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INFORMAÇÃO AMBIENTAL COMO DIREITO E DEVER FUNDAMENTAL 1

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Academic year: 2021

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Elisa Cerioli Del´Olmo

SUMÁRIO: Introdução. 1. Histórico e Evolução da Proteção Ambiental na Esfera Jurídica Internacional e Estrangeira. 1.1 Conscientização do problema ambiental e os documentos de organismos internacionais. 1.2 A proteção ambiental na perspectiva jurídica-constitucional (interna) dos estados. 1.3 Ambiente ecologicamente equilibrado como direito e dever fundamental e como dimensão da dignidade humana e da vida. 2. O Direito à Informação Ambiental na Legislação Brasileira. 2.1 Conceito e importância de informação ambiental. 2.2 A legislação brasileira e o direito à informação ambiental. 2.3 Limites ao direito à informação ambiental e a jurisprudência brasileira. 3. A Proteção Ambiental na Ordem Jurídica Alemã. 3.1 Proteção ambiental como preocupação social nacional e os parâmetros emanentes da Lei Fundamental. 3.2 O direito comunitário europeu e a lei de informação ambiental alemã. 3.3 Interpretação da legislação sobre informação ambiental no âmbito da jurispurdência. 4. A Informação Ambiental como Direito e Dever Fundamental no Âmbito da Constituição Federal de 1988. 4.1 A informação ambiental como dever do Estado e do cidadão. 4.2 A educação ambiental como forma de concretizar os princípios da informação e da prevenção e a experiência alemã. 4.3 A informação ambiental como princípio, dever e direito fundamental no Brasil. Considerações Finais.

RESUMO

O presente trabalho se propõe a analisar o direito e o dever da informação ambiental, de maneira a demonstrar sua essencialidade na sociedade de risco em que vivemos, cuja população carece de conscientização e interesse. Perante o conceito abstrato do Estado Socioambiental de Direito, reconhece-se os princípios do direito ambiental, como o da prevenção, da reparação e da responsabilidade, bem como o princípio da educação, da participação e da democracia ambiental como formas de concretizar a convivência em equilíbrio entre o ser humano e a natureza. Primeiramente refere-se à evolução do direito do ambiente e sua importância nos ordenamentos jurídicos internos e na sociedade internacional. Analisam-se os princípios que permeiam o

1 Artigo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, aprovado, com grau máximo pela banca examinadora composta pelo orientador Prof. Dr. Ingo Wolfgang Sarlet, Profª. Drª. Fernanda Luiza Fontoura de Medeiros, e Prof. Dr. Carlos Alberto Molinaro, em 27 de novembro de 2007.

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sistema jurídico brasileiro, expondo o direito e o dever da informação no seu viés ambiental. Estuda-se a legislação brasileira atinente ao tema, bem como se refere o posicionamento da jurisprudência. Reflexões são feitas sobre a proteção ambiental na Alemanha, tecendo-se comentários sobre a lei de acesso à informação ambiental desse país, contextualizando e comentando as semelhanças e as diferenças no seu âmbito sócio-cultural.

Palavras-chave: Direito e dever fundamental da informação ambiental. Proteção ambiental na Alemanha.

ZUSAMMENFASSUNG

Diese Arbeit hat zum Ziel, das Umweltinformationsrecht und die Umweltinformationspflicht zu analysieren sowie ihre Bedeutung für die heutige "Risikogesellschaft" darzustellen, deren Mitglieder sich nicht immer umweltbewusst verhalten. Im abstrakten Bezeichnung des Sozialen Umwelt- und Rechtsstaates sind die Prinzipien des Umweltrechts zu erkennen, wie das Vorsorge- und Verursacherprinzip, die Erziehung zum umweltbewußten Umgang sowie das Kooperation- und Umweltdemokratieprinzip. Sie stehen in enger Verbindung mit der Verwirklichung einer gleichgewichtigen Beziehung zwischen Mensch und Natur. Im ersten Teil der Arbeit wurde die Entwicklung des Umweltrechts und seine Bedeutung in den juristischen Ordnungen verschiedener Länder sowie auf internationaler Ebene aufgezeigt. Im zweiten Teil wurden die umweltrechtlichen Prinzipien im brasilianischen Rechtssystem, der dortigen Gesetzgebung und Jurisprudenz sowie das Recht und die Pflicht zur Umweltinformation analysiert. Im Anschluß wurden Überlegungen zum Umweltschutz in Deutschland und zum deutschen Umweltinformationsgesetz präsentiert und aus soziokultureller Perspektive Unterschiede und Ähnlichkeiten herausgearbeitet

Schlüsselwörter: Umweltrecht. Umweltinformationsrecht und Umweltinformationspflicht. Umweltinformationsgesetz

INTRODUÇÃO

Nos últimos quarenta anos, em meio ao acelerado e contínuo desenvolvimento tecnológico, os efeitos colaterais de um crescimento desmedido com os limites ambientais do

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planeta tornaram-se evidentes, requerendo urgentemente medidas para contornar ou amenizar os danos já sofridos. Inúmeras catástrofes ambientais ocorreram e marcaram profundamente a nossa história, ao mesmo tempo que o homem, por meio da sua atividade negligente, olvidou que os recursos naturais possuem limites, tendo como conseqüência inevitável um impacto ambiental sem precedentes. A crença de que os avanços da ciência remediariam os males da humanidade não mais se propagou, bem como a idéia de que a natureza deveria ser colocada a serviço do homem. A preservação do meio ambiente se tornou, assim, um tema casa vez mais presente.

Tendo em vista a necessidade imediata de mudar drasticamente a forma com que os governos, os entes econômicos e a sociedade civil lidam com os bens ambientais, muitos esforços já foram dispendidos através de pesquisas, da atividade de organizações e instituições ambientais, bem como dos governantes. Nesse diapasão, surge a importância da informação na sociedade de risco e o conceito de um Estado Socioambiental, suas características e instrumentos realizadores.

O presente trabalho monográfico apresenta como problema identificar e analisar a informação ambiental no âmbito da teoria dos direitos e deveres fundamentais. A escolha do tema se deve à importância do mesmo na sociedade atual, onde o acesso à informação qualificada é pressuposto essencial para viabilizar a ação positiva das instituições sociais através do planejamento e da criação de programas, de forma a prevenir danos e reparar os já existentes.

Pretende-se demonstrar a evolução do direito à informação ambiental na Republica Federal da Alemanha, enfatizando igualmente o desenvolvimento e as influências do direito comunitário europeu, de forma a delinear as semelhanças e as diferenças entre o direito à informação no Brasil e no país germânico. Traçar-se-ão a importância e o nível elevado de consciência ambiental na população alemã e expor-se-ão casos jurisprudenciais sobre o tema.

Dissertar-se-á sobre o dever da informação ambiental, tecendo-se considerações sobre a teoria dos deveres fundamentais, enfatizando-se a política da educação ambiental como instrumento para alcançar uma sociedade informada, organizada e participativa, em que se consiga efetivar as prerrogativas do princípio da prevenção.

Visa-se a demonstrar também a importância de uma sociedade ambientalmente conscientizada na busca da concretização da determinação constitucional de que Estado e sociedade têm o dever de proteger o meio ambiente. Procurar-se-à referir no decorrer do texto as disposições constitucionais e infraconstitucionais pertinentes ao tema, bem como as medidas disponibilizadas pelo Estado para que esse objetivo se torne alcançável.

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1 HISTÓRICO E EVOLUÇÃO DA PROTEÇÃO AMBIENTAL NA ESFERA JURÍDICA INTERNACIONAL E ESTRANGEIRA

Der Mensch ist (...) ein Teil seiner Umwelt und mit ihr schicksalhaft verbunden2. Michael Kloepfer

1.1 Conscientização do problema ambiental e os documentos de organismos internacionais

O século XXI começou turbulento sob o ponto de vista ambiental: a intensa e descontrolada depredação ocorrida nas últimas décadas causou inúmeros danos, talvez irreversíveis, como o buraco na camada de ozônio, o efeito estufa, a desertificação de extensas áreas e o desmatamento de florestas e matas nativas. O capitalismo desenfreado, a ganância de sempre querer mais com o menor custo, a falta de controle e de instrumentos de fiscalização e os passos ainda lentos em que avança a implementação das leis ambientais são elementos que mostram o longo caminho a ser percorrido pelo homem para que encontre harmonia com o ambiente em que vive3.

Em meados do século XVIII, a partir da Primeira Revolução Industrial, a exploração dos recursos naturais pela atividade humana passou a ter conseqüências danosas, fragilizando o planeta ambientalmente. Nesse período, houve grandes avanços tecnológicos que mudaram drasticamente o modo de vida das pessoas: a indústria se expandiu, o carvão e a máquina a vapor forneceram combustível e energia para a produção em larga escala, sem contar com o grande aumento populacional4.

As duas Guerras Mundiais, especialmente a segunda, contribuíram não somente para a poluição, desmatamento, concentração de entulhos e uso indiscriminado dos recursos naturais, utilizados para a fabricação da estrutura bélica necessária, mas, também, representaram uma época em que qualquer propósito ambiental foi totalmente negligenciado. Por certo, foi o meio ambiente um grande perdedor desses conflitos, que não deixou de sofrer conseqüências, mesmo anos após a assinatura e a consolidação da paz.

Com o decorrer dos anos, a preservação da natureza e a busca de um meio ambiente ecologicamente equilibrado passaram a receber atenção de governos, consistindo em objeto de

2 O ser humano é (...) uma parte do seu meio ambiente e tem seu destino a ele ligado.

3 Neste sentido: MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio Ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 23-25.

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discussões legislativas. Além disso, grupos ambientais, pesquisadores, imprensa e emergentes organizações não-govenamentais tiveram um papel essencial na introdução do tema ecológico. Enfim, foi uma época marcada pelo aumento da conscientização ambiental na população.

Diante desse quadro, CANOTILHO sabiamente afirma que uma das qualidades do Estado de direito democrático-constitucional seria a de ser também um Estado ambiental (juntamente com o Estado de direito, o Estado constitucional, o Estado democrático e o Estado social). Perante a incapacidade das instituições e do Direito de evitar a degradação ambiental, ele discorre sobre a necessidade de a teoria da constituição compreender os novos conceitos da teoria social, incluindo o risco, a fim de que englobe as experiências das sociedades altamente industrializadas. As situações de risco provêm, muitas vezes, da irresponsabilidade das decisões tomadas, pautadas por critérios de injustiça ambiental, gerando situações danosas. Assim, o autor questiona, sob o prisma da teoria da constituição, a possibilidade de ela contribuir para a modernização reflexiva, seja a análise crítica do desenvolvimento científico-tecnológico, a desmonopolização do conhecimento (e sua democratização), inclusive no que tange aos efeitos secundários das decisões de risco, despriorizando a política a favor da ciência e da técnica, visando a uma escolha racional de decisões em situações de incerteza. O problema maior reside no ponto em que, diante da articulação de subsistemas científico, econômico, político e jurídico, é difícil para um esquema normativo-constitucional assegurar os procedimentos e instituições de uma democracia e de uma justiça de risco5.

Aliás, conforme bem entendem LEITE, PILATI e JAMUNDÁ6, define-se a sociedade de risco como sendo aquela que, devido ao crescimento econômico permanente, sem a adequação dos mecanismos jurídicos a fim de solucionar os problemas, pode vir a sofrer, a qualquer momento, as conseqüências de uma catástrofe ambiental. Apesar de haver a conscientização desse quadro pelo governo, não são desenvolvidas políticas de gestão, o que os autores denominam irresponsabilidade organizada.

5 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. reeimp. Coimbra: Almedina, 2003, p. 1354-1355.

6 LEITE, José Rubens Morato Leite; PILATI, Luciana Cardoso; JAMUNDÁ, Woldemar. Estado de Direito Ambiental no Brasil. In: KISHI, Sandra Akemi Shimada; SILVA, Solange Teles da; SOARES, Inês Virgínia Prado (Orgs.). Desafios do Direito Ambiental no Século XXI: estudos em homenagem a Paulo Affonso Leme Machado. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 611-612.

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Segundo SILVA7, devido a tal situação, inclusive à ocorrência de grandes desastres ecológicos, formou-se uma consciência ambientalista ou consciência ecológica, chamando a atenção das autoridades para essa problemática e demonstrando a necessidade da proteção jurídica do meio ambiente, com o combate pela lei de todas as formas de perturbação da qualidade de vida e do equilíbrio ecológico.

Diante disso, o Estado moderno deve criar mecanismos e implementar a defesa dos recursos naturais, especialmente os não-renováveis, intervindo na economia e limitando o exercício das atividades humanas em prol do bem-estar coletivo. Isso é responsabilidade de todos os Estados, não consistindo em uma faculdade, mas em um dever.

A partir do final do século XIX, inúmeros tratados, convenções, congressos, pesquisas e movimentos de conotação ambiental tiveram lugar em importantes centros do mundo industrializado, com o objetivo de discutir questões relativas ao meio ambiente e as precauções a serem tomadas visando ao bem-estar das gerações vindouras. Esse processo contínuo e longo pode-se chamar de internacionalização da idéia de proteção ambiental.

As primeiras mobilizações para defender bens ambientais visavam a proteger espécies de animais específicos com valor comercial8, imbuídas de interesses eminentemente utilitaristas e econômicos, considerando esses animais como mercadorias. Assim, não se buscava um ecossistema ecologicamente equilibrado, mas a preservação de bens de caráter patrimonial9.

Em 10 de dezembro 1948, foi adotada a Declaração Universal dos Direitos Humanos, com a aprovação de 48 Estados e a abstenção de 8. Sua importância para esse estudo resta no art. 19, pois prega que toda a pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão, incluindo a liberdade de ter opiniões e de procurar receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios.

A partir da década de 60, período marcado pela conscientização ambiental, iniciou-se a chamada era ecológica, impulsionando os países a estabelecerem normas acerca dos bens ambientais. Em 1968, a Assembléia Geral das Nações Unidas decidiu convocar (por meio da

7 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiente Constitucional. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 33. 8 Entre elas, a Convenção ocorrida em Paris, em 1902, que visava a proteger as aves úteis à agricultura.

9 MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio Ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 40-41; TEIXEIRA, Orci Paulino Bretanha. O Direito ao Meio Ambiente Ecologicamente Equilibrado como Direito Fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 27-28.

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Resolução nº 2.398) uma conferência mundial a respeito do ambiente, que veio a ser realizada em 1972, em Estocolmo, capital da Suécia10.

Dessa forma, da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, então realizada, resultou a Convenção de Estocolmo, com seus 26 princípios e 109 resoluções, que constituem um prolongamento da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948. Essa Convenção consiste na base da política ambiental internacional, sendo de extrema importância, pois a partir dela se estabeleceu que é obrigação de qualquer governo e preocupação primordial do mundo a proteção e melhora do meio ambiente11.

Dessa conferência resultou ainda o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA, organismo voltado para a preocupação com os problemas ambientais do planeta, sendo de alta relevância no debate perante os desafios ambientais, intervindo em três domínios: avaliação do meio ambiente, gestão do meio ambiente e medidas de sustentação.

De acordo com SILVA, abriu-se então o caminho para que as Constituições posteriores reconhecessem o meio ambiente ecologicamente equilibrado como um direito fundamental do homem, pois somente através da tutela do meio ambiente se assegurará a qualidade de vida. Os princípios estabelecidos pela Declaração de Estocolmo influenciaram os constituintes na elaboração do capítulo sobre o meio ambiente da Constituição Brasileira de 198812.

Conforme MEDEIROS13, estima-se que, após Estocolmo, mais de 300 tratados multilaterais, 900 tratados bilaterais e 200 outros textos de organizações internacionais tiveram lugar ocupando-se da proteção da biosfera, consagrando, desse modo, o processo de internacionalização da proteção ambiental. BARRAL e FERREIRA14 acrescentam que a interpretação da matéria ambiental foi no sentido de se incluir na pauta a questão do desenvolvimento, o que veio a se consolidar na definição de desenvolvimento sustentável.

Duas décadas após Estocolmo, foi realizada a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, também conhecida como Eco 92 ou Cúpula da Terra. O Rio

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MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio Ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 41.

11 KLOEPFER, Michael; unter Mitarb. von BRANDNER, Thilo. Umweltrecht. München: C.H. Beck´sche Verlagsbuchhandlung, 1998. p. 582.

12 SILVA, José Afonso da. Direito Constitucional Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2002.

13 MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio Ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 42-43.

14 BARRAL, Welber; FERREIRA, Gustavo Assed. Direito Ambiental e Desenvolvimento. In: BARRAL, Welber; PIMENTEL, Luiz Otávio (Orgs.). Direito Ambiental e Desenvolvimento. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2006, p. 26-27.

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de Janeiro foi escolhido para ser a sede desse evento sem precedentes, seguramente um dos mais importantes do ambientalismo internacional, com a participação de 178 países, 108 chefes de Estado, 2400 ONGs, cientistas e diplomatas. Buscavam-se meios de conciliar o desenvolvimento sócio-econômico e industrial com a conservação e proteção dos ecossistemas da Terra. Como resultado de onze dias de discussões, debates e tratativas foram estabelecidas a Agenda 21 e a Declaração do Rio sobre o Meio Ambiente, além da Declaração dos Princípios da Floresta, a Convenção sobre Mudanças Climáticas e a Convenção sobre a Diversidade Biológica.

A Agenda 21 é um programa de ação que objetiva um novo padrão de desenvolvimento ambientalmente racional e procura auxiliar os Estados na busca de soluções para diversos problemas ambientais. A Declaração sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento afirma, no primeiro Princípio, que os seres humanos têm direito a uma vida saudável e produtiva, em harmonia com a natureza. Ambas reafirmam a Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano (Declaração de Estocolmo).

No entanto, a Convenção de maior importância para o presente estudo é a Convenção sobre o Acesso à Informação, a Participação do Público no Processo Decisório e o Acesso à Justiça em Matéria de Meio Ambiente, mais conhecida como Convenção de Aarhus (Dinamarca). Foi realizada de 23 a 25 de junho de 1998, entrando em vigor em 30 de outubro de 2001. A União Européia, juntamente com 35 países, assinou o documento, com 22 artigos e 2 anexos, cujo fundamento consiste em que toda pessoa tem o direito de viver em um ambiente adequado para a sua saúde e bem-estar, permanecendo o dever, individual e coletivo, de preservação do meio ambiente para benefício da presente e das futuras gerações.

A Convenção de Aahrus, em seu art. 1º, afirma que “para contribuir para a proteção do direito de qualquer pessoa das presentes e futuras gerações a viver num ambiente adequado para o seu bem-estar, deverá ser garantido o seu direito de acesso à informação, à participação pública em processos decisórios e à justiça em matéria de meio ambiente”15. Trata-se de um direito humano e fundamental e, apesar de ser de caráter regional, serve de exemplo para muitos países, como base para adoção de normas em várias localidades16.

15 CONVENTION on Access to Information, Public Participation in Decision-making and Access to Justice in Environmental Matters, Aahrus, 25 jul 1998. Disponível em: <http://www.unece.org/env/pp/documents/cep43e.pdf>. Acesso em: 15 de jul. 2007.

16 FURRIELA, Rachel Biderman. A Lei Brasileira sobre Acesso à Informação Ambiental como Ferramenta para a Gestão Democrática do Meio Ambiente. Revista Brasileira de Direito Constitucional, no 3, jan/jun 2004, p. 286.

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1.2 A proteção ambiental na perspectiva jurídico-constitucional (interna) dos Estados

MEDEIROS17 esclarece que a universalização da consciência ecológica (conforme demonstrado no item anterior) levou a um processo de positivação nas constituições de normas atinentes à proteção ambiental, sem desfazer, contudo, o valor das normas infraconstitucionais, tendo em vista que são elas que sustentam e mantêm os princípios relativos à proteção do ambiente na Carta Magna.

De acordo com os ensinamentos de CANOTILHO, algumas constituições européias preocuparam-se com o direito do ambiente e outras com o direito ao ambiente, evitando, dessa forma, caracterizar o ambiente como direito subjetivo do cidadão18. De qualquer modo, ambos correlacionam-se, já que o direito à informação ambiental pode ser entendido tanto como direito ao ambiente, direito subjetivo do cidadão, como vertente do direito à informação, quanto direito do ambiente, pois é necessário o conhecimento das questões ambientais por parte da população, a fim de que haja uma efetiva proteção ambiental.

Em 1971, a Constituição da Bulgária foi a pioneira em positivar jurídico-constitucionalmente a conservação da natureza como dever do Estado e dos cidadãos, visando a salvaguardar, enfaticamente, as riquezas naturais da água, ar e solo19.

Na mesma década, a Constituição Portuguesa, de 1976, positivou o ambiente como direito fundamental do cidadão. Dois anos mais tarde foi a vez de a Espanha consagrar nos “princípios reitores da política social e econômica”, o direito de todos desfrutarem e o dever de conservarem o meio ambiente.

A Lei Fundamental alemã, com a emenda de 1994, inseriu o art. 20a, que dispõe explicitamente o dever de o Estado proteger os recursos naturais vitais e os animais frente às gerações futuras, por meio dos poderes legislativo, executivo e judiciário. No mesmo ano, a Constituição da Bélgica também reconhecia o direito à proteção de um meio ambiente sadio.

Conforme lembra BOSSELMANN20, a Suíça acrescentou em sua Constituição, após o plebiscito de março de 1992, o art. 24, que, ao discorrer sobre princípios da técnica e

17 MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio Ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 48-49.

18CANOTILHO, J. J. Gomes. Estudos sobre Direitos Fundamentais. Coimbra: Coimbra Editora, 2004, p. 178-179. 19 MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio Ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 48-49.

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manipulação de genes e reprodução, estabelece que deve ser observada a dignidade da criatura, leia-se de animais, de vegetais e de outros organismos.

No âmbito jurídico dos países latino-americanos, vale citar a Constituição da Argentina de 1853 que, a partir da reforma de 1994, previu, em seu art. 41, a preservação do meio ambiente, o uso racional dos recursos naturais, a preservação do patrimônio natural e cultural e da diversidade biológica, a informação e educação ambiental. Antes dela, porém, em 1980, 1983, 1991 e 1992, o Chile, o Equador, a Colômbia e o Paraguai, respectivamente, já haviam constitucionalizado o dever do Estado de preservar o ambiente21. Ainda nas Américas, o meio ambiente já foi abordado nas Constituições da Guiana (1980), Guatemala (1985), Nicarágua (1987), Cuba (1992), Uruguai (1996), Venezuela (1999) e México (reforma constitucional de 2000).

No Brasil, as constituições anteriores não se ocuparam expressamente do meio ambiente. Seria exceção a Constituição de 1967, que se referia, no art. 172, à ecologia. Pode-se sustentar, entretanto, que o assunto era abordado por meio de uma leitura abrangente de outros dispositivos, como o direito à vida, à dignidade da pessoa humana, à saúde, entre outros.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, coerente com o seu caráter participativo e democrático, seguindo forte impulso internacional, versou pela primeira vez diretamente sobre o tema e transformou o tratamento jurídico dado ao meio ambiente até então, reconhecendo-o como bem jurídico autônomo. Sua importância valeu o “Capítulo VI – Do Meio Ambiente no Título VIII – Da Ordem Social”. Ademais, há dispositivos esparsos ao longo da Carta que dispõem, direta ou indiretamente, sobre a tutela do meio ambiente22.

Entre eles, o inc. LXXIII do art. 5º da Constituição proclama que qualquer cidadão é parte legítima para impetrar ação popular destinada a anular ato lesivo ao ambiente; o inc. III do art. 129 permite ao Ministério Público promover ação civil pública para a proteção do ambiente; e o art. 225, mais importante dispositivo da constitucionalização do ambiente, afirma que todos têm direito ao ambiente ecologicamente equilibrado23.

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BOSSELMANN, Klaus. Ökologische Grundrechte: zum Verhältnis zwischen individueller Freiheit und Natur. Baden-Baden: Nomos Verlagsgesellschaft, 1998, p. 51.

21 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito à Informação e Meio Ambiente. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 81-82. 22 MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio Ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 62-63. Entre os dispositivos esparsos no decorrer da carta, referem-se implicitamente ao meio ambiente: art. 43, §§ 2°, inc. IV, e 3°; 40, incs. XIV e XVI; 91, § 1°, inc. III; 129, inc. III: 170, incs. II, III e VI; 174, §§ 3° e 4°. Ainda, referem-se explicitamente: art. 5°, inc. LXXIII (ação popular); art. 91, § 1°, inc. III (atribui ao Conselho de Defesa Nacional opinar sobre o efetivo uso das áreas indispensáveis à segurança do território nacional). 23 GAVIÃO FILHO, Anizio Pires. Direito Fundamental ao Ambiente. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 23 e 24.

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Chama a atenção o fato de que diversos países do leste europeu, que haviam passado várias décadas sob governos autoritários, adotaram em suas Constituições, tão logo inseridos no sistema democrático ocidental, o direito à informação ambiental. Nessa tessitura, estão a Constituição da Eslováquia de 1992 (art. 45), da Letônia de 1992 (art. 115), da Polônia de 1997 (art. 74), da Federação Russa de 1993 (art. 42) e a Constituição da Ucrânia de 1996 (art. 50-1). Essa postura generalizada é fruto, por certo, da reação de tantos anos sob regime no qual não havia liberdade de expressão e o acesso à informação era restrito e controlado, permitindo-se, então, em um segundo momento, o livre acesso à informação, inclusive à ambiental24.

No âmbito infraconstitucional brasileiro, as primeiras normas a tutelarem o meio ambiente são da década de 30 do século passado, mas ganharam impulso somente na década de 60 e se consolidaram nas de 80 e 90.

1.3 Ambiente ecologicamente equilibrado como direito e dever fundamental e como dimensão da dignidade humana e da vida

Há praticamente um consenso no que diz respeito ao reconhecimento de que o direito a um ambiente ecologicamente equilibrado está diretamente relacionado ao direito à vida, o direito base de todos os demais, já que é essencial para se desfrutar de uma vida digna, sadia e com qualidade. Nesse sentido, dentre tantos, adotam esse entendimento TEIXEIRA, MEDEIROS e SILVA25. Por essa razão, um ambiente ecologicamente equilibrado é considerado um direito fundamental, pois esse direito e o direito à vida são pressupostos recíprocos.

A primeira dimensão dos direitos surgiu como expressão do individualismo liberal do século XVIII que predominava em uma época em que se lutava por uma prestação negativa do Estado, ou seja, buscava-se antes uma abstenção do Poder Público do que uma intervenção. Correspondem aos direitos de liberdade, sejam os direitos civis e políticos, os primeiros a serem consolidados e presentes em qualquer Constituição da atualidade digna de ser assim chamada26.

Os direitos de segunda dimensão são os direitos sociais, culturais e econômicos, ligados prevalentemente ao princípio da igualdade (égalité) na sua dimensão material e provenientes da

24 Brevemente sobre o tema, Bosselmann discorre em BOSSELMANN, Klaus.Ökologische Grundrechte: zum Verhältnis zwischen individueller Freiheit und Natur. Baden-Baden: Nomos Verlagsgesellschaft, 1998, p. 49. 25 MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio Ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 109, 113; SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 58.

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ideologia antiliberal do século XX, dominando as Constituiçõs após a Segunda Guerra. Esses direitos exigem uma prestação do Estado, que deve oferecer aos cidadãos educação, assistência social, trabalho, saúde, enfim, preencher as necessidades básicas para o bem-estar social.

Já os direitos de terceira dimensão se assentam na solidariedade, cristalizando-se no final do século XX. São os direitos considerados difusos, emergidos da reflexão sobre questões como o desenvolvimento, a paz, o meio ambiente e o patrimônio comum da humanidade, tendo como destinatário o gênero humano. O cidadão é ao mesmo tempo titular desses direitos, bem como tem o dever, em comum esforço com o Estado, de defendê-los com os instrumentos que dispuser.

Há, ainda, quem sustente a existência de uma quarta dimensão de direitos fundamentais, que surgiu sob a influência do neoliberalismo e da globalização econômica. BONAVIDES27 sintetiza-os afirmando que consistem em direitos que concretizam uma sociedade “aberta ao futuro, em sua dimensão de máxima universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as relações de convivência”. Nesse rol inclui-se o direito à informação ambiental, bem como o direito à democracia (direta), à informação e ao pluralismo.

O legislador brasileiro legitima a proteção do meio ambiente com o fundamento da qualidade de vida e da dignidade humana. Essa noção de dignidade da pessoa humana variou historicamente, ao longo do tempo, conforme a cultura de cada povo. Diversos conceitos e pensamentos precederam o que hoje é tido como um direito fundamental, reconhecido no âmbito do direito positivo.

Atualmente, já se fala, além da dignidade do homem, na dignidade dos seres vivos. Nesse sentido, BOSSELMANN28 relaciona a dignidade do homem à da natureza. Segundo o autor, a dignidade do homem e a dignidade da natureza não são iguais. Essa última também não vai suprimir do homem a sua dignidade, pelo contrário, o reconhecimento da dignidade da natureza vai revalorizar a própria dignidade do homem, que assumirá um nível qualitativo mais alto. Complementa que toda dignidade do homem tem origem na dignidade da natureza.

Conforme os ensinamentos de SARLET, tendo em vista a época em que vivemos, pode se sustentar, antes da dignidade da pessoa humana, a dignidade da própria vida de um modo geral, pois o reconhecimento da proteção do meio ambiente como valor fundamental nos mostra que se deve, além da vida humana, preservar igualmente todos os bens naturais e as formas de vida

27 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 16. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 570-572. 28 BOSSELMANN, Klaus. Ökologische Grundrechte: zum Verhältnis zwischen individueller Freiheti und Natur. Baden-Baden: Nomos Verlagsgesellschaft, 1998, p. 89-90.

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existentes no planeta, mesmo se argumentando que tal proteção é, por fim, requisito da própria vida humana com dignidade29.

Há de se reconhecer que a qualidade do meio ambiente correlaciona-se diretamente com a dignidade da pessoa humana, já que nos dias atuais é inviável, perante o valor e o direito (formal e materialmente) constitucionalizado da necessidade de preservar os bens ambientais, pensar em uma vida digna sem um meio ambiente saudável.

SARLET30 enfatiza que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, consagrado no caput do art. 225 da Constituição, mesmo estando localizado fora do título dos direitos fundamentais, deve ser considerado como tal, tendo como objetivo o resguardo de uma existência digna do ser humano, na sua dimensão individual e social. Entende o autor que o art. 5º, § 2º, da Magna Carta estabelece um conceito materialmente aberto de direitos fundamentais, apontando para a existência de direitos fundamentais positivados em outras partes do texto constitucional, em tratados internacionais e, até mesmo, a possibilidade de se reconhecerem direitos fundamentais não escritos, implícitos nas normas do catálogo, bem como decorrentes do regime e dos princípios da constituição31.

Neste ponto, vale brevemente explanar a dupla fundamentalidade dos direitos fundamentais. Conforme Alexy, segundo CANOTILHO32, a fundamentalidade apresenta a proteção dos direitos em duplo sentido, formal e material. O primeiro, relacionado ao direito constitucional positivo, se caracteriza por serem, os direitos fundamentais, contidos no texto escrito da Constituição, possuindo a característica de se submeterem aos limites formais e materias de reforma constitucional33 e se constituindo em normas diretamente aplicáveis.

Por seu turno, a fundamentalidade material diz respeito aos direitos que são elementos constitutivos da Constituição material, isto é, ao analisar seu conteúdo, verifica-se que, apesar da

29 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. 5. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 34-35. No mesmo sentido: BOSSELMANN, Klaus. Ökologische Grundrechte: zum Verhältnis zwischen individueller Freiheti und Natur. Baden-Baden: Nomos Verlagsgesellschaft, 1998, p. 51.

30 SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 3. ed. rev., atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p. 74 e 128-129.

31 SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 3. ed., atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p. 74.

32 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. reeimp.. Coimbra: Almedina, 2003, p. 373. Nao mesmo sentido: SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 6. ed. rev., atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 88-89.

33 Os limites formais dizem respeito ao procedimento diferenciado (agravado) de reforma descrito na Constituição e os limites materiais às cláusulas pétreas (art. 60, § 4°, da CF), que não podem ser objeto de alteração.

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sua ausência expressa no rol dos direitos fundamentais, constituem decisões fundamentais sobre a estrutura básica do Estado e da sociedade. Assim, eles não estão obrigatoriamente ligados à fundamentalidade formal, pelo contrário, permitem a abertura da Constituição, como foi supra-referido, a outros direitos fundamentais não presentes em seu texto ou que se localizam fora do catálogo do art. 5º da Constituição (no caso da Carta Magna pátria)34.

Há diversas decisões de nosso Tribunal supremo que reconhecem a afirmação constitucional do direito fundamental ao meio ambiente. A decisão pioneira teve como relator o Ministro Celso de Mello, no Recurso Extraordinário n. 134297-8/SP, de 13 de junho de 1995, cujas partes eram o Estado de São Paulo contra Paulo Ramos. Nesse acórdão, conforme o relator:

Incumbe ao Poder Público o dever constitucional de proteger a flora e de adotar as necessárias medidas que visem coibir práticas lesivas ao equilíbrio ambiental. (...) Os preceitos inscritos no art. 225 da Carta Política traduzem a consagração constitucional, em nosso sistema de direito positivo, de uma das mais expressivas prerrogativas asseguradas às formações sociais contemporâneas. Essa prerrogativa consiste no reconhecimento de que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Trata-se de um típico direito de terceira geração que assiste, de modo subjetivamente indeterminado, a todos os que compõem o grupo social.(...) A proteção da flora e a conseqüente vedação de práticas que coloquem em risco a sua função ecológica projetam-se como formas instrumentais destinadas a conferir efetividade ao direito em questão.

Diante da sociedade de risco em que vivemos e o reconhecimento do direito fundamental a um ambiente ecologicamente equilibrado, surgiu, na década de 90, a noção abstrata do denominado Estado Socioambiental (ou Estado Ambiental de Direito ou Estado de Direito Ecológico35), isto é, além de ser um Estado de Direito, um Estado Democrático e um Estado Social, deve também modelar-se com um Estado Ambiental.

Cabe mencionar brevemente as variações de terminologia que, apesar de se assemelharem, possuem as suas peculiaridades. De acordo com BOSSELMANN36, que discorre sobre o modelo de um Estado de Direito Ecológico (ökologische Rechtsstaat), seria um Estado primeiramente delimitado por determinações governamentais que visam a suprir o déficit ecológico do Estado, a fim de encontrar possíveis soluções através de uma melhor proteção

34 Nesse sentido: MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio Ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 80; SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 6. ed. rev., atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 88-89; CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. reeimp. Coimbra: Almedina, 2003, p. 373-374.

35 BOSSELMANN, Klaus. Ökologische Grundrechte: zum Verhältnis zwischen individueller Freiheit und Natur. Baden-Baden: Nomos Verlagsgesellschaft, 1998, p. 47-53. e BOSSELMANN, Klaus. In Name der Natur: der Weg zum ökologischen Rechstsstaat, Bern: Scherz Verlag , 1992, p. 351-388.

36 BOSSELMANN, Klaus. Ökologische Grundrechte: zum Verhältnis zwischen individueller Freiheit und Natur. Baden-Baden: Nomos Verlagsgesellschaft, 1998, p. 47-50.

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ambiental, já que consiste em um Estado em que devem se realizar, além dos direitos humanos, também os direitos da natureza, afastando-se do antropocentrismo exagerado. Para que o Estado atual possa ter um papel ativo no mecanismo da conversão ecológica, ele precisa agir sob uma outra lógica, impulsionado pelos princípios ecológicos37.

O próprio autor diferencia o modelo por ele desenvolvido com o apresentado por Michael Kloepfer, o Estado Ambiental (Umweltstaat), em que deveriam haver mudanças sociais a fim de se adaptarem com as estruturas estatal e jurídica. O problema ecológico seria eminenentemente um problema organizacional. A tarefa principal seria a manutenção da liberdade individual e das estruturas estatais. KLOEPFER38 o define como um Estado, cujas decisões devam ser guiadas com o objetivo essencial de proteger o meio ambiente, consistindo em um estado estruturado sob a égide da Constituição, e seguindo os princípios de um Estado de Direito, democrático e social39. Por fim, conforme MOLINARO, um Estado Socioambiental e Democrático de Direito se preocupa primordialmente com o direito fundamental à vida e à manutenção das bases que a sustentam, o que inclui um ambiente ecologicamente equilibrado e saudável. Privilegia-se a existência de um mínimo existencial ecológico, expressão material da dignidade da pessoa humana40. Para o autor, o disposto no art. 225 da Carta Constitucional não deixa dúvidas de que o nosso Estado pode assim ser caracterizado: socioambiental e democrático de direito41.

À primeira vista, a concretização desse Estado-modelo parece um tanto utópica, tendo em vista o mundo em que vivemos, marcado por desigualdades sociais e pela degradação em escala planetária, onde a produção de capital e o consumo em massa antagonizam com os recursos naturais, que se esgotam gradativamente. Porém, a discussão sobre esse Estado de Direito deve entendê-lo como um parâmetro a ser atingido, mesmo que a superação da crise ambiental esteja ainda longe de ser alcançada. Dessa maneira, haverá uma mobilização política e econômica cada vez mais ativa, notória e incentivadora.

37

BOSSELMANN, Klaus. In Name der Natur – Der Weg zum ökologischen Rechsstaat. Bern: Scherz, 1992, p. 352 38 KLOEPFER, Michael; unter Mitarb. von BRANDNER, Thilo. Umweltrecht. München: C.H. Beck´sche Verlagsbuchhandlung, 1998.

39 Nota-se que o autor se refere à sua realidade social e política, seja à Lei Fundamental alemã e a República Federal da Alemanha, que nos permite compreender a idéia de Estado Ambiental.

40 MOLINARO, Carlos Alberto. Racionalidade Ecológica e Estado Socioambiental e Democrático de Direito. 2006. 198 f. Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2006, p. 102.

41 MOLINARO, Carlos Alberto. Direito Ambiental: proibição de retrocesso. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 103.

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2 O DIREITO À INFORMAÇÃO AMBIENTAL NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

Information für den Bürger, denn “Wissen ist Macht42 Katja Bratrschovsky

2.1 Conceito e importância de informação ambiental

Foi somente no século XX que o direito à informação passou a ter um caráter de direito subjetivo do cidadão, em que os vínculos existentes entre informação e poder tornaram-se cada vez mais gritantes, demonstrando que constitui um direito tanto perante os meios de comunicações quanto perante o Poder Público, como forma de realizar os preceitos de uma democracia.

No sábio e tão citado ensinamento de CANOTILHO43, o direito à informação tem três níveis: o direito de informar, ou seja, a liberdade de transmitir ou comunicar informações a outrem; o direito de se informar, liberdade de buscar as informações e não ser impedido para tanto; e o direito de ser informado, a versão positiva do direito de se informar, ser mantido informado pelos meios de comunicações disponíveis e pelos poderes públicos.

O direito à informação possui assento em vários dispositivos constitucionais, entre eles no rol do art. 5º. O inciso XIV prevê que “é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”. Em sentido semelhante, o inciso XXXIII refere que os cidadãos “têm direito de receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral”, ressalvadas as situações determinadas (aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado)44.

Para SILVA45, esse direito do inc. XXXIII do art. 5º da Magna Carta é o de receber informações requeridas e formuladas perante os órgãos públicos, correspondendo aos mesmos a obrigação de satisfazê-lo no prazo que a lei estabelecer. Se não o fizer, a autoridade estará sujeita

42 Informação para os cidadãos, pois “saber é poder”. BRATRSCHOVSKY, Katja. Wissen ist Macht – Auch im Umweltschutz – Zugang zu Umweltinformationen in Europa. In: EISENBERGER, Iris et al. (Orgs.). Festschrift für Bernd-Christian Funk zum 60. Geburstag. Wien: Springer Verlag, 2003, p. 4.

43 CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital. Constituição da República Portuguesa Anotada. 3. ed. rev. Coimbra: Coimbra Editora, 1993, p. 225-226.

44 O direito genérico à informação está previsto em várias constituições, como, por exemplo, na Constituição da Colômbia (art. 20), do México (art. 6º), da Espanha de 1978 (art. 105), de Portugal de 1976 (art. 268), da Grécia de 1975 (art. 10), entre outras.

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à pena de responsabilidade (e não crime de responsabilidade), que é de natureza administrativa, consistente na falta de cumprimento de obrigação legal.

O direito de acesso às informações públicas decorre do princípio da publicidade ou da transparência administrativa, previsto no art. 37 da Carta Constitucional, permitindo que seja exercido um controle social dos atos da Administração, bem como seja proporcionada maior eficácia à participação pública na gestão estatal, tornando possível para o cidadão melhor entender os atos burocráticos. Somente por meio desse instrumento é possível a realização da democracia participativa, prevista no art. 1º da Constituição Federal.

Além desses dispositivos, lembra FREITAS46 que o princípio da publicidade também se encontra desdobrado no art. 5º, inc. LXXII, que introduziu o habeas data a fim de assegurar ao impetrante o conhecimento ou retificação de informações relativas à sua pessoa constantes em registros ou banco de dados de entidades governamentais ou de caráter público. De igual maneira, o inc. LX do mesmo artigo prega que o princípio deve se aplicar aos atos processuais administrativos, podendo ser passível de restrições somente quando a defesa da intimidade ou o interesse social exigirem.

Nesse ínterim, conforme os sábios ensinamentos de KLOEPFER, sem suficientes informações sobre as condições do meio ambiente e as causas dos danos ambientais, não será possível implantar uma política ambiental efetiva. Com o aumento do conhecimento-base e o aperfeiçoamento do mesmo sobre o estado do meio ambiente, a necessidade de informações do Estado também aumentou. Da mesma forma, o cidadão precisa de informações suficientes para que tenha um comportamento ecologicamente correto (umweltbewusst). Complementa o autor que, até o momento, o fator de prevenção informação foi contemplado, na República Federal da Alemanha, muito rigorosamente quanto aos limites legais47.

Tendo em vista os documentos internacionais já elencados, é inegável o elo entre o meio ambiente e o direito de ser informado, permitindo ao cidadão opinar, pronunciar-se e, o mais relevante: formar uma consciência ambiental nas pessoas. Somente dessa forma, o cidadão pode manifestar-se por meio dos instrumentos disponibilizados pelo Estado, sejam administrativos ou judiciais, assegurando a eficácia dos seus direitos constitucionalmente protegidos.

46 FREITAS, Juarez. O Controle dos Atos Administrativos e os Princípios Fundamentais. 3. ed., rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 56-58.

47 KLOEPFER, Michael, unter Mitarb. Von BRANDNER, Thilo. Umweltrecht. München: C. H. Beck´sche Verlagsbuchhandlung, 1998.

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Conforme lição de MACHADO48, é direito do cidadão receber não somente aquelas informações referentes a acidentes e catástrofes ambientais, mas, sim, toda e qualquer informação recebida pelos órgãos públicos, excetuando-se aquelas que envolvam comprovadamente segredo industrial ou de Estado. Evita-se, dessa forma, que a transmissão de dados ocorra somente quando o prejuízo já tenha ocorrido.

Os destinatários da informação são tanto a Administração Pública quanto os cidadãos. Deve haver uma constante troca de informações ambientais entre todos os atores da sociedade, mesmo que o Poder Público seja o maior gerador e provedor dessas informações. Somente um acesso facilitado à grande quantidade de informações, seja a nível nacional ou internacional, permitirá um maior engajamento de todos, sociedade e Administração, em uma solução viável para os problemas ambientais49.

Encontra-se subsídio do direito à informação (especificamente) ambiental em vários documentos internacionais, bem como na legislação nacional. A Declaração de Estocolmo, em seus Princípios 19 e 20, reconhece pela primeira vez o significado da informação para a opinião pública e para haver uma relação responsável entre o homem e o ambiente. Posteriormente, a Agenda 21 e a Declaração do Rio sobre o meio Ambiente também apresentarão dispositivos reafirmando a importância da informação.

Essas Declarações internacionais não são auto-aplicáveis, já que pertencem à categoria da soft law, não tem força cogente e os Estados não estão obrigados a cumprir, porém servem como indicadores e referência para a produção normativa e o desenvolvimento da legislação ambiental internacional e interna de cada país.

Para que a população possa agir antes que o dano exista, é preciso ter o conhecimento do que e de como se prevenir. São necessárias pesquisa, informação organizada e educação para que se possa evitar a degradação ambiental e formar pessoas com consciência ambiental, cientes das necessidades do meio ambiente. O Estado não pode exigir dos cidadãos o zelo necessário, se eles não são devidamente instruídos no decorrer de seu crescimento educacional para que tenham esse posicionamento diligente.

48 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 13. ed. rev. atual. ampl.. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 88.

49 FURRIELA, Rachel Biderman. A Lei Brasileira sobre o Acesso à Informação Ambiental como Ferramenta para a Gestão Democrática do Meio Ambiente. Revista Brasileira de Direito Constitucional, no 3, jan/jun 2004, p. 283-284.

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A participação sem a informação adequada não é eficaz. Depreende-se que a participação ambiental somente se completa com a informação e a educação ambiental. As informações e dados transmitidos, por sua vez, não podem ser fornecidos de qualquer maneira, ao capricho de quem os transmite. Devem ser adequados e respeitar algumas qualidades e características básicas, como de serem verazes, contínuos, tempestivos e completos.

Outros requisitos essenciais da informação são: tecnicidade, compreensibilidade, tempestividade, imprescindibilidade em situação de emergência e desnecessidade de interesse pessoal do informado50.

Apesar de ser inegável a relevância do princípio do direito à informação ambiental como instrumento do cidadão de controle social do poder e pressuposto da participação popular (já que permite interferir nas decisões governamentais), há a necessidade de efetivar esse acesso à informação, de forma a torná-la realmente acessível às pessoas, estabelecendo procedimentos, instâncias, prazos, formas, sistematização, organização e padronização de bancos de dados para que se torne plenamente um mecanismo de participação popular. Não se pode negar que as primeiras atitudes por parte do nosso governo já foram tomadas, como é o caso da Lei 10.650/2003, porém, ainda falta muito para alcançar esse ideal51.

2.2 A legislação brasileira e o direito à informação ambiental

A Lei 6.938/198152 introduz a Política Nacional do Meio Ambiente53 – PNMA – que tem como princípio básico a importância do Estado na manutenção do equilíbrio ecológico. Com ela, há um tratamento global e unitário à defesa da qualidade do meio ambiente no país.

Essa Lei também institui o SISNAMA – Sistema Nacional do Meio Ambiente, um conjunto de órgãos, entidades, regras e práticas, formado por órgãos e entidades da União, Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios, bem como fundações instituídas pelo Poder Público, que são responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental, conduzindo a

50 MACHADO, Paulo Affonso, Leme. Direito à Informação e Meio Ambiente. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 91-95 51 GRAF, Ana Cláudia Bento. O Direito à Informação Ambiental. In: FREITAS, Vladimir Passos de (Coord.). Direito Ambiental em Evolução. Curitiba: Juruá, 1998, p. 12.

52 SILVA acrescenta que a referida lei tem fundamento no art. 8º, XVII, “c”, “h” e “i”, da Constituição de 1969, que conferiam à União o poder de legislar e que na atual Constituição esse dispositivo está contido nos arts. 22, inc. IV, 24, inc. VI e VIII, e 225.

53 MEDAUAR, Odete. Coletânea de Legislação Ambiental e Constituição Federal. 3 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dosTribunais, 2004, p. 705-714.

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política ambiental da administração pública brasileira. A razão de sua existência consiste na capacidade de interligar as diversas instituições que o integram54.

O CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente – é um órgão deliberativo e consultivo do SISNAMA, que seria o assessor do Conselho de Governo (se ele existisse). Sua composição expressa amplo espectro dos segmentos da sociedade civil, incluindo representantes de associações ambientalistas, representantes de povos indígenas e tradicionais. As resoluções emanadas desse órgão possuem caráter normativo, impondo-se em todo o país.

O Ministério do Meio Ambiente seria o órgão central, cuja área de competência consiste na Política Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos, bem como a política de preservação, conservação e utilização sustentável dos ecossistemas, proposição de estratégias, mecanismos e instrumentos econômicos e sociais para a melhoria da qualidade ambiental e do uso sustentável dos recursos naturais, entre outros55.

O órgão executor é o IBAMA – Instituto Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis, entidade autárquica de regime especial, dotada de personalidade jurídica de Direito Público e que possui autonomia administrativa e financeira. Entre as suas principais atribuições, deve formular, coordenar e executar a Política Nacional do Meio Ambiente, assim como preservar, conservar, fiscalizar, controlar e fomentar os recursos naturais renováveis.

Por fim, instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente (art. 9°, inc. VII, da Lei 6.938/1981) muito interessante para o presente trabalho é o SINIMA – Sistema Nacional de Informação sobre Meio Ambiente (regulamentado pelo Decreto 99.274/1990), responsável pela gestão da informação ambiental no âmbito do SISNAMA, de acordo com os princípios e a lógica da gestão ambiental. Possui como objetivo a sistematização de informações necessárias para apoiar o processo de tomada de decisão na área ambiental em todos os níveis. No que tange ao SISNAMA, esse sistema possibilita ao Estado coordenar a coleta, a produção, o processamento, o arquivamento, a organização, a atualização, a utilização e a difusão pela sociedade, de informações de cunho ambiental e também daquelas correlatas à matéria, como de aspectos sociais, econômicos, de saúde pública, entre outros56. No entanto, na prática, o SINIMA ainda

54 MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente: doutrina – jurisprudência – glossário. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 39-40.

55 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 5. ed.. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 224-225.

56 Site do Ministério do Meio Ambiente . Disponível em:

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não atingiu seu êxito maior, não logrando proporcionar aos órgãos ambientais e à coletividade todos os benefícios vislumbrados pelo legislador57.

A própria Lei 6.938/1981 prevê, em seu art. 4º, inciso V, a “difusão de tecnologias de manejo do meio ambiente, a divulgação de dados e informações ambientais e a formação de uma consciência pública sobre a necessidade de preservação da qualidade ambiental e do equilíbrio ecológico”. Ademais, o art. 6º, §3º, afirma que os órgãos central, setoriais, seccionais e locais do Sistema Nacional do Meio Ambiente devem fornecer os resultados das análises efetuadas e sua fundamentação, quando solicitados por pessoa legitimamente interessada.

O art. 9º da mesma lei estabelece os instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, inclusive, nos incisos VII, X e XI, respectivamente, o sistema nacional de informações ambientais, a instituição do Relatório de Qualidade do Meio Ambiente (que deve ser divulgado anualmente pelo IBAMA) e a garantia da prestação de informações relativas ao meio ambiente, obrigando-se o Poder Público a produzi-las, quando inexistentes. Por fim, o pedido de licenciamento de obras ou atividades efetiva ou potencialmente poluidoras, tal como sua renovação ou concessão, devem ser publicados no Diário Oficial do Estado e em outro jornal regional ou local de grande circulação, de acordo com o disposto no art. 10, §1º, dessa lei.

Não há dúvidas, portanto, como bem acentua MACHADO58, de que no Brasil a informação é parte integrante das atividades da Administração Pública, tanto no sentido geral de que a população deve estar informada, como no sentido mais específico, de que o Poder Público deve fiscalizar e controlar os empreendimentos das pessoas físicas, jurídicas, privadas e públicas.

O Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EIA), contido no art. 225 da Carta Magna, é também um viés importante da informação ambiental, já que consiste no procedimento que precede o deferimento ou indeferimento da autorização ou licenciamento ambiental. Esse instrumento somente será implantado de forma satisfatória no momento em que a própria Administração Pública estiver informada e organizada.

Flavia Tavares Rocha. A Implementação do Direito à Informação Ambiental. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, ano 9, no 34, abr/jun 2004, p. 204-205.

57 LOURES, Flavia Tavares Rocha. A Implementação do Direito à Informação Ambiental. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, ano 9, no 34, abr/jun 2004, p. 205.

58 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito à Informação e Meio Ambiente. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 100-101.

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Nesse contexto, a lei mais notória para o presente estudo é a Lei 10.650/200359. Inspirada pela Convenção de Aarhus, ela dispõe sobre o acesso público aos dados e informações existentes nos órgãos e entidades integrantes do SISNAMA. Proveniente do Projeto de Lei no 4.649/1998, dois de seus dez artigos foram vetados pelo Presidente da República. Além de tratar do acesso e fornecimento às informações ambientais, ela também determina (art. 4º) a obrigatoriedade da publicação de determinadas questões no Diário Oficial da União60. O art. 2º enfatiza oito áreas do meio ambiente sobre as quais devem ser fornecidas as informações requisitadas, mas não é uma lista exaustiva, pois o conceito de meio ambiente deve ser buscado na Lei 6.938/1981, que é mais abrangente.

Pergunta-se, assim, que espécies de informações são abrangidas pela Lei 10.650/2003? Conforme o pensamento de MACHADO61, a lei seria incompleta, pois se limita a conceder o acesso a dados e informações existentes, ao passo que a Constituição Federal é mais ampla no seu art. 5º, inc. XXXIII, afirmando que “todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral”, não se limitando às existentes. Até mesmo o art. 9º, inc. XI, da Lei 6.938/1981, como já citado, havia estabelecido, quatorze anos antes (tendo em vista que o inciso XI foi acrescentado pela Lei 7.804/1989), que o Poder Público deve prestar as informações ambientais, obrigando-se a produzi-las quando inexistentes.

O Poder Público tem o dever de sempre informar aquilo que lhe compete controlar ou fiscalizar, não se admitindo desculpas por parte da administração de que não possui certa informação, sob pena de ser conivente com os poluidores, pelo fato de não saber e, por isso, não informar.

Faz parte do direito à informação ambiental o acesso às informações, que, diferentemente da publicidade, transmitida independentemente de solicitação, deve ser requerido, fruto da vontade daquele que o almeja. Assim, a lei estabelece que o público deve ter acesso aos documentos, expedientes e processos administrativos (ou qualquer procedimento isolado contido

59 MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 10. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 759-760.

60 Sejam: I – pedidos de licenciamento, sua renovação e a respectiva concessão; II – pedidos e licenças para supressão de vegetação; III – autos de infrações e respectivas penalidades impostas pelos órgãos ambientais; IV – lavratura de termos de compromisso de ajustamento de conduta; V – reincidências em infrações ambientais; VI – recursos interpostos em processo administrativo ambiental e respectivas decisões; e VII – registro de apresentação de estudos de impacto ambiental e sua aprovação ou rejeição.

61 MACHADO, Paulo Affonso, Leme. Direito à Informação e Meio Ambiente. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 204-205.

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nesse processo) de matéria ambiental, i.e., se requeridos, e quando não salvaguardados por motivo que autoriza o sigilo, devem ser fornecidos ao cidadão, mesmo que sob vigilância de um agente da Administração Pública.

A lei, em seu art. 2o, prega que qualquer informação, seja em meio escrito, visual, sonoro ou eletrônico, deve ser fornecida pelos órgãos da Administração Pública (direta, indireta ou fundacional) integrantes do SISNAMA. MACHADO62 critica a redação do artigo na expressão sob sua guarda, pois deixaria espaço para a passividade e inércia da Administração Pública como órgão informador.

O mesmo artigo ainda comenta que o requerente da informação não precisa comprovar interesse específico. Tal dispositivo caracteriza-se por ser um direito fundamental dos indivíduos (art. 5º, inc. XXXIII, da Constituição Federal), bem como conseqüência lógica dos fatos, já que se trata de direitos e interesses difusos. Entretanto, o artigo complementa que o requerente deve assumir duas obrigações, seja a de não utilizar os dados colhidos para fins comerciais e a de citar as fontes, caso venha a divulgá-los.

O art. 3º da Lei estabelece que para bem atender as disposições da mesma, o Poder Público pode exigir a prestação periódica de informação perante as entidades privadas, independentemente da existência ou necessidade de instaurar um processo administrativo.

O art. 5º da mesma norma jurídica diz respeito ao indeferimento da requisição de informações ou pedido de consulta a processos administrativos que devem ser devidamente motivados, sujeitas ainda a recurso hierárquico.

2.3 Limites ao direito à informação ambiental e a jurisprudência brasileira

O direito à informação propriamente dito não é absoluto, sendo autorizado o indeferimento de um pedido de dados se a situação for protegida na lei e permitir a exceção. Essas limitações serão válidas para o direito à informação ambiental, por isso é oportuno citá-las brevemente.

O art. 5° da Constituição Federal, em quatro de seus incisos, preserva-se a inviolabilidade de bens jurídicos específicos. Quando o direito à informação ambiental antagonizar com um

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desses direitos, deve-se analisar o caso concreto, equilibrando os interesses e as pretensões opostas, para que se verifique qual prepondera na situação.

São os bens jurídicos dispostos nos incisos X (intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação), XII (sigilo da correspondência, das comunicações telegráficas, bem como dados e comunicações telefônicas), XXIX (propriedade intelectual) e o inciso XXXIII (sigilo imprescindível à segurança da sociedade e do Estado). Nesses casos, o sigilo há de predominar sobre a publicidade, a fim de preservar esses direitos declarados invioláveis.

Além dessas exceções que tocam direitos fundamentais do cidadão, há ainda a garantia do segredo industrial ou comercial propriamente dito, que são assegurados pela legislação, sendo devidamente delineados. Os documentos mais importantes são: Acordo dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionado ao Comércio, Lei 9.279/1996 – Lei sobre direitos da propriedade industrial63, Lei 10.603/200264 – Lei sobre a proteção de informação não divulgada submetida para a aprovação de comercialização de produtos, Lei 11.111/200565 – Lei sobre o segredo de Estado.

As legislações, pertinentemente, delimitam as áreas protegidas pelo sigilo para que não se caracterize invasão da privacidade ou violação de direitos das pessoas, das famílias e das empresas. De forma similar, a Lei 10.650/2003 dispõe em seu art. 2°, §2°, sobre o sigilo comercial, industrial, financeiro ou qualquer outro sigilo protegido por lei, como também o relativo às comunicações internas dos órgãos e entidades governamentais.

Jurisprudência

Lamenta-se não terem sido encontrados exemplos mais adequados de jurisprudência no que tange ao acesso à informação ambiental propriamente dita ou à Lei 10.650/2003 (talvez pelo fato de ser uma lei ainda recente). No entanto, há ampla jurisprudência no Brasil sobre a importância de um ambiente ecologicamente equilibrado, reconhecido como direito fundamental. Consoante o exposto, o Tribunal maior do nosso país afirmou e reconheceu o direito fundamental à preservação do meio ambiente em diversos decisões. Um dos meios para dotar de

63 Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Leis/L9279.htm>. Acesso em: 15 ago. 2007.

64 Disponível em:

http://www.desenvolvimento.gov.br/arquivo/sti/proAcao/proTecnologica/proIntelectual/lei10603.pdf. Acesso em: 16 ago. 2007.

65 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11111.htm. Acesso em: 16 ago. 2007.

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eficácia jurídica a afirmação constitucional da preservação do meio ambiente, para essa e para as gerações vindouras, está associado diretamente ao direito e ao dever da informação ambiental e tudo que deles decorre, seja a ampla divulgação sobre o tema e a formação de uma sociedade ambientalmente consciente.

Vale citar o acórdão do Tribunal de Justiça referente à Apelação Crime no 70008278897, na qual o réu havia danificado floresta de preservação permanente, cortando um número significativo de espécies nativas com o auxílio de moto-serra sem licença da autoridade de proteção ambiental. O réu alegou desconhecimento das regras, ou seja, erro de proibição e ausência de dolo. Foi decidido por unanimidade que ele não poderia alegar tal circunstância, já que tem havido ampla divulgação sobre a preocupação ambiental e a necessidade de preservação, principalmente no meio rural. Nota-se que se vislumbra no caso a importância de ter havido ampla informação, afastando o argumento do réu. Se houve informação, o que de fato ocorre em certos meios, não há justificativa ao causar danos. A informação é o início da preservação.

Ademais, é interessante apresentar a decisão da Apelação Cível do Processo 200072010011086, do TRF da 4ª Região, cuja relatora, Vânia Hack de Almeida, comenta sobre a audiência pública. O autor requereu a nulidade de uma audiência pública destinada à apreciação do Estudo de Impacto Ambiental que cuidava da construção de terminal portuário no município de Itapoá, em Santa Catarina. Ao não dar provimento, a relatora ressaltou a importância e o objetivo da audiência, afirmando que a mesma é o real instrumento de informação ao público, pois convida a comunidade a se manifestar sobre o empreendimento, consistindo em meio legítimo de enfrentamento das questões sociais. A importância de informar o público é mais uma vez ressaltada.

Referências

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