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A autonomia da Defensoria Pública da União e o acesso à justiça

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(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

FACULDADE DIREITO

DEPARTAMENTO DE DIREITO PÚBLICO

CURSO DE DIREITO

RAFAEL SANTIAGO DE CODES OLIVEIRA

A AUTONOMIA DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO E O ACESSO À JUSTIÇA

FORTALEZA

(2)

RAFAEL SANTIAGO DE CODES OLIVEIRA

A AUTONOMIA DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO E O ACESSO À JUSTIÇA

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Constitucional.

Orientador: Prof. Msc. William Paiva Marques Júnior.

FORTALEZA

(3)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca Setorial da Faculdade de Direito

O48a Oliveira, Rafael Santiago de Codes.

A autonomia da Defensoria Pública da União e o acesso à justiça / Rafael Santiago de Codes Oliveira. – 2013.

74 f. : enc. ; 30 cm.

Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2013.

Área de Concentração: Direito Constitucional. Orientação: Prof. Me. William Paiva Marques Júnior.

1. Acesso à justiça. 2. Defensores públicos - Brasil. 3. Assistência judiciária - Brasil. I. Marques Júnior, William Paiva (orient.). II. Universidade Federal do Ceará – Graduação em Direito. III. Título.

(4)

RAFAEL SANTIAGO DE CODES OLIVEIRA

A AUTONOMIA DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO E O ACESSO À JUSTIÇA

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Ceará como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Constitucional.

Aprovado em ____/____/_______.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________

Prof. Msc. William Paiva Marques Júnior (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

___________________________________________

Profa. Msc. Janaína Soares Noleto Castelo Branco

Universidade Federal do Ceará (UFC)

___________________________________________

Prof. Francisco de Araújo Macedo Filho

(5)

A Deus.

À minha família, que me ama e contribui com a

minha formação.

A todos meus amigos, que tornam a vida mais

encantadora.

À Universidade Federal do Ceará, que

possibilitou a minha educação superior.

À Defensoria Pública da União, que me inspirou

(6)

AGRADECIMENTOS

A Deus, por ter me concedido a vida e ter me oferecido todas as bênçãos, as

oportunidades e as pessoas que me cercam.

Aos meus pais, incluindo todos os que participaram da minha vida, que me

educaram, amaram-me e me auxiliaram nas dificuldades, a quem sou muito feliz de estarem

presentas na minha jornada. Aos meus irmãos e à minha madrinha cujas companhias me fazem

muita falta. À minha vó a quem gostaria de ter mostrado esse trabalho.

Aos meus amigos, que conseguem me suportar e me proporcionam momentos

felizes, especialmente, Victor, Gabriel, Ulisses, Yuri, Feliciano, Leonardo, Fernando, Paulo,

André, Stanley, Bruno, Cristiano (os três companheiros do 2º ofício civil), Alan, Daniel, Samuel,

Mário, Filipe, Maia e Rafael.

À Bruna, minha amiga e companheira de um longo percurso da minha vida, que me

influenciou a tomar o caminho jurídico e a quem agradeço por todos os anos que passamos

juntos.

À Defensoria Pública da União, instituição onde adquiri grande conhecimento da

prática jurídica, onde pude ajudar muitas pessoas e onde convivi com várias pessoas

extraordinárias, como a Dra. Gislene, Dra. Márcia, Raquel, Dona Lêda, Eladário, Renata

Catarina, Aline, Naíra, Lara, Thuanny, Elaine, Caroline Sofia, Sofia, Mariana, Julianne, Ana

Caroline, Fernanda, Luana, Enale, Andrezza, Samara, Fredi, Tomaz, Gabriel, Hélio, Rodrigo,

Fabrício.

À Universidade Federal do Ceará que me proporcionou uma boa formação, e aos

seus professores, especialmente aos professores Falcão, Mazé, Tarin e Regenaldo, e aos

servidores da biblioteca.

Ao meu Orientador, Prof. Msc. William Paiva Marques Júnior, por toda atenção

durante esse trabalho e pela dedicação à Faculdade.

Aos componentes da Banca examinadora, a Profa. Msc. Janaína Soares Noleto

Castelo Branco e o Prof. Francisco de Araújo Macedo Filho, pela disponibilidade, gentileza e

colaborações.

(7)

“Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz. Onde houver ódio, que eu leve o amor;

Onde houver ofensa, que eu leve o perdão;

Onde houver discórdia, que eu leve a união;

Onde houver dúvida, que eu leve a fé;

Onde houver erro, que eu leve a verdade;

Onde houver desespero, que eu leve a esperança;

Onde houver tristeza, que eu leve a alegria;

Onde houver trevas, que eu leve a luz.

Ó Mestre, fazei que eu procure mais

Consolar, que ser consolado;

Compreender, que ser compreendido;

Amar, que ser amado.

Pois, é dando que se recebe,

É perdoando que se é perdoado,

E é morrendo que se vive para a vida eterna.”

(8)

RESUMO

O objetivo desse estudo foi analisar o processo de obtenção da autonomia pela Defensoria

Pública da União e os seus possíveis efeitos quanto à ampliação do acesso à justiça, direito

fundamental previsto pela Constituição Brasileira em vigor. Com a promulgação da Emenda

Constitucional nº 74, de 2013, foi concedida, ao órgão, autonomia funcional, administrativa,

financeira e a iniciativa de sua proposta orçamentária, que lhe permite maior efetividade no

desempenho de suas funções institucionais. Embora essa autonomia tenha sido limitada, visto

não ser permitido à instituição propor alterações de matérias interna corporis, e não exista uma

destinação orçamentária adequada para que ele possa exercer suas atribuições, ainda assim, será

possível ao mesmo expandir seus serviços, desde os rotineiramente até os inabitualmente

prestados, e garantir, aos hipossuficientes econômicos e jurídicos um efetivo acesso à justiça.

(9)

ABSTRACT

The aim of this study was analyze the process of autonomy acquisition by the Union Public

Defender's Office and their possible effects regarding to expansion of access to justice,

fundamental right protected by Brazilian Constitution in force. With the enactment of

Constitutional Amendment No. 74, 2013, it was granted functional autonomy, administrative,

financial and initiative in its budget proposal, that allows greater effectiveness in the

performance of its institutional functions. Although this autonomy has been limited, since it is

not permitted the institution to propose amendments of interna corporis matters, and there is no

adequate budgetary allocation so that it can exercise its powers, yet it will be possible to expand

its services, from routine to the unusually provided, and to ensure the economic and legal inapt,

an effective access to justice.

(10)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ANADEP - Associação Nacional dos Defensores Públicos

ASINT - Assessoria Internacional

CF - Constituição Federal

CLT – Consolidação das Leis do Trabalho

DPU - Defensoria Pública da União

DAJI - Divisão de Assistência Jurídica Internacional

DCRI - Divisão de Cooperação e Relações Internacionais

DEPEN - Departamento Penitenciário Nacional

IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis

INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

OEA – Organização dos Estados Americanos

PEC – Proposta de Emenda à Constituição

STF – Supremo Tribunal Federal

STJ – Superior Tribunal de Justiça

STM – Superior Tribunal Militar

TCU – Tribunal de Contas da União

TSE – Tribunal Superior Eleitoral

(11)

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 16

2. ACESSO À JUSTIÇA... 17

2.1 Conceito de acesso à justiça ... 17

2.2 Evolução conceitual do acesso à justiça ... 19

2.3 Três ondas de acesso à justiça ... 21

2.3.1 A primeira onda: assistência judiciária gratuita ... 22

2.3.2 A segunda onda: representação dos direitos difusos e dos coletivos ... 24

2.3.3 A terceira onda: o acesso à justiça sob um novo enfoque ... 25

2.4 O acesso à justiça como um direito fundamental ... 26

3. ASPECTOS DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO ... 29

3.1 O processo histórico da assistência jurídica no Brasil e a instituição da Defensoria Pública ... 29

3.2 Defensoria Pública da União ... 34

3.3 Princípios e objetivos institucionais da Defensoria Pública ... 36

3.4 Funções institucionais da Defensoria Pública... 38

3.5 Diagnóstico da Defensoria Pública da União ... 40

4. AUTONOMIA DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO ... 44

4.1 Recomendações da Organização dos Estados Americanos para a existência de uma Defensoria Pública autônoma ... 44

4.2 Promulgação da Emenda Constitucional nº 45/2004: concessão da autonomia às Defensorias Públicas Estaduais ... 46

4.3 A conquista da autonomia pela Defensoria Pública da União ... 50

5. A AUTONOMIA DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO COMO MEIO DE AMPLIAÇÃO DE ACESSO À JUSTIÇA ... 53

5.1 Uma autonomia limitada: restrição quanto à iniciativa legislativa para propor alterações de matérias interna corporis ... 53

5.2 Atividades passíveis de ampliação com a concessão da autonomia da Defensoria Pública da União ... 56

(12)

5.2.2 Assistência jurídica integral na Justiça do Trabalho ... 60

5.2.3 Concretização e ampliação dos Projetos Especiais da Defensoria Pública da União .. 63

5.2.4 Assistência jurídica internacional ... 65

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 68

(13)

1. INTRODUÇÃO

A Defensoria Pública da União, constituída para prestar assistência jurídica integral e

gratuita aos necessitados, individual e coletivamente, passa por uma evolução institucional, com

a aquisição de sua autonomia, que permite ampliar o acesso à justiça aos beneficiários de seus

serviços.

O acesso à justiça é um direito previsto na Constituição Federal que serve de

instrumento para que o cidadão pleiteie outros direitos, seja judicial ou extrajudicialmente, além

da obrigação de ser informado desses.

Todavia, nem todos os brasileiros conseguem acessar esse direito, permanecendo à

margem dessa proteção jurídica. A Defensoria não obtém êxito para efetivá-lo, bem como para

efetivar suas funções institucionais, por razões que serão expostas nesse trabalho.

Com a promulgação da Emenda Constitucional nº 74/13, foi concedida a ela

autonomia administrativa, funcional e financeira de modo a alterar esse estado.

Assim, justifica-se o presente estudo para demonstrar como será possível ampliar o

acesso à justiça pela Defensoria Pública da União, após a aquisição da autonomia, de modo a

expandir a concretização dos direitos previstos no nosso ordenamento jurídico.

Neste trabalho, tenta-se responder às seguintes indagações: a) O que é acesso à

justiça? E como ocorreu seu desenvolvimento? b) Como sucedeu a institucionalização da

Defensoria Pública da União no Brasil? E quais são suas principais características e funções? c)

Como decorreu o processo para a concessão da autonomia a esse órgão? d) Qual são os possíveis

efeitos capazes de ampliar o acesso à justiça, pela Defensoria da União, com a aquisição dessa

autonomia?(e) Quais os principais serviços do órgão deverão ser expandidos para atingir esse

fim?

Para tanto, foram utilizados livros, monografias, dissertações, artigos, revistas,

reportagens, informações da internet, decisões dos Tribunais, dentre outras fontes bibliográficas,

abordando os temas já mencionados.

Com isso, buscam-se demonstrar quais são as principais atividades que serão

aprimoradas pela Defensoria Pública da União, após a aquisição da autonomia e o seu

(14)

2. ACESSO À JUSTIÇA

O presente capítulo destina-se a conceituar o termo acesso à justiça, bem como

demonstrar a evolução histórica do seu significado e as suas três "ondas" descritas por

Cappelletti e Garth e, por fim, apontar a previsão constitucional desse direito como

fundamental. Objetiva-se, com isso, dar fundamento teórico para o tema principal deste

trabalho, que é ampliação do acesso à justiça com conquista da autonomia pela Defensoria

Pública da União -DPU.

2.1 Conceito de acesso à justiça

Inicia-se este trabalho tentando conceituar o que é acesso à justiça para

compreender como a autonomia da DPU garantirá uma ampliação desse direito aos usuários

desse órgão.

O conceito de acesso à justiça é dinâmico, assumindo alguns sentidos ao longo do

tempo. Todavia, sempre foi e ainda é difícil sua precisa delimitação.

Conforme Mauro Cappelletti e Bryant Garth, uns dos principais autores sobre o

tema, na obra “Acesso à Justiça":

A expressão “acesso à Justiça” é reconhecidamente de difícil definição, mas serve para determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico – o sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob os auspícios do Estado. Primeiro, o sistema deve ser igualmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam individual e socialmente justos.1

Na visão de Amanda Marques, o termo “acesso à justiça” acaba sendo utilizado de

maneira indiscriminada e na direção do interesse de quem o utiliza. Para ela, o acesso à justiça

não se limita ao acesso ao Judiciário, mas também a um processo mais célere e isento de

custas para aqueles que não podem as arcar, bem como pela prestação jurisdicional com uma

sentença justa e pela efetivação dos direitos.2

Para ela, a doutrina traz três enfoques principais: (1) o acesso à justiça como um

direito de ação; (2) como instrumento para a realização de direitos; e (3) como assistência

jurídica em sentido amplo. O primeiro não é o mais adequado porque se limita ao âmbito

1 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998, p. 08.

(15)

processual, ao início do processo e somente ao autor da ação.3 O segundo também não é

adequado porque também de cunho processual e como mero instrumento. Entende, portanto,

mais apropriado o terceiro foco, nesses termos:

Portanto, a última e mais própria concepção de acesso à justiça aqui estudada envolve não somente a previsão legal de direitos, a garantia de direito de ação ou existência de um processo apto a realizar as funções da jurisdição, mas, sobretudo, abrange toda atividade jurídica, desde a criação de normas jurídicas, sua interpretação, integração e aplicação, com justiça, atingindo inclusive, segundo entendemos, toda assistência extraprocessual, extrajudicial aos necessitados.4

Na óptica de Zollinger, o acesso à justiça deve abranger:

(i) Um direito de acesso a uma ordem jurídica justa; (ii) que permita uma tutela jurisdicional efetiva, adequada e tempestiva, (iii) considerando as particularidades das situações de direito substancial, (iv) e as diferentes posições sociais, (v) que possibilite também a participação das partes na formação da decisão, (vi) bem como garanta o acesso à informação e à orientação jurídica.5

Já para os autores Marcos Antônio C. de Castro e Leonardo Mendes Memória, o

acesso à justiça é: “[...] a própria materialização de reivindicar o fundamento da dignidade da

pessoa humana através dos direitos elencados na Carta Magna [...]”,6 adotando um

posicionamento de que esse direito seria um instrumento para concretização dos outros

previstos na nossa Constituição.

Um conceito bem explicativo do que seria o acesso à justiça é o trazido por Kazuo

Watanabe:

[...] o acesso à ordem jurídica justa implica o direito à informação e perfeito conhecimento do direito substancial (o que conhecemos por educação em direitos); pesquisa permanente a cargo de especialistas para aferição da adequação entre a ordem jurídica e a realidade socioeconômica do país; Justiça adequadamente organizada e juízes inseridos na ordem social e comprometidos com a realização da ordem jurídica justa; instrumentos processuais capazes de promover a efetiva tutela de direitos; direito à remoção de todos os obstáculos que se anteponham ao acesso à justiça.7

3 BATISTA, Amanda Marques. A Defensoria Pública e o Acesso Coletivo à Justiça. 2008. Dissertação (Mestrado em Direito) - Universidade Católica de Pernambuco, Recife, 2008. Disponível em: <http://www.unicap.br/tede//tde_busca/arquivo.php?codArquivo=345>. Acesso em 20 ago. 2012 p. 32.

4 Ibidem, p. 33.

5 ZOLLIGER, Márcia Brandão. Proteção processual aos direitos fundamentais. Salvador: Juspodivm. P. 124-125. Nota 43. Apud SOUZA, Denise Bispo de. O papel da defensoria pública na concretização do acesso à justiça. Fortaleza, CE, 2008. 82 f. TCC (graduação) - Universidade Federal do Ceará. Faculdade de Direito, Fortaleza (CE), 2008. Disponível em: <http://www.repositoriobib.ufc.br/000004/0000043F.pdf>. Acesso em: 13.08. 13. p. 16.

(16)

Após essa abordagem conceitual sobre o acesso à justiça, demonstra-se, a seguir,

como ocorreu a evolução da sua concepção ao longo do tempo.

2.2 Evolução conceitual do acesso à justiça

Face à tentativa de conceituar o que seria acesso à justiça, é importante também

demonstrar como foi que esse instituto surgiu bem como ocorreu o processo da construção do

seu conteúdo.

Apesar da preocupação dos povos Antigos em estabelecer condições para

aplicação da Justiça, o marco inicial do reconhecimento positivado do direito ao acesso à

justiça ocorreu apenas com a elaboração da Magna Carta do Rei João Sem-Terra, em 1215.

A Magna Carta teve influência da aristocracia inglesa que tinha como objetivo

limitar os abusos do Poder Soberano do Rei João e defender os interesses dessa classe em

ascensão. Apesar desse documento servir de proteção apenas a uma classe da população, ele

acabou sendo reconhecido como “declaração de direitos”, influenciando futuras cartas

políticas, como a Constituição dos Estados Unidos e a Declaração Universal de Direitos

Humanos da ONU.8

O seu papel inovador, relacionado ao tema aqui abordado, está prescrito na

cláusula de número 29, nesses termos:

Nenhum homem livre deverá no futuro ser detido, preso ou privado de sua propriedade, liberdades ou costumes, ou marginalizado, exilado ou vitimizado de nenhum outro modo, nem atacado, senão em virtude de julgamento legal por seus pares [júri popular] ou pelo direito local. A ninguém será vendido, negado ou retardado o direito à justiça.9

Percebe-se que no final da cláusula: “A ninguém será vendido, negado ou

retardado o direito à justiça”, há um reconhecimento do direito ao acesso à justiça apenas

Cândido Rangel; WATANABE, Kazuo (Org.). Participação e processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, passim apud PINTO, Ana Karoline dos Santos. O defensor público interamericano e a concretização do acesso à justiça no sistema americano de proteção aos direitos humanos. 2013. 122 f. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Ceará. Faculdade de Direito, Fortaleza - CE, 2013. p. 18.

8 ANNONI, Danielle. O direito humano de acesso à justiça no Brasil. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2008, p. 73 e 74.

(17)

quanto ao aspecto de garantir o acesso ao Judiciário, de forma gratuita, célere e eficaz.

O acesso à justiça, após esse marco inicial, sofreu influências externas, como

políticas e históricas, de modo que seu conceito foi sendo desenvolvido à medida em que

havia uma evolução organizacional dos Estados.

Já no período compreendido entre os séculos XVIII e XIX, nos estados liberais

burgueses, o acesso à justiça se limitava apenas ao direito de petição ao Estado, cabendo a

esse apenas garantir a igualdade formal entre os litigantes para que tivessem acesso ao

Judiciário, sem haver qualquer preocupação com o efetivo acesso em face das limitações

sociais e econômicas. 10

Assim, o acesso à justiça era estudado e tratado tão somente dentro do campo dogmático, teórico, distante da prática e da realidade social. Os direitos eram reconhecidos apenas em sua concepção individual, enquanto que os direitos sociais e coletivos não eram legitimados, o que se dava justamente devido à grande consequência da cultura do laissez-faire11: a inércia do Estado.12

Nesse período do Estado Liberal, caracterizado pelo absenteísmo estatal, pelo

individualismo e pela existência de igualdade meramente formal, o acesso à justiça era um

“direito natural”, anterior ao Estado, em que esse não precisaria intervir para garantir aquele, mas apenas atuaria para que não fosse tolhido por outrem.13

[...] cabe ao Estado o mínimo de intervenção na vida privada, garantindo-se aos cidadãos, dentre outros, os direitos de liberdade e propriedade. Nesse momento, a ideia de assistência judiciária aos pobres não possuía assento constitucional. O trabalho, quando realizado, se dava de forma voluntária, eventual e gratuita, e sempre sem intervenção estatal.14

Diante desse contexto, apenas as pessoas abastadas e com conhecimento dos seus

direitos poderiam usufruir da justiça, limitada à classe dos detentores do poder e da burguesia.

Ao restante da população, quando chegava a ter alguma noção da necessidade da proteção de

seus direitos, enfrentava as dificuldades quanto ao pagamento das custas judiciais e dos

10 ANNONI, Danielle. O direito humano de acesso à justiça no Brasil. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2008, p. 60.

11 “Em francês, deixe fazer. O termo é comumente utilizado como síntese do pensamento liberal burguês e remete à expressão do século XVIII “laissez faire, laissez passer” (deixe fazer, deixe passar), consagrada por Vicent de

Gournay (1712 – 1759).” REBOUÇAS, Elaine Cristina do Rosário. O acesso à justiça e a Defensoria Pública da

União no Ceará. 2013. 143 f. TCC (graduação) - Universidade Federal do Ceará. Faculdade de Direito, Fortaleza (CE), 2013. p. 16.

12 Ibidem, p. 16.

13 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998, p. 09.

(18)

honorários advocatícios, permanecendo à margem do Direito.

Por decorrência dessa exclusão social, econômica, além de tudo da justiça, e com

o aumento das relações interpessoais e da complexidade dos povos, no século XX, os

excluídos passaram a ganhar força, como grupo, para poderem reivindicar direitos coletivos e

exigirem a intervenção estatal para garanti-los.

O Estado deixa de ser omisso e passa a atuar como garantidor desses direitos,

conhecidos como Direitos Sociais, Econômicos e Culturais, ou de segunda dimensão,

iniciando-se o neoconstitucionalismo, a serem agregados aos de primeira, os Direitos Civis ou

Políticos, que tiveram sua valorização no constitucionalismo clássico. O Estado deixa de ser

Liberal para se tornar Social (Welfare State ou de Bem-Estar Social).15

Com essa função estatal mais atuante, o acesso à justiça se tornou mais concreto

porque havia uma preocupação de que fosse atingida a igualdade entre as pessoas, não

meramente formal, mas uma igualdade material, em que todos tinham o direito subjetivo de

acessar a justiça, garantindo-se uma conscientização social dos direitos e facilitando o acesso

ao Judiciário das pessoas necessitadas, com a isenção de custas e de taxas judiciais, além da

promoção de advogados pagos pelo Estado.

Já na segunda metade do século XX, com o desenvolvimento do Estado

Democrático de Direito, o acesso à justiça ganha uma maior significância em razão do novo

contexto em que, além de o Estado ser limitado pela legalidade, a democracia caracterizava-se

pelo maior compromisso com a função social, por ser estruturada em uma ordem jurídica

legítima e em um intervencionismo estatal mais efetivo.16

Com isso, surgem movimentos para ampliar e efetivar a prestação jurisdicional

com o reconhecimento de direitos e a criação, pelo Estado, de instrumentos e de alternativas

para um maior acesso à justiça. Esses movimentos são descritos por Cappelletti e Garth, na

obra "Acesso à Justiça".

2.3 Três ondas de acesso à justiça

15 “O neoconstitucionalismo de matriz europeia (conformador do Estado Social e Democrático de Direito) que teve por gênese o processo histórico que se desenrolou na Europa Ocidental a partir do final da Segunda Guerra Mundial, no Brasil só teve início após a promulgação da Constituição Federal de 1988.” MARQUES JUNIOR, William Paiva. Reflexos do Neoconstitucionalismo na eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações jurídico-privadas. In: Publicização do Direito Privado e Privatização do Direito Público. Obra Mimiografada, passim.

(19)

Cappelletti e Garth identificam, nos países ocidentais, três ondas de acesso à

justiça. Essas "ondas" são soluções práticas que os estudiosos buscaram com o intuito de

ampliar esse acesso. Resumidamente, a primeira refere-se à assistência judiciária; a segunda, à

representação dos interesses difusos ou coletivos; e a terceira refere-se à mudança

procedimental e da organização Judicial, que inclui os dois anteriores.

2.3.1 A primeira onda: assistência judiciária gratuita

O primeiro movimento a ser percebido foi o de prestação de serviço judiciário aos

pobres como fator a fomentar o acesso à justiça.

Inicialmente, a assistência judiciária17 aos pobres era feita restritivamente pelos

advogados filantrópicos, que prestavam um munus honorificum, visto não receberem qualquer

contraprestação financeira. Todavia, o número de advogados que prestavam esse serviço era

restrito e insuficiente para a grande demanda de excluídos da Justiça.18

Assim, após o reconhecimento desse abismo no acesso à justiça entre ricos e

pobres, alguns Estados, como a Alemanha, a Inglaterra, os EUA e a França passaram a custear

os serviços de advogados particulares para atender as demandas dos que não podiam pagar

pelos serviços.

Nas palavras de Danielle Annoni:

Na primeira onda, buscava-se garantir isonomia de acesso aos mais pobres, não apenas isentando-os de custas judiciais, como também lhes conferindo advogados gratuitos. Essa fase fortaleceu o papel da Ordem dos Advogados, criando a figura do advogado dativo, ora remunerado pelos cofres públicos. Também fomentou a criação das defensorias públicas e organizações da sociedade civil em prol da assistência judiciária gratuita.19

Esse sistema, em que os Estados pagavam para que os advogados particulares

realizassem assistência judiciária aos pobres, mas sem vínculo empregatício com o Poder

Público,20 e nos limites estabelecidos em lei, era conhecido como judicare. Com ele, “o apoio

judiciário deixa de ser entendido como filantropia e passa a ser incluído como medida de

17 Assistência judiciária não se confunde com assistência jurídica. O primeiro se restringe ao acesso ao judiciário, possibilitando-se a propositura de uma ação ou a contestação de um direito. Já o segundo é mais abrangente, pois, além de incluir o primeiro, também se refere às resoluções extrajudiciais de conflitos, bem como a orientação jurídica e os procedimentos mais céleres e eficazes.

18 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998. p. 32.

19 ANNONI, Danielle. O direito humano de acesso à justiça no Brasil. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2008. p. 80.

(20)

combate à pobreza nos programas estatais.”21

Apesar do avanço no aspecto econômico, em que foi quebrada a barreira dos

custos, esse sistema ainda era limitado em aspectos culturais, visto que ainda permanecia

difícil aos pobres tomarem consciência dos seus direitos e reivindicá-los, procurando os

advogados. Normalmente, buscavam auxílio em casos familiares, mais no âmbito do Direito

Penal ou no de Família. 22

Além disso, haviam outros problemas, como a baixa remuneração paga aos

advogados, o que acabava os desestimulando a prestarem um serviço adequado; a falta de

intimidade e o distanciamento geográfico entre eles e seus clientes;23 e a limitação da

atividade às causas individuais, negligenciando as causas coletivas da população

desfavorecida economicamente. 24

Posteriormente, esse sistema foi modificado para que os advogados fossem

remunerados pelos cofres públicos, conhecido como "escritórios de vizinhança". Nesse caso,

os escritórios de advocacia eram instalados nos locais onde iriam atuar. Dessa forma, esses

profissionais estariam mais próximos dos problemas enfrentados por essa classe mais pobre,

bem como poderiam conscientizá-los dos direitos deles. Outra vantagem era que, diante do

conhecimento da realidade social, os advogados se esforçavam para que fosse modificada a

legislação com o objetivo de ampliar os direitos dos pobres enquanto classe.25

Assim como o modelo anterior de acesso à justiça, esse também apresentou falhas

que ainda dificultavam a concretização desse direito. Nas palavras de Elaine Rebouças:

[...] assim como todo sistema, ele possui também suas deficiências, e as principais delas estão relacionadas ao fato de que, na organização em equipes para auxiliar os pobres em seus problemas enquanto classe e grupo social, muitas vezes, ignoravam os problemas individuais. Assim, numa impossibilidade real de promover o adequado auxílio à classe pobre como um todo, mas também às causas particulares, por vezes estas ficavam em segundo plano.

Outro grande problema enfrentado por essas equipes de advogados consistia na dependência que tinham do governo, por serem remunerados pelo Estado. E, nas suas atividades políticas e de defesa dos interesses dos pobres, encontravam muitas dificuldades para receber o necessário apoio governamental, já que muitas de suas causas iam de encontro aos interesses do próprio governo. 26

21 SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma revolução democrática da justiça. São Paulo: Cortez, 2007. p. 31. 22 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998. p. 38.

23 DELGADO NETO, Adalberto. A incapacidade do estado brasileiro em proporcionar um pleno acesso à justiça. Fortaleza, CE, 2011. 67 f. TCC (Graduação em Direito) - Universidade Federal do Ceará. Faculdade de Direito. Fortaleza (CE), 2011. Disponível em: <http://www.repositoriobib.ufc.br/000009/00000933.pdf>. Acesso em: 29 fev. 2012. p. 24.

24 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant, op.cit., p. 39. 25 Ibidem. p. 40.

(21)

Percebendo as limitações dos sistemas judicare e dos "escritórios de vizinhança",

alguns países, como a Suécia, Austrália, Holanda e Grã-Bretanha implementaram o sistema

misto em que complementava esses dois sistemas anteriores de forma que somasse os seus

benefícios e reduzisse as suas limitações.27

Nesse sistema; “[...] os advogados particulares agiam em causas individuais e eram remunerados pelo Estado na medida em que conseguiam a pretensão judicial de seus

clientes, e o sistema de equipes de advogados pagos pelo Estado independentemente do

sucesso obtido em suas causas.”28

Dessa forma, existia a possibilidade de escolha entre os

advogados particulares, que atuavam predominantemente nas causas individuais, e os

escritórios de advocacia, mais atuantes nos problemas do grupo dos pobres.

É certo que essa primeira “onda” contribuiu para destruir barreiras que impediam

os excluídos de acessarem a justiça. Todavia, ainda existiam outras dificuldades que os

limitavam de acessá-la efetivamente, como o número insuficiente de advogados para a

demanda solicitada; a falta de comprometimento destes em proteger adequadamente os

interesses dessa classe decorrente da inferior remuneração paga pelo Estado para esse fim; e o

custo/benefício das pequenas causas individuais restringia o número de pessoas que se

arriscavam a buscar a proteção desses direitos.29

Em face da evolução da atuação dos “escritórios de vizinhança” na proteção

jurisdicional da classe dos pobres, ampliou-se a proteção de outros direitos, como dos

consumidores e do meio ambiente. Iniciava-se, assim, a segunda “onda” a qual se protegiam

os interesses difusos e coletivos.

2.3.2 A segunda onda: representação dos direitos difusos e dos coletivos

O segundo movimento adotado para se buscar um maior acesso à justiça foi o da

representação dos interesses difusos.

Nesse período, após a Segunda Guerra Mundial, buscou-se uma humanização do

direito, protegendo-se também os indivíduos como integrantes de um grupo. Determinava-se

uma proteção de uma nova classe de direitos, conhecidos como de terceira dimensão ou

Direitos Difusos e Coletivos ou de Solidariedade ou Fraternidade. Inclui-se, dentre esses

27 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998. p. 43 e 44.

(22)

direitos, os de proteção ao meio ambiente, aos consumidores e à criança e ao adolescente, etc.

Para que se pudesse proteger esses novos direitos deveria haver uma mudança no

instrumento utilizado para garanti-los, que se limitava à proteção dos direitos individuais.

Dever-se-ia revisar os institutos de processo civil tradicional. Adalberto Delgado Neto cita

alguns exemplos dos institutos que limitavam essa proteção, tais como “a citação de todos os

envolvidos na querela, a legitimidade das partes, a coisa julgada inter partes e a liquidação do

quantum devido”.30

A concepção tradicional do processo civil não deixava espaço para a proteção dos interesses difusos. O processo era visto apenas como um assunto entre duas partes, que se destinava à solução de uma controvérsia entre essas mesmas partes a respeito de seus próprios interesses individuais. Direitos que pertencessem a um grupo, ao público em geral ou a um segmento do público não se enquadrava bem nesse esquema. As regras determinantes da legitimidade, as normas de procedimento e a atuação do juízes não eram destinadas a facilitar as demandas por interesses difusos intentadas por particulares.31

São adotadas algumas ações para dar efetividade ao acesso à justiça no âmbito

coletivo. Uma delas é por meio de uma ação governamental, em que são criadas instituições

do governo e ampliadas as funções das já existentes com o objetivo de proteger os interesses

coletivos, como, por exemplo, através do Ministério Público.

Com isso, passa-se a dar mais efetividade ao acesso à justiça com a

implementação da defesa dos direitos difusos e coletivos.

2.3.3 A terceira onda: o acesso à justiça sob um novo enfoque

Esse terceiro movimento viria a aprimorar os outros dois, tratando-os como uma

das possibilidades para ampliar o acesso.

Nesse caso, houve reformas institucionais, com a criação de tribunais

especializados; procedimentais, adotando-se procedimentos específicos para determinados

direitos, como os juizados especiais; e a criação de meios alternativos de resolução de

conflitos; bem como o reconhecimento da jurisdição além da atividade estatal,32 surgindo

30 DELGADO NETO, Adalberto. A incapacidade do estado brasileiro em proporcionar um pleno acesso à justiça. Fortaleza, CE, 2011. 67 f. TCC (Graduação em Direito) - Universidade Federal do Ceará. Faculdade de Direito. Fortaleza (CE), 2011. Disponível em: <http://www.repositoriobib.ufc.br/000009/00000933.pdf>. Acesso em: 29 fev. 2012. p. 25.

31 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998, p. 49 e 50.

(23)

institutos como a arbitragem, mediação e a conciliação como mecanismos extrajudiciais de

resolução de conflitos, reconhecidamente acatados pelo Estado.

A criação de novos direitos por leis novas estava acontecendo, mas a concretização deles pela sociedade e, principalmente, pela grande camada mais desfavorecida, dificilmente acontecia. Passou-se a perceber, portanto, que o surgimento de maiores garantias estava acontecendo somente na teoria, de maneira que os belos avanços não saiam dos rebuscados termos legais.

Foi assim que emergiu a necessidade de criação de novos procedimentos judiciais capazes de facilitar o funcionamento do burocrático sistema judiciário e de derrubar as barreiras do acesso à justiça.33

Assim, esse novo enfoque de acesso à justiça fez com que se revisasse a

tradicional estrutura e funcionamento do aparelho judicial, bem como demonstrou a

possibilidade da resolução de conflitos além do aparelho estatal, tudo de forma a garantir

ainda mais o acesso à justiça.

Apesar dos avanços demonstrados, a justiça é conquistada no dia a dia e o seu

acesso deve ser constantemente aprimorado de forma que seja garantido a todos,

indistintamente, bem como de maneira mais célere e eficaz possível.

2.4 O acesso à justiça como um direito fundamental

Para que o acesso à justiça não fique apenas no plano teórico, os sistemas

jurídicos passaram a positivá-lo e instituíram meios para que esse direito fosse concretizado.

No sistema brasileiro, existem preceitos constitucionais que fundamentam a sua aplicação e

garantem a eficácia daquele.

Por estar inserido no Título “Dos Direitos e Garantias Fundamentais” e por

também servir como proteção a vários direitos fundamentais, o direito de acesso à justiça é

uma cláusula pétrea, nos termos do artigo 60, § 4º, inciso IV da CF/88, não podendo existir

emenda constitucional que o extinga ou o minore, podendo apenas ampliá-lo.34

Na Constituição Federal Brasileira vigente, em seu artigo 5º, inciso XXXV, o qual

está inserido no Título “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, há previsão da proteção

33 REBOUÇAS, Elaine Cristina do Rosário. O acesso à justiça e a Defensoria Pública da União no Ceará. 2013. 143 f. TCC (graduação) - Universidade Federal do Ceará. Faculdade de Direito, Fortaleza (CE), 2013. p. 23. 34 “O acesso à justiça encontra-se salvaguardado pela vedação do retrocesso, não podendo a sua natureza de direito social contribuir para negar-lhe concreção, mas sim ser motivo de sua progressiva implementação, sempre de acordo com o máximo das capacidades estatais e supranacionais, dada sua relação com a proteção dos

demais direitos.” PINTO, Ana Karoline dos Santos. O defensor público interamericano e a concretização do

(24)

desse direito. Assim dispõe: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou

ameaça a direito.”

Pela leitura do dispositivo, percebe-se que ele se restringe ao acesso ao Judiciário,

uma das facetas do acesso à justiça.35 Nele, está inserido o que a doutrina classificou como o

princípio da inafastabilidade do Judiciário, o qual toda e qualquer lesão ou ameaça a direito

poderá ser protegida jurisdicionalmente, seja decorrente do Poder Público, seja dos conflitos

privados.36

Esse princípio funciona tanto como um direito aos que necessitam do Judiciário

quanto um dever que vincula o Estado na prestação jurisdicional. No âmbito legislativo, o

legislador deverá criar leis que possibilitem um efetivo acesso ao judiciário, bem como

possibilite ao Judiciário uma prestação da tutela jurídica de forma célere e justa.37

O direito de acesso à justiça foi ampliado pela Constituição de 1988, de forma a abranger não apenas a via repressiva (“lesão”), mas também a via preventiva (“ameaça a direito”). [...] Não obstante o dispositivo constitucional se referir à lei, o princípio se dirige não apenas ao legislador, mas a todas as autoridades. Qualquer tipo de exigência que possa inviabilizar o acesso à justiça, direta ou indiretamente, caracteriza uma violação ao princípio.38

Outro dispositivo que contribui para o acesso à justiça é o previsto no inciso

LXXIV do mesmo artigo, nesses termos: “o Estado prestará assistência jurídica integral e

gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;”. Assim, ele assegura que o Estado

prestará a assistência jurídica aos que não podem arcar com os custos judiciais e com os

honorários advocatícios, permitindo que a justiça possa chegar a todos, nos âmbitos judiciais,

extrajudiciais, seja quanto aos aspectos consultivo, preventivo e/ou litigioso.

Obviamente, essa nova concepção alarga de maneira notável o âmbito da assistência, que passa a compreender, além da representação em juízo, além da defesa judicial, o aconselhamento, a consultoria, a informação jurídica e também a assistência aos

35 DELGADO NETO, Adalberto. A incapacidade do estado brasileiro em proporcionar um pleno acesso à justiça. Fortaleza, CE, 2011. 67 f. TCC (Graduação em Direito) - Universidade Federal do Ceará. Faculdade de Direito. Fortaleza (CE), 2011. Disponível em: <http://www.repositoriobib.ufc.br/000009/00000933.pdf>. Acesso em: 29 fev. 2012. p. 27.

36 MENDES, Gilmar Ferreira; MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 5ª.ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 492.

37 SOUZA, Denise Bispo de. O papel da defensoria pública na concretização do acesso à justiça. Fortaleza, CE, 2008. 82 f. TCC (graduação) - Universidade Federal do Ceará. Faculdade de Direito, Fortaleza (CE), 2008. Disponível em: <http://www.repositoriobib.ufc.br/000004/0000043F.pdf>. Acesso em: 13.08.13. p.28.

(25)

carentes em matéria de atos jurídicos extrajudiciais, como, por exemplo, os atos notariais.39

Pelo preceito, percebe-se que o Estado se obrigará a prestar assistência jurídica

integral e gratuita aos necessitados. “Aqui temos umas daquelas prestações positivas do

Estado, que há de traduzir-se em uma ação afirmativa, mediante políticas adequadas ao

cumprimento da imposição constitucional”.40 Em face da imposição estatal de prestar essa

assistência, mediante políticas e recursos públicos, defende-se que o acesso à justiça é um

direito de segunda dimensão.41 No mesmo sentido, Amanda Marques42 e Ana Karoline dos

Santos Pinto.43

Essa norma contribui de forma significativa para o acesso à justiça em face da

realidade brasileira, em que várias pessoas vivem com poucos recursos, não possuindo

condições para contratação de serviços advocatícios para proteção de seus direitos. Para que o

Estado brasileiro prestasse assistência jurídica a essa classe da população, criou-se uma

instituição com esse fim, qual seja, a Defensoria Pública, essencial para que esse grupo

também possa garantir esse direito fundamental.

39 BARROSO, Kátia da Silva Soares; LIMA, Lucienne Borin. Direito fundamental à Defensoria Pública. Revista Ciência Jurídica e Sociedade da Unipar. Umuarama. v. 10, n. 2, jul./dez. 2007, p. 391.

40 SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. 4ª. ed.. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 173. 41 SALES, José Rômulo Plácido. Acesso à justiça e Defensoria Pública no Brasil. In: Revista das Defensorias Públicas do Mercosul. DPU. Nº1. Brasília. 2010. p. 20.

42 BATISTA, Amanda Marques. A Defensoria Pública e o Acesso Coletivo à Justiça. 2008. Dissertação (Mestrado em Direito) - Universidade Católica de Pernambuco, Recife, 2008. Disponível em: <http://www.unicap.br/tede//tde_busca/arquivo.php?codArquivo=345>. Acesso em 20 ago. 2012 p. 41.

(26)

3. ASPECTOS DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO

O terceiro capítulo desse trabalho se refere à Defensoria Pública da União. Serão

demonstrados o processo da evolução da assistência judiciária brasileira, que favoreceu a

instituição desse órgão, as mudanças sofridas após a promulgação da Constituição Federal de

1988, bem como uma visão geral das características dele.

Objetiva-se, com isso, primeiramente, analisar a instituição para saber como a sua

atuação poderá ampliar o acesso à justiça no Brasil, com a posterior promulgação da Emenda

Constitucional nº 74/13, que lhe instituiu autonomia.

3.1 O processo histórico da assistência jurídica no Brasil e a instituição da Defensoria

Pública

A implementação da assistência jurídica no Brasil se deu de forma lenta e

gradativa, sofrendo variações conforme as posições políticas adotadas em nosso país.

Para Luciana Gross Siqueira Cunha, os modelos de assistência jurídica brasileiros

podem ser identificados em três fases: a primeira vai desde o seu início até a promulgação da

Lei nº 1.060/50; a segunda vai da década de 1950 até a promulgação da Constituição Federal

de 1988; a terceira, refere-se às posteriores mudanças nessa Carta.44

Segundo a autora, a assistência jurídica iniciou em nosso país a partir das

Ordenações Filipinas, com a Lei de 20.10.1823, que determinava o patrocínio gratuito pelos

advogados particulares às causas cíveis e criminais dos miseráveis e dos indefesos em juízo.45

Outra fonte legal que contribuiu ao acesso à justiça brasileiro foi o Decreto nº

2.457, de 08 de fevereiro de 1897, que estabelecia regras para a prestação dos serviços de

assistência judiciária para o Distrito Federal, na época, o Rio de Janeiro. Apesar de incipiente,

foi fundamental para o desenvolvimento de conceitos do acesso à justiça aos necessitados.46

Um dos conceitos trazidos por essa norma foi a de pobre, muito parecida com a

adotada atualmente pela Lei nº 1.060/50, para efeito de receber a prestação judiciária, que

44 CUNHA, Luciana Gross Siqueira. Acesso à justiça e assistência jurídica em São Paulo. In: Acesso à justiça. (Org. Maria Tereza Sadek) São Paulo: Konrad-Adenauer-Stiftung, 2001. p. 156.

45 No Livro III, Título 84, § 10 dessa lei já havia afirmação de pobreza, verbis: "§ 10 – Em sendo o agravante tão pobre que jure não ter bens móveis, nem de rais, nem por onde pague o aggravo, e dizendo na audiência uma vez o Pater Noster pela alma Del Rey Don Diniz, ser-lhe-á havido, como se pagasse os novecentos réis, contanto que tire de tudo certidão dentro do tempo, em que havia de pagar o aggravo".

(27)

consistia naquele que receberia todos os serviços judiciários necessários, independentemente

do pagamento de quaisquer taxas ou custas. Estabelecia seu artigo 2º:

Considera-se pobre, para os fins desta instituição, toda pessoa que, tendo direitos a fazer valer em Juizo, estiver impossibilitada de pagar ou adeantar as custas e despezas do processo sem privar-se de recursos pecuniarios indispensaveis para as necessidades ordinarias da propria manutenção ou da familia.

Esse serviço era prestado por advogados particulares, os quais eram indicados por

uma comissão estatal para esse fim. Não recebiam qualquer contraprestação do Estado nem da

pessoa a quem assistia, mas apenas a remuneração proveniente de eventual condenação do

adversário ao pagamento de honorários. Caso se recusassem a prestar essa obrigação imposta,

poderia implicar no pagamento de multa e na suspensão do exercício da profissão.

Pra Chiaretti, esta norma formatou algumas características da assistência

judiciária brasileira, que permanecem em nosso ordenamento, dentre as quais estão:

i) possibilidade de concessão do benefício indistintamente a autor e réu em processo civis e criminais; ii) adoção de um critério relativo para aferição de hipossuficiência; iii) garantia da gratuidade de praticamente todos os custos processuais; i) garantia da assistência por um advogado.47

Outra fonte que pode ser destacada é o Decreto nº 17.231-A de 1926, que

estruturou a advocacia de ofício na Justiça Militar, a qual influenciou na criação da

Defensoria Pública da União. Assim, existia um advogado, pertencente ao quadro da Justiça

Militar, que agia na defesa daqueles que fossem acusados, a não ser quando revéis, e não

tivessem representação processual (artigo 209). Esse modelo era diferente da do adotado pelo

Decreto nº 2.457/1897, pois esse profissional era vinculado e remunerado pelo Estado, bem

como atuava apenas no âmbito Militar.48

Após a criação da Ordem dos Advogados do Brasil, em 1930, a assistência

47 CHIARETTI, Daniel. Breve histórico do desenvolvimento institucional da assistência jurídica no Brasil. In: Boletim da Reunião das Instituições Públicas das Assistência Jurídica dos Países de Língua Portuguesa/ DPU nº 1. 2012. p. 13.

48 Jurandy Porto Rosa, primeiro Defensor Geral da DPU, atuou como advogado de ofício na Justiça Militar, relata, em entrevista dada ao Projeto Memória da Defensoria Pública da União no Ceará, o nascimento dessa instituição nesses termos: “Antes da Constituição de 88, no âmbito da União, só quem tinha um quadro de defensores, na época, chamados de advogados de ofício, era a Justiça Militar, incrivelmente. Desde muito tempo, há quase 100 anos, tinha um quadro para defender as praças, quer dizer, soldado, cabo, sargento, para os processos nitidamente militares e de crimes militares. Então essas praças precisavam de defesa perante os Conselhos da Justiça Militar. Por isso, a Justiça Federal Militar tinha um quadro de defensores. Esse quadro foi o embrião da Defensoria Pública da União. Esse quadro foi absorvido e foram os primeiros defensores públicos da

União aqueles regressos do quadro de advogados de ofício da Justiça Militar.” REBOUÇAS, Elaine Cristina do

(28)

judiciária passou a ser gerenciada por essa instituição, mas continuavam as mesmas regras

adotadas nas normas anteriores.

Somente após a promulgação da Constituição de 1934 houve mudança no cenário

do acesso à justiça no Brasil. Nessa Lei Maior, a assistência judiciária passava a ser

considerado um direito fundamental e deveria ser garantida pela União e pelos Estados

através de órgãos especiais (art. 113, nº32).

Essa norma constitucional obrigou os estados a também prestarem assistência

judiciária. Um exemplo é o do estado de São Paulo que instituiu, pela Lei Estadual nº

2.497/1935, o Consultório Jurídico do Estado, o qual tinha pessoal próprio e deveria prestar

assistência jurídica a todos que necessitassem da sua proteção, salvo os trabalhadores que

eram protegidos pelo Departamento Estadual do Trabalho, tais como os menores, a família, os

desvalidos, os egressos de reformatórios e de estabelecimentos penais. A realização de seus

serviços era isento do pagamento de custas, taxas e emolumentos dos atos processuais, bem

como a assistência judiciária. Essa instituição se tornou a Procuradoria da Assistência

Judiciária (PAJ), em 1947, que depois se desmembrou da Procuradoria do Estado e surgiu a

Defensoria Pública do Estado de São Paulo, em 2006.49

Já com a outorga da Constituição de 1937, a mesma não se referiu sobre o tema da

assistência judiciária nem da necessidade da criação de um órgão especial para realizá-la,

perdendo, assim, o caráter constitucional, que só retornaria na Constituição de 1946. A

omissão, que aparentemente demonstrou um retrocesso, facilitou a consolidação da autonomia

dos Estados em prestar a assistência judiciária, que continuava sendo exercida.

Posteriormente, foi promulgada a Lei nº 1.060/50, ainda em vigor, a qual

uniformizou a prestação da assistência judiciária em todo território nacional, mas ainda sem

determinar a criação de um órgão específico para esse fim. Assim, os estados passaram a se

organizar de forma não homogênea.

Exemplifica-se com o Rio de Janeiro cujo modelo de assistência influenciou o

adotado pela Defensoria Pública. Nesse caso, foram criados os primeiros cargos de defensores

públicos no Estado, os quais eram providos por indicação do Poder Executivo. Como ainda

não havia um órgão específico que prestasse essa função, os defensores foram vinculados às

Procuradorias de Justiça.50

Já no estado de São Paulo, optou-se pela prestação da assistência jurídica através

49 CHIARETTI, Daniel. Breve histórico do desenvolvimento institucional da assistência jurídica no Brasil. In: Boletim da Reunião das Instituições Públicas da Assistência Jurídica dos Países de Língua Portuguesa/ DPU nº 1. 2012. p. 15 e16.

(29)

das Procuradorias dos Estados, os quais designavam os advogados públicos para assistirem os

necessitados.51

O próprio Ministério Público passou a atuar subsidiariamente na assistência dos

necessitados nos estados onde não existisse órgão atuando nessa função, após a vigência da

Lei Federal nº 40/81. Tal função não é mais prevista após a implementação da Lei Orgânica

do Ministério Público.52

Toda essa evolução do ordenamento jurídico brasileiro para garantir o acesso à

justiça ocorreu sob a influência das “ondas renovatórias” explicitadas por Cappelletti e Garth.

Já era evidente que esse acesso não se restringia apenas ao Judiciário, mas também a uma

ordem jurídica justa e célere capaz de resolver os conflitos de seus jurisdicionados

independentemente de terem condições financeiras de arcar com os custos exigidos.

Em 1988, foi promulgada a vigente “Constituição Cidadã”, que ampliou o acesso à justiça, de forma integral e gratuita, instituindo direitos e garantias aos cidadãos, passando o

Estado a ter o dever de também informá-los e orientá-los, bem como ampliar os

procedimentos extrajudiciais de resolução de conflitos.53

Uma mudança fundamental foi a garantia, em âmbito constitucional, de instituição

de um órgão específico para a prestação da assistência jurídica aos necessitados. Previa-se, a

partir daí, a criação da Defensoria Pública. Dispõe, nesses temos, o artigo 134 da Constituição

Federal: “A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado,

incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na

forma do art. 5º, LXXIV”.

A prestação estatal da assistência judicial integral e gratuita prometida pelo Estado brasileiro é atribuição da Defensoria Pública, tal como previsto na Constituição da República em seu artigo 134, dentre aquelas essenciais à função jurisdicional do

Estado. Nesse sentido, merece destaque o título do capítulo IV da Lei Maior: “Das

funções essenciais à Justiça”, dentro do qual estão inseridos, além da Defensoria Pública, o Ministério Público e a Advocacia Pública, de onde se conclui que detêm o mesmo peso que o Poder Judiciário no que diz respeito à atividade jurisdicional (diferenciada da administrativa e da legislativa), […].54

Apesar da constitucionalização da instituição desse órgão, o modelo da Defensoria

Pública como instrumento de acesso à justiça não foi uma opção inovadora visto que já existia

51 CUNHA, Luciana Gross Siqueira. Acesso à justiça e assistência jurídica em São Paulo. In: Acesso à justiça. (Org. Maria Tereza Sadek) São Paulo: Konrad-Adenauer-Stiftung, 2001. p. 158.

52 Ibidem, p. 158. 53 Ibidem, p. 158 e 159.

(30)

em alguns estados, como o de São Paulo, mesmo que de forma não uniforme, em que a

prestação de assistência jurídica era realizada por órgãos análogos.55 Todavia, dava maior

segurança aos hipossuficientes econômicos cobrarem seu direito fundamental de acesso à

justiça, além da criação de um órgão específico para esse fim.56

Embora essa previsão constitucional seja do ano de 1988, a Defensoria Pública da

União foi criada e organizada apenas quando promulgada a Lei Complementar nº 80, de 12 de

janeiro de 1994,57 mas implementada, de forma provisória e emergencial, em 1995, com a Lei

nº 9.020, 30 de março desse ano.

A instituição das Defensorias foi bastante benéfica para ampliação do acesso à

justiça brasileiro, enumerando, Boaventura de Sousa Santos, as seguintes vantagens:

[...] universalização do acesso através da assistência prestada por profissionais formados e recrutados especialmente para esse fim; assistência jurídica especializada para a defesa dos interesses coletivos e difusos; diversificação do atendimento e da consulta jurídica para além da resolução judicial dos litígios, através da conciliação e da resolução extrajudicial dos conflitos e, ainda, atuação na educação dos direitos.58

Posteriormente, em 2004, houve a reforma do Judiciário, implementada

especialmente pela Emenda Constitucional nº 45, tendo como uma das mudanças a

reestruturação da Defensoria Pública. Com esta Emenda foi inserido o § 2º ao artigo 134 da

Constituição Federal em que foi assegurado às Defensorias Públicas Estaduais a “autonomia

funcional e administrativa e a iniciativa de sua proposta orçamentária dentro dos limites

estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias e subordinação ao disposto no art. 99, § 2º”.

A medida foi muito importante para a liberdade de atuação desses órgãos

55 CHIARETTI, Daniel. Breve histórico do desenvolvimento institucional da assistência jurídica no Brasil. In: Boletim da Reunião das Instituições Públicas das Assistência Jurídica dos Países de Língua Portuguesa/ DPU nº 1. 2012. p. 21.

56 Além disso, cabe ressaltar que o sistema judicare (advocacia dativa) ainda é utilizado pelo Brasil, de modo que é adotado um sistema misto de assistência jurídica no país, utilizando-se, predominantemente, o da Defensoria Pública ou staff model. COGOY, Daniel Mourgues. Assistência jurídica e judiciária no Brasil: legitimação, eficácia e desafios do modelo brasileiro In: Revista da Defensoria Pública da União. DPU nº 5. Brasília. 2012. P. 161.

57 “Os advogados de ofício, a partir da Lei complementar 80 de 1994 puderam optar em permanecer como advogado de ofício, vinculado ao STM - Superior Tribunal Militar, ou então, optarem pela carreira da Defensoria Pública da União, com a transformação dos cargos, tudo de acordo com o artigo 138 da L.C. 80/94, passando a denominar-se Defensores Públicos da União, tendo como chefe da instituição o Defensor Geral da Defensoria Pública da União. Somente a partir de então a autonomia funcional e processual estava garantida.” OLIVEIRA, Liliane Maria Mendes de. A evolução da Defensoria Pública no Brasil: suas atribuições e a defesa do hipossuficiente. 2011. 52 f. TCC (graduação). Escola Superior de Guerra (ESG). Rio de Janeiro (RJ). p. 41. Dispõe o artigo 138 da Lei Complementar nº 80/94: “Os atuais cargos de Advogado de Ofício e de Advogado de Ofício Substituto da Justiça Militar e de Advogado de Ofício da Procuradoria Especial da Marinha, cujos ocupantes tenham sido aprovados em concurso público de provas ou de provas e títulos e optem pela carreira,

são transformados em cargos de Defensor Público da União.”

(31)

estaduais, permitindo uma atuação mais livre do Poder Executivo a qual estava vinculado e

que, muitas vezes, litigava contra,59 mesmo que tal autonomia não tenha sido estendida à

Defensoria Pública da União.

Após a aprovação dessa Emenda outras inovações legislativas foram

implementadas ao nosso ordenamento com a finalidade de fortalecer a atuação dessa

instituição, tais como a possibilidade de impetração de ações coletivas, através da Lei nº

11.448/2007, e as alterações à Lei Complementar nº 80/94 pela Lei Complementar nº

132/2009, dentre as quais são destacadas:

i) o reconhecimento explícito da possibilidade de atuação nas esferas extrajudicial e coletiva; ii) ênfase na mediação, conciliação e arbitragem, possibilitando a solução de conflitos fora do Poder Judiciário; iii) exercício da defesa de grupos sociais vulneráveis, extrapolando o caráter meramente econômico do conceito de hipossuficiência; iv) prestação de atendimento interdisciplinar; v) possibilidade de representação a organismos internacionais de proteção dos direitos humanos; vi) atuação junto ao sistema prisional (o que foi reforçado pela Lei nº 12.313/10).60

Por fim, foi aprovada a Emenda Constitucional nº 74, de agosto de 2013, em que

foi estendida a autonomia, antes concedida às Defensorias Públicas dos Estados, para a

Defensoria Pública da União, acabando com a anomalia existente na instituição e ampliando o

acesso à justiça no âmbito da justiça onde essa atua.

3.2 Defensoria Pública da União

A Defensoria Pública da União foi instituída apenas na Constituição Federal de

1988, no seu artigo 134, prevendo o §1º desse artigo que “Lei complementar organizará a

Defensoria Pública da União e do Distrito Federal e dos Territórios e prescreverá normas

gerais para sua organização nos Estados, [...]”.

Assim, a sua criação e organização ocorreu apenas quando promulgada a Lei

Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994. Mas a sua real implementação ocorreu apenas

em 1995, de forma provisória e emergencial, com a Lei nº 9.020, de 30 de março desse ano.61

Dessa forma, foi instituída como função essencial da justiça, juntamente com o

59 Não será abordado o tema da autonomia das Defensorias Públicas nesse momento pois será detalhado em capítulo próprio.

60 CHIARETTI, Daniel. Breve histórico do desenvolvimento institucional da assistência jurídica no Brasil. In: Boletim da Reunião das Instituições Públicas das Assistência Jurídica dos Países de Língua Portuguesa/ DPU nº 1. 2012. p. 24.

(32)

Ministério Público e a Advocacia Pública e Privada.

Ao estabelecer a existência de três instituições públicas distintas essenciais à função jurisdicional do Estado – quais sejam, o Ministério Público, a Advocacia Pública e a Defensoria Pública, - o legislador constituinte delimitou a área de atuação de cada uma delas. A mera leitura dos dispositivos constitucionais já externa a inexistência de qualquer diferenciação hierárquica entre as citadas instituições; a distinção reside apenas no enfoque atribuído pelo constituinte à atuação de cada uma delas.

Em assim, sendo temos na autuação do Ministério Público um enfoque voltado aos interesses da sociedade, impondo-se ao Parquet o dever de zelar pelos interesses difusos na defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127); quando se fala da Advocacia Pública, há predominância do interesse estatal, mediante a representação da União, judicial e extrajudicialmente, em prol dos interesses dos poderes constituídos (CF, art. 131); no tocante à Defensoria Pública, por sua vez observa-se um enfoque voltado para a defesa do cidadão necessitado (CF, art. 134).62

Em função do sistema federativo, da mesma forma como ocorre com o Ministério

Público, a atuação é dividida entre a Defensoria Pública da União e as Defensorias Públicas

Estaduais. Aquela atua na Justiça Federal, na do Trabalho, na Justiça Militar da União, na

Justiça Eleitoral, além de atuar no Tribunal Marítimo63; enquanto esta tem atribuição nas

causas da Justiça Estadual.64

Dessa forma, cabe à Defensoria Pública garantir o acesso à justiça aos

economicamente desfavorecidos, de modo a concretizar a igualdade material estabelecida na

Constituição, função democratizadora reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal.65

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63 “Habitualmente, a Defensoria atua em casos previdenciários, como na obtenção de benefícios previdenciários denegados pelo Instituto Nacional do Seguro Nacional (INSS); em casos cíveis, como no saque de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e financiamento do Sistema Financeiro da Habitação (SFH). Além disso, pode atuar na obtenção de serviços de saúde e de medicação, essenciais à sobrevivência do cidadão. A Defensoria Pública União não atua somente na defesa de casos individuais: atua também na tutela coletiva, visando a garantia de implementação de políticas públicas do interesse do cidadão carente, como combate à

dengue, bem como a consecução de medidas de melhoria de bem-estar social.” SANTOS, Denise Tanaca dos. A

Defensoria Pública da União e o incremento às políticas públicas afirmativas de cidadania. In: Revista das Defensorias Públicas do Mercosul. DPU. Nº1. Brasília. 2010. p. 30.

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Referências

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