UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE COMUNICAÇÃO E ARTES
A virada discursiva: persuasão e censura no mundo do trabalho Um estudo das políticas de comunicação nas organizações
Cristiana de Siqueira Silva Santos
Projeto de iniciação científica sob orientação da Profa. Dra. Roseli Aparecida Fígaro Paulino
SÃO PAULO, abril/2009
A virada discursiva: persuasão e censura no mundo do trabalho Um estudo das políticas de comunicação nas organizações
Palavras-chave : Discurso; Comunicação; Censura; Mundo do trabalho
INTRODUÇÃO
A censura é uma violência à expressão de pessoas e grupos. É uma forma de poder e controle utilizada pelo Estado, pelas elites e por instituições as mais diversas: da Igreja à escola, passando pela empresa. A censura, em sentido amplo, é coerção, pressão, força utilizada para que alguém ou um grupo social mude de atitude. É, nesses termos, a coerção (com violência física ou não) para a adesão, para a adequação ao status quo.
Viver em sociedade é, de certa maneira, regrar-se às normas do viver em conjunto, é limitar- se para compartilhar com outros, é fazer uso de persuasão para a adequação do sujeito ao grupo.
A sociedade ocidental tem priorizado definir censura como interdição às expressões artístico- culturais e políticas, esquecendo-se, muitas vezes, da censura existente, por exemplo, na escola e no trabalho.
O estudo das relações de comunicação no mundo do trabalho, principalmente, por meio dos discursos que circulam na empresa – o discurso oficial e os discursos não-oficiais – permite-nos entender como os recursos comunicacionais são relevantes para a implantação de processos de reorganização do trabalho e da produção nas organizações. Permite-nos vislumbrar a responsabilidade que temos ao enquadrarmos processos, procedimentos, atitudes e, principalmente, culturas a parâmetros definidos unilateralmente por nosso grupo social.
Permite, sobretudo, questionar os meios e as finalidades da implantação de políticas de comunicação no mundo do trabalho.
Comunicação é uma palavra-chave no mundo contemporâneo. Com ela podem-se abrir inúmeras perspectivas de compreensão da realidade. Este protagonismo da comunicação deve- se à relevância das transformações que se operaram no mundo do trabalho. As inovações tecnológicas e a reorganização do processo produtivo – em novos patamares não mais necessariamente tendo o modelo fordista/taylorista como paradigma – lastreadas, agora, na produção flexível, própria do modelo toyotista, têm no cerne de seu funcionamento os processos de comunicação. As tecnologias são de informação e de comunicação e a
aparato ideológico-discursivo em que se baseiam os três pilares do toyotismo: kaizen, kanban e just-in-time.
OBJETIVO
Este Projeto de Pesquisa tem por objetivo estudar as estratégias discursivas das empresas no que diz respeito à organização da produção e à gestão de pessoas. Como a persuasão e a censura estão instituídas em discursos normativos das relações de comunicação no mundo do trabalho.
PROBLEMÁTICA E JUSTIFICATIVA DO TEMA
A pertinência dessa pesquisa justifica-se devido à importância da compreensão das profundas mudanças que ora se dão na sociedade contemporânea, principalmente em torno do binômio comunicação e trabalho. Desta compreensão se poderá subsidiar iniciativas no campo da produção comunicacional nos mais diferentes aspectos, sobretudo aqueles relativos à qualidade de vida, democratização da informação, acesso e qualidade dos produtos culturais e conquista da cidadania.
É necessário que se realizem estudos para se compreender como essas mudanças atuam concretamente no cotidiano; como as estratégias discursivas para a gestão de pessoas constroem hegemonia; e como os discursos que circulam no mundo do trabalho se manifestam na organização de outras instituições sociais.
REFERENCIAL TEÓRICO
Basicamente dois fatores – tecnologia e novas formas de organização do trabalho – têm mudado o panorama do capitalismo e da superação de suas crises sucessivas (Antunes, 1997;
Gorender, 1997; Batista Jr., 1997). Quanto às tecnologias, vários estudos apontam que, tomando-se a tecnologia de forma isolada, não se pode imputar apenas a ela a crise no mundo do trabalho, ou melhor, ao fechamento de postos de serviço.
Acresça-se a esse quadro a introdução de novos métodos e paradigmas de gestão e organização da produção, especificamente das técnicas conhecidas como toyotismo Os princípios do método japonês baseiam-se na horizontalização da produção, na desespecialização e polivalência da mão-de-obra operária. Seus elementos fundamentais, sintetiza Gorender (1997: 315), são “a economia de escopo, as equipes de trabalho ou células de
produção, o just-in-time”, o kaizen e o kanban1. É fundamental neste processo a circulação de informações entre os setores produtivos. Por isso, as diferentes estratégias de comunicação ganham destaque na consecução da adesão dos trabalhadores aos novos processos. Esta adesão torna-se mais viável à medida que se necessita, para a implantação das técnicas do toyotismo, agregar o controle e gestão da qualidade no próprio processo de produção às operações realizadas pelo trabalhador, além do encargo de observação e orientação da manutenção cotidiana das máquinas, resultando na redução hierárquica entre as funções e dos cargos de chefia diretamente ligados ao chão de fábrica, pois os métodos de controle do trabalhador se fazem no próprio processo de produção com a introdução de uma série de procedimentos e ferramentas que dão viabilidade e suporte ao sistema.
Dessa forma, devem-se valorizar os estudos que buscam a maior compreensão do que de fato acontece com as relações de comunicação no mundo do trabalho e como eles se orientam no sentido de aprofundar nossa compreensão sobre as transformações sociais em curso.
Nas Teorias de Comunicação hegemônicas, as tecnologias de transmissão ou o conteúdo e significado das mensagens foram os priorizados e a comunicação foi dada como resultado dessa abordagem. Nesse quadro de mudanças sociais, relativas principalmente ao mundo do trabalho, ganham proeminência os Estudos do discurso, pois eles podem ajudar a compreensão do que se passa no processo comunicacional e como essa comunicação adquire sentido, valor, ao tornar-se conhecimento para o sujeito receptor e para as organizações.
Os meios de comunicação e as novas tecnologias, ao trazerem em si mesmos a lógica da reprodução / reelaboração de mensagens, a maior facilidade de trânsito das informações e do conhecimento, a possibilidade de transmissão da herança cultural de uma geração para outra, colocaram à mostra os diferentes sentidos e as diferentes formas das expressões culturais que circulam na sociedade. E aí que se dá a constituição da subjetividade dos indivíduos/sociais, bem como os processos de persuasão, coerção e censura.
METODOLOGIA: MATERIAIS E MÉTODOS
O estudo propõe a utilização de entrevistas qualitativas já documentadas no arquivo do grupo Comunicação e Trabalho, realizadas tanto com profissionais da área quanto com pessoas
1 Kanban é uma estratégia de gestão da produção que reorganiza os fluxos de abastecimento das linhas de produção a partir das encomendas, procurando reduzir os tempos mortos em sua extensão. Just-in-time é uma ferramenta da estratégia do kanban, diz respeito ao fluxo das entregas. Ambas são suportes do kaizen, que significa mudar para melhor, ou seja, a busca de mudanças contínuas que visem melhorar a qualidade e a produtividade dos produtos através da reorganização de fluxos de materiais e homens e da extinção do retrabalho. Ver sobre o assunto CORIAT,
que participam das políticas de comunicação aplicadas na empresa onde trabalham. Serão observados os meios de comunicação interna de três empresas. Serão recolhidas as publicações editadas no período de um mês para que se possa realizar a análise do discurso. Também se fará visitas de campo, com a finalidade de diagnosticar a estrutura física e a política de comunicação organizacional. Todo o material será analisado e interpretado com base na análise do discurso.
A análise do conteúdo nos permitirá atuar com categorias e classificações e a análise do discurso, com base em Mikhail Bakhtin, nos permitirá mobilizar os conceitos de dialogismo, polifonia e intertextualidade para estudarmos os discursos inscritos nas políticas de comunicação das organizações, bem como os profissionais que atuam em sua formulação.
Cronograma
Meses MesesMeses
Meses Atividades
Leitura Pesquisa de campo
Pesquisa no acervo
de empresas
Coleta de material
Classificação do material
Análise Relatório parcial
Interpretação dos dados
Resultados Relatório final
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12º x
BIBLIOGRAFIA
BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. 9a. ed. São Paulo: Hucitec, 2002.
BRANDÃO, Helena Nagamine. Introdução à análise do discurso. Campinas, Edunicamp, 1991.
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São Paulo: Pólis, 1987