• Nenhum resultado encontrado

Heróis ou Bandidos? Militantes de esquerda nos cárceres políticos

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "Heróis ou Bandidos? Militantes de esquerda nos cárceres políticos"

Copied!
9
0
0

Texto

(1)

A R T I G O

TSRQPONMLKJIHGFEDCBA

"H E R Ó IS " O U "B A N D ID O S "?

M ILITA N TE S D E E S Q U E R D A

N O S C Á R C E R E S P O LíTIC O S (1964 -1979)1

SRQPONMLKJIHGFEDCBA

II'lT R O D U Ç Ã O

JO S É G E R A R D O V A S C O N C E L O S *

yxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

perem os códigos de

si-lêncio e honra imanentes aos grupos de esquerda. R E S U M O

T e m e s te e s tu d o o o b je tiv o d e a n a fls a r o p a p e l d o h e ró i n o p e río d o c o rre s p o n d e n te à s d é c a d a s d e 6 0 e 7 0 , n o B ra s il a u to ritá rio . O h e ró i n a p o lític a in c o rp o ra in fin d á v e is c ó d ig o s d e h o n ra fu n d a d o s e m a to s d e c o ra g e m e , p rin c ip a lm e n te , n a le i d o s ilê n c io . E m s e tra ta n d o d e u m p e río d o m a rc a d o p e la fo rte re p re s s ã o p o lí1 ic a ,a s q u a fld a d e s p e s s o a is d o s h e ró is p o d e m s e r a v iv a d a s e m im e d ia ta c o n tra p o s iç ã o a o b a n d id o (d e la to r) q u e , ro m p e n d o o s c ó d ig o s d e h o n ra , p õ e e m ris c o o s s o n h o s c o le tiv o s d o s a g ru p a m e n to s d e e s q u e rd a .

O

presente estudo é parte de urna pesqui-sa desenvolvida desde 1991, no Pro-grama de Pós-Graduação em Sociologia da Universi-dade Federal do Ceará, cujas conclusões iniciais, obtidas em 1993, serviram de base à dissertação do autor (VASCONCELOS, 1993), defendida junto ao referi-do Programa. A

investiga-ção de que se trata foi aprofundada no doutoramento, na mesma área e instituição, com o estudo da memória dos militantes de esquerda no Brasil pós 64 (presos, clandesti-nos, mortos e desaparecidos) construída como estratégia política.

Conforme os estudos de POLLAK (989), a memória pode entrar em disputa com a me-mória oficial e sobreviver, subterraneamente, aguardando o momento da escuta. Entendemos todavia, que essa disputa pode acontecer inclu-sive no interior da memória subterrânea.

Neste trabalho enfocaremos alguns ele-mentos que possibilitem a compreensão de determinados atos de heroísmo, articulados aos sonhos coletivos construídos pela esquer-da brasileira. O período da pesquisa, vai de 1964, ano do golpe militar, até 1979, ano da anistia. Os heróis, contudo, encontram sua própria antinomia na figura dos delatores (bandidos para a esquerda), que não tendo a capacidade de silenciar perante os tortura-dores, são estigmatizados pelo fato de

rom-o

H E R Ó i E A M O R T E

Valeria repassar o significado da memória heróica dos militantes de es-querda que ganham um novo sentido com a morte, pois passam a ser consi-derados, unanimemente, como símbolos da resistên-cia. Na realidade temos uma construção simbólica, pois os militantes, por mais firmes que estejam na defesa dos chamados "ideais revolucionários", por mais que arrisquem a vida como prova do seu empenho na "luta contra a ditadura" que se instaurava no pós-64, só se transformaram ver-dadeiramente em "heróis" no momento em que foram mortos pela repressão.

Vale lembrar que, na mitologia, a morte vem sempre acompanhada do sono; são irmãos, filhos da noite, que habitam os lugares sombrios onde o sol (Apelo) jamais ilumina. Essa morte/sono do

he-rói como se fosse apenas urna passagem. A passa-gem da vida para a história. A morte, na Grécia,

• P ro fe s s o r A d ju n to d o P ro g ra m a d e P ó s -G ra d u a ç ã o e m E d u c a ç ã o B ra s ile ira d a U n iv e rS id la d e F e d e ra l d o C e a rá ; E d ~ o r· C h e fe d a R e v is taE ducação em D ebated a F a c u ld a d e d e E d u c a ç ã o d a U F C ; m e s tre e d o u to r e m S o c io lo g ia

110 R E V IS T A D E C IÊ N C IA S S O C IA IS V . 3 1 N . 1 2 0 0 0

kjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

E ra d o g ê n e ro m a sc u lin o , e n o s m o n u m e n to s

d e a rte , ép o r v e ze s d ific ílim o d istin g u i-Ia d o

S o n o . O s d o is irm ã o s e ra m g ê m e o s e frequentemente re p re se n ta d o s ju n to s

(MÉNERARD,1991:118).

(2)

esquer-da, naquele momento, necessitava para dar prosseguimento aos seus projetos coletivos.

Dentre as vários cisões que okjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAP a rtid o C o m u -n ista B ra sile iro (P C B ) propiciou, Marighella

acabou integrando um dos principais agrupa-mentos políticos que dirigiu a guerrilha urba-na no Brasil - a A ç ã o L ib e rta d o ra N a c io n a l -A L N , sendo inclusive o seu comandante.

C a rlo s M a rig h e lla , segundo a afirmação de

ALVES,

0993:

14), era E x p a n siv o c o m o os

b a ia n o s e b rig u e n to c o m o o Z u m b i, defensor

da luta armada na cidade, como preparação da guerrilha no campo. O seu projeto era, na realidade, um g o v e rn o d e lib e rta ç ã o n a c io n a l.

M u la tob a ia n o , h a v ia p a rtic ip a d o , m u ito jo v e m

a in d a , d o m o v im e n to d o P C B e m 1935,q u a n

-d o se -d e slo c o u -d a B a h ia p a ra oR io d e ja n e iro .

F o i p re so , v io le n ta m e n te to rtu ra d o , m a s c o n

-q u isto u n a p risã o u m a lid e ra n ç a e a fa m a d e

d irig e n te so lid á rio e c o rn b a tiu o ( ..) E m 1 9 6 4 ,

re a g iu ào rd e m d e p risã o m a s te rm in o u p re so ,

a p e sa r d e fe rid o . A p a rtir d a li e sc re v e u u m

li-v ro a o q u a l d e u

o

n o m e

Por que resisti

à

Pri-sã o , d e m o n stra n d o a d isp o siç ã o d e n ã o d a r

tré g u a à d ita d u ra e c o n v o c a n d o

gfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

o sm ilita n te s d e e sq u e rd a p a ra u m a re sistê n c ia a tiv a c o n tra

o re g im e m ilita r (SADER,1995: 110).

Marighella transforma-se rapidamente num mito para a esquerda. Encamava a resis-tência, a coragem, a valentia e encantava, prin-cipalmente quando se tinha a possibilidade de definir caminhos que fossem mais apropriados para um novo projeto de humanidade.

Mas, o cerco começou a ser fechado, os caminhos ficaram mais estreitos e as luzes que indicavam as saídas, como nos jogos eletrôni-cos, se foram apagando pouco a pouco. MarigheIla, ao perceber que as trilhas definha-vam, busca refúgio junto aos padres dominicanos e, com toda a sua experiência, não percebia que alguns já estavam presos e outros sob ex-cessivo controle dos órgãos repressivos.

A ssim , a o m a rc a r u m e n c o n tro c o m o s d o m in ic a n o s, n u m a q u a rta -fe ira d e n o v e m b ro

d e 1969, n u m d ia e m q u e a c id a d e se e n c o n

-tra v a d e se rta , p o r c a u sa d a -tra n sm issã o p e la

te le v isã o d o jo g o S a n to s e C o rin tb ia n s,

M a rig b e lla c a iu n u m a a rm a d ilh a m o n ta d a

c o n tra e le , n a a la m e d a C a sa B ra n c a , e n tre a s

A v e n id a s P a u lista e N o v e d e ju lh o , n o b a irro

d o s ja rd in s, e m S ã o P a u lo " Ao atravessar a

rua," O s p o lic ia is fu zila ra m C a rlo s M a rig b e lla se m q u e e le p e g a sse u m a a rm a o u e sb o ç a sse

q u a lq u e r re a ç ã o " ( SADER,1995: 126).

Acrescenta, ainda, SADER

(995),

que a morte de Marighella foi anunciada no intervalo do jogo, exibindo as imagens de seu corpo recostado no banco traseiro do Fusca. Era uma

m o rte e le trô n ic a , encoberta pela mística da T V ,

envolvida num processo simbólico cercado de imagens e, ao mesmo tempo, anunciada, em meio ao jo g o d e fu te b o l, cuja audiência era altíssima. Era, na realidade, uma morte muito especial, vivida em vários momentos das lutas nacionais. Marighella era um desses se n h o re s d o te m p o . Aquele que não conseguia morrer,

mas simplesmente ficava encantado, adorme-ce momentaneamente para acordar os novos viventes. É como se ao desaparecer no céu encoberto por uma imensa nuvem de fumaça branca, reaparecesse nas manifestações e, prin-cipalmente, na memória dos grandes liberta-dores e sonhaliberta-dores do mundo.

Com características similares à A ç ã o L ib e rta d o ra N a c io n a l- A L N , um grupo de

milita-res abandona os quartéis e se junta aos mari-nheiros, sargentos e cabos expulsos das forças armadas pelo golpe militar. Formam assim, outra organização que representaria a esperança dos revolucionários que combatiam o autoritarismo de Estado. Essa organização era a V a n g u a rd a P o p u la r R e v o lu c io n á ria - V P R ,cujo principal di-rigente era o C a p itã o C a rlo s L a m a rc a l .

A guerrilha estava restrita ao espaço ur-bano. Além do PC do B, apenas a VPR, manti-nha um acampamento de treinamento no sertão da Bahia, que também foi desmontado pela repressão.

N o c o m e ç o d e 1971

foi

fe ito oú ltim o se q ü e stro

d e e m b a ix a d o r, q u e p ro m o v e u a lib e rta ç ã o d e

m a is d e 7 0 p re so s p o lític o s. E ssa a ç ã o fo i

(3)

re a liza d a p e lo c a p itã o L a m a rc a , q u e , e m se g u id a , id isc o rid a n id o id a lin h a c o n siid e ra id a m ilita

-rista - p o r p riv ile g ia rgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAo s e n fre n ta m e n to s

a rm a d o s, d e ix a n d o p a ra se g u n d o p la n o

yxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

o

tra

-b a lh o p o lític o d e m a ssa s -, m u d o u d e o rg a n i-za ç ã o p o lític a e fo i te n ta r d e se n v o lv e r u m tra b a lh o c o m o s c a m p o n e se s n o in te rio r d a B a h ia . A li C a rlo s L a m a rc a fo i d e sc o b e rtoPela

re p re ssã o e m o rto , d e sa p a re c e n d o a ssim a se -g u n d a -g ra n d e fi-g u ra d a lu ta a rm a d a d a q u e le p e río d o d a e sq u e rd a b ra sile iraCSADER,1995:129)

As mortes deMarigbella e L a m a rc a trariam grande mudança entre os combatentes nos anos de chumbo no Brasil, pois representava não somente a morte de "heróis", como também a morte de um projeto. O esgotamento da resis-tência passava a ser cada vez mais visível, o que possibilitava a produção de olimpianos, de quase deuses, que de agora em diante passari-am a ser mais temidos que os militantes, pois representavam um símbolo.

A morte de C a rlo s Marigbella e do capi-tão C a rlo s L a m a rca representou, para muitos, a

c o n sc iê n c ia d a d e rro ta , o limite da temporalidade

e o fracasso da opção pelo enfrentamento ao Regime Militar.É o que afirmará Jo sé F erreira d e Alencar", 64, militante do PCB na época:

A c o n sc iê n c ia d a d e rro ta v e m a í p e lo s a n o s 7 0 ,

p rin c ip a lm e n te d e p o is d o a ssa ssin a to d o

Marigbella, d o a ssa ssin a to d o L a m a rc a , e

o

d e se n c a d e a m e n to d a re p re ssã o a n ív e l n u n c a v isto . F o i a é p o c a d o g o v e rn o Mêdici.

o

que restava fazer? Na realidade, era a tentativa desesperada de, heroicamente, sobrevi-ver resistindo ou de escapar fugindo das malhas do terror, rompendo assim, os códigos de honra e quebrando o silêncio com a fala da delação, para depois envergonhar-se com a o tormento de suas lembranças lançadas na ótica dos militantes revo-lucionários nos escombros da história. As opções eram colocadas para os militantes ou para os dela-tores, que não poderiam simplesmente exteriorizar o cansaço dos seus limites. Teriam que refazer suas vidas a partir de seus projetos individuais e coletivos. Talvez necessitassem refrear um pouco

os seus desejos, aprender a conviver com a ad-versidade. O período de chumbo já era realidade e a força da paixão já não era suficiente para combater a força do Estado militar e a cu ltu ra d o

m e d o gerada na sociedade.

Alencar relata o contexto em que toma consciência da derrota e quando pela primeira vez é abatido pelo sentimento de impotência, talvez maior do que aquele que sentiu no mo-mento em que descobre na cadeia que havia perdido a perna'. Com toda a sua manifestação de angústia, de fragilidade e, até certo ponto, de desencanto, resolve permanecer na militância. Na sua fala, era como se um enorme poder fosse incorporado, superando limites físicos e subjetivos. Um imenso fardo que, ao ser carre-gado, tomasse forma em nome de um projeto civilizatório muito maior e, principalmente, para

h o n ra r os compromissos políticos assumidos. É

o discurso heróico do militante que supervaloriza todos os atos, como se quisesse recompensar a si mesmo pelos seus feitos memoráveis, obten-do assim o passaporte para entrar na história.

E u a in d a fiq u e i n a m ilitâ n c ia a té a p risã o .

P o r q u ê ? P o rq u e e u a in d a tin h a a ssu m id o c o m -p ro m isso s. E c o m -p ro m isso s, -p rin c i-p a lm e n te

c o m a ju v e n tu d e . H a v ia m u ito s jo v e n s e m u i-to s q u a d ro s, q u a d ro s h istó ric o s. E u n ã o m e c o n sid e ra v a n e n h u m q u a d ro h istó ric o , m a s e m fre n te àju v e n tu d e e u e ra o m a is velh o . P o r

e x e m p lo , e x istia m m u ito s e stu d a n te s d a u n i-v e rsid a d e e n i-v o li-v id o s n a lu ta a rm a d a . E u e ra p ro fe sso r. V o c ê e n c o n tra S ilu io M o ia , v o c ê v a i e n c o n tra r F a b ia n i, a S w ia m i ; b a sta d ize r o

se g u in te : to d o so sp re so s p o lític o s q u e e sta v a m n o P a u lo S a ra sa te (. ..)

o

ú n ic o q u e tin h a c u

r-s o su p e rio r e ra e u . T o d o so s d e m a is e sta v a m e m p ro c e sso d e fo rm a ç ã o (. ..) E u e ra o ú n ico

fo rm a d o , p o rta n to c o m d ire ito a p risã o e sp e -c ia l. E e u a b ri m à o (. ..) p a ra e sta r n o -c o le tiv o d e p re so s e d e c o m p a n h e iro s (. ..). E u m e se n

-tia c o m a re sp o n sa b ilid a d e m u ito g ra n d e , d e n ã o sa ir d o b a rc o n a h o ra q u e

o

b a rc o c o m e -ç a v a a d a r á g u a , n ã o q u e e u m e se n tisse

o

c o m a n d a n te d a m a rin h a , q u e éo ú ltim o a d

ei-x a r

o

b a rc o (. ..) e ra u m a a titu d e , v a m o s d i-ze r, n o b re , d e n o b re za .

(4)

E sse se n tim e n to d e so lid a rie d a d e , e v id e n -

yxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

temente digno, que nem todos os m ilita n te s de esquerda desenvolveram para com os seus com-panheiros, representava, além da opção, uma elevada preocupação n o rm a tiza d o ra . Era como se todos tivessem a re sp o n sa b ilid a d e de conti-nuar lutando pelas idéias, pelos projetos emancipatórios que alimentavam a própria exis-tência e, ao mesmo tempo, se esse elo fosse quebrado, isso poderia representar não somen-te a quebra dos valores éticos do revolucioná-rio, como também implicava punições para o indivíduo que se afastasse desses laços. O militante estabelecia um pacto normatizador. Um pacto de luta, de vida e de morte se fos-se preciso. Isso poderia ser gratificante nas recordações coletivas dos grupos, mesmo que vividas clandestinamente.

TSRQPONMLKJIHGFEDCBA

A C U L P A E O A N T I-H E R Ó I (B A N D ID O )

A antinomia do Herói, gerada no contex-to aucontex-toritário é configurada nos atos de fala do militante, no momento em que o silêncio era exigido como condição de possibilidade para alimentar o sonho revolucionário. Temos de lem-brar que o militante que fala (delata), seria efe-tivamente acometido de um grande se n tim e n to d e c u lp a e, além de tudo, poderia ser

transfor-mado em a n ti-h e ró i (Bandido). Muitos indivídu-os que viveram essa situação, ou pelo menindivídu-os foram colocados como suspeitos, mesmo de-pois de todo o processo, ainda tentam justificar ou esclarecer os detalhes de sua "fraqueza" para os sobreviventes. A d e la ç ã o ou a simples pos-sibilidade, revelaria na óptica dos militantes, uma perda irreparável em relação a tudo o que po-deria ter o selo ético do revolucionário. P e d ro

A lb u q u e r q u e ', duas décadas depois ainda se

defende do e stig m a da "traição'". Magoado com a insinuação de delação. Albuquerque assegura:

N e n h u m c o m p a n h e iro o u a m ig o c a iu p e la

m in h a b o c a . T e n h o a c o n sc iê n c ia tra n q ü ila

so b re isso " .

gfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

E completa: " N ã o c o n d e n o m e

s-m o os q u e e n tre g a ra m p o rq u e e le s ta m b é m

fo ra m v ítim a s. S e r h u m a n o n ã o n a sc e u p a ra

se r to rtu ra d o . A to rtu ra m e e n sin o u q u e o

se r h u m a n o é c a p a z d e a m a r a lé m d o q u e

im a g in a . P o sso e n c o n tra r-m e c o m u m d e

m e u s to rtu ra d o re s. N ã o sin to ó d io , m a s q u e

-ro ju stiç a (O Povo, 31/10/93: 27A ) .

A recuperação da memória como estraté-gia política não pode ser maculada pela míni-ma suspeita de anti-heroísmo. O possível delator teria que ultrapassar sua temporalidade, convivendo com esse fantas-ma, o que implica um sofrimento para o per-sonagem e para sua família, principalmente se essa família tem uma tradição de militância. Sua Mãe, L o u rd e s A lb u q u e rq u e , 74, revela a mágoa em relação à esquerda pela suspeita que envolve um membro de sua família

E u fiq u e i m u ito re v o lta d a c o m a a c u sa ç ã o d o

P o m a r. T iv e v o n ta d e d e re sp o n d e r e tu d o , m a s

fin a lm e n te

o

p a rtid o re sp o n d e u . E le (P e d ro

A lb u q u e rq u e ) sa iu d e lá (G u e rrilh a d oAraguaia),

p o rq u e a m e n in a (su a e sp o sa ) e sta v a g rá v id a e

e le e sta v a c o m u m a fe rid a m u ito g ra n d e n a p e

n a . M a s n ã o sa ira m fu g id o s, sa íra m tu d o d e a c o

r-do. J a m a is u m filh o m e u se ria u m d e d o -d u ro .

M u ita s v e ze s p e sso a s d isse ra m q u e e u d e v e ria

c o n v e rsa r c o m m e u filh o M á rio p a ra e le ir à te le

-v isã op a ra d ize r q u e se a rre p e n d e u . E u d izia : e u

n ã o c o n c o rd o .OT e im o (u m d e la to r c o n h e c id o )

fo i, e u m e le m b ro d o T e im o n a T e le v isã o . E u

m e a d m ire i m u ito p o rq u e e le e ra u m a c ria tu

-ra id e a lista , n ã o se i p o r q u e e le fe z isso . E u

n ã o a c re d ita v a . D ize m q u e e le d e la to u m u ita

g e n te , e u n ã o se i. E u d izia p a ra a m in h a c h e

-fe : E u p re firo p e rd e r e m p re g o , p e rd e r tu d o , d o

q u e u m filh o m e u ir à te le v isã o . A té e u fic o

e n c a b u la d a c o m u m n e g ó c io d e sse . D e m a

-n e ira a lg u m a e u a c e ito u m -n e g ó c io d e sse .

A saída do espaço de conflito deveria ser justificada ao centro de comando da guerrilha. O militante não poderia mais abandonar o lu-gar que fora cuidadosamente "escolhido" e "pla-nejado" nos detalhes de ação e de combate; afinal era a "questão de segurança" e de preser-vação das vidas doadas à c a u sa re v o lu c io n á ria

que estava em jogo e, nesse caso, a mínima

(5)

suspeita apavorava a todos os membros que testavam constantemente os valores revolucio-nários em atos de coragem, de heroísmo e de solidariedade. Além de tudo, a memória da fa-mília precisava ser preservada. Era uma memó-ria de luta, de militância, de perdas compensadas pela coragem de seus integrantes, não

poden-do dar lugar àkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAm e m ó ria e n v e rg o n h a d a do dela-tor. Essa memória deve ser escondida em

escaninhos, pois a mínima suspeita é punida com a eterna sombra da delação, mesmo que possa revelar a fraqueza possível de qualquer

ser humano no momento de to rtu ra .

SRQPONMLKJIHGFEDCBA

o

TSRQPONMLKJIHGFEDCBA

R E E N C O N T R O C O M O S íM B O L O V IV O N A F IR M E Z A D O N Á o -D IT O D O H E R Ó i M O D E R N O

Figura como a deJ o sé D u a rte traria no seu corpo e na sua trajetória de vida e de militância a própria reconstrução de um sím b o lo , que todos gostariam de acompanhar e que deveriam passar adiante. Para o velho militante era possível in-clusive ironizar com a repressão, mostrar que não tinha sentido todo um aparato para vigiar um senhor de idade, frágil, doente mas, ao mes-mo tempo, sereno e firme nas suas convicções.

A cadeia era na realidade a casa de J o sé D u a rte , tendo sido preso várias vezes, inclusi-ve antes do Golpe Militar e essa experiência e coragem eram repassadas aos demais militantes com quem dividiu o mesmo espaço institucional. A busca incessante de referências para a es-querda, já completamente desestruturada, era na realidade a busca do líder, do "herói". A

memória é aqui revestida de heroísmo.

gfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

É a lem-brança que pode ser contada e repassada para

a história; contudo, o herói moderno é uma re-presentação. Para BENJAMIN

(994),

o

h e ró i m o d e rn o n ã o é h e ró i a p e n a s re p re -se n ta

o

p a p e l d e h e ró i. A m o d e rn id a d e h e ró ic a

se re v e la c o m o u m a tra g é d ia o n d e

o

p a p e l d o

h e ró i e stá d isp o n ív e l (. ..). C e n á rio , a to r e h e

-ró i e stã o re u n id o s (BENJAMIN,1994:95).

Essa representação moderna do herói é, na política, revestida de uma necessidade

apai-114 RE V IS T A D E C IÊ N C IA S S O C IA IS V . 3 1 N . 1 2000

xonada, cujos desdobramentos inserem-se nas próprias ações dos heróis e dos seus produto-res. A idéia do risco, de atos que desafiem a noção do perigo, foram necessários para que os revolucionários continuassem acreditando nas próprias representações e nos seus desa-fios em que o medo da morte passa a ser um simples detalhe, pois representa a resistência às suas forças, mesmo que para isso o suicí-dio esteja em cogitação:

A m o d e rn id a d e d e v e m a n te r-se so b

o

sig n o d o

su ic íd io , se lo d e u m a v o n ta d e h e ró ic a , q u e

n a d a c o n c e d e a u m m o d o d e p e n sa r h o stil.

E sse su ic íd io n ã o é re n ú n c ia , m a s sim p a

i-x ã o h e ró ic a . É a c o n q u ista d a m o d e rn id a d e

n o â m b ito d a s p a ix õ e s (, . .). O su ic íd io d e h e ró is a n tig o s é u m a e x c e ç ã o ( ...

J.

A

m o d e rn id a d e m a n té m p ro n ta a m a té ria p

ri-m a d e ta is re p re se n ta ç õ e s e e sp e ra u ri-m ri-m e

s-tre (BENJAMIN,1994: 74 e 75).

Para a m u lh e r m ilita n te , contudo, a sensi-bilidade deveria seguir passo a passo o caminho da política e juntar -se ao que era até então consi-derado forte ou heróico, levando em conta o fato de que o modelo de militância é masculino. A imagem da mulher/musa, inspiradora dos talen-tos, expressão da beleza e da sensualidade, da pureza e do encanto, é acompanhada na mitolo-gia grega como a expressão da desgraça mascu-lina que, com a curiosidade de Pandora, mãe do gênero humano, abre a caixa que recebera de Júpiter, deixando que todos os males se espa-lhassem pela terra, restando apenas a esperança. BAUDELAIRE(996) mostra esses encantos:

...a m u lh e r, n u m a p a la v ra , n ã o é so m e n te p a ra

oa rtista e m g e ra l (, . .). É a n te s u m a d iv in d a d e , u m a stro q u e p re sid e to d a s a s c o n c e p ç õ e s d o c é

-re b ro m a sc u lin o , é u m a -re v e rb a ç ã o d e to d o so s

e n c a n to s d a n a tu re za c o n d e n sa d o s n u m ú n ic o

se r; éoo b je to d a a d m ira ç ã o e d a c u rio sid a d e

m a is v iv a q u e oq u a d ro d a v id a p o ssa o fe re c e r

a o c o n te m p /a d o r (BAUDELAIRE;1996:54).

(6)

Baudelaire e suas considerações sobre Flaubert,

lembra a preocupação com akjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAm u lh er in telectu -a l. Sem deixar de lado o elogio a Flaubert, que

foi capaz de construir o ser humano perfeito, apto para o cálculo e para o sonho, mostra que

M a d a m e B o va ry permaneceu sendo um homem.

Se a heroína não encontra lugar na modemidade, pois há uma grande incompatibilidade entre a beleza e a força, o herói moderno não conse-guiria sequer reproduzir a própria vida.

o

h eró iétã o fo rte, tã o en g en h o so , tã o h a rm o -n io so , tã o b em estru tu ra d o co m o esses -n a vio s.

P a ra ele, co n tu d o , o a lto - m a r a cen a em vã o .

P o is u m a m á estrela p a ira so b re su a vid a . A m o d ern id a d e se revela co m o u m a fa ta lid a d e. N elao h eró i n ã o ca b e; ela n ã o tem em p reg o a

l-g u m p a ra esse tip o . A m a rra -o p a ra sem p re n u m p o rto seg u ro ; a b a n d o n a -o a u m a etern a o cio

-sid a d e(B E N JA M IN ,

1994: 93).

gfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

É então que o "herói" perdido no· tempo se reencontra na política. Esse provavelmente será o seu último refúgio, o último sonho. Os militantes de esquerda no Brasil necessitavam construir os próprios "heróis".

o h ero ísm o a p a receu co m o u m a n ecessid a d e q u e d everia sa tisfa zer u m a id en tid a d e en ig m á

-tica e, n este sen tid o , ela tin h a eficá cia . O h eró i

q u e existe em ca d a m o rta l p o d ia ser vivid o em d iferen tes situ a çõ es, m a s a revo lu çã o era u m a co n tecim en to p a ra d ig m â u co . E la d esp erta va a o esp írito h eró ico a en erg ia p a ssio n a l n a d i-reçã o d o q u e era co m u m , d o q u e era p ú b lico , p erm itin d o a o h eró i revela r-se asie a o s o u tro s.

Ilu sã o n ecessá ria e efica z fo rta lecia a a u to -im a g em d o in d ivíd u o e

o

referen cia va so cia

l-m en te( PIETROCOLLA,1995:53).

TSRQPONMLKJIHGFEDCBA

C O N C L U S Ã O

Nesses "heróis", o sonho coletivo poderia alcançar níveis inesperados. Alguns grupos po-líticos foram realmente grandes produtores de sonhos e de "heróis" que, em determinados ca-sos, revestiam-se de uma distância planetária

no que se referia à realidade social do autoritarismo. Em outros casos, alguns in d ivíd u

-o s-m ilita n tes compactuaram, à sua maneira, do

sonho coletivo, o que não deve diminuir ou tirar a importância da dimensão utópica e cria-dora desses maravilhosos revolucionários que, com sua capacidade de sonhar, deram um novo sentido ao processo revolucionário brasileiro e, conseqüentemente, à luta contra o autoritarismo.

N O T A S

Este trabalho foi apresentado no VII Encontro de Ciências Sociais do Norte/Nordeste - Modo de pensar o Social- Espaço, Tempo e Imagens - GT -8 Política, Imagens e Representações, realizado no Ponta Mar Hotel em Fortaleza- CE, no período de

10

a

13.06.97.

2 Militante comunista, fundador e dirigente nacio-nal da Ação Libertadora Nacionacio-nal - ALN, nasceu em Salvador, Bahia, em

5

de dezembro de

1911.

Começou a militar no Partido Comunista Brasilei-ro aos

18

anos, quando iniciava o curso de

Enge-nharia na Escola Politécnica da Bahia. Foi preso

em

1932,

por fazer críticas através de um poema

ao interventor Juracy Magalhães. Em

1935,

mu-dou-se para o Rio de Janeiro. Como integrante do Comitê Central, era responsável pelo trabalho de imprensa e divulgação do Partido. Em

1939,

retoma

ao cárcere, onde mais uma vez renova o exemplo de resistência e determinação frente aos interroga-tórios e às torturas. Em

1945,

conquista a Anistia e retoma à liberdade. Em

1946,

foi eleito deputado constituinte representando o Estado da Bahia. Em

1948

foi cassado e retoma à clandestinidade. Em

1952,

foi enviado à China peJo Partido, onde estu-da a experiência estu-da Revolução Chinesa. Em

1962,

dá-se o início da ruptura com o PCB, que passa a ser aprofundada com o golpe militar de

64.

-"Marigghel1aaprofundou suas críticas à orientação oficial do partido poucas semanas após o golpe, no dia 9 de maio, foi localizado num cinema da Tijuca, no Rio, e preso. Embora baleado, à quei-ma-roupa, repetiu a postura de altivez das prisões anteriores. Fez de sua defesa um ataque aos cri-mes da ditadura. A mobilização política forçou os generais a aceitarem a concessão de um

(7)

corpus que novamente lhe deu a liberdade" (Dossiê

SRQPONMLKJIHGFEDCBA

d o s M o r to s e D e s a p a r e c id o s a p a r tir

d e 64; 1995: 58). Esse episódio resultou em um livroP o r q u e r e s is ti à p r is ã o . O rompimento de-finitivo com o PCB seria efetivado com um docu-mento intitulado "Pronunciamento do Agrupamento Comunista de São Paulo", divulga-do em fevereiro de 1968. A organização foi, en-tão, denominada Ação Libertadora Nacional- ALN. Nascido no Rio de Janeiro em 27 de outubro de 1937. Participou na juventude, de algumas mani-festações nacionalistas como "O Petróleo é Nos-so". Formou-se pela Escola Militar das Agulhas Negras, em Resende - Rio de Janeiro, em 1960. Em 1967, obtém a patente de Capitão. Foi em São Paulo, no quartel de Quitaúna, para onde foi trans-ferido em 1965, que Iarnarca, juntamente com um grupo de companheiros, fez a opção revolucioná-ria pela luta armada. A Ação Libertadora Nacional já estava organizada - ALN e havia um grupo de militares, expulso das forças armadas, que manti-nha ligação com o movimento operário, inicial-mente vinculado ao Movimento Nacionalista Revolucionário - MNR, que, unindo-se a setores dissidentes da Política Operária (POLOP) deu ori-gem, juntamente com o grupo do Capitão Lamarca, à Vanguarda Popular Revolucionária - VPR. Em abril de 1971, discordando da VPR, ingressou no Movimento Revolucionário 8 de Outubro - MR-8, deslocando-se para o sertão da Bahia com o obje-tivo de manter uma base desta organização no interior. Em agosto do mesmo ano, ocorre em Sal-vador a prisão de um militante que conhecia o seu paradeiro e a localização de um aparelho onde estava localizada a sua companheira lara Yavelberg. O referido aparelho foi rapidamente localizado, fazendo com que Yara se suicidasse com um tiro. Em seguida, partem para o local onde Lamarca estava refugiado. " A imprensa brasileira apresentou na ocasião duas versões sobre o diálo-go que teria havido entre Lamarca e o 'agente federal'. Para o Globo, foram apenas três frases: 'Você é Lamarca?-' Sou o Capitão Carlos Lamarca'. - 'Era. Agora você vai ser defunto'. A versão da maioria dos jornais foi um pouco mais longa: 'Quem é você? - 'Carlos Lamarca'. - 'Sabe o que aconteceu com lara?' - 'Ela se suicidou em Salvador.' 'Onde está sua mulher e seus filhos?'

-116

gfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

R E V IS T A D E C IÊ N C IA S S O C IA IS V . 3 1 N . 1 2000

'Estão em Cuba.' - 'Você sabe que é um traidor da Pátria?'. Lamarca teria morrido sem responder essa última pergunta" (D o s s iê d o s M o r to s e D e s a p a

-r e c id o s a p a r tir d e 64; 1995: 105)

4 Militante do PCB, preso várias vezes, inclusive an-tes do regime militar pós-64, atuava na Universi-dade Federal do Ceará, relata que "De 68 em diante eu fui várias vezes preso e às vezes com muita violência. Eu tinha um problema circulató-rio, um problema de deficiência na circulação, e isso está muito relacionado com o problema

tam-bém de tensão, de conflito, dekjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAstress.E a cabeça é boa, tem companheiro que se não tiver cuidado,

(8)

resistindo à prisão. Então, ele dá um chute na porta do quarto ao lado, onde eu tinha duas filhas e uma sobrinha, que estavam dormindo. O quarto era pequeno. Minha casa era casa de classe média, média, casa pequena, quartos quase conjugados. Tinha dois filhos que não moravam comigo, para ver se aliviavam as ten-sões. A minha filha mais velha é acordada com ele batendo com o cano da metralhadora nela, ela tinha quatorze anos. Ele a despertou, ba-tendo com o cano da metralhadora nela. E dá ordem de prisão para todo mundo. As duas mais novas, uma sobrinha e a outra filha tinham dez e onze anos. Daí eu sou levado para a sala. Quando eu chego na sala, eu procuro falar com uma pessoa que parecia que chefiava, coman-dava o grupo. E fui falar com ela dizendo exa-tamente isso: olha eu não estou resistindo à prisão, não há necessidade de violência". Sofrendo de problemas circulatórios, com o pro-cesso que o levou a amputar a perna. "Eu tinha perdido a perna, justamente com o agravante des-sa prisão violenta, pois eu tive problemas circula-tórios, isso foi até o dia 10 de dezembro. Eu já estava em uma situação difícil, fui solto e preso novamente no final de 1970. No dia 18 de dezem-bro eu estava internado por uma gangrena no dedo, houve uma amputação no dedo porque gangrenou, porque com essa violência a doença agravou-se rapidamente, houve bloqueio total, e eu perco um dedo. Fomos para a operação do dedo, e aí a gangrena degenera para a perna. E à minha revelia, que eu perdi os sentidos, eu ainda tomei conhecimento da amputação do dedo no dia 19; no dia 20 as coisas se agravavam, eu entro numa base de sedativo violento e perco ... não entro em coma, mas perco a noção de realidade. Quando vou ter noção de realidade novamente, é no dia 10 de janeiro de 1971. Passei vinte dias sem saber o que aconteceu na minha vida. Me disseram que dei até escândalo no hospital; fiz comício, discurso, falei de ditadura, de médico, chamei médico de filho da puta ... estava muito pressionado, muito, muito. Foi quando acordo dia 10, é que eu sinto que perdi a perna. O pior, é que a dor continuava, reflexo ... que isso é um pro-blema biológico. Você perde a perna, mas para ela ir embora do seu consciente, ainda hoje você

6

fala dela e ela aparece. E a minha primeira reação eu acho que foi psicologicamente boa. A primeira coisa que eu pensei, quando vi que tinha perdido a perna, procuro e não a encontro, foi um impac-to muiimpac-to grande; se eu fosse o Pelé, eu estava perdido, mas eu não sou o Pelé, foi o que pensei" Participou da Guerrilha do Araguaia na década de 70, foi preso várias vezes pela repressão até optar pelo exílio. Sua mãe, Maria de Lurdes

Albuquerque, relata sua história de vida.

gfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

" Pe d ro foi preso três vezes: a primeira vez, ele já

estuda-va e fazia Escola Técnica. Ele tinha tomado ba-nho, estava na sala esperando o jantar, quando de repente eu procurei o Pedro e não encontrei mais. Foi aí que eu tomei um choque muito grande. Hoje eu não enxergo, só se estiver calma. Quatro dias depois, eu não enxergava nada. Um vizinho então disse que um soldado e um rapaz tinham vindo buscá-lo. Depois eu soube que ele estava perto do Tiradentes, andando de joelhos e um rapaz atrás dele. Esse rapaz era filho de um se-nhor que era da polícia. Ele passou a ser infor-mante da polícia. Estudava na Escola Técnica, tinha raiva do Pedro, pois o Pedro ganhara o Grêmio. Depois o Pedro foi preso novamente, passou vin-te e três dias no 23ºBC (...) Depois o Pedro foi preso, lá no Congresso que houve em São Paulo (Ibiúna). Ele já participava do Centro Estudantil. Ele foi preso várias vezes, a história do Pedro é muito longa. Foi para a guerrilha, eu não sabia onde ele estava. Soube depois que ele estava lá e só depois que ele chegou. Quanto à participação dele lá eu não sei de nada, porque ele não conta". A acusação de traição foi feita pelo guerrilheiro Ângelo A rro y o , único sobrevivente da terceira investi da militar na região do Araguaia. Na

reali-dade, Albuquerque teria fugido para relatar os

acontecimentos da guerrilha. Contudo, a acusa-ção de delaacusa-ção é repetida pela reportagem da re-vista

TSRQPONMLKJIHGFEDCBA

V e ja d e

13/10/93.

7

B IB U O G R A F IA

ALVES ,Márcio Moreira.

SRQPONMLKJIHGFEDCBA

6 8 m u d o u o m u n d o

-a explosão dos sonhos libertários e a guinada conservadora num ano que valeu por décadas, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.

(9)

PIETROCOLA, Luci Gati.

SRQPONMLKJIHGFEDCBA

A n o s 60/70 : O

v iv e r e n t r e p a r ê n t e s e - perseguição política aos revolucionários e suas famílias, Tese de Doutorado, Defendida na USP em 25.05.95.

POLLAK, Michael.kjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAM e m ó r ia , e s q u e c im e n to , s ilê n c io , In. E s t u d o s h is t ó r ic o s

3

-Memória. São Paulo: Edições Vértice, 1989.

SADER,Emir.O a n j o torto-esquerda (e Direita) no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1995. VASCONCELOS,José Gerardo, T o t a lit a r is m o

e a n is t ia : o pecado e o perdão na esfera da política, Tese de Mestrado, defendida no Departamento de Ciências Sociais e Filosofia da UFC em 22 de setembro de 1993. BAUDEIAIRE, Charles. S o b r e a m o d e r n id a d e .

Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.

BENJAMIN, Walter. C h a r le sBaudelaire, u m lír ic o n o a u g e d o c a p ita lis m o , In. O b r a s

e s c o lh id a s

gfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

m ,São Paulo: Brasiliense, 1994d.

D O S S I Ê d o s m o r t o s e d e s a p a r e c id o s p o lít ic o s a p a r t ir d e 1 9 6 4 . Recife: Companhia Editora de Pemambuco, 1995. GOFFMAN, Erving. E s t ig m a - notas sobre a

manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro: Guanabara, 1988.

MARIGHELLA,Carlos. P o r q u e r e s is t i à p r is ã o .

São Paulo: Brasiliense; Salvador: EDUFBA: OLODUM,1995.

MÉNARD, René, M it o lo g ia g r e c o - r o m a n a .

São Paulo: Opus 1991.

Referências

Documentos relacionados

Os acelerômetros como os CSA representam uma ferramenta válida e útil na avaliação da atividade física (Freedson, Melanson & Sirard, 1998). Os resultados dos CSA combinam com

E porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas.. E porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a

X - O gabarito definitivo será divulgado em data estipulada pela Comissão de Seleção, nos sites: www.pm.ma.gov.br e www.colegiomilitarbacabal.com.br ., após análise dos pedidos

De fato, a aplicação das propriedades da regra variável aos estudos lingüísticos além da fonologia não constitui assunto tranqüilo, seja porque a variável passa a ser

Os fatos desagradáveis, traumáticos da vida, muitas vezes estão aí atuando, potencialmente, a nosso favor, pois podem nos fazer evoluir, melhorar, cres- cer, mas, claro, se

Os materiais e cores representados poderão sofrer pequenas alterações sem prévio aviso em função da disponibilidade dos mesmos no mercado. Contrato padrão e demais condições

F oram dois dias de muito aprendizado e troca de informações para mais de 700 participantes dos dez cursos, além dos eventos paralelos que aconteceram durante a II Jornada

Gostava que muitos meninos fossem tão felizes como eu sou, mas sei que há muitas crianças neste mundo que não sabem o que é alegria, nem sabem o que é brincar8. Queria que todas