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INGESTÃO COMPULSIVA E GESTÃO DAS EMOÇÕES NA OBESIDADE

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Academic year: 2021

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Tapadinhas, A.R., & Pais Ribeiro, J. (2008). Ingestão Compulsiva e Gestão das Emoções na Obesidade. In: I.Leal, J.Pais-Ribeiro, I. Silva & S.Marques (Edts.). Actas do 7º congresso nacional de psicologia da saúde (pp.85-88 ).Lisboa: ISPA

INGESTÃO COMPULSIVA E GESTÃO DAS EMOÇÕES NA OBESIDADE Ana Rosa Tapadinhas & José Luís Pais Ribeiro

Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto

Em termos históricos, os obesos foram considerados como pertencendo a um grupo homogéneo, tendo por base uma única característica: o seu peso. Na revisão de investigações em obesidade, Friedman e Brownell (1995, 2002) enfatizaram a heterogeneidade das características comportamentais, que possivelmente sustenta a obesidade, e investigaram algumas subcategorias entre os obesos nas quais se incluía a perturbação de ingestão compulsiva (PIC) ou binge eating disorder (Napolitano, Head, Babyak & Blumenthal, 2001).

A PIC constitui uma nova entidade nosológica cujos critérios de diagnóstico foram definidos por Spitzer et al. (Azevedo, Santos & Fonseca, 2004; Fandiño, Benchimol, Coutinho & Appolinário, 2004; Grilo, 2002), integrados no DSM-IV (1996), e os seus critérios fundamentais são: a ingestão objectiva de grandes quantidades de comida e a perda de controlo (Yanovski, 2002). Os obesos com PIC diferem claramente dos obesos sem PIC em diversos aspectos clínicos. Os obesos com PIC apresentam, entre outros aspectos: 1) uma obesidade mais grave; 2) excesso de peso mais cedo; 3) preocupação com dietas mais cedo e mais frequente; 4) maiores níveis de psicopatologia, incluindo depressão, abuso de substâncias e problemas emocionais e afectivos, bem como perturbações de personalidade (Antoniou, Tasca, Wood & Bissada, 2003; Bulik, Sullivan & Kendler, 2002; Pull, 2004; Stunkard & Allison, 2003; Yanovski, 2002).

Os obesos com PIC podem constituir uma subcategoria entre a população de obesos atendendo às características específicas que apresentam (Azevedo, Santos & Fonseca, 2004). Denotam uma auto-estima mais baixa e respondem com afectos negativos à avaliação externa

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do seu peso e comportamento alimentar (Antoniou et al., 2003; Bulik, Sullivan & Kendler, 2002), e tendem a apresentar dificuldades mais marcadas em decifrar as sensações de fome e saciedade (Zwaan et al., 1994 citados por Plannell & Marí, 2002). Ocorrem, neste grupo, frequentemente, perturbações do Eixo II, particularmente dos clusters B e C ( Stunkard & Allison, 2003). Em estudos com amostras da comunidade normativa, a prevalência ronda os 2% a 10%, onde cerca de metade são sujeitos obesos. Em grupos de indivíduos com obesidade mórbida submetidos a cirurgia bariátrica, o rácio varia entre os 27% e os 47% (Azevedo, Santos & Fonseca, 2004; Pull, 2004), podendo atingir valores superiores (68%) (Cohn, 2003).

Diversos estudos têm procurado estabelecer a relação entre a obesidade e a psicopatologia, nomeadamente as perturbações do humor. Os estudos comparativos sobre a prevalência de perturbações afectivas sublinharam que, cerca de 30 a 50% dos obesos com PIC referem episódios depressivos major, enquanto que a prevalência desta patologia nos obesos sem PIC é sobreponível com os resultados encontrados para a população em geral e de peso normal. São também os obesos com PIC os que apresentam níveis mais baixos de auto-estima, estes dados sugerem que a obesidade por si só não parece induzir níveis relevantes destas alterações psicoemocinais (Jambekar, Masheb & Grilo, 2003).

Apesar de se considerar que a existência de obesidade mórbida não implica a presença de perturbação psicoemocional, parece que existem determinados padrões de comportamento e de personalidade que determinam a ingestão alimentar. Desta forma, Guisado et al. (2002) concretizaram um estudo com doentes com obesidade mórbida, e encontraram perturbação psiquiátrica do Eixo I em 40% dos sujeitos. Os diagnósticos mais frequentes identificados no estudo de Guisado et al. (2002) foram as perturbações afectivas e de ansiedade, e em 15% dos sujeitos foi diagnosticada PIC. Identificaram perturbações na relação conjugal em 50% dos sujeitos com perturbações psíquicas. O estudo de regressão estatística permitiu evidenciar a

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relação entre a existência de psicopatologia e as escalas de depressão, ansiedade e hostilidade e o Índice Sintomático Geral (GSI) do SCL-90-R.

O presente estudo foi desenvolvido com o objectivo fazer a caracterização e avaliar a relação entre a PIC e os aspectos psicoemocionais numa amostra de sujeitos obesos.

MÉTODO Participantes

Participaram, no presente estudo, 67 sujeitos obesos, dos quais 37 eram candidatos a cirurgia bariátrica (G1) seguidos na consulta de Psicologia, num Hospital Geral da Região de Lisboa e, os restantes 30 eram sujeitos obesos sem qualquer intervenção clínica (G2), constituindo o grupo de controlo. A amostra foi recolhida entre Dezembro de 2005 e Novembro de 2006. Os participantes do G1 apresentaram IMC médio de 44,9kg/m2 sofrendo na sua maioria (78%) de obesidade mórbida, com idades entre os 19 e os 58 (M =39) anos, maioritariamente do sexo feminino (81%). Quanto ao G2 o IMC médio foi de 35,9kg/m2 em que apenas 20% evidenciaram obesidade mórbida, com idades entre os 19 e os 65 anos (M = 34), maioritariamente do sexo feminino (60%). A maior percentagem (44,8%) de participantes, apresentou uma escolaridade ao nível do ensino básico, e referiram ter companheiro (50,8%).

Material

Neste estudo foram utilizados 3 instrumentos: um Questionário Sócio-Demográfico; a Escala de Ingestão Compulsiva (BES, versão portuguesa da Binge Eating Scale, adaptada por Tapadinhas & Paiva, 2004); o Inventário de Sintomas Psicopatológicos (BSI, versão reduzida do SCL-90-R, cuja versão portuguesa foi adaptada por Canavarro, 1999). A BES é constituída por 16 itens, oito descrevem manifestações comportamentais de ingestão compulsiva e os restantes, sentimentos e cognições associados à ingestão compulsiva.

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A amostra de participantes candidatos a cirurgia bariátrica foi recolhida no Hospital Geral da Região de Lisboa, no âmbito da consulta de psicologia integrada na intervenção multidisciplinar na obesidade. Paralelamente, procedeu-se à recolha da amostra do grupo de controlo, tendo-se procurado fora do hospital uma amostra de participantes obesos, ou seja com IMC a partir de 30kg/m2, dentro da mesma faixa etária e não inseridos em programas multidisciplinares de intervenção na obesidade.

RESULTADOS

Através dos resultados encontrados neste estudo constatou-se uma incidência significativa de PIC (24%) nos participantes, sendo mais relevante no G1 (27%) onde se evidenciam níveis de gravidade mais severa (5,4%), embora sem diferenças estatisticamente significativas entre os grupos. O aumento do peso foi referido maioritariamente na idade adulta (58%), sendo que o excesso de peso ocorrido mais precocemente (infância ou adolescência) foi mais evidenciado pelos participantes sem PIC (35%) que pelos com PIC (30%).

No que concerne aos aspectos psicoemocionais constatou-se que, apesar do G2 apresentar maior percentagem de casos com psicopatologia (27%), o G1 evidenciou níveis mais graves na maioria da subescalas, evidenciando-se diferenças estatisticamente significativas entre os grupos no que se refere aos níveis de ansiedade (ANX: X2=8,1; p=0,004; PHO: X2=6,8; p=0,009) e stresse (GSI: X2=7,9; p=0,005).

Quando se estabeleceu uma relação entre a PIC e os aspectos psicoemocionais constatou-se que no G2 não se verificavam associações significativas entre as variáveis. Enquanto que no G1 os participantes com PIC apresentavam níveis de psicopatologia, com associações positivas entre a PIC e as duas variáveis psicoemocionais; depressão (r=0,36; p=0,02), e ansiedade (r=0,32; p=0,04).

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DISCUSSÃO

A análise dos resultados obtidos neste estudo, com uma amostra de obesos, sugere que a PIC está associada com a obesidade (Jambekar, Masheb & Grilo, 2003), e os obesos com PIC parecem constituir uma subcategoria entre a população de obesos atendendo às características específicas que apresentam (Azevedo, Santos & Fonseca, 2004; Segal & Garcia, 2005). A prevalência da PIC evidenciada nesta amostra segue uma distribuição equivalente à encontrada em diversos estudos internacionais, nomeadamente nos candidatos a cirurgia bariátrica (Azevedo, Santos & Fonseca, 2004; Pull, 2004). Nesta amostra, os obesos com PIC parecem diferir dos obesos sem PIC em alguns aspectos clínicos, nomeadamente quanto à gravidade da obesidade e aos níveis mais acentuados de psicopatologia, no entanto, quanto à idade mais precoce do inicio da obesidade parece existir neste grupo uma ligeira inversão face a outros estudos (Antoniou et al., 2003; Bulik, Sullivan & Kendler, 2002; Pull, 2004; Stunkard & Allison, 2003; Yanovski, 2002).

De acordo como DSM-IV (1996) o aumento do apetite está reconhecido como sendo um indicador de depressão, o que poderá fazer crer que a depressão afecta o apetite e o comportamento alimentar. A presença da PIC aparece associada com uma maior tendência a reagir aos acontecimentos stressantes com índices elevados de ansiedade (Bulik, Sullivan & Kendler, 2002; Guisado et al., 2002; Grilo, 2002), e depressão (Bulik, Sullivan & Kendler, 2002; Grilo, 2002), ou com outros sintomas psicopatológicos (Guisado et al., 2002; Segal & Garcia, 2005), tal como foi possível constatar neste estudo. A PIC pode representar um fenómeno de regulação do humor em indivíduos que estão predispostos a afectos depressivos ou ansiosos. Contudo, a psicopatologia pode ser secundária surgindo, muitas vezes, como uma reacção à própria obesidade e decorrente da estigmatização social e do isolamento profissional e social (Fandiño et al., 2004).

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Com este estudo podemos concluir que a obesidade é um processo complexo, multifactorial e dinâmico, que parece complicar-se com a ocorrência de perturbações do comportamento alimentar as quais acarretam outros aspectos psicopatológicos que tendem a agravar o quadro clínico.

REFERÊNCIAS

Antoniou, M., Tasca, G. A., Wood, J., & Bissada, H. (2003). Binge eating disorder versus overeating: A failure to replicate and common factors in severely obese treatment seeking women. Eating and Weight Disorders - Studies on Anorexia, Bulimia and Obesity, 8, 145-149. doi.org/10.1007/BF03325004

Azevedo, A. P., Santos, C. C., & Fonseca, D.C. (2004) Transtorno de Compulsão Alimentar. Revista de Psiquiatria Clínica, 31, 170-172.

Bulik, C. M., Sullivan, P. F., & Kendler, K. S. (2002). Medical and Psychiatric Morbidity in Obese Women with and without Binge Eating. International Journal of Eating Disorders, 32, 72-78. doi:org/10.1002/eat.10072

Cohn, N. (2003). The Preoperative Psychiatric Histories and Postoperative Weight Losses of Ninety Bariatric Surgery Patients. Perspectives in Psychology, 41- 49.

DSM-IV - Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais (1996) Lisboa: Climepsi Editores.

Fandiño, J., Benchimol, A. K., Coutinho, W. F., & Appolinário, J. C. (2004) Cirurgia Bariátrica: aspectos clínico-cirúrgicos e psiquiátricos. Revista de Psiquiatria RS, 26, 47-51.

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Friedman, M. A., Brownell, K. D. (1995) Psychological correlates of obesity: moving to the next research generation. Psychological Bulletin, 117, 3–20. doi:org/10.1037//0033-2909.117.1.3

Friedman, M. & Brownell, K.D. (2002) Psychological Consequences of Obesity. In C.G.Fairburn & K.D. Brownell (Eds.) Eating Disorders and Obesity. (pp.393-398). London: The Guilford Press.

Grilo, C. M. (2002) Binge Eating Disorder. In Fairburn, C. G. & Brownell, K.D. (Eds.) Eating Disorders and Obesity. (pp.178-187). London: The Guilford Press.

Guisado, J. A., Vaz, F. J., Alarcón, J., Béjar, A., Casado, M., & Rubio, M. (2002) Psicopatologia en Pacientes com Obesidad Mórbida Poscirugía Gástrica. Revista Cubana Endocrinologica, 13, 29-34.

Jambekar, S. A., Masheb, R. M., & Grilo, C. M. (2003) Gender Differences en Shame in Patients with Binge-Eating Disorder. Obesity Research, 11, 571-577.

doi:org/10.1038/oby.2003.80

Napolitano, M.A., Head, S., Babyak, M.A., & Blumenthal, J. A. (2001). Binge Eating Disorder and Night Eating Syndrome: Psychological and Behavioral Characteristics. International Journal of Eating Disorder, 30, 193-203. doi:org/10.1002/eat.1072

Pull, C. B. (2004). Binge Eating Disorder. Current Opinion in Psychiatry, 17, 43-48.

doi:org/10.1097/00001504-200401000-00008

Stunkard, A.J., & Allison, K. C. (2003). Two forms of disordered eating in obesity: binge eating and night eating. International Journal of Obesity, 27, 1-12.

doi:org/10.1038/sj.ijo.0802186

Yanovski, S. Z. (2002) Binge Eating in Obese Person. In C.Fairburn & K.Brownell (Eds.) Eating Disorders and Obesity. (pp. 403-407). London: The Guilford Press.

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Zwann, M., Mitchell, J.E., Howell; L. M., Monson, N., Kremeier, L. S., Crosby, R. D., & Seim, H. C. (2003). Characteristics of Morbidly Obese Patients Before Gastric Bypass Surgery. Comprehensive Psychiatry, 44, 428-434.

Referências

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