A
zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAfim de melhor
com-preender o real O objetivo da teoria crítica radical é empreender uma incursão pelo
campo doFEDCBAt r a b a lh o a b s t r a t o para analisar o sentido de sua condição significado das trans- enquanto determinante e constituinte das demais relações sociais da
formações que vêm modernidade. Tal crítica permite retomar uma discussão política
im-portante, quanto ao caráter do t r a b a lh o considerado por muitos como
ocorrendo, ao longo das princípio educativo e emancipatório. O argumento desenvolvido neste
três últimas décadas, no artigo conduz a uma posição oposta. A dialética imanente ao trabalho
que produz o c a p it a l, sugere a possibilidade objetiva e subjetiva de "mundo do trabalho" é uma lorma superior de "Iazer" relações sociais, não mais
necessário reafirmar o heteronomicamente determinada. No lugar da razão abstrata, inerente
ao v a lo r ,a razão sensível, para que seja possível organizar um debate
caráter historicamente lundamentado em experiências práticas, a lim de vislumbrar quão
destrutivo é o movimento tautológico do d in h e ir o . A razão sensível
definido e elaborar uma requer um movimento de ruptura que se ponha numa metaperspectiva
crítica radical ao traba- aoc a p it a l e que contribua para reagregar todas as lutas delensivistas imanentes ao sistema, até então desencadeadas pelos movimentos so-lho ' que é inerente à ciais. A "destruição" do v a lo r é o real objetivo da crítica radical para reprodução socioeconô- que seja possível pensar a emancipação dot r a b a lh o nesta sociedade.
mica do capital. O pon-
ABSTRACT-to de partida refere-se à The aim 01 the critical radical theory is to undertake an incursion into assertiva de que oihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAc a p i- the lield 01a b s t r a c t la b o r to analyze the sense 01 its condition, while
ta l deve ser tratado em decisive and constituent 01ali other social relation~hips in the modernity. Such a crttíque permlts to retake anírnportant pofltlcal dlscussion related termos de um metabo- to the character 01la b o r ,considered by many as an educational and the . _ . lundamental emancipatory principie. The argument developed in this lismo de reproduçao his- article leads to an opposite position. The immanent dialectics to that toricamente específico labor which produces c a p it a l suggests the objective and subjective ,. possibility 01 a superior mode to the "making" 01 social relationships, no qual a forma básica no longer heteronomously determined. Instead 01a b s t r a c t r e a s o n ,
de interdependência so- inherent to v a lu e , the s e n s it iv e r e a s o n is proposed to make possible . to organize a debate based upon practical experiences, in order to grasp cial apresenta-se com how destructive the tautological movement 01m o n e y is. S e n s it iv e
um caráter abstrato im- r e a s o n requires a global process 01 rupture with the existing order that , puts itsell b e y o n d c a p it a l and that contributes to rearticulate ali the
pessoal e quase objeti- delensive and immanent struggles within the s y s t e m o f c a p it a l, that balhadora, o portador
vo (Postone 1996: 3-5). ~as been developed by s~cial movements. The "destruction" 01v a lu e coletivo da mercadoria
, IS the real goal 01 the radical critlcal theory In order to show that It IS
Nesse sentido, a dinâmi- possible to think 01e m a n c ip a t io n o f la b o r b e y o n d the capitalist society. f o r ç a - d e - t r a b a l h o , a p a
-ca históri-ca do desenvol- * O autor agradeceaos colegas, Prolessor Marcelo Marques, do CEFET-CE,e r e c e como "oposto
vimento do c a p ita l na Ramon da Ponte, Mestrando do Programa de Pós-Graduação em se- antagônico" da classe
d d I ciologiaiUFC, pelas críticas e sugestões, e pela cumplicidade no
gru-socie a e capita ista, po de estudo interessado em aprolundar a Teoria Crítica Radical. capitalista e, em virtude
principalmente a partir ** Prolessor do Departamento de Teoria Econômica-UFC e Doutorando dessa condição, como o
do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade
Fe-de sua forma industrial deral do Ceará. Membro do Núcleo Interdepartamental de Estudos, sujeito da emancipação
de produção, consolida Pesquisa e Extensão na Área do Trabalho-UNITRABALHO/UFC. humana. Essas são
ques-uma estrutura de domi- tões que, na atualidade,
nação social, historicamente determinada, que estão a merecer uma crítica categorial profunda.
se constitui a partir do tr a b a lh o . Pode-se dizer A crítica categorial ao tr a b a lh o , ao
assu-que se trata da forma de dominação mais pérfi- mir um caráter radical, toma um sentido
peda-RESUMO
da da história, a qual se
dissemina através de
uma coerção silenciosa
e de uma d ivis ã o s o c ia l
d o tr a b a lh o que opõe os
seres humanos nos mais
diversos níveis da hierar-TSRQPONMLKJIHGFEDCBA
A D IA lÉ T IC A
D O " F IM "
D O T R A B A lH O *
In tr o d u ç ã o MCIO ALVES DE OLIVEIRA* *
quia socioeconômica
inerente ao modo de
produzir do capital. O
que é identificado
en-quanto dominação de
pessoas sobre pessoas,
ou de classe sobre
clas-se, é apenas o la d o
a p a r e n c ia l inerente ao
caráter abstrato da
domi-nação social do c a p ita l.
Assim, a
explora-ção econômica
caracte-rística do modo de
produção capitalista
a p a r e c e como fruto da
vontade subjetiva do
"explorador". Do
mes-mo mes-modo, a classe
D O S S I ÊzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
gógíco importante, uma vez que apontaihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAp a r a
a l é m d o c a p i t a l , de sua ainda dominante,
apa-rentemente eterna, rede de mediações de
se-unda ordem (Mészáros, 1995: 108-110). O
pressuposto que orienta o sentido indicado se
prende à necessidade humana de que a vida em
sociedade deixe de ser a conseqüência de umsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
"comp l exo de múltiplas determinações"
e tabelecidas de modo heteronômico, fruto de
decisões enquadradas pela lógica da anarquia
da produção, e que produz sofrimentos
evitá-· eis, para se tornar o resultado de uma
alterna-tiva social, conscientemente formulada (Kurz,
999: 210-211). Por esse motivo, para ser
radi-I, a crítica não pode ficar restrita a aspectos
istributivos, mas, fundamentalmente, situar-se
no modo de produzir a riqueza sob o comando
o c a p i t a l para incluir, de maneira consistente,
crítica ao modo de distribuição, seja este
atra-· és do mercado ou politicamente determinado
planejamento estatal). Portanto, a crítica ao t r a
-. a l h o deverá corresponder a uma ruptura
tegorial necessária para desfetichizar a forma
..•e dominação abstrata dele emanada. o lugar
s relações sociais que antes existiam entre
produtores independentes, edificou-se o domínio
ca lógica da valorização do c a p i t a l que passa a
bmeter todos, capitalistas e trabalhadores,
atra-'és da fria e mecânica relação social mediada
pelo d i n h e i r o . Segundo Marx (1985a: 28), "EI
pital es Ia potencia económica, que 10domina
.odo, de Ia sociedad burguesa." Com a
socie-:;ade capitalista, tal lógica inerente à esfera
eco-ômica, tende a permear as demais esferas e ser
expressão - mesmo quando dissimulada - da
iabilidade fetichista sob o domínio do c a p i t a l .
A crítica aqui ensaiada tem por base as
categorías marxianas fundamentais que se
des-obram desde a esfera da moderna produção
.e mercadorias. Como se trata da relação social
e produção das condições materiais que
carac-zeriza esta sociedade, a análise do v a l o r , além
e possibilitar a ampliação da compreensão do
desenvolvímento capitalista permite situar,
his-zoricamente, o processo de constituição de suas
estruturas fundamentais e das práticas sociais,
ao longo desse mesmo desenvolvimento. A
forma aparencial inerente ao funcionamento
des-sas estruturas sociais se projeta sobre as ações e
sobre o modo de pensar cotidianos, como se
fossem dadas e quase imutáveis, o que leva os
indivíduos a reconstituírem, com suas açôes,
mes-mo sem perceberem, essas estruturas alienadas.
Assim, as relações sociais na sociedade
capitalista são constituídas de modo alienado, a
partir do t r a b a l h o , o qual submete e transforma
as formas sociais anteriores. As pessoas, no
ca-pitalismo, constituem suas relações sociais e sua
história através do t r a b a l h o a b s t r a t o , que se
desdobram em práticas concretas alienadas. Ao
mesmo tempo, o modo de constituição
media-do pelo t r a b a l h o implica o estabelecimento de
um contexto social que se caracteriza por um
crescente distanciamento entre indivíduo e
so-ciedade à medida que se dissemina a
forma-mercadoria. Diante disso, a compreensão
relacionada ao modo como no capitalismo as
formas sociais anteriores são subsumidas e
trans-formadas sugere a possibilidade objetiva
e
sub-jetiva de uma forma superior de "fazer" relações
sociais, não mais determinadas
automaticamen-te como aquelas constituídas pelo t r a b a l h o .
Evidentemente, a relação di ai ética entre
estrutu-ras e práticas (ações) sociais se refere às
dimen-sões objetiva e subjetiva inerentes à produção
do v a l o r .
Na atualidade do desenvolvimento do c a
-p i t a l é crucial que a categoria t r a b a l h o seja
confrontada com seu oposto, com uma
"anticategoria" que possa dar conta de um
movimento de ruptura (categorial) e de
ressolidarização em um nível mais elevado e de
máxima abrangência. No lugar da razão
abstra-ta, inerente ao valor, a razão sensível, para que
seja possível organizar um debate
fundamenta-do em experiências práticas, a fim de
vislum-brar quão destrutivo é o movimento tautológico
do d i n h e i r o (Kurz, 1999: 216-219). Ademais, a
razão sensível requer um movimento de ruptura
que se ponha numa meta perspectiva ao c a p i t a l
que contribua para reagregarihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAto d a s a s lu ta s d e je n s ivis ta s im a n e n te s a o s is te m a , até então
desencadeadas pelos movimentos sociais,
den-tro de uma estratégia de negação dialética das
categorias dominantes voltada para a
"destrui-ção" do va lo r . Esse, o real objetivo da crítica
radical para que seja possível pensar a
emanci-pação do tr a b a lh o nesta sociedade. Trata-se de
uma ruptura que tem por ponto de partida a
recusa e o nojo diante das mediações sociais e
da existência determinadas pelo tr a b a lh o ?
A atividade humana orientada para a
cria-ção do va lo r importa apenas na medida em que
põe uma diferença quantitativa entre os valores
envolvidos no processo de troca inerente à
contraposição orgânica entre c a p ita l e tr a b a lh o .
O trabalhador interessa pelo fato de que é
por-tador material do tr a b a lh o , não importando sua
condição de ser humano ou o caráter
determi-nado da substância que transporta consigo.
Mesmo assim, se estabelece uma oposição de
interesses. Contudo, embora não seja percebida de imediato, trata-se de uma oposição de
pode-res diferenciados que permanece restrita à
dinâ-mica da valorização do c a p ita l. As lutas
desencadeadas durante o século XIX e em
gran-de parte do século XX, objetivando a redução
da jornada, m a io r e s s a lá r io s , melhores
condi-ções de tr a b a lh o , direitos sociais; e, na
atualida-de, as lutas pela p e r m a n ê n c ia n o e m p r e g o c o m s a lá r io s r e d u zid o s e por uma política pública
de ocupação e renda; todas guardam em
co-mum a manutenção dos pressupostos que
fun-damentam o tr a b a lh o nesta sociedade. Por esse
caminho, c a p ita l e tr a b a lh o transformaram-se,
historicamente, nos lados de uma mesma
"moe-da". Esta "moeda" não é outra coisa senão a
expressão da contraposição entre tr a b a lh o
exis-tente no espaço ( tr a b a lh o "morto") e tr a b a lh o
que toma existência no tempo ( tr a b a lh o "vivo"),
ambos compondo um todo orgânico necessário
à produção do va lo r ( e da m a is - va lia ) .
No embate que se estabelece entre as clas-ses, o interesse de uns poucos é transformar o
vir - a - s e r no s e r ,3 o interesse de muitos outros se
80srqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAREVISTA DE CIÊNCIAS SOCIAIS v.34 N. 1
torna produzir o vir - a - s e r como garantia de
recompra de sua mercadoria. A manutenção dos
pressupostos do tr a b a lh o fica mais patente
quan-do se constata um outro embate no interior da classe trabalhadora. Nesse sentido, é de se
espe-rar que qualquer categoria de trabalhadores
(so-bremaneira em circunstâncias de "horror
econômico"), defenda ardorosamente programas
e políticas que mantenham em pleno
funciona-mento as atividades às quais se encontra
vincula-da, independentemente dos efeitos (deletérios)
que se projetem sobre os demais despossuídos de meios de produção, e sobre o ambiente.
Man-ter-se organicamente vinculada a determinado
c a p ita l é a concretização da recompra da merca-doriaFEDCBAf o r ç a - d e - t r a b a l h o , da identificação de
clas-se e do "passaporte" socialmente venerado para obter condições materiais de vida nesta socieda-de. Esse é o caminho para que se afirme a inclu-são-cidadã característica da sociedade burguesa.
Desse modo, pode-se dizer, tem-se uma
c la s s e q u e vive p a r a o tr a b a lh o - aqueles que
sacrificam a própria vida em benefício do c a p
i-ta l - e a outra que vive d o tr a b a lh o a lh e io
-aqueles que são os beneficiários deste
sacrifí-cio. Ambas compõem, funcional e
organicamen-te, o processo de produção do va lo r . Assim, a
"identificação" entre capitalistas e trabalhadores
se efetiva em virtude mesmo da d o m in a ç ã o s o
-c ia l a b s tr a ta que envolve a sociedade capitalista. A crítica radical é crucial para o
entendi-mento das mudanças em processo no atual
momento de reestruturação do c a p ita l. Antes de
tudo, as mudanças correspondem a uma maior
sofisticação na aplicação de antigas normas de
funcionamento da economia capitalista em sua
incessante busca de maximização da
explora-ção econômica do tr a b a lh o . Para tanto, podem
ser combinadas formas de intensificação e de
extensão da jornada do tr a b a lh o e de
relaxa-mento de direitos dos trabalhadores, mais ainda
num contexto de pressões por
desregula-mentações generalizadas no âmbito da
circula-ção de mercadorias e do c a p ita l, este em suas
diversas modalidades. São mudanças que se
D O S S I ÊzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
concretizam através da disseminação e
utiliza-ção de "novos conceitos de produção", tais
como, "qualidade total", "reengenharia",
"pro-dução enxuta"ihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAC j o be n r ic b m e n t, j o b e n la r g e m e n t,
l e a n p r o d u c tio n ,FEDCBAj u s t i n t i m e ) , e tantos outros,
30 lado da adoção de diversas modalidades de
subcontratação. As inovações em andamento são
arte da "contradição em processo", as quais,
30 lado da "financeirização da economia", ou
da emergência de um r e g i m e d e a c u m u l a ç ã o
n u r i d i a l p r e d o m i n a n t e m e n t e fi n a n c e i r o "
Chesnais, 1999: 258-260), compõem o quadro
crise estrutural do c a p i t a l como se apresenta
na atualidade. A eliminação de postos de
traba-o e traba-o desmtraba-onte dos direitos e conquistas
indi-iduais e sociais dos trabalhadores são
manifestações dessa crise e conformam o
cená-no de "horror econômico" com o qual a
huma-idade vem se deparando, principalmente desde
duas últimas décadas do séculosrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAXX.
Diante de tal quadro, é crucial elaborar
ma pauta que inclua a discussão de uma crítica
_ cial radical, expressamente formulada, tendo
m vista provocar um debate teórico-político,
r-ara que e possa pensar um processo
pedagó-_ICO no qual sejam explicitadas práticas sociais
ue se contraponham ao t r a b a l h o . Como se sabe,
°"Xio sistema de reprodução social tem seus
li-ites intrínsecos ou absolutos que não podem
r ultrapassados enquanto não for
experimen-. do um outro modo de reprodução social. Esse
reconhecimento terá que ser avançado com o
.rercício de uma crítica emancipatória,
radical-ente transformadora, mesmo se tendo
consci-ê ncia das "insuperáveis" complexidades
xi tentes na atualidade."
u n d a m e n to s d a c rític a ra d ic a l a o tra b a lh o a s o c ie d a d e p ro d u to ra d o c a p ita l
o
c a p i t a l é um metabolismo dereprodu-- o historicamente específico no qual a forma
: ica de interdependência social apresenta-se
om um caráter impessoal e quase objetívo.?
- u desenvolvimento aprofunda-se p a r i p a s s u
com a dinâmica histórica da sociedade
capitalis-ta e, a partir da forma industrial de produção,
inicia o processo de dominação ab trata que se
constitui a partir do t r a b a l h o . As implicações da
dinâmica de seu desenvolvimento e de seu
pro-cesso de reprodução permitem identificar a
contradição básica que lhe é imanente e,
conse-qüentemente, a natureza da crítica social que se
faz necessária.
As relações sociais específicas da
socieda-de capitalista, por seu lado, são constituídas a
partir de determinadas práticas e estruturas que
assumem o lugar das pessoas, ou mesmo das
classes sociais, engajadas nestas mesmas
práti-cas. Tais práticas e interdependência compõem
a forma de mediação social específica referida
ao t r a b a l h o nesta sociedade. Evidentemente que,
em tal contexto, o significado de t r a b a l h o não
corresponde a "mediações de primeira ordem"
(Mészáros, 1995: 138-141), estas entendidas em
seu aspecto geral, inerente à interação entre o
homem e a natureza para criar produtos que
deverão satisfazer necessidades humanas de
várias ordens.f
A ampliação do conceito para incluir o
"tra-balho doméstico", o não profissional, o não
assa-lariado, o não remunerado, apenas embotaria a
compreensão quanto ao lugar mesmo dessas
ati-vidades no seio da dominação do c a p i t a l . Menos
ainda, a inclusão do chamado mercado de "bens
simbólicos" (Bourdieu, 1997: 159-164). Antes de
tudo, são atividades cujos produtos não podem
ser considerados diretamente sociais. Por não
comporem o quadro da produção do v a l o r (e da
m a i s - v a l i a ) , essas "produções" ocorrem num
âmbito privado e de uso individual (também
pri-vado). De acordo com Marx ( G r u n d r i s s e 1: 213):
"El trabajo como mera prestación de servicios para
Ia satisfacción de necesidades directas, nada tiene
que ver con el capital, pues a éste no le interesa."
Ampliar o significado para nele incluir as
consi-derações pertinentes a relações de gênero (o
cha-mado "sexo social"), também carece de
fundamento, principalmente quando tais relações
são transformadas em "questão única". De
neira análoga, incluir tal questão não ajuda a captar
adequadamente o real significado da dominação
social inerente aoihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAc a p ita l. A problemática das
relações de gênero é inegavelmente muito
im-portante - como também o é aquela relacionada
aos desequilíbrios ecológicos -, porém, torna-se
mais consistente quando contextualizada ao
qua-dro dessa mesma dominação.
O fundamento central para a crítica
radi-cal pode ser encontrado em Marx C1985a: 84).
Segundo este pensador alemão, o nexo social
inerente ao s is te m a d o c a p ita l se expressa no
va lo r - d e - tr o c a que estabelece a dependência
recíproca geral entre os indivíduos:
A dependência mútua e generalizada dos
indivíduos reciprocamente indiferentes
constitui seu nexo social. Este nexo social se expressa no v a l o r - d e - t r o c a ... O indiví-duo deve produzir um produto universal: o valor-de-troca ou, considerado este em si, isoladamente e individualizado, d i n h e i -r o . [... ] vale dizer, algo universal no qual
toda individualidade, todo caráter próprio
é negado e cancelado. Na realidade, estaé
uma situação muito distinta daquela na qual o indivíduo natural ou historicamente am-pliado na família ou na tribo (e em
segui-da na comunisegui-dade), se reproduz sobre
bases diretamente naturais ...
Desse modo, o s is te m a d o c a p ita l, ao
dis-solver as relações pessoais (históricas) de
de-pendência, constituídas em torno da produção
das condições materiais e culturais de
existên-cia, quase naturais, funciona no sentido de
re-duzir todos os produtos e todas as atividades a
va lo r e s - d e - tr o c a . Ao serem dissolvidas, essas
relações pessoais dão lugar a uma situação na
qual o caráter social da atividade implica
subor-dinar os indivíduos a relações que subsistem
independentemente deles, as quais emergem dos
"choques" entre "indivíduos reciprocamente
in-diferentes". Tais "choques" decorrem da
socia-bilidade que emana da necessidade de
reprodução do c a p ita l. Ainda de acordo com
Marx ( G r u n d r is s e 1: 84-85):srqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
82 REVISTA DE CIÊNCIAS SOCIAIS V. 34 N. 1
O intercâmbio geral das atividades e dos produtos, que se há convertido na condi-ção de vida para cada indivíduo particular,
eésua conexão recíproca [[comos outrosl],
se apresenta perante eles mesmos como algo alheio, independente, como uma coisa. No valor-de-troca o vínculo social entre as pes-soas se transforma em relação social entre coisas. [...] Cada indivíduo possui o poder social sob a forma de uma coisa.
Pode-se, então, depreender que o
coman-do sobre as coisas fornece a dimensão
quantita-tiva e qualitaquantita-tiva do poder que cada indivíduo
exerce sobre o conjunto da riqueza social,
so-bre o mundo das mercadorias. Marx sintetiza:
"Seu poder social, assim como seu nexo com a
sociedade, [o indivíduo] o leva no bolso."
As relações de dependência pessoal
esta-vam restritas a lugares isolados. Pode-se dizer
que as primeiras formas (naturais) que
consti-tuíam o nexo social entre os indivíduos
expres-savam as "mediações de primeira ordem". Na
moderna sociedade produtora de mercadorias,
por sua vez, a independência pessoal fundada
na dependência com relação às coisas é a forma
mais adequada para a constituição de "um
siste-ma de metabolismo social geral, um sistema de
relações universais, de necessidades universais
e de capacidades universais" (Marx, 1985a: 85).
Tal sistema, fundado na "relação social entre as
coisas", que corresponde à sociedade
capitalis-ta, revela o caráter do nexo social das
"media-ções de segunda ordem".
As "mediações de segunda ordem"
carac-terísticas da sociedade capitalista vão
generali-zando um nexo social externo aos indivíduos e
independente deles, através da d ivis ã o s o c ia l d o
tr a b a lh o , que acentua a dependência recíproca
universal entre os produtos e o isolamento de
seus interesses privados. Nesse sentido, os
indi-víduos tornam-se reciprocamente indiferentes,
uma vez que a lógica do c a p ita l compreende a
necessidade de transformar todas as atividades
humanas em d in h e ir o ( va lo r - d e - tr o c a ) . O
po-der das coisas, o nexo social determinado pelas
D O S S I ÊsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
_...
_~.
'~.;zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAB c H - t F ( :
E '1 0 0 I S 0 8
coisas, projeta-se sobre os indivíduos quase que
como uma fatalidade e concretiza a finalização
do processo histórico de dissolução das
diver-as formdiver-as anteriores nas quais o trabalhador é
proprietário ou o proprietário trabalha." Tal
dis-olução apenas afirma o novo nexo social que
emerge com o capitalismo, ao qual corresponde
o trabalhador "livre", como capacidade
puramen-e subjpuramen-etiva, que se defronta com condições
ob-etivas de produção como sua não-propriedade.
Para oihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAs is te m a d o c a p ita l o trabalhador não pode
er considerado uma condição da produção, mas
sim o tr a b a lh o que realiza. Se este puder ser
realizado "por meio de máquinas, ou
simples-mente por meio da água ou do ar, tanto melhor"
M arx, 1985a: 459).
Por conseguinte, na sociedade capitalista,
para que as coisas adquiram e manifestem seu
poder social, é imperativo transformar as
ativi-dades dos indivíduos e seus produtos em d
i-ib e ir o . Por esse caminho afirma-se o caráter
iretamente social da produção que não resulta
e uma associação de indivíduos na qual
preva-ece uma divisão do "trabalho" autonomamente
efinida. A heteronomia que caracteriza o tr a
-b a lh o significa que os indivíduos se encontram
subsumidos à produção social, e que, por este
motivo, esta não é controlada por eles como se
fosse um patrimõnio coletivo (M arx, 1985a: 86).
O nexo social entre os indivíduos, que é
estabe-ecido com a d ivis ã o d o tr a b a lh o s o c ia l, se
es-ende até o mercado mundial, através da d ivis ã o
n te r n a c io n a l d o tr a b a lh o . Não se trata de um
nexo social qualquer, mas daquele que se
ade-ua à lógica da valorização do va lo r .
Esse nexo social corresponde a um
meta-bolismo material e espiritual que se vai
constru-indo independentemente do saber e da vontade
dos indivíduos e que pressupõe precisamente sua
indiferença e independência recíproca (Marx,
1985a: 89), (Trata-se de um nexo diametralmente
oposto àquele determinado por vínculos de
consangüinidade ou de servidão.) Por outro lado,
resulta das práticas dos indivíduos, é uma
cria-ção social, um produto histórico necessário para
o desenvolvimento da individualidade, contudo
de forma alienada e externa a esses mesmos
in-divíduos. A estreiteza do nexo social
característi-co da sociedade capitalista, cuja marca é a
alienação, impede o desenvolvimento universal
dos indivíduos com base em relações sociais que
lhes possibilitem o efetivo exercício da
autono-mia submetida ao controle coletivo. O
desenvol-vimento da individualidade permitido pelo nexo
social orientado pelo va lo r cria a universalidade
da alienação do indivíduo frente a si mesmo e
aos demais. Todavia, também cria possibilidades
para que surjam relações sociais próprias,
sub-metidas ao controle coletivo.
A crítica ao tr a b a lh o aqui apresentada é
fundamentalmente diferente da crítica social ao
capitalismo que se restringe aos limites
defini-dos pelos pressupostos que caracterizam o
Mar-xismo tradicional (Postone, 1995: 7-15), De início
foi necessário qualificar e atualizar a
compreen-são quanto à natureza da dominação do c a p
i-ta l. O Marxismo tradicional personifica a
dominação e a assume em termos do confronto
entre exploradores e explorados, de pessoas
sobre pessoas ou de uma classe (os capitalistas)
sobre a outra (os trabalhadores). A abordagem
aqui desenvolvida tem por ponto de partida a
c o n tr a d iç ã o c e n tr a l específica da sociedade
ca-pitalista moderna explicitada rigorosamente nos
G r u n d r is s e (Marx, 1985b: 216-237),8 a qual
ser-ve, ao mesmo tempo, de fundamento à crítica
aos pressupostos básicos das interpretações do
Marxismo tradicional. Deve ficar claro que a
c o n tr a d iç ã o c e n tr a l, conforme revelada por Marx
nos idos de 1857-1858, adquire maior
visibilida-de e transparência nas condições históricas
atu-ais do desenvolvimento do c a p ita l.
A crítica social tradicional focaliza o
capita-lismo do ponto de vista do tr a b a lh o , do ponto
de vista de quem o realiza; uma crítica radical
deve voltar-se para o caráter historicamente
de-terminado do tr a b a lh o no capitalismo, vendo-o
como elemento constitutivo da e constituído pela
sociedade capitalista. A crítica social ao
capitalis-mo do ponto de vista do tr a b a lh o o mantém
quanto tal: fragmentado, alienado e desrealizador,
vale dizer. esses termos, a crítica social
tradicio-nal, ao servir como legitimadora doihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAtr a b a lh o
su-prime a si mesma. Tal posição, contrariamente
ao que Marx sugere, atribui a "dignidade"
a\cançada através deste tr a b a lh o como
necessá-ria à existência humana. Marx antecipara nos
G r u n d r is s e a necessidade da superação histórica
do "mero trabalhador", com a abolição do va lo r
-c a p ita l constituindo-se uma pré-condição para a
plena realização do ser humano. A humanização
do homem, portanto, deveria realizar-se através
de uma estrutura de mediação social
radicalmen-te oposta, que permitisse o "trabalho" de cada
um tornar-se o contributo de uma coletividade
de "produtores livremente associados".
Ironica-mente, quando a crítica ao capitalismo é feita do
ponto de vista do trabalho, o tr a b a lh o é
defendi-do pelo movimento clássico dos trabalhadores e
exigido por todos como um direito de cidadania nesta sociedade.
A c rític a a o tra b a lh o e o s e n tid o d a d o m in a ç ã o s o c ia l a b s tra ta
o
duplo caráter da mercadoria ajudará amelhor entender as diferenças entre a crítica à
sociedade capitalista a partir do tr a b a lh o , da
perspectiva de quem o realiza, e aquela
relacio-nada à crítica ao tr a b a lh o nesta sociedade. Esta
última perspectiva deverá revelar que as
estru-turas que conformam as relações sociais de
pro-dução do c a p ita l, construídas pelas práticas das
pes oas, ou das classes sociais, em acordo com
a lógica da produção do va lo r , correspondem a
uma forma de "dominação social sem sujeito"
(Kurz, 2000).9 Ou seja, não se trata,
essencial-mente falando, da dominação de pessoas sobre
pessoas, ou de uma classe sobre outra classe,
ou de países sobre países, mas sim, do poder de
um metabolismo social que a todos aprisiona e
no qual predomina um dos aspectos da
merca-doria. A "dominação sem sujeito" aqui
afirma-da, contudo, manifesta-se através de práticas das
pessoas, ou das classes sociais, e das estruturassrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
84 REVISTA DE CIÊNCIAS SOCIAIS V. 34 N. 1
organizadas e adequadas para dar vazão à
pro-dução e à realização do va lo r .
Desse modo, sendo a dominação social
abstrata a marca do sistema do c a p ita l, na
soci-edade capitalista as pessoas são dominadas pelo
tr a b a lh o a b s tr a to . Este tr a b a lh o constituiu o
metabolismo que dissolveu as relações sociais
de produção anteriores, nas quais o
valor-de-uso se apresentava como finalidade das
ativida-des produtivas, e em seu lugar posicionou o
va lo r - d e - tr o c a . Tal dissolução, por sua vez,
so-mente ocorreu a partir de certo
desenvolvimen-to das forças produtivas, materiais e intelectuais,
que permitiram o estabelecimento de novas
ba-ses técnicas que se foram tornando
crescen-temente adequadas à produção do va lo r . Com
isso, a produção do va lo r , e da m a is - va lia ,
dei-xa de ser, gradativamente, fruto da vontade
pes-soal e se torna, crescentemente, imposta pela
necessidade de autovalorização do c a p ita l.
Desse modo, a mercadoria assume a
con-dição do verdadeiro sujeito e o homem o
exe-cutor de sua lógica, executor do movimento
automático do valor, o qual, segundo MarxFEDCBA
( A p u d , ]appe, 2003: 98), se apresenta como
su-jeito. Portanto, não sendo o homem, o sujeito é
o capital, e as pessoas, a ele sujeitadas. Assim,
as elas es são executoras da lógica da
valoriza-ção. Nesse sentido, vale transcrever de ]appe
( I d e m : 97), quando cita Marx para criticar o
marxismo tradicional:
Le capitaliste fonctionne uniquement
comme p e r s o n i fi c a t i o n du capital,
capital-personne, de Ia mêrne maniêre que l'ouvrier
n'est que le t r a v a i l personifié L .. ] La
domination du capitalista sur l'ouvrier est,
en conséquence, domination dela chose sur
l'hornrne, du travail mort sur le travail
vivant, du produit sur le producteur»>, un
procês «qui, sous un autre angle certes,
nous montre, à un pôle, le capitalista tour
autant asservi au capital que l'ouvrier, au
pôle oposé.
Com esse desenvolvimento, o argumento
subjetivista (dominação com sujeito) perde
D O S S I ÊzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
cácia explicativa, mais ainda com a explicitação
da crise estrutural doihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAc a p i t a l . Se na fase caracte-rizada pela s u b s u n ç ã o j o r m a l d o t r a b a l h o a o
c a p i t a l os sujeitos se revelavam através da
for-ma mercadoria, com a r e a l i za ç ã o da subsunção
erão que, gradativamente, deixar de fazê-lo. A
produção do v a l o r , e da m a i s - v a l i a , deixa de
er fruto da vontade pessoal e se torna,
rescentemente, imposta pela necessidade de
utovalorízação do c a p i t a l . esse sentido, não
se poderia atribuir os malefícios produzidos na
ociedade do c a p i t a l - desemprego estrutural,
. rmas de precarização do t r a b a l h o
(incluindo-a flexibiliz(incluindo-ação da legislação que "civiliza" a
relação c a p i t a l - t r a b a l h o ) , violência crescente,
rrirninalidade em vários níveis, miséria
amplia-, concentração de renda, degradação do
am-ente, discriminação entre gêneros, tráfico de
rogas, corrupção, seqüestros, terrorismos, e
im por diante - exclusivamente a sujeitos
_ iados pela vontade e pelo interesse egoístico,
bretudo quando se sabe que o sistema do
ip ita l e a contradição que lhe é inerente têm
viés destrutivo, e até mesmo autodestrutivo.
E, o que talvez seja mais importante
per-r, a dominação social perde seu caráter pes-srqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
I e se introjeta nas pessoas enquanto
etividade, precisamente através do t r a b a l h o
realizam para produzir v a l o r ( e m a i s - v a l i a ) .
e sentido, a dominação social que se
esta-ece por sobre as pessoas, ou por sobre as
es, torna-se crescentemente abstrata à
me-que vai se explicitando a contradição
cen-do sistema do c a p i t a l . Ao mesmo tempo,
"dominação sem sujeito" vai se
"objeti-ndo", tornando-se mais visível, àmedida que
b a l h o "vivo" vai sendo substituído pelo t r a
-o "m-ort-o", este, principalmente, na
condi-e agcondi-entcondi-e fixo qucondi-e condi-embutcondi-e condi-elcondi-evado contcondi-eúdo
tífico. Apesar de apontar para seu limite
his-absoluto, logicamente previsível, o
siste-e t r a b a l h o capitalista encontra, em seu
ior, mecanismos recorrentes de resolução e
. mento de sua d é b â c l e . Contudo, sempre
ndo as condições de possibilidade de sua
superação com o aprofundamento da
contradi-ção fundamental que lhe é inerente.
Um outro aspecto a ser considerado,
na-quilo que se relaciona ao caráter diretamente
social do t r a b a l h o , refere-se ao modo atomizado
de existência social dos indiv íduo na
socieda-de capitalista. Tal modo de exi tência poderia
ser criticado pelo fato de os indivíduo terem
uma existência relativamente isolada e a
produ-ção resultar da coletividade desse me mo
in-divíduos. Embora o caráter social do t r a b a l h o
possa dar margem a tal crítica é preci o que a
mesma não restrinja apenas a esse aspecto da
existência social individual. A sociedade
capita-lista não deveria ser analisada em termo da
contradição entre os indivíduos isolado
(mônadas) e a coletividade social. A crítica deve
se referir a a m b o s os termos, uma vez que e tão
estruturalmente relacionados e decorrem da
especificidade do t r a b a l h o : ao mesmo tempo,
os indivíduos estão isolados, mas são
interde-pendentes e mutuamente indiferentes. A análise
crítica com relação a tal questão deve, portanto,
ser desenvolvida a partir do ponto de vista da
possibilidade histórica da superação de tal
con-tradição, quando cabe a noção de "indivíduo
social" de Marx Cl985b: 228).
Se o trabalho que interessa como objeto
da crítica é aquele que constitui o v a l o r , o
pon-to de partida a esfera da produção capitalista de
mercadorias, como já referido anteriormente. O
v a l o r se converte em c a p i t a l - e o c a p i t a l em
v a l o r - tão logo o consumo deFEDCBAf o r ç a d e t r a b a
-l h o engendra a m a i s - v a l i a , condição para a
re-produção do c a p i t a l e da própria relação social
de produção que lhe é adequada. Nesse
senti-do, a especificidade histórica do t r a b a l h o no
capitalismo coincide com a assunção do c a p i t a l
enquanto relação social de produção. Agora o
t r a b a l h o pertence ao c a p i t a l , pois seu resultado materializa-se em c a p i t a l . A troca de f o r ç a d e
-t r a b a l h o por d i n h e i r o é a fase necessária para a
transformação do d i n h e i r o em c a p i t a l ; e o
tra-balhador, formalmente livre para alienar ou não
sua f o r ç a - d e - t r a b a l h o , em troca de salário.
tudo, a renovação de suas necessidades o
man-tém preso à força criadora doihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAt r a b a l h o , agora já
transformada em força produtiva do c a p i t a l ,
como que uma espécie de poder que lhe é
alheio. De qualquer maneira, o trabalhador
in-teressa ao c a p i t a l justamente pelo fato de que é
portador material do t r a b a l h o . Por esse motivo,
o t r a b a l h o torna-se o sistema de dominação mais
pérfido da história que se dissemina através de
uma coerção silenciosa, estabelecendo os mais
diversos níveis da hierarquia socioeconômica
inerente a esta sociedade. Como se trata de um
sistema totalizador, os trabalhadores, objetivando
a satisfação de suas necessidades imediatas, se
defrontam com os capitalistas, enquanto classe,
e individualmente entre si.
O t r a b a l h o "vivo", cuja qualidade é
con-servar o t r a b a l h o já existente no espaço
con-verte-se, por este motivo, em força do c a p i t a l
no tempo. A qualidade vivificante do t r a b a l h o ,
que nada custa ao trabalhador, só interessa na
medida em que beneficia gratuitamente ao
ca-pitalista (Marx, 1985a: 311). Trata-se de um
"dom" que se concretiza na relação entre c a p i
-t a l e t r a b a l h o com a combinação orgânica
en-tre as condições materiais e a força social do
t r a b a l h o . De um lado, os meios de produção, cujo v a l o r se conserva com sua transferência
para o produto (um novo v a l o r ) ; de outro, cada
vez menos determinante, o fator subjetivo do
processo de produção, a fonte do v a l o r novo.
Os fatores objetivos não são reproduzidos, mas
sim, têm seus v a l o r e s conservados, pois nunca
poderão agregar ao produto um v a l o r maior
do que aquele que representam. O contrário
ocorre com o fator subjetivo, cuja qualidade
crucial é produzir um novo valor-de-uso que
contenha um v a l o r superior àquele
correspon-dente ao da fo r ç a - d e - t r a b a l h o . Assim, essa
qua-lidade da mercadoria fo r ç a - d e - t r a b a l h o , seu
valor-de-uso como propriedade do c a p i t a l ,
desvenda e explicita a verdadeira fonte do
lu-cro do capitalista. Fica desvendada,
definitiva-mente, a categoria-chave da produção capitalista,
a m a i s - v a l i a .
86srqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAREVISTA DE CIÊNCIAS SOCIAIS V. 34 N. 1
A revelação da categoria-chave do modo
de produção capitalista mostra que a condição
de vida do trabalhador está vinculada às
necessi-dades do c a p i t a l . Ou seja, o trabalhador
assalari-ado só encontra suas condições de vida se sacrifica
uma parte de seu tempo de vida em benefício do
c a p i t a l (Rosdolsky, 1979: 256-260).10 O t r a b a l h o
aparece, desde sempre, como sacrifício, e neste
sentido a produção de m a i s - v a l i a assemelha-se
a outras formas coercitivas anteriores, de
nature-za extra-econômicas."! Se o sacrifício da própria
vida é condição de vida para o trabalhador, ao
c a p i t a l pouco importa fazer uso do t r a b a l h o
di-reto forçado - seja a escravidão ou a servidão
-ou produzir excedente através do t r a b a l h o
força-do mediaforça-do, o t r a b a l h o a s s a l a r i a d o +
A situação na qual predomina o t r a b a l h o
direto forçado, além de ser identificada a um
bai-xo estágio das forças produtivas, também se
refe-re a uma formação socioeconôrnica voltada para
o atendimento de necessidades mais ou menos
limitadas. Nesse caso, o objetivo das atividades
humanas é a produção de valores-de-uso, tanto
para dominantes quanto dominados, e a
compulsão para tal se dá através da relação
dire-ta entre as pessoas. Nas sociedades primitivas
pré-classistas, a totalidade do processo reprodutivo é
tal que não há nem "trabalho", nem "tempo
li-vre", nem "cultura", como esferas particulares. Em
tais circunstâncias, o "mundo dos homens"
(Mészáros, 1981: 113) e o "mundo do trabalho"
seguiam as mesmas normas inerentes às relações
de dominação e de dependência pessoal.
Reli-gião, tradição, cultura, compromissos mútuos,
asseguravam a natureza da subordinação. Assim,
de um modo geral, nas formações
pré-capitalis-tas, a identidade do processo da vida em todos
os seus momentos afirma-se no interior do
pro-cesso de reprodução social dos produtores
ime-diatos e perdura até a emergência da M a n u fa t u r a
e da divisão capitalista do t r a b a l h o . Quando a
energia humana é transformada em d i n h e i r o , a
esfera do t r a b a l h o tende, progressivamente, a se
separar do contexto mais amplo da vivência e
passa a obedecer à racionalidade estrita da
D O S S I ÊzyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
rização doihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAc a p i t a l - d i n h e i r o para a qual serve de uporte. Nessa circunstância, o t r a b a l h o a l i e n a
-d o (ou a s s a l a r i a d o ) sintetiza a crescente
valori-zação do "mundo das coisas" e a crescente
desvalorização do "mundo dos homens".
Portanto, pode-se concluir, a crescente
reificação das relações sociais inclui o processo
de qualificação-desqualificante (Oliveira, 2002)
daj o r ç a - d e - t r a b a l h o , e tanto os homens quanto o t r a b a l h o "desumanizam-se". A relação c a p i t a l
- entendida como a forma desenvolvida do v a -FEDCBA
X J r - produziu, em sua pureza, a separação
en-.re o t r a b a l h o e os outros momentos do processo
e reprodução social. Por seu lado, a
apropria-cão do t r a b a l h o e x c e d e n t e converteu-se em um
.im em si mesmo e ot r a b a l h o j o r ç a d o m e d i a d o
naturalizou-se com base em meios e estímulos
cionados pelo metabolismo social do c a p i t a l .
sse modo, o desenvolvimento do c a p i t a l , ao
assentar sobre a alienação do t r a b a l h o ,
reve-que o tipo de dominação que lhe é
apropria-assume a qualidade de ser c r e s c e n t e m e n t e
a b s tr a ta . E o trabalho que se manifesta separa-do "tempo livre", da "política", da "arte", da ltura" etc., é desde sempre t r a b a l h o a b s t r a t o .
d o m in a ç ã o s e m s u je ito a tra v é s d osrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
ínhetro
(o u o d in h e iro c o m o s u je ito d a m in a ç ã o )O sistema do c a p i t a l compõe-se de um
njunto de mecanismos necessários à
organiza-desenvolvimento e aperfeiçoamento de suas
turas sociopolíticas e econômicas. Todo esse nto tem por finalidade a produção da
ener-"ital exigida para a reprodução ampliada do
ta l. Em particular, no que se relaciona aos
de produção, estes são sistematicamente
cionados para impulsionar aumentos da
tividade do t r a b a l h o . Quanto aos meios e
tímulos subjetivos, os mesmos se materiali-através de uma forma de coerção, a qual
e um caráter direta e crescentemente social
mo tempo em que indireta e
crescen-e impcrescen-essoal). A naturcrescen-eza abstrata da
do-minação social do c a p i t a l , deverá manifestar-se
através daquelas estruturas e, sobretudo, através
do d i n h e i r o , em virtude de ua condição de
"re-presentante material univer aI da riqueza",13
ex-pressão última do v a l o r - d e - t r o c a e portanto, a
senha para o mundo das mercadorias.
Quando o d i n h e i r o apenas expressava a
riqueza em suas diversas forma naturai ,a
rela-ção entre estas e seus possuidore era tal que,
na essência, os indivíduos apareciam
identifica-dos com as próprias coisas, as quai e con
titu-íam a expressão do d e s e n v o l v i m e n t o d e s u a
i n d i v i d u a l i d a d e . O sujeito e o objeto confor-mavam a unidade necessária que acompanhava
a existência terrena das coisas e o d i n h e i r o
apa-recia apenas como simples meio de troca em
sua condição de moeda, enquanto mercadoria
particular. Nessa circunstância, a produção de
valores-de-uso era a finalidade e o d i n h e i r o o
meio para obter mercadorias. Quando o d i n h e i
-r o se afasta de sua condição de meio de troca,
transforma-se em sujeito da riqueza universal e
rompe o vínculo com seu possuidor no sentido
de que não decorre do desenvolvimento da
in-dividualidade deste mesmo possuidor, mas sim
de circunstâncias particulares. Sendo o d i n h e i r o
o sujeito universal da riqueza, o indivíduo
po-derá obtê-Io vendendo ou comprando j o r ç a d e
-t r a b a l h o ; ou através de assaltos, do tráfico de
drogas, ou ainda de seqüestros. Importa,
sobre-tudo, a quantidade obtida pois esta irá
repre-sentar a dimensão do domínio particular (do
indivíduo) sobre o mundo das mercadorias e
das pessoas.l" A condição de sujeito adquirida
pelo d i n h e i r o confere e transfere poder a seu possuidor de tal modo que este adquire
capaci-dade e condições necessárias para impor
deter-minações, propor objetivos e praticar ações. Na condição de vendedor dej o r ç a d e t r a
-b a l h o , o indivíduo procura meios para atender
suas necessidades imediatas; na condição de
comprador, é obrigado a acumular d i n h e i r o
en-quanto c a p i t a l , independentemente da origem
do d i n h e i r o inicial e do caminho que irá
esco-lher para atingir tal objetívo.l? Tal circunstância
corresponde ao uso produtivo doihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAd i n h e i r o , o
que pressupõe a existência do t r a b a l h o a s s a l a
-r i a d o - a relação através da qual a dominação
social se projeta sobre os trabalhadores e que
tem como fulcro o d i n h e i r o . Nesse contexto, a
laboriosidade do indivíduo não pode ser o
limi-te e não importa a particularidade ou as
caracte-rísticas individuais. Isso porque, não se trata mais
do desenvolvimento das virtudes e criatividade
dos indivíduos, mas sim da impetuosidade do
c a p i t a l . Ambas as condições correspondem à "dissolução" do indivíduo. Ou seja, na condição
de vendedor a "dissolução" ocorre em virtude
do fato de que se trata de uma escolha forçada
pelas necessidades. a condição de comprador
de força-de-trabalho, porque a busca incessante
de d i n h e i r o deixa de ser a busca por melhores
condições de vida para seu possuidor e se volta
para atender a necessidade de expansão do c a
-p i t a l . A concorrência impulsiona a "dissolução"
e a conseqüente transformação dos indivíduos
em agentes do c a p i t a l . Assim, afirma-se,
histori-camente, um modo de produção construído e
orientado diretamente para o v a l o r - d e - t r o c a e
apenas indiretamente para o valor-de-uso.
O v a l o r - d e - t r o c a (o d i n h e i r o ) , enquanto finalidade objetiva do sistema produtivo, já
con-tém em si a coerção sobre o indivíduo. Isso
porque, ao mesmo tempo, sua existência social
depende da produção do v a l o r , e de um
produ-to que lhe é estranho. Nesse sentido, sua
exis-tência natural fica negada e ele se torna uma
determinação da sociedade, uma produção
his-tórica da sociedade capitalista. Assim, o t r a b a
-l h o apresenta-se como a d e t e r m i n a ç ã o do
hornem.l'' O produto deixa de ser produto para
o trabalhador e somente se realiza através da
circulação, mais amplamente quanto mais
de-senvolvida for a d i v i s ã o d o t r a b a l h o s o c i a l . No
seio do sistema do c a p i t a l esse é, precisamente,
o processo social de produção do v a l o r . Tal
pro-cesso expressa, ao mesmo tempo, a negação do
d i n h e i r o como elemento passivo da circulação
e sua afirmação como elemento incitador da
produção e da circulação, bem como da sede
88srqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAREVISTA DE CI~NCIAS SOCIAIS V.34 N. 1
de enriquecimento de seu possuidor, seja este
trabalhador assalariado ou capitalista.
O d i n h e i r o enquanto meio de circulação
(portanto, na condição de moeda) esgota, do
ponto de vista de quem o possui, sua capacida-de capacida-de compra tão logo reingressa na circulação; o d i n h e i r o enquanto c a p i t a l , amplia sua capaci-dade de compra tão logo ingressa na circulação.
esse último sentido, o d i n h e i r o se afirma como
a r e l a ç ã o s o c i a l desta sociedade. Uma vez que
o nexo social que se estabelece entre
indivídu-os "reciprocamente indiferentes" se materializa
no v a l o r - d e - t r o c a , o d i n h e i r o se torna a finali-dade última e a medida do poder dos
indivídu-os sobre as "riquezas sociais". Portanto, de
incitador de apetites, o d i n h e i r o enquanto c a p i
-t a l adquire a condição de estimulador do
de-senvolvimento das forças produtivas, materiais
e espirituais desta sociedade, desde o momento
histórico a partir do qual a coerção para o t r a
-b a l h o tornou-se mediada pela retribuição sob a
forma de d i n h e i r o (Marx, 1985a: 158).
A base para a reprodução social dos
indi-víduos deixa de ser, definitivamente,
determi-nada pelo que produzem e como produzem, para
ser determinada pelo produto do t r a b a l h o como
algo alheio que lhes subordina a relações que
subsistem independentemente deles, que
nas-cem e se reproduzem através do entrechoque
de indivíduos reciprocamente independentes.l?
Portanto, os indivíduos são aprisionados por
(suas próprias) práticas voltadas para a
produ-ção do u a l o r - d e - t r o c a . E ainda, sendo o d i n h e i
-r oo "produto universal" da sociedade capitalista,
alimenta a sede de enriquecimento dos
indiví-duos, tornando-se objeto de desejo e potência
incitadora capaz de liberar toda a laboriosidade
humana para a produção do v a l o r - d e - t r o c a . As
relações entre os indivíduos assumem um
cará-ter tal que todos ficam subsumidos a a b s t r a ç õ e s ,
estas entendidas enquanto expressão teórica das
relações materiais que os dominam (M arx, 1985a:
92). O d i n h e i r o - por ser a manifestação
univer-sal da riqueza - apresenta-se como a a b s t r a ç ã o
máxima dessas relações.
D O S S I Ê
D o m in a ç ã o s e m s u je ito e c ris e d o tra b a lh ozyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
Conforme o argumento apresentado na
eção anterior, o contraponto entreihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAc a p ita l e tr a
-b a lh o é uma oposição adequada ao modo de produzir da sociedade capitalista. Em particular, luta de classes revelou-se ao longo do tempo orno imanente à dinâmica interna da
valoriza-_- o do c a p ita l, ou seja, como o canal social e
político através do qual os interesses
divergen-es se foram explicitando. O capítulo VIII de O
a p ita l, que trata da luta histórica pelo estabele-imento de uma jornada de trabalho mais "acei-tável" - e a esta se podem agregar outras lutas ravadas ao longo do século XX, por direitos ndividuais e sociais, elevação de salários, me-ores condições de trabalho, "políticas de
em-rego e renda" - demonstra que o pressuposto
ndante do sistema do c a p ita l ficou
resguarda-0.18 Embora tenham sido lutas voltadas parasrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
uestões distributivas, foram importantes para
elerar a missão modernizadora e civilizatória
c a p ita l e acelerar o desenvolvimento da
con-dição fundamental do capitalismo.
Essa "identificação" entre c a p ita l e tr a b a
-se efetiva em virtude da d o m in a ç ã o s o c ia l
s tr a ta que envolve a sociedade capitalista.
mo que não seja percebida de imediato, a
. tência de uma oposição de poderes
díferen-dos permanece restrita à dinâmica da valoriza-- do c a p ita l. As lutas anteriores encetadas pelos balhadores por salários e melhores condições
trabalho e de vida - mesmo que na atualidade
a adquirido lugar a luta pela p e r m a n ê n c ia
e m p r e g o c o m s a lá r io s r e d u zid o s - , todas
guar-:TI em comum a manutenção dos pressupostos
fundamentam o tr a b a lh o nesta sociedade.
~esse caminho, c a p ita l e tr a b a lh o
transformam-nos lados de uma mesma "moeda".
Ao mesmo tempo, sendo o c a p ita l uma
ão social, um metabolismo social de dorni-- o abstrata, é tr a b a lh o a c u m u la d o ( tr a b a lh o
rto"): e o tr a b a lh o , por sua vez, constitutivo
a c u m u la ç ã o d e c a p ita l ( tr a b a lh o "vivo"): o e o vir - a - s e r se completam coercitivamente.
Essa "moeda" não é outra coisa senão a
expres-são da contraposição entre tr a b a lh o existente
no espaço e tr a b a lh o que toma existência no
tempo, ambos compondo um todo orgânico
necessário à produção do va lo r (e da m a is va
-lia ) . O interesse de uns poucos no embate de
classes é transformar o vir - a - s e r no s e r , o
inte-resse de (muitos) outros é produzir o vir - a - s e r
como garantia de recompra de sua mercadoria ... Em particular, a busca da garantia acima
mencionada poderia levar uma categoria de
tra-balhadores, sobretudo em circunstâncias de
"hor-ror econômico", a defender, ardorosamente,
programas e políticas voltadas para manter em
pleno funcionamento as atividades às quais se
encontra vinculada, mesmo causando efeitos
deletérios sobre o ambiente. Manter-se
vincula-do a um c a p ita l, assegura a identidade (de
clas-se) e a chamada inclusão-cidadã da sociedade
burguesa. esse sentido, talvez fos e mais
cor-reto fazer referência à classe trabalhadora como
aquela que vive p a r a o tr a b a lh o e que ao me
-mo tempo, vive d o tr a b a lh o . I o porque. como
já referido, é a portadora coletiva da fome de
valorização do c a p ita l, de ua auto-reprodução
e da produção da m a is - va lia .
Desse modo, o significado atribuído ao
tr a b a lh o não permite reduzi-lo a sua
simplicida-de, como atividade humana em geral. Não se
trata de atividades através das quais os homens
transformam a natureza e se relacionam entre
si, tipificadas nas chamadas "mediações de
pri-meira ordem". Ademais, não se trata da determi-nação natural do homem, a não ser que se admita
que este pode realizar-se através de produtos
que não Ihes pertencem. Ao longo do tempo, o
desenvolvimento do c a p ita l aprofundou o
pro-cesso de fragmentação e de tendência ao
esva-ziamento do substrato real do tr a b a lh o .
Por outro lado, se a "vontade" de vender aFEDCBAf o r ç a - d e - t r a b a l h o for condição necessária para
a satisfação de necessidades individuais, a
efetivação dessa venda, a condição suficiente e cada vez mais distante do controle de seu
pos-suidor, não depende do vendedor. Ao mesmo
"morto", representado noihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAd i n h e i r o , uma vez que
a produção de riqueza na sociedade capitalista
somente tem sentido se for representável na
for-ma monetária.
O processo de
simplificação/indiferen-ciação - ou de abstração - inerente ao t r a b a l h o ,
que na atualidade se apresenta de maneira mais
visível, tende a afetar a totalidade de seus
dife-rentes gêneros concretos. Tal conjunto se
estru-tura em função do aprofundamento da divisão
técnica do t r a b a l h o , à qual corresponde,
tendencialmente, uma espécie de
"desuma-nização" - não apenas determinada pela
substi-tuição do t r a b a l h o "vivo" pelo t r a b a l h o "morto"
- mas, sobretudo, decorrente do esvaziamento
que vai caracterizando gradativamente este
mes-mo t r a b a l h o . Como conseqüência, na
socieda-de capitalista, na qual o v a l o r - m e r c a d o r i a é a
forma de riqueza que se generaliza, e que lhe é
específica, a indiferença dos que trabalham e a
indiferenciação quanto ao que fazem vão
ga-nhando nitidez, à medida que o t r a b a l h o vai
expondo seus limites como fonte que constitui
o c a p i t a l . Assim, o t r a b a l h o , ao mesmo tempo
em que é uma atividade humana consciente,
porque orientada para um fim pré-concebido
-heteronomicamente concebido, vale dizer -,
ten-de a corresponten-der a um simples dispêndio de
energia física e mental, independentemente do
conteúdo, das necessidades, da vontade e da
qualidade dos portadores deFEDCBAf o r ç a - d e - t r a b a l h o .
A necessidade de "se vender" para poder
viver - portanto, a necessidade de viver para o
t r a b a l h o e do t r a b a l h o - apresenta-se, desde
sempre, como um vínculo de dependência
to-tal. Uma dependência "servil" - ao c a p i t a l , e
não à classe capitalista - para atender a
finalida-de finalida-determinada pelo c a p i t a l que guarda pouca
ou nenhuma relação com as necessidades
des-ses "servos" da modernidade. Assim, os
"escra-vos" do c a p i t a l realizam o sacrifício do t r a b a l h o
para produzir v a l o r (e m a i s - v a l i a ) . o lugar de
laços de dependência extra-econômicos (senhor/
escravo/servo), uma relação social que se
im-põe e se 'naturaliza' para além das necessidadesTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
tempo, a satisfação de necessidades humanas
não sendo a finalidade da produção, seu
aten-dimento afirma-se como uma coerção social
determinada pela lógica da autovalorização do
c a p i t a l . Ou seja, a satisfação das necessidades
individuais de várias ordens tem por
pressupos-to a produção do v a l o r - m e r c a d o r i a . Em sendo
assim, no limite matemático da plena operação
da contradição central do sistema do c a p i t a l , o
t r a b a l h o deixará de ser a eterna necessidade imposta ao homem, tão alegada pelos ideólogos do sistema.
O atual estágio do desenvolvimento do
c a p i t a lpermite perceber práticas nas quais as ativi-dades produtivas já estão reduzidas a simples gasto indiferenciado def o r ç a - d e - t r a b a l h o , desprovidas
de conteúdo substancial que, obviamente, se
desenvolvem independentemente das
necessida-des e vontade dos envolvidos. Antes, quando
prevaleciam relações de dependência pessoal,
também não se poderia falar de atividades
hu-manas autodeterminadas, pois o "mundo do
tra-balho" confundia-se com o da vivência, e ambos
estavam integrados a um complexo sociopolítico
no qual as normas coercitivas eram ditadas pela
religião, pela tradição social e cultural e previam
compromissos pessoais mútuos. Por outro lado,
na formação social capitalista, na qual a
produ-ção de mercadorias corresponde à
transforma-ção da energia física e intelectual em d i n h e i r o , a
esfera do t r a b a l h o , crescentemente dissociada das
demais, constitui-se num importante seu
determinante. De certa maneira, o "mundo do
trabalho" submete para si o "mundo dos homens",
sem que haja com este uma vinculação de
intimi-dade mais profunda, regulando-o por
intermé-dio de uma racionalidade abstrata, na qual o
t r a b a l h o é o fim em si mesmo, na medida em
que é o suporte da valorização do v a l o r .
Interes-sa, sobretudo, que a mercadoria seja
transforma-da em d i n h e i r o e este em t r a b a l h o para produzir
d i n h e i r o em escala ampliada. Desse modo, o
c a p i t a l se autodefine como um metabolismo que suga energia física e mental para atender a única
finalidade que conhece: acumulação de t r a b a l h o
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dos envolvidos. No "reino" doihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAt r a b a l h o ,
portan-to, prevalece uma atividade humana
hetero-nômica e se efetiva a perda de liberdade e de
possibilidades emancipatórias em seu interior:
nesse "reino" o gasto de f o r ç a - d e - t r a b a l h o
hu-mana reafirma-se como um fim determinado
externamente pelas leis imanentes à produção
do v a l o r - m e r c a d o r i a : qual seja, a produção do
d i n h e i r o em escala crescente.'? Ao mesmo
tem-po, a negação da liberdade para muitos - ou
para todos? - e o caráter heteronômico do t r a
-b a l h o , refletem-se sobre a organização da vida
social e cultural da humanidade e tendem a se
tornar marcas indeléveis da quase-objetividade
da dominação social, crescentemente abstrata,
do c a p i t a l .
Em síntese, na sociedade do t r a b a l h o ,
onde tudo pode ser negociado, menos os
fun-damentos do modo de produzir o c a p i t a l (com
ou sem o t r a b a l h o a s s a l a r i a d o ) , a objetividade
da dominação social que lhe é inerente
impõe-e através da forma dimpõe-e compulsão historicamimpõe-entimpõe-e
constituída pelo t r a b a l h o . a esfera em que se
dá a produção do c a p i t a l também se produzem
as bases dos antagonismos típicos dessa
socie-dade, tanto entre semelhantes ( c a p i t a l x c a p i
-t a l ) , quanto entre dessemelhantes ( c a p i t a l x
t r a b a l h o ) . (E ao lado dessas mesmas bases, com
elas compondo a unidade necessária à
reprodu-ção sócio-econômica do c a p i t a l , o mercado
as-cende à condição de arena sagrada e legitimadora
do espetáculo da dominação do d e u s - c a p i t a l
materializado no d i n h e i r o .) Em particular, o
an-tagonismo inerente à luta distributiva encetada
pelos trabalhadores assalariados, tendo em
vis-ta ampliar sua participação no valor agregado,
e x i g e que o excedente seja produzido e que,
para tal, os trabalhadores deverão produzir, não
apenas m a i s - v a l i a , mas ainda, produzir numa
e cala crescente. Assim, essa luta de interesses
de classes que se trava entre "buscadores" de
d i n h e i r o - no caso, entre semelhantes e
dessemelhantes -, torna-se a expressão do
de-envolvimento de um processo de
auto-ominação e nunca de autodeterminação.
Em sua fase atual, a moderna sociedade
produtora de mercadoria revela sinais, mais ou
menos visíveis, de seu limite absoluto, o que·
não significa dizer, necessariamente, de seu
fi-nal. A riqueza da época capitalista sempre exigi-rá o t r a b a l h o como fonte de sua produção.
Contudo, com o prosseguimento da revolução
microeletrônica, acentua-se a tendência de
re-dução do uso direto de f o r ç a - d e - t r a b a l h o ,
con-firmando a assertiva de Marx nos G r u n d r i s s e
(1985b: 227-230). O que poderia ser
considera-do uma "ficção científica" há poucas décadas
passadas, hoje ganha concretude. Embora tenha
havido um intenso crescimento econômico do
pós-Guerra até meados dos anos 70 - período
que ficou conhecido por "trinta [anos)
glorio-sos" -, o crescimento do nível geral do emprego ocorreu em função do ritmo crescente das
ino-vações de produtos, comparativamente mais
ele-vado do que o ritmo das inovações de processos. No entanto, passada a "bonança" da ola
fordista-keynesiana, a "tempestade" que se seguiu
correspondeu a um intenso processo de
inova-ções técnico-produtivas e organizacionais de
base microeletrônica, cuja marca reveladora é a
redução do tempo de t r a b a l h o e da quantidade
de t r a b a l h o por unidade produzida.
As inovações de processos, e os
aumen-tos de produtividade delas decorrentes, têm sido
acompanhadas da aceleração do declínio da taxa
de utilização do valor-de-uso (Mészáros, 1995:
566-569).20 Ao mesmo tempo, têm significado a
perda de importância relativa do t r a b a l h o
ime-diato diante do t r a b a l h o objetivado: a venda da
mercadoria f o r ç a - d e - t r a b a l h o vai se "notabilizan-do" como um "negócio" cada vez menos
"lucra-tivo". Nesta sociedade, quem não consegue
vender suaf o r ç a - d e - t r a b a l h o - quem não
con-segue ser "útil para o lucro", direta ou
indireta-mente - é considerado supérfluo e jogado numa
espécie de "aterro sanitário" social. Por outro
lado, a virulência da concorrência intercapitalista, ao acelerar o processo de
concentração-centra-lização do c a p i t a l , contribui para a emergência
de crises periódicas de superprodução, a