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Teatro radical brasileiro

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Academic year: 2018

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5. Caldas Aulete, Diciondrio Contemporâneo da Lfngua Portuguesa. Rio de Janeiro, ed. Delta, v. IV, p . 2638a. ·

6 . Osman Lins . Entrevista a Astolfo Araújo, Hamilton Trevisan, Gil-berto Mansur e Wladyr Nader. Escrita n.• 13, p. 3, 1976.

7. Textura. São Paulo·USP, p. 16, maio/1974. 8. Escrita, p. 6.

9. Escrita, p. 6. 10. Escrita, p. 6.

• Estas notas de leitura surgiram no inicio dos anos 80, quando desen-volvia estudos específicos sobre o conto. Posteriormente, tive opor-tunidade de cor1hecer estudos importantes sobre a obra de Osman Lins. Para citar alguns, lembro o de Ana Luiza Andrade, Osman Lins. Crítica e Criação São Paulo. Hucitec, 1987; e o de Sandra Nitrini, Poéticas em Confronto, Nove No11ena e o Novo Romance. São Paulo-Hucitec, Brasília-Instituto Nacional do Livro-Fundação Nacional Pró-Memória-MINC, 1987. Insisto, contudo, em publicar estas "notas" acreditando que, pelo seu caráter didático, talvez possam ser úteis a alunos de cursos de Literatura.

160 Rev. de Letras, Fortaleza, 14 (1/2) - jan./dez. 1989

TEATRO RADICAL BRASILEIRO

Ricardo Guilherme

O Brasil, além de sua crise sócio-econômica e política, enfrenta urna crise de caráter ético e moral que ernperra o processo de redes-coberta do País corno um espaço potencialmente viável sobretudo pelo testemunho da sua cultura. É inadmissível a tendência em consagrar a crise brasileira como se fosse crônica, irreversível e não circunstancial. O Teatro Radical Brasileiro se contrapõe a essa desesperança que nos enfraquece enquanto povo, se impõe ante todo esse neocolonia-lisrno cultural que rnassifica e desestirnula nossos impulsos criativos, ao engendrar urna teoria e urna prática que pretendem recuperar a auto-estima do brasileiro e a potencialidade inventiva do Teatro.

A radicalidade, corno síntese dos verbos radicar e radicalizar, ca-racteriza o Teatro Radical Brasileiro. A palavra Radical se refere a dois aspectos: o da radicação, corno busca e resgate de raízes culturais, e o do radicalismo, corno ruptura e independência, proposta de erradi-cação e transformação. Radierradi-cação e radicalismo no Teatro Radical Brasileiro têm urna vocação serniológica de estudo da linguagem pri-mária do Teatro, e urna vocação antropológica, de estudo da cultura brasileira em suas raízes morenas e transistóricas . Essas vocações constituem a radicalidade.

No sentido serniológico, a pesquisa da radicação teatral reestabe-lece o Teatro corno relação interpessoal, reconhecendo a especificidade de sua sintaxe e seu caráter épico. A criação no Teatro tem a singula-ridade de não dispensar a presença física do artista na concretização de seu produto final, a obra de arte. O artista em outros domínios, corno no cinema, na literatura, na música etc., não se associa estrutu-ralmente à sua obra. No Teatro, porém, se o intérprete não emprestar à dramaturgia a sua voz, o seu corpo, não haverá Teatro, porque Teatro presume a interseção fundamental e imprescindível do artista com a arte e desta com o público, num jogo de invenção e intervenção.

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Geralmente, quando se quer colocar o Teatro outra vez impac· tante, renovado, atualizado em função do desenvolvimento científico-tecnológico nos campos da comunicação e das artes, é experimentada uma teatralidade que redunda na junção do ator a uma série de ele-mentos não-teatrais. Esse entendimento reduz o Teatro a um mero aglutinador de outras fontes de expressão, reafirmando a concepção de que - por estar enfraquecido pela indústria cultural - o Teatro precisaria incorporar algumas conquistas tecnológicas, para, então, ser novamente convincente . Pretendendo fortalecer o Teatro, essa idéia enfraquece o Teatro naquilo que ele tem de mais característico, essen-cial, apesar de e, por causa mesmo de todos os avanços da ciência e da

tecnologia: a relação interpessoal espetáculo/público. Alguns tentam compatibilizar o Teatro com a chamada era eletrônica, pondo o ator em articulação com uma tela ou usando um monitor no palco no qual figuras aparecem em planos, ângulos etc.

O Teatro Radical Brasileiro entende ser possível uma antropo-fagia dos meios expressivos sem que o Teatro perca a sua integridade

semiológica e se propõe a transubstanciar outras linguagens em Teatro. Pode-se, por exemplo, transcodificar em Teatro o corte, o plano cine· matográfico, a edição de VT, os movimentos de câmera, o foco . Co-mo o telespectador, também o espectador pode desfrutar a variedade de ângulos, planos e contraplanos de uma cena, independentemente da sua posição na platéia . Basta que ocorram movimentos de atores estabelecendo planos, contraplanos e ângulos diversos dando ao pú-blico a impressão de estar testemunhando a ação de variados pontos de vista .

Muitas outras alternativas dessa antropofagia podem ser experi-mentadas, mas, afora esse viés antropofágico, o Teatro Radical Bra-sileiro admite a autofagia, quer dizer, o Teatro se expressando através de suas estruturas, revelando suas gramáticas, dessacralizando a inte-ração dos atores em cena e o jogo deles com o público, reinstaurando

do palco o seu sentido épico.

Do ponto de vista do radicalismo teatral, uma das proposições do Teatro Radical Brasileiro é a de ruptura com os padrões da "natura-lidade televisiva". O Teatro, muitas vezes tentando se ajustar aos in-teresses da mídia, consagra uma lir.guagem que não contraria expec-tativas, não ambiciona perspectivas, numa preocupação em satisfazer horizontalmente o público . Uma dessas tentativas de ajustamento é exatamente fazer o ator interpretar no palco como se estivesse no vídeo. Paira sobre o ator teatral o fantasma da TV, sob a alegativa de que, sem a tutela de seu tônus realista ou naturalista, o espectador -por ser telespectador habitual - refutaria o Teatro. Esse entendi-mento o Teatro Radical Brasileiro deseja erradicar .

162 Rev. de Letras, Fortaleza, 14 U/2) - jan./dez. 1989

O naturalismo televisivo parte do pressuposto de que existe uma quarta parede no palco separando o ator do público . Os atores, então, representam como se estivessem circunscritos a uma redoma, sem considerar o espectador um co-participante da aventura teatral. O Teatro Radical Brasileiro rompe a quarta parede, assim como a rom-peram outras vocações teatrais ao longo da história na linha do teatro épico e enseja pesquisas na relação espetáculo/platéia, buscando sub-6ídios no séquito, na arena, no carnaval, nos terreiros etc. Para a fala, ror exemplo, outras modalidades de regência, além da gramatical, a radicalidade tenta definir. Há na palavra uma acepção plástica, coreo-gráfica, concretista, que motiva no ator não a possibilidade de recriar a naturalidade de uma determinada época ou de um lugar, mas a pos-sibilidade de desmontar e remontar o texto, na perspectiva de com-preendê-lo e, de fazer com que o público o compreenda, a partir de novas percepções.

Teatro não é a reprodução da realidade mas sim uma intervenção na realidade que resulta numa invenção da realidade. Esta supra-realidade (a supra-realidade teatro-cêntrica, a supra-realidade do palco) se alimenta de todos os arsenais do conhecimento humano (a antropologia, a psi-cologia, a filosofia, a sociologia, etc.) mas não se deixa tutelar. A supra-realidade administra esses conhecimentos, transubstanciando-os em função da teatro-Lógica, em função de seu dialeto e de sua parti-tura gestual, em função da fabulação, da inventiva do Teatro. Esse teatrocentrismo estabelece os parâmetros gerais de uma expressão ra-dicalmente teatral que entenda o Teatro como uma espécie de hete-rônimo da realidade, uma fonte de criação do conhecimento que, além de gerir, deve também e principalmente gerar informações .

O Teatro Radical Brasileiro objetiva impulsionar o surgimento não somente da sua escrita cênica como espetáculo (interpretação, direção etc . ) mas também a aparição de uma dramaturgia e a fun-dação ou reestruturação de escolas de Teatro. A revolução no Teatro exige reformulações radicais nos nossos centros de formação do ator, do diretor, do autor teatral. A universidade, por exemplo, deveria redimensionar seus modelos de atuação e avaliação, porque estudo de Teatro requer dedicação exclusiva, tempo integral, prática intensiva, embasamento teórico, pesquisas participativas, currículos com flexi-bilidade, abertos à experimentação, à transdisciplinaridade e ao apro-fundamento das questões concernentes às artes em geral, à história, à psicologia, à sociologia, à filosofia , à antropologia, etc . A formação teatral não se limita ao estudo das artes cênicas e ao repasse de técnicas e métodos . Assim como o brasileiro precisa reaprender a ser brasileiro, também o ator precisa aprender a ser representativo do seu povo . Ser brasileiro é um desafio e uma conquista que não se vence e não se faz apenas ao nascer e viver no Brasil. セ@ necessário um aprendizado

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Geralmente, quando se quer colocar o Teatro outra vez impac-tante, renovado, atualizado em função do desenvolvimento científico-tecnológico nos campos da comunicação e das artes, é experimentada uma teatralidade que redunda na junção do ator a uma série de ele-mentos não-teatrais. Esse entendimento reduz o Teatro a um mero aglutinador de outras fontes de expressão, reafirmando a concepção de que - por estar enfraquecido pela indústria cultural - o Teatro precisaria incorporar algumas conquistas tecnológicas, para, então, ser novamente convincente. Pretendendo fortalecer o Teatro, essa idéia enfraquece o Teatro naquilo que ele tem de mais característico, essen-cial, apesar de e, por causa mesmo de todos os avanços da ciência e da

tecnologia: a relação interpessoal espetáculo/público. Alguns tentam compatibilizar o Teatro com a chamada era eletrônica, pondo o ator em articulação com uma tela ou usando um monitor no palco no qual figuras aparecem em planos, ângulos etc.

O Teatro Radical Brasileiro entende ser possível uma antropo-fagia dos meios expressivos sem que o Teatro perca a sua integridade semiológica e se propõe a transubstanciar outras linguagens em Teatro. Pode-se, por exemplo, transcodificar em Teatro o corte, o plano cine-matográfico, a edição de VT, os movimentos de câmera, o foco. Co-mo o telespectador, também o espectador pode desfrutar a variedade de ângulos, planos e contraplanos de uma cena, independentemente da sua posição na platéia . Basta que ocorram movimentos de atores estabelecendo planos, contraplanos e ângulos diversos dando ao pú-blico a impressão de estar testemunhando a ação de variados pontos de vista.

Muitas outras alternativas dessa antropofagia podem ser experi-mentadas, mas, afora esse viés antropofágico, o Teatro Radical Bra-sileiro admite a autofagia, quer dizer, o Teatro se expressando através de suas estruturas, revelando suas gramáticas, dessacralizando a inte-ração dos atores em cena e o jogo deles com o público, reinstaurando do palco o seu sentido épico.

Do ponto de vista do radicalismo teatral, uma das proposições do Teatro Radical Brasileiro é a de ruptura com os padrões da ''natura-lidade televisiva". O Teatro, muitas vezes tentando se ajustar aos in-teresses da mídia, consagra uma lir.guagem que não contraria expec-tativas, não ambiciona perspectivas, numa preocupação em satisfazer horizontalmente o público . Uma dessas tentativas de ajustamento é exatamente fazer o ator interpretar no palco como se estivesse no vídeo. Paira sobre o ator teatral o fantasma da TV, sob a alegativa de que, sem a tutela de seu tônus realista ou naturalista, o espectador -por ser telespectador habitual - refutaria o Teatro. Esse entendi-mento o Teatro Radical Brasileiro deseja erradicar.

162 Rev. de Letras, Fortaleza, 14 (1/2) - jan./dez. 1989

O naturalismo televisivo parte do pressuposto de que existe uma quarta parede no palco separando o ator do público. Os atores, então, representam como se estivessem circunscritos a uma redoma, sem considerar o espectador um co-participante da aventura teatral. O Teatro Radical Brasileiro rompe a quarta parede, assim como a rom-peram outras vocações teatrais ao longo da história na linha do teatro épico e enseja pesquisas na relação espetáculo/platéia, buscando sub-sídios no séquito, na arena, no carnaval, nos terreiros etc. Para a fala, ror exemplo, outras modalidades de regência, além da gramatical, a radicalidade tenta definir . Há na palavra uma acepção plástica, coreo-gráfica, concretista, que motiva no ator não a possibilidade de recriar a naturalidade de uma determinada época ou de um lugar, mas a pos-sibilidade de desmontar e remontar o texto, na perspectiva de com-preendê-lo e, de fazer com que o público o compreenda, a partir de novas percepções.

Teatro não é a reprodução da realidade mas sim uma intervenção na realidade que resulta numa invenção da realidade . Esta supra-realidade (a supra-realidade teatro-cêntrica, a supra-realidade do palco) se alimenta de todos os arsenais do conhecimento humano (a antropologia, a psi-cologia, a filosofia, a sociologia, etc.) mas não se deixa tutelar. A supra-realidade administra esses conhecimentos, transubstanciando-os em função da teatro-Lógica, em função de seu dialeto e de sua parti-tura gestual, em função da fabulação, da inventiva do Teatro. Esse teatrocentrismo estabelece os parâmetros gerais de uma expressão ra-dicalmente teatral que entenda o Teatro como uma espécie de hete-rônimo da realidade, uma fonte de criação do conhecimento que, além de gerir, deve também e principalmente gerar informações .

O Teatro Radical Brasileiro objetiva impulsionar o surgimento não somente da sua escrita cênica como espetáculo (interpretação, direção etc. ) mas também a aparição de uma dramaturgia e a fun-dação ou reestruturação de escolas de Teatro. A revolução no Teatro exige reformulações radicais nos nossos centros de formação do ator, do diretor, do autor teatral. A universidade, por exemplo, deveria redimensionar seus modelos de atuação e avaliação, porque estudo de Teatro requer dedicação exclusiva, tempo integral, prática intensiva, embasamento teórico, pesquisas participativas, currículos com flexi-bilidade, abertos à experimentação, à transdisciplinaridade e ao apro-fundamento das questões concernentes às artes em geral, à história, à psicologia, à sociologia, à filosofia, à antropologia, etc. A formação teatral não se limita ao estudo das artes cênicas e ao repasse de técnicas e métodos. Assim como o brasileiro precisa reaprender a ser brasileiro, também o ator precisa aprender a ser representativo do seu povo . Ser brasileiro é um desafio e uma conquista que não se vence e não se faz apenas ao nascer e viver no Brasil .

B

necessário um aprendizado

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temático. Do mesmo modo, o homem de Teatro deve dominar teori-camente e por vivência a linguagem popular e a expressão dramática. Portanto, formar uma geração teatral que repense o seu ofício e o seu país demanda - além de talento, aptidão - metodologia específica, ciência, consciência e paixão.

No aspecto antropológico, a radicação é a busca da pan-brasili-dade, ou seja, a invenção de um Brasil que não está geográfica, his-tórica e etnologicamente apenas num determinado Brasil mas em todo o Brasil. Ser pan-brasileiro é tocar a alma brasileira que diz respeito

& todos os Brasis, .5 biografar o Brasil atemporal, simultaneamente

pas-sado, presente e futuro, é traçar uma brasilidade-síntese, com transis-tcricidade, um Brasil dos Brasis. O Teatro Radical Brasileiro obje-tiva a invenção e a intervenção da, e, na alma brasileira. A idéia é desenvolver uma pan-brasilidade ontológica, que contextualize o Bra-sileiro, tentando encontrar o Homem no Homem Nacional. Esse pan-Brasil, ontológico e transistórico enseja, não a compilação de todos os Brasis, mas, o estudo das raízes da cultura popular brasileira que tenham resistido ao tempo e à história. Interessa ao Teatro Radical Brasileiro saber que dinâmica os arquétipos, os ritos, os mitos, os heróis sofreram, em que medida eles explodem ainda que inconscien· temente na contemporaneidade e de que modo o homem contemporâ-neo brasileiro confirma, neutraliza, reforça ou transfigura o Homem primário do Brasil, em sua tropicalidade mestiça. O Teatro Radical Brasileiro se dispõe a ser um teatro da transitividade pan-brasileira, um teatro castanho cuja morenidade relacione o conhecimento antro-pológico ao reconhecimento sociológico da atualidade. Em sua meto-dologia, estão alguns procedimentos tais como o estabelecer relações entre a história, a antropologia e o hoje, o nós-agora, já que se pretende empreender uma psicos5ocioanálise antropológica do Brasileiro,

consi-derando a etnografia como a cosmovisão empírica do nosso povo, em seu desejo de compreender e de explicar o mundo.

Identificar nossos protótipos, considerar nossa morenidade ca-bocla, mulata e cafuza, nossa mestiça trindade euro-afro-ameríndia, con-frontar tempos e espaços, personagens reais e ficcionais são objetivos co Teatro Radical Brasileiro, expressados cenicamente, não pelo parâ-metro da verossimilhança mas pelo do verossimulante 1, o ator que - assumindo sua vocação épica - se faz um contador de histórias, um ''embaixator", ou seja, alguém que, inspirado nos embaixadores dos autos populares, representa sua embaixada, um ator brechtiana-mente folclórico.

O ideal seria aglutinar autores em tomo da proposta da radica-lidade para que surgissem textos especificamente radicais, epopéias, 1 Termo empregado por Arthur da Távola, no livro O Ator .

164 Rev. de Letras, Fortaleza, 14 <1/2) - jan./dez. 19811

rapsódias pan-brasileiras que explicassem o Brasil, abordando a etno-grafia, a história e a literatura nacionais, de modo a que esses segmentos se inter-relacionassem transistoricamente para constituir um Brasil condensado, radical.

Independentemente do surgimento de uma dramaturgia específica, é possível, do ponto de vista cênico, tratar qualquer texto radicalmente. Como escrita cênica, o Teatro Radical Brasileiro pode permear a lei· tura ou a interpretação de qualquer obra. Entretanto, a radicalidade contém um apelo irrecusável a uma dramaturgia direcionada e pautada pela interdependência conceitual de radicação e radicalismo.

Em suma: o Teatro Radical Brasileiro é um teatro épico, teatro-cêntlico, que - transubstanciando conhecimentos e sintetizando con-flitos - teatraliza a raiz desses conhecimentos e desses conflitos. "I! radical porque transubstancia todo o conhecimento em Teatro e tea-traliza epicamente a vontade e a contra-vontade determinantes do conflito essencial de cada cena e é brasileiro porque se expressa, temá-tica e formalmente, levando em consideração a pan-brasilidade, a transistoricidade e a morenidade que caracterizam a antropologia

cultural do Brasil.

Embora seja produto de uma formulação teórica que como tal não deve prescindir de postulados científicos, o Teatro Radical Brasileiro é, acima de tudo, arte, fruição de idéias, ideais e sentimentos, e se destina não a uma elite previamente preparada mas ao público em geral, ao cidadão comum, capaz de descobrir na simplicidade a inven·

ti v a transgressora e o teor revolucionário do Teatro .

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temático . Do mesmo modo, o homem de Teatro deve dominar teori-camente e por vivência a linguagem popular e a expressão dramática. Portanto, formar uma geração teatral que repense o seu ofício e o seu país demanda - além de talento, aptidão - metodologia específica, ciência, consciência e paixão.

No aspecto antropológico, a radicação é a busca da pan-brasili-dade, ou seja, a invenção de um Brasil que não está geográfica, his-tórica e etnologicamente apenas num determinado Brasil mas em todo o Brasil. Ser pan-brasileiro é tocar a alma brasileira que diz respeito

á todos os Brasis, .S biografar o Brasil atemporal, simultaneamente

pas-sado, presente e futuro, é traçar uma brasilidade-síntese, com transis-tcricidade, um Brasil dos Brasis. O Teatro Radical Brasileiro obje-tiva a invenção e a intervenção da, e, na alma brasileira. A idéia é desenvolver uma pan-brasilidade ontológica, que contextualize o Bra-sileiro, tentando encontrar o Homem no Homem Nacional. Esse pan-Brasil, ontológico e transistórico enseja, não a compilação de todos os Brasis, mas, o estudo das raízes da cultura popular brasileira que tenham resistido ao tempo e à história. Interessa ao Teatro Radical Brasileiro saber que dinâmica os arquétipos, os ritos, os mitos, os heróis sofreram, em que medida eles explodem ainda que inconscien-temente na contemporaneidade e de que modo o homem contemporâ-neo brasileiro confirma, neutraliza, reforça ou transfigura o Homem primário do Brasil, em sua tropicalidade mestiça. O Teatro Radical Brasileiro se dispõe a ser um teatro da transitividade pau-brasileira, um teatro castanho cuja morenidade relacione o conhecimento antro-pológico ao reconhecimento sociológico da atualidade. Em sua meto-dologia, estão alguns procedimentos tais como o estabelecer relações entre a história, a antropologia e o hoje, o nós-agora, já que se pretende empreender uma psicossocioanálise antropológica do Brasileiro,

consi-derando a etnografia como a cosmovisão empírica do nosso povo, em seu desejo de compreender e de explicar o mundo.

Identificar nossos protótipos, considerar nossa morenidade ca-bocla, mulata e cafuza, nossa mestiça trindade curo-afro-ameríndia, con-frontar tempos e espaços, personagens reais e ficcionais são objetivos co Teatro Radical Brasileiro, expressados cenicamente, não pelo parâ-metro da verossimilhança mas pelo do verossimulante 1, o ator que - assumindo sua vocação épica - se faz um contador de histórias, um ''embaixator", ou seja, alguém que, inspirado nos embaixadores dos autos populares, representa sua embaixada, um ator brechtiana-mente folclórico.

O ideal seria aglutinar autores em tomo da proposta da radica-lidade para que surgissem textos especificamente radicais, epopéias,

1 Termo empregado por Arthur da Távola, no livro O Ator .

164 Rev. de Letras, Fortaleza, 14 (1/2) - jan./dez. 198&

rapsódias pan-brasileiras que explicassem o Brasil, abordando a etno-grafia, a história e a literatura nacionais, de modo a que esses segmentos se inter-relacionassem transistoricamente para constituir um Brasil condensado, radical.

Independentemente do surgimento de uma dramaturgia específica, é possível, do ponto de vista cênico, tratar qualquer texto radicalmente. Como escrita cênica, o Teatro Radical Brasileiro pode permear a lei-tura ou a interpretação de qualquer obra. Entretanto, a radicalidade contém um apelo irrecusável a uma dramaturgia direcionada e pautada pela interdependência conceitual de radicação e radicalismo.

Em suma: o Teatro Radical Brasileiro é um teatro épico, teatro-cêntrico, que - transubstanciando conhecimentos e sintetizando con-flitos - teatraliza a raiz desses conhecimentos e desses conflitos. I!

radical porque transubstancia todo o conhecimento em Teatro e tea-traliza epicamente a vontade e a contra-vontade determinantes do conflito essencial de cada cena e é brasileiro porque se expressa, temá-tica e formalmente, levando em consideração a pan-brasilidade, a transistoricidade e a morenidade que caracterizam a antropologia

cultural do Brasil.

Embora seja produto de uma formulação teórica que como tal não deve prescindir de postulados científicos, o Teatro Radical Brasileiro é, acima de tudo, arte, fruição de idéias, ideais e sentimentos, e se destina não a uma elite previamente preparada mas ao público em geral, ao cidadão comum, capaz de descobrir na simplicidade a

inven-tiva transgressora e o teor revolucionário do Teatro.

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