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O Sistema Único de Saúde - SUS - sua criação, seus princípios e a efetivação do direito à saúde

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GRANDE DO SUL

PATRICIA DE MELLO BERTI

O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SUS – SUA CRIAÇÃO, SEUS PRINCÍPIOS E A EFETIVAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE

Santa Rosa (RS) 2012

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PATRICIA DE MELLO BERTI

O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SUS – SUA CRIAÇÃO, SEUS PRINCÍPIOS E A EFETIVAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE

Trabalho de Conclusão final do Curso de Graduação em Direito da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul - UNIJUÍ, apresentado como requisito parcial para a aprovação no componente curricular Metodologia da Pesquisa Jurídica.

DEJS - Departamento de Estudos Jurídicos e Sociais.

Orientador: Dr. Daniel Rubens Cenci

Santa Rosa (RS) 2012

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Dedico este trabalho a Deus, fonte da minha sabedoria, e a meus pais João e Rosane, por todo o apoio e incentivo durante estes anos da minha caminhada acadêmica.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, acima de tudo, fonte da minha sabedoria, pela vida, pela fé e pela graça alcançada.

A meus pais que sempre me incentivaram e me deram forças, e se sacrificaram tanto por mim.

A meu irmão Tiago pela paciência nas muitas horas de ausência.

A meu orientador Dr. Daniel Cenci pela sua dedicação e disponibilidade, e empréstimo de livros.

A todos que de uma forma e outra colaboraram durante a trajetória de construção deste trabalho, minha muito obrigada!

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“Amado, desejo que te vá bem em todas as coisas e que tenhas saúde, assim como bem vai a tua alma.”

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O presente trabalho de pesquisa monográfica faz uma análise de como se deu o surgimento do Direito à Saúde, relatando desde seu conceito até a construção do Sistema Único de Saúde – SUS. Analisa a consolidação do Direito à Saúde, se atendo aos fatos que discorrem sobre a construção do Sistema Único de Saúde, principalmente no que diz respeito a sua construção e as normas Constitucionais e infraconstitucionais. Faz também uma breve exposição dos princípios que norteiam o Direito à Saúde, tecendo um breve comentário sobre a política de acesso aos medicamentos.

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The present monographs research provides an analysis of how was the appearance of the Right to Health, reporting since its conception to the construction of Unic Health System – (SUS). It analyzes the consolidation of the Right to Health, having the facts that the discourse about the construction of Unic Health System – (SUS), mainly regarded to its construction and to its constitutional and infra norms. It also makes a brief exposition of the principles that guide the Right to Health leading on a brief comment about the politics access to medicine.

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INTRODUÇÃO ... 8

1 O DIREITO À SAÚDE E CIDADANIA ... 10

1.1 Conceituando saúde e cidadania ... 11

1.2 O conceito de saúde ao longo da história ... 13

1.3 O conteúdo de direito à saúde na Constituição Federal ... 17

2 A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE ... 20

2.1 A construção histórica do SUS ... 22

2.2 O SUS na Constituição Federal ... 26

2.3 O SUS na legislação infraconstitucional ... 30

3 POLÍTICA PARA ACESSO AOS MEDICAMENTOS ... 35

3.1 Os princípios do direito à saúde ... 37

3.2 Instrumentos jurídicos de garantia do direito à saúde quanto aos medicamentos ... 46

3.3 O tratamento jurisprudencial do direito à saúde ... 50

CONCLUSÃO ... 55

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INTRODUÇÃO

O presente estudo aborda o direito à saúde, por ser este um direito fundamental de toda a pessoa humana. Discorre-se sobre aspectos históricos da emergência deste direito, buscando destacar os aspectos mais marcantes do direito à saúde no Brasil. Dessa forma, relata desde as primeiras Constituições, até chegarmos à promulgação da Constituição Federal de 1988.

Nesse sentido, analisa-se também os princípios que norteiam o direito à saúde. Assim, discorre-se de forma sucinta cada um dos principais princípios do Sistema Único de Saúde. Ademais, traz ainda posicionamentos judiciais a respeito do direito à saúde, sua vasta fundamentação legal, especialmente amparado pela Constituição Federal de 1988, mas também percebendo que tal direito se consolida mundialmente nos grandes documentos das Nações Unidas.

Assim, para que fosse concretizado o presente trabalho, foram efetuadas pesquisas bibliográficas e também por meio eletrônico, analisando também as jurisprudências, a fim de permitir um aprofundamento no estudo do direito à saúde, seus fundamentos legais até sua efetivação.

Inicialmente, foi feita uma abordagem referente a uma visão ampla do conceito de saúde. Nesse sentido, foi visualizada a saúde ao longo da história, fazendo um apanhado de como surgiu, nos primórdios, a idéia de saúde. Ademais, faz-se também uma pequena explanação do que seria o conceito de saúde.

No segundo capítulo, é analisada mais profundamente a forma como se consolidou o Sistema Único de Saúde. Dessa forma, abrange desde sua construção,

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indo até um apanhado de sua história. Assim, engloba como foi adotada a concepção de direito à saúde nas Constituições Federais que o Brasil já teve, englobando como está hoje a saúde consolidada em nosso sistema jurídico. Destarte, refere-se também às Leis Orgânicas que regulamentam o direito à saúde.

Por fim, no terceiro capítulo faz-se uma abordagem no que diz respeito aos princípios que norteiam o direito à saúde. Assim, conceitua e descreve cada um isoladamente. Ainda, refere-se de modo sucinto ao que nossos Tribunais vem julgando quanto à saúde – esta, avençada como um direito social, que deve ser estendido a todos, sem quaisquer distinções.

Nesse sentido, o presente trabalho busca ampliar os conhecimentos do pesquisador, bem como, informações e reflexões ao leitor, no que se refere aos princípios do Sistema Único de Saúde, mostrando, de forma clara, como ele se originou e se consolidou vindo a estar em nossa Constituição Federal, hoje, como um direito essencial, que deve ser garantido e estendido a todos, por meio de políticas públicas.

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1 DIREITO À SAÚDE E CIDADANIA – APONTAMENTOS INTRODUTÓRIOS

O direito à saúde, tal qual temos hoje, contemplado em nossa Constituição, com ênfase no princípio da dignidade da pessoa humana, englobando o acesso a todos, sem distinção de raça, cor, credo ou religião, não foi sempre assim. Em princípio, era destinado apenas a uma pequena classe, a qual tinha direito apenas aos cuidados básicos de saúde, de forma precária.

Aos poucos, tudo foi mudando, e o acesso a saúde foi se solidificando, fazendo com que, não apenas uma pequena parcela da população pudesse ter direito a uma saúde digna – em especial ao acesso aos medicamentos –, mas que a todos fosse garantida a acessibilidade sem qualquer discriminação.

Assim, temos legitimado na Constituição o direito de todos às ações de saúde, devendo o Poder Público prover o pleno gozo desse direito. É, portanto, um ordenamento político e organizacional para reordenar os serviços e ações de saúde, aprimorada em princípios doutrinários que correspondam a direitos humanos, dando o aparato legal para o exercício da prática de saúde ética.

Nesse contexto, segundo Mariana Flichtiner Figueiredo (2007, p. 78) “a proteção sanitária seria finalmente tratada como saber social e política de governo”, no passo que ao ser estabelecido em nosso ordenamento constitucional a saúde como “direito de todos e dever do Estado”, deve, portanto, ser tal disponibilizada, ou, possibilitada aos brasileiros e estrangeiros residentes no país.

Como se verá mais adiante, além do que nos garante a Constituição Federal de 1988, temos ainda, a Legislação do Sistema Único de Saúde, a Lei n.° 8.080/90, que traz, em seu bojo, garantia de qualidade de vida digna, estendida a todos, sem qualquer distinção.

Ademais, saúde não se resume tão somente a medicamentos, ou simplesmente a um atendimento ambulatorial. Saúde é qualidade de vida. E essa qualidade de vida envolve várias ações, que primam para o bem-estar dos cidadãos.

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1.1 Conceituando saúde e cidadania

Saúde e cidadania são palavras que, unidas, fazem frente a uma gama de direitos. Nesse sentido, pode-se destacar, nos dizeres de Marcos Silvio de Santana, que:

A história da cidadania confunde-se com a história dos direitos humanos, a história das lutas das gentes para a afirmação de valores éticos, como a liberdade, a dignidade e a igualdade de todos os humanos indistintamente; existe um relacionamento estreito entre cidadania e luta por justiça, por democracia e outros direitos fundamentais asseguradores de condições dignas de sobrevivência.

Assim, conforme nos ensina Dalmo Dallari (apud SANTANA), tem-se que:

A cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social.

Já a saúde, “é o estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doença”, conforme o conceito adotado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Nesse sentido, podemos dizer que o conceito de saúde simboliza um compromisso, um horizonte a ser perseguido, pois essa ainda não é nossa realidade. Isto porque, nos remete tal conceito a um nível de „saúde ótima‟, o que é algo utópico, já que é a mudança em nossa vida que irá nos garantir um bem-estar físico, e não a estabilidade.

Tal conceito dado pela OMS, segundo Figueiredo (1997, p. 80) “superou a idéia de saúde como mera inexistência de doenças, destacando a importância entre o equilíbrio do homem, interna e externamente.” Nesse sentido, o Estado atua subsidiariamente, tão somente na proporção de cuidados à saúde das pessoas, suprimindo o questionamento quanto às estruturas sociais e econômicas, ocultando, assim, os problemas sanitários.

Desse modo, tanto direito à saúde quanto direito à cidadania são expressões que remetem aos direitos humanos. Ambos dizem respeito aos direitos e deveres

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que terá um cidadão. Ele terá deveres a cumprir, enquanto que o Estado vai lhe garantir seus direitos fundamentais, consolidados na legislação.

A OMS alargou a opinião de saúde, pois ultrapassou o ponto de vista negativista de „ausência de doenças‟ ao acrescentar um aspecto positivo, qual seja objetivar um completo estado de bem-estar físico, mental e social. Assim, propôs uma saúde não apenas preventiva, mas criou uma saúde efetivamente palpável, retornando à ideia de qualidade de vida. Nesse parâmetro, Sarlet (2003, p. 02 apud FIGUEIREDO, 2007, p. 82) escreve que:

O completo bem-estar físico, mental e social densifica o princípio da dignidade humana, pois não se imagina que condições de vida insalubres e, de modo geral, inadequadas, sejam aceitas como conteúdo de uma vida com dignidade.

Esse entendimento, portanto, assegura a justiciabilidade do direito à saúde, no que se refere às prestações materiais originárias, bem como, na proteção do alcance das palavras dignidade da pessoa humana, que complementa o contexto do direito à saúde.

Assim sendo, a saúde, ou, o direito à saúde, está também previsto em nossa Constituição Federal no artigo 6°, que integra o Capítulo II do Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais –, apontado como consistindo em um direito social oponível ao Estado, sendo especificada também no Título VIII – Da Ordem Social – Seção II, no artigo 196, ambos referidos abaixo:

Art. 6°. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

[...]

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Diante da leitura de tais dispositivos, podemos exarar que o direito à saúde corresponde a um direito fundamental, devendo o Estado realizar políticas sociais e

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econômicas, como propósito de reduzir e prevenir o risco de doenças e outros agravos, possibilitando, dessa forma, o acesso igualitário e universal às ações e aos serviços de saúde.

Igualmente, não há apenas um direito, mas um dever, que aponta para o acolhimento de uma categoria constitucional independente, devendo o Estado, facilitar ou fornecer diretamente serviços e bens que supram as necessidades primárias da sociedade, implantando uma política de saúde eficaz, que aumentem o nível de proteção à saúde já ofertada.

Como elemento de cidadania, o direito à saúde esta especificado, ainda, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, descrito no art. 25, abaixo descrito:

Art. 25

1. Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle.

2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças nascidas dentro ou fora do matrimônio gozarão da mesma proteção social.

Ante isso, delineia uma pretensão longa e convalida não apenas o curar ou evitar as doenças, mas ter toda uma vida saudável, de modo que não seja suscetível a doenças, levando em conta o padrão de vida que cada um possui. Ou seja, não basta prevenir ou curar doenças, deve-se, antes de tudo, buscar meios para que todos possam ter uma vida digna, de modo que sejam evitadas moléstias na população.

1.2 O conceito de saúde ao longo da história

A saúde, tal como a temos hoje, passou por um longo processo de evolução, se consolidou de forma lenta e gradual, iniciando ainda no século XIX, com a vinda da Corte portuguesa ao Brasil. Nas palavras do doutrinador Luis Roberto Barroso (2009, p. 12-14 apud MATTOS; SOUZA, 2011, p. 14-15):

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A trajetória da saúde pública no Brasil inicia-se ainda no século XIX, com a vinda da Corte portuguesa. Nesse período, eram realizadas apenas algumas ações de combate à lepra e à peste, e algum controle sanitário, especialmente sobre os portos e ruas. É somente entre 1870 e 1930 que o Estado passa a praticar algumas ações mais efetivas no campo da saúde, com a adoção do modelo “campanhista”, caracterizado pelo uso corrente da autoridade e da força policial. Apesar dos abusos cometidos, o modelo “campanhista” obteve importantes sucessos no controle de doenças epidêmicas, conseguindo, inclusive, erradicar a febre amarela na Cidade do Rio de Janeiro. Durante o período de predominância desse modelo, não havia, contudo, ações públicas curativas, que ficavam reservadas aos serviços privados e à caridade. Somente a partir da década de 30 há a estruturação básica do sistema público de saúde, que passa a realizar também ações curativas. É criado o Ministério da Educação e Saúde Pública. Criam-se os Institutos de Previdência [...], que ofereciam serviços de saúde de caráter curativo. [...] A saúde pública não era universalizada em sua dimensão curativa, restringindo-se a beneficiar os trabalhadores que contribuíam para os institutos de previdência. [...] No entanto, grande contingente da população brasileira, que não integrava o mercado de trabalho formal, continuava excluído do direito à saúde, ainda dependendo, como ocorria no século XIX, da caridade pública.

Dessa forma, a saúde contemplada no século XIX, pode ser chamada de saúde curativa, na medida em que procurava tão somente dirimir as enfermidades e moléstias do povo. Isso ocorria em virtude de que, um trabalhador doente, era um trabalhador sem valia para o empregador, devendo, portanto, ser substituído.

Nesse sentido, quando houve a promulgação da Constituição, em 1988, o direito à saúde foi universalizado, deixando de abranger apenas um pequeno contingente da população de trabalhadores formais. Além disso, foi previsto em seu ordenamento o Sistema Único de Saúde (SUS), que possuí caráter público, sendo formado por uma rede de serviços regionalizada, hierarquizada e descentralizada, tendo em cada esfera de governo direção única, e, garantindo aos usuários, através de participação popular, controle nas Conferências e Conselhos de Saúde.

Nesse sentido, destaca-se que:

O Texto da Constituição Federal de 1988 assume várias propostas do Movimento Sanitário. Saúde é definida como Direito de todos e dever do Estado (Art. 196). As ações e serviços de saúde são de relevância pública (Art. 197). O Sistema Único de Saúde é proposto como uma rede organizada de acordo com as diretrizes de

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descentralização, atendimento integral e participação da comunidade (Art. 198). (DANIEL RUBENS CENCI, 2010, p. 44)

Diante disso, Silva (1995, p. 123 apud SCHWARTZ, 2001, p. 50) nos apresenta que “a tarefa do Estado Democrático de Direito consiste, pois em recuperar as desigualdades sociais e regionais e instaurar um regime democrático que realize a justiça social.” Busca, ainda, uma justiça social efetiva, bem como uma qualidade de vida moderna, alcançando a transformação da realidade que se proporciona.

Nesse sentido, até que foi consolidado em nossa Carta Magma, passou o direito à saúde por longas transformações. Primeiramente, era tido apenas como busca de eliminar os males da humanidade, pois muitas pessoas eram acometidas de doenças, sem que tivessem um medicamento ou mesmo uma vacina que pudessem tomar ou remediar sua cura.

Nesse contexto, podemos dizer que os direitos humanos, em uma visão ampla, foram uma conquista para todos, na medida em que analisamos os primórdios dos tempos e contemplamos que, nos tempos antigos, o direito à saúde era visto como algo para remediar males, ou, que só alcançava uma pequena parcela da população. Ainda, remetendo aos primórdios da humanidade, como por exemplo, para os Dez Mandamentos ou para a Lei das Doze Tábuas, visualizamos que estes eram conjuntos de regras pré-estabelecidas, repletas de obrigações, contudo, não falavam, em nenhum momento, em direitos. Nas palavras de Lopes (apud FIGUEIREDO 2007, p. 19), “os primeiros códigos morais e jurídicos, [...] eram conjuntos de regras que estabeleciam obrigações para os indivíduos, mas não direitos.”

Já na fase da burguesia, na Idade Média, surge a concepção de direitos naturais, ou seja, aqueles inerentes ao homem, inderrogáveis, abstratos e universais. A positivação deles se deu na Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão na Revolução Francesa, promulgada em 26 de agosto de 1789. Tal declaração tinha como intuito proteger os direitos do homem contra atos do governo,

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informando, assim, aos indivíduos sobre seus direitos fundamentais, que eram apenas declarados, mas ainda não tinham sido constituídos.

O Brasil, mesmo tendo sido signatário da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, ainda não contemplava um artigo exclusivo em sua Constituição de 1967, onde, apenas havia ressalvas, indícios de que os governantes estavam começando a preocupar-se com a proteção sanitária, sem, contudo, acontecer avanços significativos na vida da população.

Foi somente com a promulgação da Constituição Federal, em 1988, que houve de fato a positivação do tema direito à saúde. Com relação a outros países que já haviam firmado em suas Constituições o direito à saúde, o Brasil o adotou de forma atrasada, consolidando a saúde como direito fundamental. Não simplesmente como um direito apenas importante, mas fundamental, onde o Estado deve garanti-lo mediante políticas públicas.

Assim, o direito à saúde, nas palavras de Figueiredo (2007, p. 96), é:

resultado das propostas de “Reforma Sanitária” defendidas por movimentos sociais e apresentados durante a Assembléia Nacional Constituinte de 1986/1987 em demonstração da “inadequação do sistema de saúde então vigente”, inapto para lidar com problemas sanitários diversos (quadro de doenças de todos os tipos, baixa cobertura assistencial da população, ausência de critérios e de transparência dos gastos públicos, etc.).

Havia até então, somente ações de promoção de saúde e prevenção de doenças, desenvolvidas pelo Ministério da Saúde para atender a população em geral. Segundo Figueiredo (2007, p. 96), “as ações de promoção da saúde e prevenção de doenças eram desenvolvidas quase que exclusivamente pelo Ministério da Saúde.” De igual forma, a assistência médico-hospitalar prestada pelo INAMPS (Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social), não era universal, restringindo-se apenas aos trabalhadores (segurados e seus dependentes) do INPS (Instituto Nacional de Previdência Social, que posteriormente veio a ser o INSS – Instituto Nacional da Previdência Social). A população mesmo,

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só tinha acesso aos hospitais públicos que prestavam os serviços básicos de atendimento.

Então, dois anos após a promulgação da Constituição, nasce a Lei n° 8.080, a Legislação do Sistema Único de Saúde, a qual, partindo do princípio da descentralização de poderes, regula as competências de cada Ente da Federação, que intera uma rede regionalizada e hierarquizada de ações e serviços de saúde. Forma, assim, um conjunto de unidades, de serviços e de ações que converge para um fim comum - a Lei do Sistema Único de Saúde – a consolidação do direito à saúde em nosso ordenamento jurídico.

1.3 O conteúdo do direito à saúde na Constituição brasileira

O tema direito à saúde foi abordado de diferentes formas ao longo de nossas Constituições, entretanto, é notório o fato de que o Brasil mostrou-se atrasado no sentido de adotar em seu ordenamento o direito à saúde.

Em 1824 temos a Constituição do Império, esta com poucas inovações no que concerne ao social. Impregnada por uma herança absolutista, continha, entretanto, forte contexto liberal. Contudo, não normatizou, regulamentou ou colocou como princípio o direito à saúde. Nesse período também eram escassos os hospitais, poucos ainda, e a vigilância sanitária ainda estava se consolidando, sendo que não cabia ao Estado interferir nesse tipo de questão.

A Constituição de 1934 preocupou-se com a questão do sanitarismo, elaborando, inclusive, a competência concorrente à União e aos Estados em relação à saúde, fixando-os como responsáveis por tal fator. Essa fórmula foi, inclusive, adotada na Constituição de 1988.

As Constituições de 1937 e 1946 nada falaram ou referiram sobre o tema. Então, em 1948, com a Constituição da República Italiana, a saúde já não foi contemplada como fator de produtividade, mas como direito do cidadão e a doença passou a ser discutida como processo biológico e social. Nela, destacou-se o art. 32, que elevou o sentido de direito à saúde trazida até então:

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Art. 32 – A República tutela a saúde como direito fundamental do indivíduo e interesse da coletividade, e garante tratamentos gratuitos aos indigentes. Ninguém pode ser obrigado a um determinado tratamento sanitário, salvo disposição em lei. A lei não pode, em hipótese alguma, violar os limites impostos pelo respeito à pessoa humana.

Também em 1948, a Declaração dos Direitos do Homem descreve a saúde como componente da cidadania, ao descrever que “art. 25. Toda pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e a sua família a saúde e a alimentação [...]” O que se mostra curioso é o fato de que o Brasil, sendo signatário dessa Declaração, não a tinha contemplado em seu ordenamento.

A Constituição de Portugal, em 1976, apenas deu uma melhor tradução no conceito de direito à saúde, descrita em 1948. Assim definia: “1. Todos têm direito à proteção da saúde e o dever de a defender e a promover.” Nesse sentido, não tinha o Estado o dever de garanti-la, mas os cidadãos deviam providenciar formas de defendê-la e/ou promovê-la.

Nesse impasse, foi apenas em 1988, com a promulgação da Constituição Federal que o direito à saúde foi, de fato, positivado em nosso ordenamento. Embora de forma atrasada, a Constituição o contemplou e inovou no sentido de afirmar que “é direito de todos e dever do Estado.” Após, tivemos implantada a Lei do Sistema Único de Saúde – SUS, Lei n° 8.080 de 1990, a qual é fundada no princípio da universalidade, ou seja, deve atender a toda a população. Renovou quanto à descentralização, firmando um comando único para cada esfera do Estado (compreendido como União), bem como na integralidade do atendimento e incluindo a participação da comunidade.

Nas palavras de Figueiredo (2007, p. 97) “dispôs sobre as condições, a organização das ações e o funcionamento dos serviços de saúde, tendentes à realização da promoção, proteção e recuperação da saúde.” Além disso, abrange o SUS a rede pública e privada (esta, através de contratos ou convênios, ajustado com

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o Poder Público), que formam uma teia, buscando o bem comum da saúde da população, atentos, sempre, aos princípios basilares do sistema.

Nesse impasse, o próximo capítulo irá abordar como se dá a construção do SUS, buscando traçar sua história desde as primeiras Constituições, fazendo um apanhado também da consolidação na Lei n° 8.080/90 – Lei do Sistema Único de Saúde.

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2 A CONSTRUÇÃO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SUS

A inauguração dos direitos sociais em nossa Carta Magma se consolidou de forma muito abrangente, com a entrada em vigor da Constituição Federal de 1988. A amplitude do direito à saúde consagrada no ordenamento constitucional, nas palavras de Figueiredo (2007, p. 62), “reconhecem aos brasileiros um conjunto de direitos fundamentais sociais bastante rico e diversificado, pretendendo abarcar os mais diferentes aspectos da vida humana.”

No entanto, conforme nos ensina Bermúdez et al (2009, p. 115):

Os antecedentes do SUS remetem a um cenário epidemiológico e de estrutura sanitária, caracterizada pela falta de cobertura e limitações do modelo vigente, relacionados com os grandes problemas de desenvolvimento e dívida social que o País acumulava. Nessa perspectiva, o SUS promove uma transição de um modelo assistencial, vertical, centrado na doença, baseado na prestação de serviços de saúde individual e notadamente curativo, para um modelo completamente novo quanto à lógica de sua organização e dos valores que o constituem.

Assim, nasce o Sistema Único de Saúde, que traz em seu bojo um conceito novo do método saúde-doença, abrigando em si, os princípios doutrinários da universalidade, da equidade e da integralidade “para o conjunto das ações em saúde que abrangem um ciclo completo e integrado entre a promoção à saúde, a proteção e a recuperação” (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1991).

Entretanto, com base em dados do Ministério da Saúde (2007, p. 10), tão somente “a consolidação do SUS, como um sistema de atenção e cuidados em saúde, não é suficiente para a efetivação do direito da população à saúde.” Isso porque, a captação da saúde, ou seja, sua conquista deve estar articulada no conjunto de fatores da ordem econômico-social e cultural, que traz influências direta ou indiretamente sobre as condições de saúde da população.

Nesse sentido, é necessário que o SUS seja entendido como um método em construção, que ainda carece de enormes esforços estatais, bem como de energias da sociedade civil, tudo isso, para que haja sua completa compreensão como

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Sistema Único de Saúde. Ademais, é notório o fato de que, embora todo o processo de construção que ainda passa o SUS, ele tem tido importantes avanços. Conforme Luchessi (2003 apud BERMÚDEZ et al, 2009, p. 116), podemos destacar, dentre os avanços alcançados:

a institucionalização e sistematização da participação social, atribuição de responsabilidades mais específicas nos processos de descentralização por meio da efetivação das Normas Operacionais Básicas do SUS, que constituem ferramentas de operacionalização e de regulação do sistema. Crescente autonomia dos municípios na gestão financeira do SUS por meio da transferência de recursos fundo a fundo, mecanismos de planejamento, gestão e avaliação do sistema nos três níveis de governo.

Não podemos esquecer, entretanto, que, a efetivação do direito à saúde não acontece de forma espontânea. Ela depende do provimento de políticas sociais e econômicas, que protestem pelo desenvolvimento econômico sustentável, bem como, pela distribuição de renda; compelindo, especificamente ao SUS a promoção, proteção e recuperação da saúde dos indivíduos e das coletividades de forma equitativa.

Portanto, temos por certo de “que cabe ao Estado a produção e a regulação das políticas sociais” (BERMÚDEZ et al, 2009), sendo que, conforme a lei do Sistema Único de Saúde, no seu artigo 2° “o dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade.”

Por fim, podemos descrever que, o SUS, tendo em vista os avanços alcançados, se mostra como um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo. Ademais, tem como proposta, uma cobertura universal e integral para os mais de 80% da população brasileira que não é coberta por planos privados de saúde.

Como política nacional descentralizada, o SUS vem fortalecendo o papel, bem como a autonomia dos níveis locais, ampliando, dessa forma, as possibilidades de controle democrático das ações e serviços oferecidos à população.

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2.1 A construção histórica do SUS

Como se sabe, o direito à saúde, no plano internacional, foi reconhecido em 1948, quando houve a aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, pela Organização das Nações Unidas (ONU). No entanto, o Brasil, embora signatário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, teve o direito à saúde contemplada como uma simples “assistência” à saúde, mas, restritos aqueles que possuíam carteira assinada.

Nesse sentido, eram contemplados pela assistência em saúde aqueles que contribuíam para a previdência social. Assim, a maioria da população estava privada do acesso às ações de saúde, sendo que tinham de contentar-se com a assistência que era prestada por entidades filantrópicas. Assim, conforme o Ministério da Saúde (2007, p. 07):

a saúde não era considerada um direito, mas tão-somente um benefício da previdência social, como a aposentadoria, o auxílio-doença, a licença-maternidade e outros.

Destarte, ainda com base no que diz o Ministério da Saúde (2007, p. 07):

durante décadas, as políticas públicas de saúde tiveram como objetivo propiciar a manutenção e recuperação da força de trabalho necessárias à reprodução social do capital. Ao mesmo tempo, o setor Saúde era marcado por forte cunho assistencialista e curativo, de caráter crescentemente privatista, com pouca prioridade para as políticas de promoção da saúde.

Dessa forma, como já explanado anteriormente, o SUS é fruto de propostas de reforma sanitária, onde os movimentos sociais da época reivindicavam melhoras no sistema sanitário, que era oferecido de forma precária e, tão somente aqueles que eram segurados do INAMPS (Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social), hoje, Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), ou seja, só quem tinha carteira assinada tinha direito a ter acesso a um sistema de saúde, ou, aos cuidados básicos de saúde.

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As primeiras articulações desses movimentos remetem-nos ao início da década de 1960, quando ainda sendo concebido, foi abortado pelo golpe militar de 1964. Dessa forma, o movimento veio a atingir sua maturidade a partir do final da década de 1970 e início dos anos 1980. O movimento teve a participação e a colaboração de técnicos e intelectuais, bem como, de partidos políticos, de diferentes correntes e tendências e, ainda, de diversos movimentos sociais da época.

A luta pela Reforma Sanitária teve como ponto ápice, a realização, em 1986, da 8ª Conferência Nacional de Saúde. Esta, de forma pioneira, “permitiu a participação da sociedade civil organizada no processo de construção de um novo ideário para a saúde” (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2007, p. 08).

A conferência teve como norte, o princípio da “saúde como direito de todos e dever do Estado”. Os principais temas, suscitados na conferência, tiveram como resultado suas decisões descritas na Constituição Federal, que foi promulgada em 1988.

Dessa forma, o Sistema Único de Saúde passou a integrar o sistema da seguridade social brasileira. Assim foi estabelecido em nossa Carta Magma, no Título VIII (Da Ordem Social), no Capítulo II (Da Seguridade Social), que a Seguridade Social compreende “um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.”

Assim, comparando a realidade que se tinha anteriormente à criação do SUS, pode-se ver que sua concepção representou um avanço significativo para a época, principalmente no que diz respeito às políticas sociais trazidas na Constituição Federal de 1988. Destarte, segundo Carvalho (apud FIGUEIREDO, 2007, p. 96):

A conformação em “sistema” impõe que o SUS subsista como “um conjunto de unidades, serviços e ações que interagem para um fim comum”, em que o adjetivo “único” determina que as diretrizes e

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princípios estabelecidos constitucionalmente devam ser seguidos de forma unívoca nos três níveis da federação.

Sob essa ótica, podemos considerar que, anteriormente à criação do SUS, a saúde não era considerada um direito social. Eis que o modelo que se tinha de saúde naquele período dividia os brasileiros em três categorias, quais sejam: “os que podiam pagar por serviços de saúde privados; os que tinham direito à saúde pública por serem segurados pela previdência social (trabalhadores com carteira assinada); e os que não possuíam direito algum” (que representavam a maioria da população) (PORTAL DA SAÚDE).

Nesse sentido, foi o SUS criado para que pudesse ser oferecido um atendimento igualitário, bem como, cuidado e promoção para proporcionar uma saúde digna à população, de modo que todos tivessem acesso ao atendimento no sistema de saúde. Assim, podemos perceber que o SUS “constitui um projeto social único que se materializa por meio de ações de promoção, prevenção e assistência à saúde dos brasileiros” (PORTAL DA SAÚDE)

Para tanto, a Lei n° 8.080/90, a lei do Sistema Único de Saúde, trouxe, em seu art. 3°, caput que:

Art. 3º - A saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais; os níveis de saúde da população expressam a organização social e econômica do País.

Seguindo essa visão que se extraí do SUS, vemos que ele compreende um dos maiores sistemas público de saúde do mundo. Ora, o SUS contempla desde um simplório atendimento ambulatorial, indo até um transplante de órgãos. E tudo isso, é garantido de forma a abranger um acesso integral, universal e gratuito para toda a população do país.

Ademais, nas palavras de Figueiredo (2007, p. 97):

Não obstante constituído como sistema público, o SUS compreende as redes pública e privada de saúde, esta última utilizada por meio

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de contratação ou convênio firmado com o Poder Público. Ambas formam uma rede regional, para adequação às particularidades locais; e hierárquica, ou seja, que deve estrita observância ao conjunto de princípios que regem o sistema (integralidade, igualdade e participação da comunidade).

O SUS, criado em 1988, pela Constituição Federal, foi instituído para ser o sistema de saúde dos brasileiros, sendo protegido por um conceito extenso de saúde. Conforme é o entendimento do Ministério da Saúde, o SUS:

além de oferecer consultas, exames e internações, o Sistema também promove campanhas de vacinação e ações de prevenção e de vigilância sanitária – como fiscalização de alimentos e registro de

medicamentos –, atingindo, assim, a vida de cada um dos

brasileiros.

Ainda, analisando a construção do SUS, visualizamos os aspectos fundamentais que, juntos, dirigiram e viabilizaram todo o processo de reforma que lhe deu origem, as quais foram as Conferências de Saúde e os Conselhos de Saúde, por meio de sua gestão; e o estabelecimento do exercício de direção, por meio de um único órgão central em cada esfera (sendo uma no plano federal, e as demais divididas em Secretarias Estaduais e Municipais).

Por fim, temos ainda, seguindo a doutrina de Neto et al, que:

a efetivação do direito à saúde depende do provimento de políticas sociais e econômicas que assegurem desenvolvimento econômico sustentável e distribuição de renda; cabendo, especificamente ao SUS a promoção, proteção e recuperação da saúde dos indivíduos e das coletividades de forma equitativa.

Assim, seguindo para a linha de financiamento do SUS, eis que houve uma significativa melhora no que diz respeito ao orçamento. Nesse sentido, temos visualizado que os repasses dos recursos da esfera federal para as esferas estadual e municipal tem ocorrido de forma regular, atendendo, assim, aos percentuais orçamentários, estabelecidos na Constituição Federal.

Ademais, a missão do SUS é a promoção no atendimento à saúde, para o fim de construir uma sociedade justa e democrática. Qualidade de vida é saúde.

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Portanto, deve ela estar vinculada aos direitos humanos. Destarte, nas palavras de Neto et al, “o direito à saúde exige a superação das desigualdades”, para tanto, é necessário que sejam assegurados o acesso igualitário aos alimentos, aos medicamentos, bem como aos serviços de saúde, que devem ser prestados de forma cada vez mais eficaz, a fim de que os princípios basilares do SUS sejam externados a toda a população brasileira.

2.2 O SUS na Constituição Federal

Preconiza nossa atual Constituição Federal, em seu artigo 196, caput, que:

Art. 196 A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

No entanto, nem sempre ela esteve assim, posta como um direito maior, como um dever do Estado em protegê-la e provê-la. O Brasil analisado pelo âmbito internacional teve um atraso significativo, no sentido de adotar o direito à saúde em seu ordenamento jurídico. Senão vejamos;

A primeira Constituição, a Constituição do Império, de 1824, foi uma Carta, trazendo alguns aspectos de “social”, pois continha em seu bojo um “forte conteúdo liberal” e também estava “impregnada de forte herança absolutista” (SCHWARTZ, 2001, p. 43 e 44). Tudo isso porque, não regulamentou ou normatizou o direito à saúde. Nessa época, vale lembrar, conforme a Revista Âmbito Jurídico que “no Brasil a intervenção estatal nos serviços de saúde vem desde a época colonial, mas somente no período republicano que essa se efetivou.”

Ademais, nesse período, eram escassos os hospitais, e os serviços de vigilância sanitária, praticamente inexistente. Ora, conforme preconiza Schwartz (2001, p. 44):

Entender saúde, à época, era visualizá-la como uma (des)graça das divindades. Não cabia ao Estado interferir nessa questão, quanto

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mais um Estado Liberal como aquele apregoado pela Constituição do Império.

Com a promulgação da Constituição Republicana, em 1891, nada mudou. Não houve, igualmente, a inserção do direito à saúde na ordem constitucional. Embora tenha ocorrido a vinda da Família Real para o Brasil, em 1808, nada sobre direito à saúde foi acrescido na Constituição de 1891.

Tão somente houve mudanças no sentido de criar, em 1829, uma Academia de Medicina, que funcionava como órgão consultivo do Imperador D. Pedro I em questões relativas à área da saúde. Nesse mesmo período, nasce a Junta de Higiene Pública, a qual, entretanto, não apresentou eficácia no que diz respeito ao cuidado da saúde da população.

Assim,

a fase imperial da história brasileira encerrou-se sem que o Estado solucionasse os graves problemas de saúde da população, fato este que fez com que o Brasil, ao final do segundo reinado, fosse conhecido como um país insalubre (REVISTA ÂMBITO JURÍDICO).

Com a proclamação da República, ocorrida em 1889, houve uma esperança de que haveria um progresso em relação à saúde, no entanto, nada aconteceu. A saúde pública era disponibilizada apenas a uma pequena parcela da população, sendo que eram realizadas tão somente ações sanitárias no intuito de controlar as endemias e epidemias que frequentemente assolavam a vida das pessoas.

Assim, a assistência médica que havia, era aquela prestada pelas Santas Casas, bem como pelas Instituições de caridade que havia na época. Ou seja, a saúde era vista como obra de caridade, pois havia arraigado na sociedade o modelo liberal privado tradicional. Quem não podia pagar por uma assistência sanitária, tinha de contentar-se com a beneficência das Santas Casas.

Já a Constituição de 1934 preocupou-se com a área sanitária. Trouxe, em seu artigo 10, inciso II a competência concorrente da União e dos Estados em

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relação à saúde, compelindo-os como responsáveis quanto à matéria. Ora, a Era Vargas foi de suma importância para o setor da saúde.

Getúlio Vargas criou, nesse período, os Ministérios da Educação e da Saúde Pública, mostrando o comprometimento do Estado com a preservação do bem-estar sanitário da população. Também possibilitou o atendimento de operários doentes, bem como, de seus dependentes. “Começaram assim a se estruturar os setores previdenciários, que foi ampliado ao decorrer dos anos, tornando-se o principal eixo de assistência médica da população trabalhadora dos centros urbanos” (REVISTA ÂMBITO JURÍDICO).

Durante a Era Vargas, houve uma significativa redução de mortes causadas por doenças epidêmicas, em especial, nos aglomerados centros urbanos do Sudeste e Sul do país. Entretanto, constatou-se um aumento nas doenças de massa, as quais atingem milhares de pessoas.

O que, no entanto, não pode ser mudado, foi o fato de o Brasil ter permanecido, nesse período, como um dos países mais enfermos do continente, embora tivesse tido um desenvolvimento na cobertura médico-hospitalar dos trabalhadores urbanos, e também no combate de enfermidades rurais.

A Constituição Federal de 1934, ainda convencionou certas garantias aos empregados, “tais como assistência médica, a licença remunerada à gestante trabalhadora, a jornada de trabalho de oito horas e o salário mínimo” (REVISTA ÂMBITO JURÍDICO).

No entanto, em 1937, a Constituição simplesmente silenciou sobre a matéria, sendo que representou um retrocesso no que diz respeito aos direitos humanos, pois ela instituiu a pena de morte, bem como, suspendeu as imunidades parlamentares, decretando a prisão e o exílio de opositores do governo. De igual forma, suprimiu a liberdade partidária, extinguindo a independência dos poderes e a autonomia federativa.

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A Constituição de 1946, assim como a de 1937, não falou nada sobre direito à saúde. No entanto, ela aboliu a pena de morte e a censura, restituindo os direitos individuais, o direito de greve, bem como a estabilidade de emprego após se completar dez anos de serviço. Ademais, retomou a independência dos três poderes e instituiu eleições diretas para Presidente da República, sendo cada mandato de cinco anos.

Todavia, com a promulgação da Constituição da República Italiana, em 1948, a saúde é concebida como um direito do cidadão, passando a abordar saúde e doença como processos biológicos e sociais. Assim dizia seu artigo 32:

Art. 32 – A República tutela a saúde como direito fundamental do

indivíduo e interesse da coletividade, e garante tratamentos gratuitos aos indigentes. Ninguém pode ser obrigado a um determinado tratamento sanitário, salvo disposição de lei. A lei não pode, em hipótese alguma, violar os limites impostos pelo respeito à pessoa humana.

No âmbito internacional, temos a Declaração dos Direitos do Homem, em 1948, a qual é o Brasil signatário, que traz em seu artigo 25 a seguinte redação:

1. Toda pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e a sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto a alimentação, ao vestuário, ao alojamento, a assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários; e tem direito a segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade. No mesmo intuito de garantir direitos sanitários, seguem “a Constituição espanhola, artigo 46, e a Constituição guatemalteca, artigos 93-100”, conforma faz referência Silva (1995, apud SCHWARTZ, 2001, p. 46).

A Constituição de 1967 trouxe como única referência do direito à saúde, a delegação à União da competência para estabelecer planos nacionais de educação e saúde, em seu artigo 8°, inciso XIV. Ou seja, mesmo o Brasil seguindo a Declaração de Direitos do Homem, não houve qualquer avanço significativo na Constituição, que representasse progressos de ordem de proteção sanitária.

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Foi somente em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, que o Brasil deu um grande passo, no sentido de garantia e proteção do direito da saúde, o qual foi estendido a toda a população, de forma que o Estado ficou encarregado de garanti-lo.

A Constituição Cidadã, como também pode ser chamada, positivou o tema „saúde‟, e teve como base a VIII Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986. Ela propôs amplas mudanças, alicerçadas no direito universal à saúde. Dentre essas modificações, podemos destacar como eixo principal, a participação da sociedade, bem como a descentralização dos serviços assistenciais.

Essa Conferência de Saúde serviu como base para a concepção do Sistema Único de Saúde – SUS, sendo que o relatório que foi elaborado nela serviu de auxílio para a construção da Constituição Federal de 1988, nos assuntos relacionados à área da saúde.

2.3 O SUS na legislação infraconstitucional

Criado com o advento da Constituição Federal de 1988, que reconheceu o direito de acesso universal à saúde a toda a população, o direito à saúde teve sua regulamentação apenas em 19 de setembro de 1990, quando entrou em vigor a Lei n° 8.080, a Lei do Sistema Único de Saúde.

Referida lei, dispôs sobre “as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde,” bem como, para “a organização e o funcionamento dos serviços de saúde.” Desse modo, conforme seu artigo 1°:

Art. 1° Esta lei regula, em todo o território nacional, as ações e serviços de saúde, executados isolada ou conjuntamente, em caráter permanente ou eventual, por pessoas naturais ou jurídicas de direito Público ou privado.

Posteriormente, mas ainda no mesmo ano, em 28 de dezembro, houve a promulgação da Lei n° 8.142, a qual dispôs sobre “a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde e sobre as transferências intergovernamentais

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de recursos financeiros na área da saúde.” Destarte, o SUS passou a contar em cada esfera de governo, com duas instâncias colegiadas, quais sejam; a Conferência de Saúde e o Conselho de Saúde.

A Conferência de Saúde tem como função avaliar a situação da saúde e propor a formulação da política de saúde. Já o Conselho da Saúde desempenha o papel de formular estratégias e atuar no controle de execução da política de saúde.

Nesse sentido então, podemos visualizar que, sem prejuízo do que dispõe a Constituição Federal de 1988, as normas infraconstitucionais que regulamentam o direito à saúde são as Leis Orgânicas da Saúde, a saber, Lei nº 8.080/90 e Lei nº 8.142/90.

Assim sendo, frisa-se que, as Leis Orgânicas da Saúde, conforme Compêndio Básico do Sistema Único de Saúde (2009, p. 02):

A Lei n° 8.080/90: regula as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços de saúde em todo o país, ao fixar normas a serem cumpridas quando da elaboração da política de Recursos Humanos para o SUS, dispôs no seu art. 27 que ela será formalizada e executada articuladamente pelas diferentes esferas de governo; A Lei n° 8.142/90: estabelece normas sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde, condiciona o recebimento de recursos da União, pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, a existência de comissão de

elaboração do plano de carreira, cargos e salários.

Ademais, além das Leis Orgânicas de Saúde, temos também as Portarias do Ministério da Saúde e as Deliberações do Conselho Nacional de Saúde e das Conferências Nacionais de Saúde. Todas servem para fazer com que o sistema jurídico-legal do SUS seja cada dia mais aperfeiçoado.

Ainda, temos no Sistema Único de Saúde, os serviços privados, os quais são contratados para prestarem assistência à saúde. Dessa forma, eles participam como complementação ao sistema, “segundo as diretrizes do Sistema Único de Saúde, a quem compete elaborar regras para regular as relações entre o SUS e

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esses serviços, tendo em vista a sua relevância pública” (COMPÊNDIO BÁSICO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE, p. 02. 2009).

Além disso, ressalta-se que as ações, os serviços públicos de saúde e os serviços privados (que são aqueles contratados ou conveniados), os quais integram o SUS, são desempenhados em conformidade com as diretrizes previstas no artigo 198 da Constituição Federal. Dessa forma, obedecem aos princípios organizativos, bem como aos doutrinários. Tais princípios são, conforme Conass – Para Entender a Gestão do SUS (2011, p. 26):

» universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência;

» integralidade de assistência, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;

» equidade;

» descentralização político-administrativa com direção única em cada esfera de governo;

» conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na prestação de serviços de assistência à saúde da população;

» participação da comunidade; e » regionalização e hierarquização.

Assim, houve uma regulamentação na organização e na forma de funcionamento dos serviços sanitários, bem como, a inclusão na lei, no que diz respeito à participação da comunidade na gestão do SUS. Mas o principal marco da Lei Orgânica da Saúde foi a inclusão, em seu texto, do acesso à saúde a TODOS, ou seja, não há mais proteção apenas aos que possuem carteira assinada, mas todos têm direito a uma saúde digna, igualitária.

Com isso, houve a organização do sistema sanitário, onde, conforme nos ensina Schwartz (2001, p. 103):

Da mesma forma que a responsabilidade sobre a saúde é dividida entre todas as esferas do governo, o SUS também assim se reparte, possuindo cada ente federado os órgãos, poderes e instrumentos para tal.

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Nesse sentido, o SUS é dividido em direções nacional, estatal e municipal – neste caso, apenas quando o Estado optar pela sua municipalização, onde atuará tão somente como colaborador técnico e financeiro, como é o caso do Rio Grande do Sul.

Assim, temos no âmbito nacional, o Ministério da Saúde, que possuí como gestor o Ministro da Saúde. A ele competem às matérias descritas no artigo 16 da Lei n° 8.080/90. A partir dela, pode-se destacar a formulação, avaliação, participação e apoio nas políticas de alimentação e nutrição.

Já no cenário estadual, a Secretaria da Saúde, tendo o Secretário de Saúde como gestor, compreende o disposto pelo artigo 17 da Lei n° 8.080/90, que compreende, dentre outras funções, promover a descentralização para os Municípios dos serviços e das ações de saúde, prestando apoio técnico e financeiro, executando ações e serviços de saúde de forma supletiva.

Por fim, o Município é encarregado de cumprir o que elenca o artigo 18 da Lei n° 8.080/90, e terá como gestor o Prefeito ou Secretário Municipal. Sua função, conforme descreve o artigo supracitado, engloba desde o planejamento, organização, controle e avaliação das ações e serviços de saúde, até a normatização, de forma complementar, no seu âmbito de atuação, das ações e serviços.

Ressalta-se aqui que, para que haja uma municipalização, necessário se faz, antes de tudo, haver um credenciamento do Município perante o SUS, obedecendo, assim, aos procedimentos técnicos exigidos. Conforme transcreve Schwartz (2001, p. 106) a respeito do credenciamento municipal perante o órgão do SUS:

Sua contrapartida financeira corresponderá a, no mínimo, 10% (dez por cento) do orçamento público municipal, que será depositado no Fundo Municipal de Saúde, administrado pelo Conselho Municipal de Saúde.

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Ainda no enfoque da municipalização, temos que ela traz muitos benefícios para a saúde. Dentre ele, podemos destacar, conforme Schwartz (2001, p. 105) que:

1) o interesse maior é o da localidade, devido às especificidades locais;

2) faz com que caiba ao Município a parcela mais importante da prestação sanitária, pois é ele que dispõe legal e materialmente sobre assuntos de interesse local – saúde;

3) grande parte da proteção à saúde é realizada no espaço local, respeitando-se as particularidades de cada região;

4) viabiliza uma administração moderna, privilegiando a competência, pois há uma vigilância maior sobre os encarregados do sistema, já que estes estarão em permanente contato com os cidadãos, que possuem participação no SUS (Art. 198, III, CF/88).

O Sistema Único de Saúde dessa forma visto desde sua criação até agora, se materializou “como a maior política de Estado do País, promotor de inclusão e justiça social.” Ademais é fruto de uma constante construção coletiva, onde se manifesta o diálogo, a composição e a busca do acordo, tudo isso, em prol do melhor para a comunidade, para a coletividade.

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3 POLÍTICA PARA ACESSO AOS MEDICAMENTOS

O Sistema Único de Saúde estabelece um marco, ou, uma linha de orientação para a ação pública, isso, enquanto política pública, estando sob a responsabilidade de uma autoridade pública, e também sob o controle democrático da sociedade. Dessa forma, visa concretizar direitos sociais auferidos pela sociedade e previstos também em leis.

Destarte, os direitos que estão declarados e garantidos nas esparsas leis, só terão aplicabilidade, quando acionados por meio de políticas públicas, as quais, devem ser correspondentes ao tema do direito, e, de igual forma, operacionalizam-se através de programas, projetos e operacionalizam-serviços (PEREIRA, 2006, apud BERMÚDEZ et al, 2009, p. 123).

O SUS, deste modo, como demonstração do público, “deve guiar-se pelo princípio do interesse comum e da soberania popular e não do interesse particular e da soberania dos governantes” (BERMÚDEZ et al, 2009, p. 123), visando, assim, à satisfação das necessidades sociais, e não o oposto, ou seja, a renda econômica privada.

Inegável destacar que, um dos nossos maiores desafios sempre foi tentar controlar, minimizar ou mesmo acabar com os sofrimentos causados pelas moléstias. Nesse sentido, o bem estar, a saúde, independe apenas de serviços de saúde e uso de medicamentos, embora essa associação contribua, e muito, no cuidado à saúde.

Nesse compasso, nasce a Assistência Farmacêutica, como política pública, em 1971. Sendo parte do Sistema Único de Saúde, a Assistência Farmacêutica é determinante na resolução, na atenção e nos serviços prestados na área da saúde, envolvendo o dispêndio de grande volume de recursos públicos. Ainda, no que diz respeito à Assistência Farmacêutica (CONASS, 2011, p. 14):

Assistência Farmacêutica no SUS deve ser entendida como política pública norteadora para a formulação de políticas setoriais, tendo

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como alguns dos seus eixos estratégicos a manutenção e a qualificação dos serviços de Assistência Farmacêutica na rede pública de saúde, a qualificação de recursos humanos, bem como a descentralização das ações.

Nela foi instituída a Central de Medicamentos (CEME), que tinha como incumbência o fornecimento de medicamentos à população sem condições econômicas para adquiri-los e se caracterizava por manter uma política centralizada de aquisição e de distribuição de medicamentos (BRASIL, 1971, apud CONASS, 2011, p. 10). A CEME foi desativada no ano de 1997, e as suas atribuições foram transferidas para diversos órgãos e setores do Ministério da Saúde.

A CEME se extinguiu, porque não conseguiu cumprir com as propostas de fornecimento de fármacos, principalmente, no que diz respeito à produção estatal de medicamentos. Conforme traz Paula et al (2009, p. 1.114):

Os conflitos entre o setor estatal e o setor público, resultado de uma dificuldade na produção de um consenso entre os atores políticos, foram se avolumando e acabaram por trazer uma hegemonia da perspectiva privativista.

Assim, foi instituído o Programa Farmácia Básica, que se propunha a fornecer os medicamentos para a atenção básica, de forma trimestral, distribuindo 32 produtos farmacêuticos para aqueles municípios onde houvesse até 21 mil habitantes. Entretanto, o desenvolvimento desse programa não levou em conta as peculiaridades das diferentes regiões do Brasil.

Dessa forma ocorreu “a necessidade da formulação de uma nova política de medicamentos e a explicitação do papel do Estado foram reforçadas diante do cenário desfavorável que o setor de saúde brasileiro vivenciava” (PAULA et al, 2009, p. 1.114).

Nesse sentido, levando em consideração as bases difundidas pela Constituição Federal e na própria Lei do SUS, podemos caracterizar que o Estado:

tem o dever de garantir um que todo brasileiro (acesso universal) tenha acesso aos medicamentos necessários à recuperação, prevenção e promoção de sua saúde (atendimento integral), e que tal

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dever se estende a todos os entes da Federação (descentralização). (NÓBREGA, 2009, p. 310)

No entanto, é fato indiscutível que o Estado não compreende recursos suficientes para atender a todas as demandas por medicamentos. Ou seja, não há estrutura suficiente que possa suprir todas as necessidades da população. Assim sendo, é necessário que se crie condições para que os direitos à saúde possam se exprimir num autêntico acesso da população aos medicamentos. Para que isso ocorra, necessário se faz a elaboração de políticas públicas, as quais devem resultar em definições e organizações para as ações estatais.

Nesse sentido, a política nacional de medicamentos, para que possa atingir seus objetivos:

define as diretrizes, os princípios e as prioridades que devem ser observadas pelos gestores da saúde no Brasil, bem como articula a distribuição de responsabilidades entre os gestores federais, estaduais e municipais. (NÓBREGA, 2009, p. 310)

Assim, podemos considerar que, dentre as políticas de medicamentos, no que diz respeito à distribuição, ela tem tido um alcance geral. Principalmente quanto à distribuição dos medicamentos genéricos, quanto ao acesso para o uso racional dos medicamentos e quanto à informação da população, bem como dos profissionais de saúde.

Destarte, continuaremos na análise do direito à saúde, quanto aos seus princípios fundamentais, quais sejam, princípios da igualdade, da proporcionalidade, e da reserva do possível. Ainda, teceremos breve comentário quanto aos princípios da universalização, da equidade, da descentralização, da regionalização, da hierarquização e da participação comunitária.

3.1 Os princípios do direito à saúde

As ações, assim como os serviços públicos de saúde e os serviços privados (contratados ou conveniados) que unificam o SUS são desenvolvidos em

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conformidade com as diretrizes estabelecidas incisos I, II e III, do artigo 198, da Constituição Federal, abaixo exposta:

Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo; II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;

III - participação da comunidade.

Obedecem, ainda, aos princípios organizativos e doutrinários, que, conforme descritos pelo CONASS (2011, p. 26) são:

» universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência;

» integralidade de assistência, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;

» equidade;

» descentralização político-administrativa com direção única em cada esfera de governo;

» conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na prestação de serviços de assistência à saúde da população;

» participação da comunidade; » regionalização e hierarquização.

Nesse sentido, traçar-se-á pequenas considerações a despeito dos princípios que regem o Sistema Único de Saúde.

O princípio da igualdade, adotado pela Constituição Federal, em seu artigo 5°, inciso I, diz o seguinte:

Art. 5°. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à

segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.

Nesse sentido, tal princípio atua na execução/feitura das leis, atos normativos e medidas provisórias, impedindo a criação de tratamentos

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demasiadamente distintos a pessoas que se encontram em situações análogas. Também, obriga a autoridade pública a aplicar a lei de maneira igualitária, sem distinções em razão de sexo, religião, raça, classe social, convicções filosóficas ou políticas.

No entanto, há casos específicos, em que, desde que haja fatos que possuam uma (co)relação lógica entre o fator da discriminação e uma desequiparação, se possibilitará à lei estabelecer discriminações. Para que isso seja possível, é necessário ocorrer quatro elementos, que não poderão agredir o princípio da igualdade/isonomia, conforme nos ensina o Ministro Celso Antônio Bandeira de Mello (apud Leny Pereira da Silva, s. a., p. 23 e 24):

a) que a desequiparação não atinja de modo atual e absoluto, um só indivíduo;

b) que as situação ou pessoas desequiparadas pela regra de direito sejam efetivamente distintas entre si, vale dizer, possuam características, traços, nela residentes, diferenciados;

c) que exista, em abstrato, uma correlação lógica entre os fatos diferenciais existentes e a distinção de regime em função deles, estabelecida pela norma jurídica;

d) que, in concreto, o vínculo de correlação supra-referido seja pertinente em função dos interesses constitucionalmente protegidos, isto é, resulte em diferenciação de tratamento jurídico fundada em razão valiosa - ao lume do texto constitucional - para o bem do público.

Dessa forma, o que se veda na lei, são discriminações absurdas, pois, aquela premissa Aristotélica de “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida em eles se desigualam”, é requisito do próprio conceito de Justiça.

Já o princípio da proporcionalidade, apesar de não constar expressamente em nosso sistema jurídico, é um princípio constitucional, mas implícito. Ora, com base no que nos diz o §2° do artigo 5° da CF/88, temos que:

§2°. Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

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