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Síndromes clínico-radiológicas de COVID-19 em doentes de cuidados intensivos com testes PCR negativos

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Academic year: 2021

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Mestrado integrado em Medicina

Síndromes clínico-radiológicas de COVID-19

em doentes de cuidados intensivos com

testes PCR negativos

Estefânia Valéria Vargas Ferreira

M

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Dissertação de candidatura ao grau de Mestre em Medicina, submetida ao Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar – Universidade do Porto

Síndromes clínico-radiológicas de COVID-19 em doentes de cuidados intensivos com testes PCR negativos

Estudante:

Estefânia Valéria Vargas Ferreira 6º ano de Mestrado Integrado em Medicina do ICBAS-CHP Nº de Aluno: 201504803 Endereço eletrónico: estefânia_95_leao@hotmail.com

Orientador:

Miguel Tavares Assistente graduado de medicina interna no Centro Hospitalar Universitário do Porto Professor convidado do ICBAS- CHP

Coorientador:

Álvaro Moreira da Silva Assistente graduado Sénior de Cuidados Intensivos- Centro Hospitalar Universitário do Porto

Professor Catedrático Convidado do ICBAS-CHP

Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar Universidade do Porto

Rua de Jorge Viterbo Ferreira, n.o 228, 4050-313 Porto, Portugal

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Dissertação de candidatura ao grau de Mestre em Medicina, submetida ao Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar – Universidade do Porto

Síndromes clínico-radiológicas de COVID-19 em doentes de cuidados intensivos com testes PCR negativos

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Dedicatória

Ao João e à Jéssica que são os meus rochedos e sem os quais não me encontraria a terminar o curso neste momento.

À residência universitária e à tuna feminina do orfeão que me deram pessoas excelentes que encheram este percurso de 6 anos de cor.

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Agradecimentos

Gostaria de agradecer primeiramente ao meu orientador, o dr. Miguel Tavares pelos conhecimentos transmitidos em cuidados intensivos, em COVID-19 e por me facultar centenas de artigos que culminaram na realização deste projeto.

Ao meu co-orientador, o Doutor Álvaro Moreira da Silva sem o qual este trabalho não poderia ser realizado.

Por último, ao engenheiro João Santos pela ajuda na realização das tabelas e gráficos e na análise dos resultados colhidos.

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Resumo

Introdução: A 31 de Dezembro de 2019, a OMS reportou uma série de casos de pneumonia viral de causa desconhecida em Wuhan, na província de Hubei, na China, causados por um novo coronavírus, posteriormente denominado SARS-CoV-2 (Severe Acute Respiratory Coronavirus 2) e a doença causada por ele de COVID-19 (coronavírus disease 2019). 1 A doença severa que requer internamento em cuidados intensivos (CI) ocorre em cerca de 5% dos doentes infetados. Os coronavírus podem causar doença sistémica com envolvimento multiorgânico onde as manifestações respiratórias e trombóticas são predominantes. As alterações laboratoriais mais frequentemente encontradas nos doentes infetados com SARS-CoV-2 são elevação da ferritina sérica, linfopenia e elevação dos D-dímeros. 2 As anomalias mais frequentes encontradas na TAC torácica de doentes com COVID-19 são as opacidades em vidro despolido. O atingimento pulmonar mais visto nos doentes com COVID-19 é bilateral, com distribuição periférica, subpleural e difusa. 2 3 O critério diagnostico para COVID-19 é o RT-PCR positivo preferencialmente por zaragatoa nasofaríngea. Foram descritos alguns doentes com pneumonia por COVID-19 com resultados negativos de múltiplos RT-PCR antes de terem confirmação laboratorial. 4 Testes falsamente negativos podem ocorrer em 20 a 67% dos doentes. 2

Objetivos: Descrever características demográficas, clínicas, laboratoriais e radiológicas compatíveis com COVID-19 em doentes com teste RT-PCR negativo e comparar com aquilo que se encontra na literatura dos doentes com diagnóstico confirmado de COVID-19.

Metodologia: Estudo retrospetivo de todos os doentes que tinham estado internados em cuidados intensivos no período de 1 de março de 2020 a 31 de agosto de 2020, altura em que o serviço estava dedicado a doentes não-COVID, e que tinham teste PCR negativo. A amostra inicial continha 209 doentes. Os doentes selecionados para este estudo foram os doentes com clínica compatível com a doença COVID-19, com imagem de tórax sugestiva e dados laboratoriais compatíveis.

Resultados: Foram identificados 9 doentes com caraterísticas clínicas, laboratoriais e imagiológicas compatíveis com COVID-19, mas com teste RT-PCR persistentemente negativo que são descritos abaixo.

Conclusões: Quando estamos perante um caso que seja provável apesar do primeiro teste PCR ser negativo, o teste deve ser repetido e a tomografia computarizada (TC) como método complementar pode aumentar a sensibilidade do teste PCR. Os valores de d-dímeros, ferritina e linfócitos devem ser pedidos em doentes com suspeita desta infeção. Apesar de compatíveis com COVID-19, estes achados não são específicos podendo ser encontrados noutras patologias. A ausência de histologia por biópsia pulmonar limita o diagnóstico.

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Palavras-chave:

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Lista de abreviaturas

OMS- organização mundial de saúde

SARS-CoV-2- severe acute respiratory syndrome coronavirus 2 COVID–19- coronavirus disease 2019

ARDS- acute respiratory distress syndrome AST- aspartate transaminase

ALT- Alanina aminotransferase

RT-PCR- reverse transcriptase polymerase chain reaction CI- Cuidados Intensivos

CHUP- Centro Hospitalar Universitário do Porto PAC- Pneumonia adquirida na comunidade BSTI- The British Society of Thoracic Imaging TSR- Técnica de Substituição Renal

SIRS- Síndrome da resposta inflamatória sistémica TC- Tomografia computorizada

AngioTC- angiotomografia computorizada

TC TAP- tomografia computorizada toraco-abdomino-pélvica TP- tempo de trombina

aPTT- tempo de tromboplastina parcial SU- Serviço de Urgência

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Índice

Agradecimentos ... v

Resumo ... vi

Lista de abreviaturas ... viii

Lista de tabelas ... xi Lista de figuras ... xi Introdução ... 1 Objetivos ... 9 Metodologia ... 9 Colheita de dados ... 9 Resultados ... 10

Descrição dos casos ... 10

Discussão ... 22

Conclusões ... 29

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Síndromes clínico-radiológicas de COVID-19 em doentes de cuidados intensivos com testes PCR negativos

Autores e instituições

Estefânia Ferreira Miguel Tavares 1,2

Álvaro Moreira da Silva 1,2 1. HSA, CHUP 2. ICBAS

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xi Lista de tabelas Tabela I ……… 31 Tabela II ……….. 32 Tabela III ………. 33 Tabela IV ………. 34 Lista de figuras Figura 1 ….……….. 35 Figura 2 .……….. 36 Figura 3 a 11 ………. 37

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Introdução

A 31 de dezembro de 2019, a OMS declarou uma série de casos de pneumonia viral de causa desconhecida em Wuhan, na província de Hubei, na China. A 7 de janeiro de 2020, foi confirmado que estes casos eram causados por um novo coronavírus, posteriormente denominado SARS-CoV-2 (Severe Acute Respiratory Coronavirus 2) e a doença causada por ele de COVID-19 (coronavirus disease 2019). 1 Os primeiros 2 casos de COVID-19 confirmados em Portugal foram no dia 2 de março de 2020, em dois homens de 60 e 33 anos provenientes de Itália e Espanha, respetivamente. Desde então o número de casos e mortes pela doença aumentou exponencialmente, sendo um grave problema de saúde pública no nosso país. A 11 de Março de 2020, a epidemia de COVID-19 atingiu o nível de uma pandemia com mais de 118 mil casos de infeção em 114 países e 4.291 mortes. A 4 de Junho 2021, a doença já atingiu mais de 172 milhões de doentes e já causou mais de 3.7 milhões de mortes.

A transmissão do vírus é feita pela inalação de gotículas em aerossol através do contacto próximo com pessoas infetadas pelo vírus SARS-CoV-2 (transmissão direta) ou através do contacto com superfícies e objetos contaminados (transmissão indireta). 2 A carga viral no trato respiratório superior parece atingir o pico perto da altura do aparecimento dos sintomas e a sua excreção começa 2 ou 3 dias antes do aparecimento dos mesmos. A excreção do vírus através da orofaringe é elevada na primeira semana de sintomas, altura em que os sintomas costumam ser ligeiros. 2

A fisiopatologia da doença não está completamente esclarecida, mas sabe-se que os doentes infetados com COVID-19 que desenvolvem a doença mais grave podem desenvolver linfopenia significativa e um síndrome hiperinflamatório fulminante e fatal com hipercitoquinemia e falência orgânica múltipla semelhante ao síndrome hemofagocítico secundário. As características deste síndrome hemofagocítico incluem febre, citopenias e aumento acentuado da ferritina com envolvimento pulmonar em cerca de metade dos doentes. Um perfil de citoquinas frequentemente designado por tempestade de citocinas está associado à gravidade da doença e caracteriza-se por aumento de interleuquinas IL-2 e IL-7, granulocyte colony stimulating factor (G-CSF), interferão gama, proteína inflamatória dos macrófagos 1 alfa e fator de necrose tumoral (TNF alfa). 5

A endotelite dos capilares pulmonares causada pela doença é responsável pela perda da vasoconstrição pulmonar hipóxica destruindo a regulação fina deste sistema, o que contribui para agravar o desequilíbrio entre ventilação e perfusão de forma significativa resultando na hipoxemia grave que, com frequência, se encontra na fase inicial da doença. Nesta fase a mecânica pulmonar está bem preservada e a perda da vasoconstrição pulmonar hipóxica parece ser determinante na hipoxemia. Mais tarde, à medida que a doença progride e que existe trombose capilar, existe um

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2 aumento do espaço morto que limita significativamente a remoção do CO2. A lesão endotelial severa associada ao vírus leva à trombose capilar difusa com oclusão dos capilares perialveolares e à disrupção da barreira endotélio-epitelial. 6

A formação de microtrombos nos capilares alveolares, que leva a um aumento do espaço morto, é 9 vezes mais frequente em doentes com COVID-19 do que em doentes com ARDS por

influenza. Os doentes do grupo de COVID-19 também apresentam danos alveolares difusos com

necrose das células que revestem os alvéolos, hiperplasia dos pneumócitos tipo 2 e depósitos lineares de fibrina intra-alveolar. No entanto, é importante sublinhar que estes doentes faleceram de doença grave sob ventilação mecânica não se podendo excluir as consequências da lesão pulmonar induzida pela ventilação sobrepostas às lesões pulmonares da COVID-19. 6 Além da microangiopatia trombótica, a doença apresenta complicações trombóticas sistémicas como trombose venosa profunda, tromboembolismo pulmonar, trombose venosa cerebral assim como complicações trombóticas arteriais com isquemia dos membros, AVC isquémico e enfarte agudo do miocárdio.

Na doença grave a ativação da cascata da coagulação leva ao consumo dos fatores da coagulação e a um aumento significativo de d-dímeros. 7

O período de incubação da doença parece ser de 4 a 14 dias após a exposição ao vírus. 2,8 O intervalo médio entre o desenvolvimento de sintomas e a admissão hospitalar é de 7 dias. 2

O espectro de doença vai desde o doente assintomáticos e chega até ao doente com doença grave que necessita de internamento em Cuidados Intensivos (CI), passando por doença ligeira que pode ser gerida em ambulatório e por doença moderada com necessidade de hospitalização. A grande maioria dos doentes desenvolve sintomas ligeiros.

Os coronavírus causam uma doença sistémica com envolvimento orgânico múltiplo. Os sintomas mais comuns são febre, tosse seca e dispneia. 1,2 Outros sintomas que também podem ser encontrados nestes doentes são fadiga, náuseas, vómitos e/ou diarreia e mialgias. Estes doentes podem apresentar apenas manifestações gastrointestinais sem sintomas respiratórios. Alterações do cheiro ou do paladar foram encontrados numa grande parte dos doentes (64 a 80%). 2 As manifestações neurológicas que podem ser encontradas são tonturas, cefaleias, alterações do cheiro e do paladar, quadros de polineuropatia, alteração do estado de consciência, acidente vascular cerebral e encefalite. 9

As complicações mais frequentemente associadas à doença são insuficiência cardíaca, cerebral, pulmonar, renal, hepática e alteração da coagulação. Eventos trombóticos arteriais e

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3 venosos ocorrem em 10 a 25% dos doentes hospitalizados, aumentando para 31 a 59% nos doentes internados em CI. 2 Um estudo efetuado na Bélgica em doentes ventilados por COVID-19 demonstrou que um terço destes doentes tinham tromboembolismo pulmonar visível na angioTC. 10 A frequência de acidentes cerebrovasculares de doentes infetados com SARS-CoV-2 hospitalizados em vários estudos retrospetivos tem sido de cerca de 1,1%. 9

A OMS desenvolveu uma escala que permite classificar os doentes de acordo com a gravidade da sua doença. A escala de progressão clínica da OMS permite medir a severidade da doença ao longo do internamento classificando os doentes numa escala ordinal de 0 (doentes não infetados) a 10 (mortos) com informação colhida nos seus processos clínicos. As categorias 5 e 6 compreendem os doentes hospitalizados que necessitam de oxigenoterapia. Nas categorias 7, 8 e 9 da escala estão compreendidos os doentes que necessitam ventilação mecânica invasiva que, apesar de ser o tratamento de suporte utilizado na doença grave e proporcionar a oportunidade de sobrevivência a estes doentes, pode, por si, induzir lesão pulmonar iatrogénica. 11 A sobrevivência é afetada pelo grau de gravidade da falência respiratória assim como o grau de disfunção orgânica adicional.

População de CI

Os estudos iniciais sugeriam que a COVID-19 estava associada a doença grave que requer internamento em CI em cerca de 5% dos doentes. A duração média desde o início dos sintomas e a admissão em CI foi de 9 a 10 dias, sugerindo uma deterioração gradual na maioria dos casos. A principal razão para a admissão dos doentes foi por falência respiratória, sendo que dois terços dos doentes tinham critérios de ARDS. 12 Na China, até março de 2020, a percentagem de doentes que precisaram de internamento em CI variou entre 5 e 32%. Na Lombardia, em Itália, a percentagem de doentes que precisaram de internamento em CI foi de 9% e a mortalidade nestes doentes foi de 26%. 13 Uma revisão sistemática de 54 estudos a descrever 13120 doentes ventilados mostrou uma mortalidade de 47,9% em doentes abaixo dos 40 anos e 84.4% em doentes com mais de 80 anos. 14

A doença severa pode ocorrer em doentes saudáveis de qualquer idade, mas é mais frequente em doentes com idade avançada e com mais comorbilidades. 8 Um estudo de 1591 doentes confirmados laboratorialmente com COVID-19 que foram internados em CI na Lombardia mostrou que a população que tem doença severa tinha uma mediana de idade de 63 anos, sendo os doentes agrupados em idade avançada se tinham mais de 64 anos e doentes mais jovens se abaixo ou igual à mediana. A maioria dos doentes tinham pelo menos uma comorbilidade, sendo que cerca de 50% dos doentes tinham hipertensão arterial. As comorbilidades associadas à doença

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4 grave e à mortalidade são doença cardiovascular, diabetes, hipertensão, obesidade, doença pulmonar crónica, neoplasias e doença renal crónica.

Achados laboratoriais

Nos primeiros 41 doentes confirmados com COVID-19 foram realizados testes laboratoriais nomeadamente hemograma, painel da coagulação, bioquímica incluindo função renal e hepática, creatina quinase, lactato desidrogenase e eletrólitos. Além disso, foram colhidas zaragatoa nasofaríngea e orofaríngea, lavado broncoalveolar, expetoração e aspirado brônquico para a pesquisa de vírus, incluindo influenza, influenza avian, vírus sincicial respiratório, adenovírus, vírus parainfluenza, SARS-CoV e MERS-CoV usando testes de sequenciação RT-PCR. Foi também realizada pesquisa de bactérias e fungos. Dos 41 doentes, apenas 13 (32%) foram internados na UCI. 1

As alterações laboratoriais mais frequentemente encontradas nos doentes infetados com SARS-CoV-2 são elevação da ferritina sérica, elevação da proteína C reativa sérica, hipoalbuminemia e elevação da velocidade de sedimentação. 3 A alteração hematológica mais frequentemente encontrada é a linfopenia, que se encontra presente na grande maioria dos doentes hospitalizados. Juntamente com coagulopatia, elevação dos tempos de trombina, trombocitopenia e elevação dos D-dímeros também são achados comuns. 2 No entanto, as alterações laboratoriais frequentemente encontradas não são específicas da COVID-19 e podem ser encontradas em pneumonias por outros agentes. 2

Os critérios laboratoriais que têm sido associados a um pior prognóstico parecem ser a leucocitose, linfopenia, elevação das enzimas hepáticas, LDH elevada, elevação dos marcadores inflamatórios (PCR e ferritina), elevação dos D-dímeros e lesão renal aguda. 2 8 3 Valores de D-dímeros superiores a 1000 ng/mL são um fator de risco para COVID-19 severa e mortalidade. 8 Valores de D-dímeros superiores a 2500 ng/mL e valores de proteína C reactiva sérica superiores a 200 mg/L estão associados a doença grave por COVID-19, podendo estar associados a maior risco de estados hiperinflamatórios e hipercoagulabilidade resultando em tromboembolismo pulmonar e êmbolos microscópicos. 9

O declínio progressivo da contagem de linfócitos assim como a elevação dos D-dímeros ao longo do tempo foram observados em doentes que acabaram por falecer, quando comparados com níveis mais estáveis em doentes que recuperaram da doença. 8

Diagnóstico

O RNA do vírus pode ser encontrado nas secreções respiratórias colhidas por zaragatoa nasofaríngea, orofaríngea, por lavado broncoalveolar, mas também pode ser encontrado no

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5 sangue, nas fezes e na urina de doentes infetados. O diagnóstico da COVID-19 é feito por teste

real-time transcriptase polimerase chain reaction (RT-PCR) de espécimes respiratórios com a deteção

de ácidos nucleicos do RNA do vírus SARS-CoV-2. O método preferencial é por zaragatoa nasofaríngea, seguido da zaragatoa orofaríngea e da expetoração. 4

As taxas de deteção podem

variar entre 32 e 93% de acordo com o local e o método de colheita. As colheitas do lavado broncoalveolar são as que têm maior sensibilidade, seguidas da expetoração e das zaragatoas nasofaríngeas. 152 O dia da colheita também pode afetar a sensibilidade do teste. A sensibilidade do teste é de 33% quatro dias após a exposição, 62% no dia em que aparecem os sintomas e 80% três dias após o aparecimento de sintomas. 2 Uma técnica de colheita inadequada, o tempo relativamente ao início dos sintomas em que este teste é feito e a amostra colhida podem alterar a sensibilidade do teste. Estes dados condicionam uma taxa de falsos negativos descrita como sendo de 3%. 16

As anomalias encontradas na TAC torácica de doentes com COVID-19 são as opacidades em vidro despolido a traduzir um padrão intersticial fino. Estas opacidades têm margens mal definidas. O atingimento pulmonar mais visto nos doentes com COVID-19 é bilateral, com distribuição periférica, subpleural e difusa. 23 As anomalias imagiológicas progridem rapidamente nas primeiras duas semanas após o início dos sintomas, diminuindo gradualmente após esse período. 2 No entanto, não é possível ignorar o efeito lesivo da ventilação invasiva sobre o pulmão e o efeito da infeção nosocomial concomitante.

Alguns doentes com confirmação laboratorial para a COVID-19 podem ter TC de tórax normal enquanto outros podem ter alteração da TC dias antes do início dos sintomas. Têm emergido vários estudos que indicam um possível papel da TC torácica no diagnóstico da doença. Uma meta análise com 26 estudos que avaliavam um total de 3466 doentes foi realizada de modo a perceber qual era a assinatura da doença na TC de tórax. A TC pode ser uma ferramenta de diagnóstico adicional ao teste PCR e pode também ser útil em doentes que carecem de confirmação laboratorial, sendo persistentemente negativos apesar da elevada suspeita clínica. Nesta revisão, 99% dos doentes apresentavam sintomas. Verificou-se que 10.6% dos doentes tinham TC sem alterações, ou seja, uma TC de tórax negativa não permite excluir a doença em doentes sintomáticos, podendo ser negativa nos primeiros dias de sintomas. Dos doentes que apresentavam alterações, 90% tinham afetação posterior preferencial, 81% tinham opacidades em vidro despolido (Ground Glass Opacities), 75.8% tinham atingimento pulmonar bilateral, 73.1% afetavam o lobo inferior esquerdo, 72.9% tinham espessamento vascular e 72.2 atingiam o lobo inferior direito. Em locais onde a doença é endémica, estes achados devem levantar a suspeita de se tratar de infeção por SARS-CoV-2. As alterações menos frequentes eram derrame pleural (5.2%),

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6 linfadenopatias (5.1%), lesão com distribuição central (3.6%), derrame pericárdico e cavitações ou lesões císticas. Estas alterações menos frequentes quando encontradas isoladamente ou associadas, devem levantar a suspeita de se tratar de um outro diagnóstico isolado ou associado. No entanto, a COVID-19 deveria ainda ser considerada no diagnóstico diferencial. 17

Quando comparado com COVID-19, os doentes com pneumonia causada pelo vírus influenza A, não têm opacidades em vidro despolido bilaterais, têm padrão de preenchimento alveolar e, sobretudo, não têm o envolvimento do pulmão profundo subpleural. 18

Atualmente não existe tratamento dirigido para a doença pelo que se faz tratamento de suporte para dar tempo ao organismo para combater o vírus. 75% dos doentes hospitalizados necessitam de oxigenoterapia em diferentes fluxos desde a cânula nasal até à administração de oxigénio em alto fluxo. Quando a oxigenoterapia não é suficiente, os doentes são sujeitos a ventilação mecânica invasiva. Nestes doentes é recomendada uma ventilação protetora do pulmão, para evitar os efeitos lesivos da ventilação no pulmão lesado. Tem sido descrita uma taxa de mortalidade superior em doentes com COVID-19 que foram submetidos a ventilação mecânica invasiva quando comparados com doentes com ARDS, não sendo possível ignorar as complicações adicionais que decorrem nesta doença que podem comprometer a função pulmonar e a recuperação.10

Um estudo multicêntrico Europeu em CI, mostrou que a incidência de pneumonia nosocomial associada ao ventilador estava presente em 50,5% dos doentes com SARS-CoV-2, um valor significativamente superior à incidência destas infeções em doentes com pneumonia por influenza. 19 Em várias publicações provenientes da China, a infeção nosocomial secundária ocorreu em cerca de 50% dos doentes COVID-19 internado no hospital. 20

Falsos negativos

Existem vários relatos e séries pequenas que mostram que podem ocorrer testes falsamente negativos em 20 a 67% dos doentes. No entanto, isto depende da qualidade da colheita e da fase da doença em que este é realizado. 2

A acuidade diagnóstica do teste PCR da orofaringe, da TC torácica, de 2 testes PCR da orofaringe ou do teste PCR da orofaringe com a TC torácica, foi avaliada individualmente. Os resultados mostraram que a combinação do teste PCR com a TC torácica tinha maior sensibilidade (91,9%) do que apenas o teste PCR da orofaringe (78%) ou apenas a TC de tórax (66,7%) ou a combinação de dois testes PCR da orofaringe (86,2%). 21

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7 Estudos chineses indicaram a existência de casos de COVID-19 que tinham tido 2 ou 3 testes PCR seguidamente negativos obtidos por zaragatoa nasofaríngea e orofaríngea antes de serem confirmados laboratorialmente. 21 Há ainda relatos de doentes com 5 testes PCR negativos até ao 6º onde houve confirmação laboratorial. 22

Um destes exemplos tratava-se de um homem de 64 anos com sintomas de febre, tosse seca, rinorreia e mialgias com 8 dias de evolução que tinha contatado com uma pessoa vinda de Hubei em janeiro de 2020, sendo admitido no hospital. Tinha linfopenia e uma TC de tórax com opacidades em vidro despolido. Os primeiros dois testes PCR realizados por zaragatoa orofaríngea, após a TC com alterações, foram negativos. A sintomatologia continuou a agravar-se, assim como as lesões na TC evoluíram e, 15 dias após a admissão hospitalar, o 6º teste PCR colhido por zaragatoa nasofaríngea foi positivo, sendo que o teste colhido por zaragatoa orofaríngea continuou negativo. 22

Bullis SSM et al 23 descreveram um doente de 72 anos com diabetes melitus tipo 2 e mieloma múltiplo que se apresenta no serviço de urgência após seis dias de mal-estar geral, tosse seca, agneusia, anosmia e febre, cuja mulher tinha tido diagnóstico de COVID-19, três dias antes dele apresentar sintomas. À admissão apresentava-se com linfopenia, lesão renal aguda e d-dímeros aumentados e ao longo do internamento foram encontrados valores elevados de ferritina. O raio-x de tórax mostrava opacidades irregulares bilaterais no parênquima pulmonar, tendo o doente realizado três testes RT-PCR. Os dois primeiros foram realizados à admissão e no quarto dia de internamento hospitalar, por zaragatoa nasofaríngea e foram negativos. Pela elevada suspeita e persistência de febre de origem indeterminada, o terceiro teste foi realizado na expetoração, sendo positivo.

Segundo a DGS, os critérios para a definição de caso de COVID-19 são clínicos, epidemiológicos, imagiológicos e laboratoriais.

Para satisfazer o critério clínico é necessário a presença de pelo menos um dos seguintes sintomas: tosse de novo ou agravamento do padrão habitual, febre (temperatura corporal ≥ 38,0ºC) sem outra causa atribuível, dispneia/dificuldade respiratória sem outra causa atribuível, anosmia de início súbito ou disgeusia ou ageusia de início súbito.

Relativamente aos critérios epidemiológicos, é necessário a presença de contacto com um caso confirmado de COVID-19, ser residente ou trabalhador numa instituição onde se encontrem pessoas em situações vulneráveis (estrutura residencial para pessoas idosas, estabelecimento prisional, abrigo, casa de acolhimento ou instituição equipara) e onde exista transmissão

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8 documentada de COVID-19 ou exposição laboratorial não protegida a material biológico infetado/contendo SARS-CoV-2, nos 14 dias que antecedem o início dos sintomas.

Os critérios imagiológicos dependem se estamos perante uma radiografia do tórax ou uma tomografia computarizada do tórax. Na radiografia do tórax é possível identificar hipotransparências difusas, de contornos irregulares, com distribuição periférica e/ou subpleural, com predomínio nos lobos inferiores e/ou consolidação com distribuição periféricas e basal. Na tomografia computarizada do tórax encontram-se hipodensidades em vidro despolido, com uma distribuição periférica e subpleural, consolidações segmentares multifocais, com distribuição predominantemente subpleural ou ao longo dos feixes broncovasculares, ou ainda, consolidação com sinal de halo invertido, sugerindo pneumonia organizativa.

Por último, os critérios laboratoriais são a deteção de ácido nucleico (RNA) de SARS-CoV-2 através de teste molecular de amplificação de ácidos nucleicos (TAAN) em pelo menos uma amostra respiratória e a deteção de antigénio de SARS-CoV-2 através de Testes Rápidos de Antigénio (TRAg) em pelo menos uma amostra respiratória, realizados nos termos da Norma 019/2020 da DGS.

Um caso é considerado possível se apenas preencher os critérios clínicos; provável se preencher os critérios clínicos e epidemiológicos ou os critérios clínicos e imagiológicos; e confirmado se preencher os critérios laboratoriais. 24

Assim, sabendo que a acuidade diagnóstica do teste PCR não é de 100%, quando estamos perante um caso que seja provável e sabendo que a clínica é muito inespecífica, o teste PCR deve ser repetido e uma TC como método complementar pode aumentar a sensibilidade do teste PCR. O uso de zaragatoas nasofaríngeas, a clínica, achados laboratoriais assim como imagiologia podem ser usados para fazer um diagnóstico presuntivo.

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Objetivos

Descrever características demográficas, clínicas, laboratoriais e radiológicas compatíveis com COVID-19 em doentes com teste RT-PCR negativo e comparar com aquilo que se encontra na literatura dos doentes com diagnóstico confirmado de COVID-19.

Metodologia

Estudo retrospetivo de todos os doentes internados no Serviço de Cuidados Intensivos do CHUP com RT-PCR negativo para SARS-CoV-2, no período de 1 de março a 31 de agosto de 2020, altura em que o Serviço estava dedicado à resposta a doentes não-COVID-19. A amostra inicial continha 209 doentes, sendo selecionados 9 doentes.

Os doentes selecionados para este estudo foram os doentes com clínica compatível com a COVID-19 que pode passar por sintomas respiratórios, gastrointestinais ou clínica compatível com eventos trombóticos múltiplos, com imagem de tórax sugestiva (consolidações bilaterais em vidro despolido) e dados laboratoriais compatíveis (valores de d-dímeros aumentados, linfopenia e ferritina aumentada) que não tinham outro diagnóstico.

Foram excluídos os doentes que não apresentavam TAC de tórax. Os doentes com choque séptico que apresentavam uma etiologia abdominal, urinária ou pulmonar em que o agente foi identificado pela microbiologia, foram excluídos do estudo. Doentes com infeção respiratória com imagem compatível com pneumonia lobar também foram excluídos deste estudo.

Colheita de dados

Os dados demográficos continham a idade, o género, a história de exposição conhecida (contacto com caso confirmado ou história de viagens recentes), os hábitos tabágicos, as comorbilidades e a medicação habitual. Os dados clínicos incluíam a sintomatologia apresentada à admissão e o seu tempo de evolução. Os dados laboratoriais consistiam em hemograma, bioquímica com função renal e hepática e marcadores inflamatórios e painel da coagulação. Os dados imagiológicos consistiam nas TAC torácicas realizadas pelos doentes e os achados imagiológicos alterados foram colhidos com base nos relatórios relatados por radiologistas. Finalmente, os dados da microbiologia realizada nos doentes também foram colhidos. Assim como a evolução ao longo do internamento que incluía a temperatura, as terapêuticas realizadas e o resultado final do internamento dos doentes.

Foi obtida a autorização do DEFI e da comissão de ética do Centro Hospitalar do Porto (CHP).

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Resultados

Os resultados dos 9 casos descritos abaixo encontram-se compilados sob a forma de tabelas no apêndice.

Todos os doentes eram residentes no distrito do Porto.

As alterações laboratoriais foram dispostas sob a forma de tabela com o valor à admissão e o pior valor na primeira semana de CI de cada doente.

Todos os doentes incluídos no estudo tinham 1 ou 2 TC de tórax realizadas durante o internamento. O doente 2 apresenta uma TC de 2008 para perceber o atingimento basal pulmonar deste doente que tinha sarcoidose pulmonar.

Foram também classificados ao longo do internamento de acordo com a escala de progressão clínica da OMS de modo a demonstrar a severidade da doença e a sua evolução ao longo do internamento (ver fig. 1).

No apêndice podem encontraram uma evolução temporal de cada doente para uma melhor compreensão da descrição que se apresenta de seguida (ver fig. 3 a 11).

Descrição dos casos

Caso 1 (fig. 3)

O doente 1 era uma mulher de 78 anos, obesa, com hipertensão arterial, doença coronária, síndrome parkinsónico e transtorno depressivo. Apresentou-se no serviço de urgência com dispneia agravada de esforço, ortopneia e DPN com oito dias de evolução, tosse seca com início concomitante e astenia associada, com um pico febril à admissão. Foi internada num serviço de medicina nesse dia com diagnóstico de insuficiência cardíaca inaugural descompensada por pneumonia adquirida na comunidade e no dia seguinte foi admitida no serviço de cuidados intensivos por insuficiência respiratória.

À admissão apresentava-se com linfócitos de 1,62 x10ˆ3 /uL. Na primeira semana de internamento em CI apresentou linfócitos com valor mínimo de 0,68 x10ˆ3 /uL, ferritina de 639 ng/ml e d-dímeros de 3060 ng/ml.

O teste PCR por zaragatoa orofaríngea realizado no serviço de urgência foi negativo, sendo repetido mais duas vezes, no segundo dia de internamento hospitalar, já em CI, também por zaragatoa orofaríngea e no terceiro dia de internamento através de colheita pelo tubo endotraqueal, ambos negativos.

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11 A TC de tórax realizada no terceiro dia de internamento hospitalar mostrou um padrão “crazy-paving” difuso e bilateral, com padrão em vidro despolido e espessamento dos septos intra/interlobulares, poupando poucas áreas do parênquima pulmonar, com ligeiras bronquiectasias de conteúdo arejado.

No 22º dia de internamento hospitalar foi realizada uma TAC TAP onde se verificou a presença de pneumomediastino e pneumotórax em relação com a ventilação mecânica invasiva, assim como múltiplas áreas de densificação em vidro despolido, com espessamento dos septos interlobulares, com áreas de padrão “crazy paving”, de predomínio no parênquima mais dependente dos lobos inferiores associando-se a áreas de consolidação peri-hilares sobretudo à direita. Relativamente à TC de tórax anterior, houve uma ligeira melhoria das lesões anteriores principalmente a nível dos lobos superiores, com maior evidência de reticulação subpleural bilateral, com algumas bronquiectasias de tração a traduzir desenvolvimento de fibrose pulmonar.

A doente foi sujeita a oxigenoterapia por cânula nasal, depois por máscara de venturi no primeiro dia de internamento hospitalar, com agravamento do quadro clínico com insuficiência respiratória global sendo sujeita a ventilação mecânica invasiva no dia seguinte. Teve um episódio de paragem cardiorrespiratória com atividade elétrica sem pulso que reverteu com 1 mg de adrenalina em menos de dois minutos, aquando da entubação orotraqueal. Ficou entubada durante 16 dias e posteriormente traqueostomizada durante 6 dias. Faleceu ao 22º de internamento em CI, manteve insuficiência respiratória grave, refratária às medidas instituídas, pelo que se considerou não haver reversibilidade do quadro.

Caso 2 (fig. 4)

O doente 2 era um homem de 77 anos, obeso, com hipertensão arterial, insuficiência cardíaca, doença cerebrovascular, sarcoidose pulmonar, leucemia mieloide/mielomonócitica crónica tipo 1, dislipidemia e DRC em estádio 3. Apresentou-se no serviço de urgência com um quadro de tosse com expetoração mucosa, dispneia com os acessos de tosse e epigastralgia com irradiação para o quadrante superior esquerdo, em cólica, associado a colúria, e vómitos alimentares com 7 dias de evolução. Ao exame físico tinha pele e mucosas ictéricas. O doente foi admitido por clínica respiratória (tosse seca) com agravamento da dispneia e epigastralgia com citocolestase, disfunção renal e hematológica.

À admissão apresentou-se com linfócitos de 1.23 x10ˆ3/uL. Durante a primeira semana de internamento em CI apresentou-se com linfócitos com valor mínimo de 0,34 x10ˆ3/uL, valor mais alto de ferritina de 4239 ng/ml e valores de d-dímeros de 2682 ng/ml.

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12 No primeiro e no terceiro dia de internamento hospitalar realizou teste PCR com colheita por zaragatoa da orofaríngea, sendo ambos negativos.

Foi realizada uma TC de tórax no primeiro dia de internamento hospitalar onde se visualizava densificação do parênquima em vidro despolido, sobretudo nos segmentos basais, de forma mais expressiva no segmento médio-basal do lobo inferior direito, onde se observaram algumas bronquiectasias de tração associadas a espessamento dos septos interlobulares, aspetos em relação com alterações inflamatórias já com algum tempo de evolução. Havia também espessamento dos septos interlobulares nos segmentos basais do lobo inferior esquerdo, algumas áreas com padrão em vidro despolido nos lobos superiores, em relação com alterações inflamatórias e uma fina lâmina de derrame pleural bilateral. No 7º dia de internamento hospitalar, repete-se a TC torácica que revela extensos focos de consolidação pulmonar bilateral, envolvendo sobretudo os segmentos posteriores dos lobos superiores e ambos os lobos inferiores com volumoso derrame pleural livre.

O doente foi internado inicialmente em gastroenterologia durante três dias pela suspeita de um choque séptico com ponto de partida abdominal numa colangite, sendo transferido para CI ao 4º dia de internamento hospitalar por agravamento de quadro séptico. O doente realizou oxigenoterapia por cânula nasal nos primeiros seis dias e por mascara de alto fluxo ou VNI nos três dias seguintes. Por agravamento do choque séptico, com acidemia mista e necessidade de suporte ventilatório, foi entubado durante cinco dias. Após 11 dias de internamento em CI o doente teve agravamento do quadro de choque séptico e faleceu por agravamento progressivo da disfunção múltipla de órgãos, apesar do aumento de vasopressores e de técnica de substituição renal (TSR). Caso 3 (fig. 5)

O doente 3 era um homem de 65 anos, com hipertensão arterial, dislipidemia e alcoolismo. Internado por desidratação grave e recusa alimentar e hídrica com três semanas de evolução, é trazido ao SU dois dias após ter caído da própria altura no domicílio com traumatismo cranioencefálico. Inicialmente foi internado num serviço de medicina pelo quadro de desidratação grave e sepsis com ponto de partida indeterminado com disfunção cardiovascular, respiratória e renal, iniciando antibioterapia empírica com piperacilina/tazobactam no dia seguinte. Evoluiu posteriormente para choque, agravamento da disfunção respiratória e parâmetros inflamatórios em crescendo, sendo internado em CI no terceiro dia de internamento hospitalar. Esteve cinco dias em CI onde foi diagnosticada disfunção respiratória por sepsis com ponto de partida em colecistite aguda com bacteriemia a E. coli, evoluiu favoravelmente com antibioterapia dirigida e resolução das disfunções tendo alta para enfermaria de um serviço de cirurgia ao 7º dia de internamento.

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13 Ao 12º dia de internamento, foi transferido para um serviço de medicina para investigar um quadro constitucional de caquexia com febre mantida, linfopenia, realizando TC de tórax onde se visualizavam infiltrados em vidro despolido bilaterais, centrais e periféricos, com atelectasia praticamente completa dos lobos inferiores.

Ao 15º dia de internamento hospitalar, foi reinternado em CI por insuficiência respiratória devido a choque séptico com ponto de partida em pneumonia bilateral nosocomial por agente não identificado. Neste dia foi realizada nova TC torácica onde se observou no parênquima não atelectasiado, múltiplas áreas de consolidação bilateral, “crazy paving” e vidro despolido e uma quantidade ligeira a moderada de derrame pleural. Foi realizada a troca do antibiótico para imipenem e vancomicina empírica no dia seguinte. Realizou 7 dias de imipenem e 14 dias de vancomicina com SIRS em resolução ao 30º dia de internamento hospitalar.

À admissão apresentou-se com linfócitos de 0.29 x10ˆ3/uL. Durante a primeira semana de internamento em CI apresentou-se com linfopenia com valor mínimo de 0,38 x10ˆ3/uL, valor mais alto de ferritina de 1712 ng/ml e os valores de d-dímeros são desconhecidos uma vez que não foram pedidos ao longo de todo o internamento.

Realizou 5 testes PCR para COVID-19, nos dias três, 4, 13, 15 e 20 de internamento hospitalar, os primeiros 3 por zaragatoa orofaríngea e os últimos 2 por colheita das secreções brônquicas do tubo orotraqueal, que foram todos negativos.

O doente evoluiu ao longo do internamento sem necessidade de oxigenoterapia no primeiro dia, necessidade de máscara de venturi nos dois dias seguintes, alternando com máscara de alto fluxo no terceiro dia e cânula nasal entre o 4º e o 7º dia e ao 11º dia, sendo que não tínhamos dados disponíveis da oxigenoterapia realizada entre o 8º e o 10º dia de internamento nem nos dias 12 e 13 de internamento. No 14º dia de internamento precisou de máscara de venturi, escalando para mascara de alto fluxo nos dois dias seguintes e posterior entubação orotraqueal após trial sem sucesso com VNI. Esteve entubado durante 6 dias com desmame ventilatório até ao 33º dia de internamento hospitalar.

Esteve internado durante 18 dias em CI, tendo alta para a enfermaria. Ao longo do internamento, o único agente isolado na cultura das secreções brônquicas foi S. aureus MRSA, pelo que se assume que a pneumonia bilateral nosocomial terá sido devida a esse agente.

Caso 4 (fig. 6)

O doente 4 era uma mulher de 60 anos, obesa, com hipertensão arterial, anemia perniciosa e hábitos alcoólicos. Recorreu ao serviço de urgência com astenia progressiva e tonturas com seis

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14 dias de evolução, hálito cetónico com quatro dias de evolução, prostração, mobilidade reduzida e recusa alimentar e hídrica com dois dias de evolução. No serviço de urgência, a respiração tinha um padrão de kussmaul, glicemias de 548 mg/dl, uma análise de gases de sangue com pH 6.8, pO2 de 273 mmHg, pCO2 era 28 mmHg, HCO3 de 5.7mmHg, lactatos de 1.5, anion gap de 29 e uma pesquisa de cetonemia positiva pelo que fica internada na UCI com diagnóstico de cetoacidose diabética.

Os linfócitos à admissão eram de 1.14 x10ˆ3/uL e durante a primeira semana de internamento hospitalar chegaram a 0,38 x10ˆ3/uL, o valor mais alto de ferritina era de 1639 ng/ml e os valores de d-dímeros mais elevados eram de 819 ng/ml.

Foi realizada TC de tórax no primeiro dia de internamento hospitalar onde se observavam ténues áreas de densificação parenquimatosa em vidro despolido, no segmento anterior do lobo superior esquerdo, na língula e em topografia subpleural no lobo inferior esquerdo, mínima quantidade de derrame pleural à direita, sem derrame pleural à esquerda.

Realizou teste PCR no serviço de urgência e no dia seguinte, com colheita por zaragatoa orofaríngea e pelas secreções respiratórias colhidas por tubo endotraqueal, respetivamente, tendo sido ambos negativos.

A doente esteve entubada durante dois dias, depois passou para máscara de venturi no dia em que foi extubada e ficou nos últimos 6 dias de internamento em CI sem oxigenoterapia suplementar. Realizou TSR durante 6 dias. Evoluiu favoravelmente após 8 dias de internamento em CI, tendo alta para o serviço de endocrinologia.

Caso 5 (fig. 7)

O doente 5 era uma mulher de 62 anos, obesa, com sequelas após poliomielite na infância e hipotiroidismo. A doente apresentou-se no SU por episódio de disfunção respiratória posterior a fenómeno de aspiração, com sinais de hipotensão com repercussão sistémica incluindo LRA. A doente apresentava-se com anosmia neurossensorial com tempo indeterminado de evolução e um quadro de tetraparésia simétrica ascendente arrefléxica com início nos membros inferiores e agravamento para os membros superiores e sinais bulbares com três semanas de evolução. No SU foi diagnosticado um Síndrome de Guillain Barre e com a realização de uma TC-CE, com enfarte subagudo da artéria cerebral posterior esquerda e foi admitida em CI atendendo aos sinais de disfunção bulbar para internamento durante o tratamento com imunoglobulina EV e por suspeita COVID-19, uma vez que tinha tido contacto com um caso confirmado, embora se desconheça a data exata do contacto.

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15 À admissão apresentou-se com linfócitos de 0,80 x10ˆ3/uL. Durante a primeira semana de internamento hospitalar apresentou-se com linfócitos com valor mínimo de 0,34 x10ˆ3/uL, ferritina com valor máximo de 970 ng/ml e valores de d-dímeros mais altos de 195 ng/ml.

No segundo dia de internamento hospitalar foi realizada TC torácica que revelou áreas de densificação parenquimatosa em vidro despolido, dispersas em todos os campos pulmonares, identificando-se espessamento generalizado dos septos interlobulares. Havia áreas de consolidação com discreto broncograma aéreo a nível da vertente interna do segmento superior do lobo inferior direito e nos segmentos basais de ambos os pulmões, tendo sindo identificadas áreas de densificação em banda, de provável etiologia fibroatelectásica. Foi realizada uma TC TAP no 14º dia de admissão hospitalar para esclarecer uma etiologia paraneoplásica para o quadro neurológico, que revelou extensas áreas de consolidação parenquimatosa pulmonar com broncograma aéreo abrangendo a totalidade de ambos os campos pulmonares e um tromboembolismo pulmonar bilateral mais evidente nos lobos inferiores. Além disso, observou-se a existência de um derrame pleural bilateral de pequeno volume.

Realizou três testes PCR para pesquisa de SARS-CoV-2 no primeiro, terceiro e 10º dia de internamento hospitalar, por colheita por zaragatoa orofaríngea, por secreções respiratórias e por aspirado traqueal, respetivamente, todos negativos.

Ao longo do internamento em CI, a doentes realizou oxigenoterapia por cânula nasal durante os primeiros 5 dias, evoluindo para máscara de alto fluxo durante dois dias, sendo entubada ao 6º dia de internamento em CI e realizou uma sessão de TSR no dia seguinte e permaneceu com ventilação mecânica invasiva durante 22 dias.

Não foi possível encontrar etiologia para o quadro neurológico, sendo explorada a hipótese imunológica, paraneoplásica, com dois ciclos de imunoglobulina sem resposta. Durante o internamento, recebeu o diagnóstico de pneumonia com padrão radiológico em agravamento desde a admissão, sem isolamento de agente e teve dois eventos trombóticos de causa indeterminada, o enfarte cerebral identificado quando se apresenta no SU e um tromboembolismo pulmonar que se desenvolveu ao longo do internamento. Após 28 dias de internamento em CI, evoluiu desfavoravelmente e acabou por falecer.

Caso 6 (fig. 8)

O doente 6 era uma mulher de 31 anos, obesa, com dislipidemia, com infeção crónica pelo vírus da hepatite B e síndrome depressivo major. Recorreu ao SU por febre com 5 dias de evolução e quadro de ortopneia e dispneia de esforço com início no dia anterior, com tosse seca e dor

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16 torácica ligeira concomitantes. A doente foi admitida no hospital com febre e insuficiência respiratória tipo 1 que evoluiu desfavoravelmente com falência respiratória, sendo admitida na UCI no dia seguinte com diagnóstico de choque séptico com ponto de partida em PAC com ARDS.

À admissão apresentava-se com linfócitos de 1.52x10ˆ3/uL. Durante a primeira semana de internamento hospitalar apresentou-se com linfopenia com valor mínimo de 0,96 x10ˆ3/uL, ferritina de 672 ng/ml e d-dímeros de 896 ng/ml.

Foi efetuada uma angioTC de tórax no segundo dia de internamento hospitalar que excluiu a hipótese de TEP, mostrando áreas de consolidação em vidro despolido bilaterais, de predomínio lobar superior, mas presente nos diferentes lobos pulmonares e uma lâmina de derrame pleural bilateral, mais acentuado à direita.

Realizou teste PCR para a pesquisa de SARS-CoV-2 no segundo, 4º e 5º dia de internamento hospitalar no lavado brônquico, por zaragatoa orofaríngea e nas secreções respiratórias, onde o resultado foi sempre negativo.

A doente fez oxigenoterapia por máscara de venturi nos primeiros dois dias, evoluiu para máscara de alto fluxo e entubação no terceiro dia de internamento. Ficou entubada durante 5 dias e foi extubada nos últimos três dias de internamento. O internamento em CI durou 8 dias, com evolução favorável, sem identificação de agente nas pesquisas microbiológicas e teve alta para um serviço de medicina.

Caso 7 (fig. 9)

O doente 7 era uma mulher de 81 anos, hipertensa, com história de evolução indeterminada de artralgias, fenómeno de raynaud, síndrome sicca, suspeita de síndrome de

Sjögren, sob disritmia não esclarecida. Recorreu ao SU de outro hospital por febre e dispneia com

sete dias de evolução, sendo medicada com antibioterapia empírica para PAC e, posteriormente, teve alta. Por dispneia agravada para o repouso nos três dias seguintes dirigiu-se a um hospital privado de onde foi transferida para o CHP onde fica internada em CI por elevada suspeita clínica de pneumonia bilateral por SARS-CoV-2 e foi entubada por insuficiência respiratória.

À admissão encontrava-se com insuficiência respiratória tipo 1, linfócitos de 0.73x10ˆ3/uL e d-dímeros de 3190 ng/dl pelo que realizou uma angioTC de tórax, que evidenciava densificação difusa de praticamente todo o parênquima pulmonar, em vidro despolido, poupando apenas escassas áreas e coexistindo espessamento difuso dos septos interlobulares. Também havia fina lâmina de derrame pleural bilateral.

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17 Durante a primeira semana de internamento em CI apresentou-se com linfócitos mínimos com valor mínimo de 0,59 x10ˆ3/uL.

Realizou teste PCR para a pesquisa de SARS-CoV-2 ao primeiro, segundo e 4º dia de internamento hospitalar, por zaragatoa orofaríngea, por colheita das secreções respiratórias e por lavado brônquico, sendo todos negativos para SARS-CoV-2. O lavado broncoalveolar foi positivo para herpes simples tipo 1.

Ao 15º dia de internamento hospitalar, realizou nova TC torácica para estudo comparativo com o exame anterior onde se verificou manutenção da extensa densificação difusa de praticamente todo o parênquima pulmonar, em vidro despolido, coexistindo espessamento dos septos interlobulares, e com extensas áreas consolidadas, mais expressivas à direita e manutenção de fina lâmina de derrame pleural bilateral.

Foi extubada, ao 13º dia, após doze dias de entubação orotraqueal, por melhoria clínica ligeira e foi transferida para a enfermaria de um serviço de medicina, onde ficou com máscara de venturi. No 14º dia, durante a noite, teve múltiplos episódios de dessaturação que reverteram com oxigenoterapia de alto fluxo, sendo que de manhã tem um episódio de dessaturação, com realização de VNI sem sucesso pelo que foi reintubada e retornou a CI no dia seguinte, por infeção nosocomial em doente com provável patologia pulmonar prévia em estudo com vidro despolido e hipertensão pulmonar. A doente apresentou múltiplos episódios de fibrilação auricular com resposta ventricular rápida. O quadro foi interpretado como doença pulmonar intersticial agudizada por contexto infecioso e progressão da doença de base, com insuficiência respiratória persistente que, após 16 dias de entubação orotraqueal, justificou traqueostomia. Apesar do tratamento com aciclovir durante cerca de um mês de internamento, não houve melhoria do padrão radiológico. A doente esteve traqueostomizada durante 29 dias, teve um internamento prolongado com evolução flutuante, mas que acabou por falecer após 60 dias de internamento em CI.

Caso 8 (fig. 10)

O doente 8 era uma mulher de 56 anos, obesa e hipertensa que recorreu ao SU por dor abdominal na fossa ilíaca direita e flanco direito, onde lhe realizaram estudo analítico que se encontrava sem alterações de relevo, sem leucocitose e PCR não aumentada, raio x abdominal com alguma aerocolia, sem níveis hidroaéreos, um sedimento urinário e uma ecografia abdominal que não mostravam alterações de relevo, tendo alta medicada para cólica abdominal após a explicação dos sinais de alarme. Regressou no dia seguinte de madrugada com dor abdominal que não aliviava com tramadol. No SU, apresentava-se com linfócitos de 1.52 x10^3/uL, foi realizado teste PCR por

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18 zaragatoa orofaríngea que foi negativo, TC TAP que demonstrava sinais de isquemia renal por oclusão do ramo anterior da artéria renal direita e um trombo na artéria ilíaca comum direita proximal e angioTC torácica que revelou um parênquima de vidro despolido, difuso e bilateral, congestão venosa basal, cardiomegalia ligeira, edema pulmonar intersticial sem evidência de lesões e um defeito de preenchimento da parede anterior do terço médio da aorta torácica descendente, com duas imagens de aproximadamente 8mm cada que poderiam corresponder a pequenos trombos da parede. Foi admitida no serviço de urologia para realização de hipocoagulação com heparina não fracionada.

A AngioTC de reavaliação no 5º dia de internamento hospitalar, onde continuava a observar-se na vertente anterior da aorta descendente, irregularidade endoluminal, condicionada por trombo parietal de morfologia e dimensões sobreponíveis ao exame anterior. Além disso, no rim direito observava-se hipocaptação de forma difusa, poupando o terço superior pela presença de uma artéria polar superior e também um pequeno defeito de repleção a nível da divisão da artéria renal principal/ramos segmentares. Continuava a observar-se trombo irregular a nível da porção proximal da artéria ilíaca direita, de aspeto sobreponível. No parênquima pulmonar havia raras imagens de enfisema parasseptal nos lobos superiores e imagens compatíveis com atelectasias lineares nos lobos basais de ambos os pulmões, segmento lingular inferior e segmento medial do lobo médio com pequeno derrame pleural bilateral.

No 9º dia de internamento hospitalar, a doente iniciou quadro de dor abdominal súbita no flanco e na fossa ilíaca direita que aliviou parcialmente com a analgesia, pelo que é pedido nova AngioTC abdomino pélvica que mostrou aumento das dimensões do trombo previamente observável na vertente anterior da aorta torácica descendente, oclusão completa da artéria ilíaca interna direita que não era evidente no exame anterior com sinais de repermeabilização distal apenas na proximidade do músculo piriforme e a presença de uma diminuta hipodensidade periférica no lúmen da artéria mesentérica superior que poderia refletir pequeno trombo com 11 mm de extensão. No parênquima renal havia resolução total do derrame pleural previamente observável nas bases pulmonares. Foi realizada colocação de endoprotese vascular na aorta torácica descendente e tromboaspiração bilateral do eixo ilíaco, sendo admitida em CI. No pós-operatório imediato, ocorreu isquemia do membro inferior direito a motivar pontagem curta da artéria femoral superficial proximal com bypass da veia grande safena invertida ipsilateral à direita. Na manhã do dia seguinte, por novo episódio isquémico necessitou de trombectomia transpoplítea direita.

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19 Durante a primeira semana de internamento em CI apresentou-se com linfopenia com valor mínimo de 0,49 x10ˆ3/uL, ferritina de 2736 ng/ml e d-dímeros de 4079 ng/ml.

No 11º dia de internamento hospitalar, a doente referiu dor epigástrica acentuada pelo que é realizada angioTC abdominal e pélvica que revelou aspetos de hipoestase pulmonar importante nas bases de ambos os pulmões. Além disso há oclusão da artéria mesentérica superior, oclusão na emergência da artéria renal esquerda por trombo aderente à parede com a emergência da artéria renal direita permeável. Houve ainda oclusão da artéria ilíaca primitiva direita. Houve clínica de isquemia mesentérica aguda com imagem a sugerir oclusão da mesma artéria pelo que a doente foi submetida a trombectomia da artéria mesentérica superior. No mesmo dia à tarde, devido a agravamento clínico com necessidade de doses crescentes de noradrenalina e dor à palpação abdominal foi feita laparotomia exploradora e colecistectomia com intestino delgado e colon sem aparentes áreas de isquemia ou má perfusão.

No 12º dia de internamento, apresentou-se com isquemia do membro inferior esquerdo, com pulso femoral esquerdo pouco amplo e sem pulsos distais palpáveis, em agravamento com livores até à região glútea esquerda e cianose cutânea mobilizável pelo que realizou trombectomia transfemoral esquerda.

No 13º dia de internamento hospitalar realizou angioTC por elevação marcada dos valores da proteína C reativa sérica e da procalcitonina para excluir isquemia intestinal com sobreinfeção ou acesso e avaliar a integridade da endoprótese vascular, que revelava endoprotese aórtica permeável, com aparentes pequenos trombos com aderentes à malha da prótese, áreas não captantes nos segmentos hepáticos IV V e VI traduzindo enfartes. Restantes lesões sobreponíveis à extensão do enfarte renal documentada no estudo anterior. À esquerda persistia trombo na origem da artéria renal inferior, com extensão ao longo dos 2/3 proximais da artéria. Sem complicações associadas às áreas de enfarte. Relativamente ao parênquima pulmonar, encontraram-se atelectasias basais posteriores periféricas bilateralmente e áreas de densificação com bronquiectasias associadas na língula, de etiologia não aguda.

Ao 20º dia de internamento hospitalar, a doente apresentou novo episódio de isquemia aguda do membro inferior esquerdo que motivou trombectomia transpoplítea das artérias crurais do membro inferior esquerdo que foi bem-sucedida e tentativa de trombectomia aorto-ilíaca bilateral que foi parcial.

Ao 21º dia de internamento hospitalar, a doente apresentava-se com necessidades de vasopressores crescentes até valores superiores a 6mg/h pelo que foi realizada angioTC que mostrava coleção hemática que media 14 cm de diâmetro longitudinal e 5 cm de diâmetro axial

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20 envolvendo os planos mais distais da artéria ilíaca externa direita com evidência de hemorragia ativa.

A doente foi internada por enfarte renal direito. Posteriormente, surgiu um trombo mural da aorta torácica descendente com embolização para territórios viscerais e membros inferiores que motivou várias idas ao bloco para reavaliação vascular culminando em infeção da ferida cirúrgica com fasceíte necrotizante ao nível da incisão cirúrgica da artéria femoral direita. Teve ainda lesão renal aguda por enfarte renal com necessidade de TSR durante grande parte do internamento, múltiplos episódios de melenas com angioTC compatível com necrose isquémica de ansas e anemia com necessidade de suporte transfusional. A doente evoluiu sem necessidade de oxigenoterapia nos primeiros 8 dias, com necessidade de oxigénio por cânula nasal durante um dia e posterior, ventilação mecânica invasiva ao 11º dia de internamento, que manteve durante 29 dias. Após 40 dias de internamento hospitalar, a doente agravou disfunções multiorgânicas com choque refratário, com evolução desfavorável, acabando por falecer.

Caso 9 (fig. 11)

O doente 9 era um homem de 53 anos, obeso, dislipidémico, com etilismo crónico que foi trazido ao SU após episódios prévios de vinda à urgência desde há 2 dias com astenia, anorexia, hematémeses, dor abdominal difusa e tonturas, tendo recusado ficar internado contra parecer médico. Por manutenção do quadro com queixas de dor abdominal e taquipneia, com necessidade de oxigenoterapia realizou raio x de tórax que revelou consolidações bilaterais e por agravamento respiratório, foi entubado como medida de proteção dado elevada suspeita de infeção por SARS-CoV-2. O doente encontrava-se muito agitado e querendo retirar os acessos durante a permanência na sala de emergência.

Foi realizada TC de tórax no 2º dia de internamento, onde se observavam extensas áreas de densificação parenquimatosa em vidro despolido, com broncograma aéreo e esboço de “crazy-paving” a toda a altura de ambos os pulmões, com distribuição periférica preferencial e predominando nos lobos inferiores. No contexto clínico e laboratorial adequado, os achados eram enquadráveis em infeção por SARS-CoV-2 (padrão clássico), grave (classificação BSTI). No 4º dia de internamento, foi realizada nova TC de tórax que revelou pequena quantidade de líquido pleural bilateralmente e no parênquima pulmonar continuaram a observar-se várias áreas de densificação em vidro despolido, com ligeira redução face ao exame prévio. Contudo, identificaram-se várias áreas de consolidação parenquimatosa.

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21 Realizou três testes PCR para a pesquisa de SARS-CoV-2 no primeiro e dois no segundo dia de internamento hospitalar por zaragatoa orofaríngea nas duas primeiras amostras e por biologia molecular das secreções do tuboendotraqueal na última, que foram negativas.

À admissão apresentou-se com linfopenia de 0.81x10ˆ3/uL. Durante a primeira semana de internamento em CI apresentou-se com linfopenia com valor mínimo de 0,28 x10ˆ3/uL, hiperferritinemia de 1980 ng/ml e d-dímeros de 2212 ng/ml.

O doente foi admitido em CI com entubação orotraqueal. No primeiro dia de internamento teve um episódio de fibrilhação auricular com ritmo ventricular rápido que foi revertida com perfusão de amiodorona. Dois dias depois tem novo episódio de fibrilação auricular com reversão após bolus e perfusão de amiodorona e cardioversão elétrica, com recorrência que se resolveu após a mesma abordagem. No dia seguinte desenvolveu um episódio de broncoespasmo com agravamento respiratório. O doente esteve internado em CI e entubado durante seis dias, com agravamento progressivo, necessidade de TSR, com choque refratário às medidas instituídas, lactatos indoseáveis e entrou em paragem cardiorrespiratória, acabando por falecer.

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Discussão

Esta amostra tem características clínicas, laboratoriais e imagiológicas compatíveis com COVID-19, todos realizaram entre 1 e 5 testes PCR que foram negativos e na investigação não foi encontrada uma etiologia alternativa que explicasse o quadro clínico.

A população escolhida para o estudo é a população de cuidados intensivos, ou seja, a que apresenta doença grave. Sabe-se que doentes de todas as idades podem desenvolver doença grave, contudo, os doentes com pior prognóstico são aqueles que têm pelo menos uma comorbilidades e idades mais avançadas.

Foram identificados 9 doentes, em que 6 eram do sexo feminino e 3 do sexo masculino. Seis destes doentes tinham idade igual ou inferior a 65 anos, sendo que três dos doentes mais jovens sobreviveram ao internamento em CI. A idade avançada é um dos fatores de risco mais importantes para pior prognóstico. A doente mais velha do grupo tinha 81 anos e foi a doente com internamento mais prolongado, acabando por falecer.

Todos tinham pelo menos uma comorbilidade, 7 deles eram obesos, 6 eram hipertensos, 4 eram dislipidémico, um estava imunossuprimido por doença auto-imune e um deles tinha doença hematológica neoplásica. A obesidade, a hipertensão e a dislipidemia foram as comorbilidades mais frequentemente encontradas. A obesidade, diabetes e hipertensão são fatores de risco importantes para pior desfecho em doentes com COVID-19 e o doente 3 não era obeso, o que pode ter funcionado como um fator protetor, apresentando-se com perda de peso importante quando recorreu ao serviço de urgência por um quadro depressivo com tempo indeterminado de evolução. A doente 6 era a doente mais jovem do grupo, com 31 anos de idade, e não era hipertensa, o que pode ter contribuído para um melhor prognóstico.

Os fatores de risco correlacionam-se com uma maior probabilidade de pior prognóstico quando estão presentes, o que não exclui que os doentes mais jovens possam ter um desfecho fatal quando infetados pela doença. A doente 8 não tinha idade avançada, mas era obesa e hipertensa, teve múltiplos eventos trombóticos e acabou por falecer. O doente 9 também não tinha idade avançada, mas tinha comorbilidades, tendo um desfecho fatal.

Os doentes 3, 4 e 6 sobreviveram ao internamento em CI. Dos três sobreviventes, o doente 3 era o que tinha idade mais avançada, com 65 anos e foi o que teve um internamento mais prolongado. As doentes 4 e 6 eram ambas do sexo feminino e tinham 60 e 31 anos, respetivamente, com internamento de 8 e 9 dias em CI, com poucos dias de necessidade de entubação orotraqueal.

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23 De todos os doentes, apenas a doente 5 tinha tido um contacto positivo com um doente COVID-19 confirmado. Não foi possível apurar a história de viagens ou contacto com um doente confirmado com COVID-19 na maioria dos doentes porque essa informação não se encontrava nos processos clínicos. Apesar disso, o período de 1 de março de 2020 e 31 de agosto de 2020 era um período em que a prevalência de COVID-19 em Portugal era alta no distrito do Porto, local de residência de todos os doentes.

Os doentes 1, 6 e 7 apresentaram-se no serviço de urgência com sintomas respiratórios, os doentes 2 e 9 apresentaram-se com sintomas gastrointestinais. Os doentes 3 e 4 apresentaram-se com uma clínica inespecífica. A doente 5 apresentou-se com um quadro neurológico e a doentes 8 apresentou-se com sintomas derivadas de evento trombótico.

Sabe-se que os doentes com idade inferior a 60 anos, têm maior prevalência de eventos trombóticos. A doente que se apresentou com isquemia renal por trombo, era a doente 8 e tinha 56 anos.

Todos os doentes realizaram pelo menos um teste PCR que foi negativo (entre 1 e 5 testes). As amostras colhidas para a realização do teste foram maioritariamente por zaragatoa orofaríngea, seguida de secreções respiratórias, colheita para biologia molecular de secreções do tubo endotraqueal e do lavado broncoalveolar. Os doentes 2 e 8 apenas realizaram teste PCR por zaragatoa orofaríngea. Os doentes 6 e 7 realizaram colheita por lavado broncoalveolar. Os restantes quando mais do que um teste, realizaram colheita das secreções respiratórias ou por biologia molecular das secreções colhidas por tubo endotraqueal. É de notar que na maioria dos relatórios das TC destes doentes eram os próprios radiologistas a sugerir a testagem de SARS-CoV-2.

Alguns motivos que podem levar a resultados falsamente negativos estão relacionados com o operador, uma má colheita ou colheita de locais como a orofaringe têm muito menor sensibilidade que colheitas da nasofaringe ou das secreções brônquicas, sendo que a OMS recomenda que as colheitas sejam da nasofaringe ou da orofaringe combinadas com zaragatoas da nasofaringe. Além disso, os dias desde a exposição ao vírus, o desenvolvimento dos sintomas e a data em que o teste é realizado podem também ter influência. Todos os doentes desta amostra apresentavam sintomas e doença mais grave e sabe-se que o teste é mais sensível quando feito após o desenvolvimento dos mesmos. A doente 5 teve contexto epidemiológico de doença. No entanto não sabemos a data exata desse contacto, pelo que não sabemos se o teste foi realizado dentro do período de incubação, o que poderá pôr em causa a sensibilidade do teste.

As alterações laboratoriais mais frequentemente encontradas nesta amostra são compatíveis com as que se encontram descritas em doentes infetados com SARS-CoV-2. Os doentes

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24 apresentavam elevação da ferritina sérica, elevação da proteína C reativa sérica, hipoalbuminemia e elevação da velocidade de sedimentação. 3 A alteração hematológica mais frequentemente encontrada é a linfopenia, que se encontra presente na grande maioria dos doentes hospitalizados. Juntamente com coagulopatia, elevação dos tempos de trombina, trombocitopenia e elevação dos D-dímeros também são achados comuns. 2

Todos os doentes apresentavam valores de proteína C reativa aumentada. O doente 7 foi aquele que apresentou valor máximo durante a primeira semana de internamento em CI de proteína C reativa mais baixo de 119.54 mg/L e o doente 5 apresentou o valor máximo de proteína C reativa mais alto de 514.31 mg/lL.

A velocidade de sedimentação encontrava-se aumentada em todos os doentes em que foi pedida, não existindo valores para os doentes 3 e 8 durante a primeira semana de internamento em CI.

Todos os doentes apresentavam taxa de filtração glomerular diminuída. Os doentes 3 e 6, que sobreviveram, tinham os valores mais altos de taxa de filtração glomerular. A doente 4 sobreviveu e tinha valores de taxa de filtração glomerular bastante baixos pelo que precisou de TSR durante o internamento em CI com boa evolução.

A evidência de coagulopatia define-se como um aumento de 3 segundo dos tempos de trombina (TP) e um prolongamento do tempo de tromboplastina parcial (aPTT) superior a 5 segundos. 25 Os doentes 1, 2, 3 e 8 não tinham estudo da coagulação completo à admissão. Os doentes 4 e 9 não apresentavam evidência de coagulopatia à admissão, vindo a desenvolvê-la posteriormente, o que é compatível com a coagulopatia causada pelo vírus SARS-CoV-2.

Todos os doentes apresentaram linfopenia e ferritina elevada durante a primeira semana de internamento em CI.

Todos os doentes tinham valores de d-dímeros aumentados à exceção do doente 3 que não teve valores de d-dímeros pedidos ao longo de todo o internamento e do doente 5 que tinha valores normais. Os doentes 4 e 6 tinham d-dímeros aumentados, mas abaixo de 1000 ng/ml, com os restantes doentes com valores acima de 2000 ng/ml.

Valores de D-dímeros superiores a 2500 ng/mL e valores de proteína C reativa sérica superiores a 200 mg/L estão associados a doença grave por COVID-19, podendo estar associados a maior risco de estados hiperinflamatórios e hipercoagulabilidade resultando em tromboembolismo pulmonar e êmbolos microscópicos. 9 Os doentes 5 e 8 tiveram eventos trombóticos. O doente 5 tinha valores de d-dímeros normais na primeira semana de internamento em CI, que não voltaram

Referências

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