasil” e considerá-lo péssimo produto cinematográfico sem ao menos tê-lo assistido.

20. Liberdade de expressão é minimizar o descaso do poder público ante as enchentes de São Paulo e reduzir candidato à presidência a mero poste.

21. Liberdade de expressão é ter dois pesos em política externa: Cuba é o inferno e China é o paraíso.

22. Liberdade de expressão é demonizar movimentos sociais e defender a todo custo latifúndios vastos e improdutivos.

23. Liberdade de expressão é usar uma concessão pública para aumentar os níveis de audiência com o uso perverso de crianças no papel de vilões.

24. Liberdade de expressão é desqualificar quem não aprecia a programação servida pelo Instituto Millenium.

25. Liberdade de expressão é rejeitar in totum toda e qualquer proposição da Conferência Nacional de Comunicação.

26. Liberdade de expressão é apostar em quem ofereça garantias robustas visando manter o monopólio dos atuais donos da mídia brasileira.

27. Liberdade de expressão é obstruir qualquer caminho que conduza mecanismos de democracia participativa.

28. Liberdade de expressão é fazer coro contra qualquer governo de esquerda e se omitir contra malfeitorias de qualquer governo de direita. Ou vice-versa.

29. Liberdade de expressão é fugir como o diabo foge da cruz de expressões como liberdade, democracia, cidadania, justiça social, controle social da mídia.

30. Liberdade de expressão é lutar para manter o status quo: o direito de informar é meu e ninguém tasca.

Washington Araújo é jornalista e escritor. Mestre em Comunicação pela UNB, tem livros sobre mídia, direitos humanos e ética publicados no Brasil,

Argentina, Espanha, México. Tem o blog http://www.cidadaodomundo.org - Email - wlaraujo9@gmail.com

Publicado na Agência Carta Miaor em 5/03/2010

Referências

Documentos relacionados

Portanto, mesmo percebendo a presença da música em diferentes situações no ambiente de educação infantil, percebe-se que as atividades relacionadas ao fazer musical ainda são

O objetivo do curso foi oportunizar aos participantes, um contato direto com as plantas nativas do Cerrado para identificação de espécies com potencial

Após 90 dias da semeadura (primeiro subcultivo), protocormos com um par de folíolos foram selecionadas visualmente, mantendo um padrão de altura de cerca de dois milímetros

É possível perceber três deslocamentos sofridos pela ideia e prática da opinião pública: o primeiro, como salientamos, é a substituição da ideia de uso público da razão

Centro de Ensino Superior de São Gotardo Jan-jun 2019 Número XIX Páginas 01-10 Trabalho 01 http://periodicos.cesg.edu.br/index.php/gestaoeengenharia periodicoscesg@gmail.com

Se - devido à razões técnicas – o leitor ELISA não puder ser ajustado a zero usando o Branco substrato, valor da absorvância deste deve ser subtraido de todos os outros valores

Em São Jerônimo da Serra foram identificadas rochas pertencentes à Formação Rio do Rasto (Grupo Passa Dois) e as formações Pirambóia, Botucatu e Serra Geral (Grupo São

é bastante restrita, visto que tanto suas duas entradas, quanto as galerias e condutos que interligam os pequenos salões são bastante estreitos, e a umidade na maioria dos salões