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DIFICULDADES MOTORAS NA INFÂNCIA: PREVALÊNCIA E RELAÇÕES COM AS CONDIÇÕES SOCIAIS E ECONÔMICAS

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DIFICULDADES MOTORAS NA INFÂNCIA:

PREVALÊNCIA E RELAÇÕES COM AS CONDIÇÕES SOCIAIS E ECONÔMICAS

MOTOR DIFICULTY IN INFANCY:

PREVALENCE AND RELATIONS WITH SOCIAL AND ECONOMICAL CONDITIONS Rodrigo Teixeira*

Roberto Gimenez** Dalton Lustosa de Oliveira*** Luiz Eduardo Pinto Bastos Tourinho Dantas****

* Universidade Nove de Julho/Curso de Educação Física

** Universidade Cidade de São Paulo/Grupo de Estudos sobre o Comportamento Motor (GECOM)/Universidade Nove de Julho *** Universidade Nove de Julho/Universidade Presbiteriana Mackenzie/Grupo de Estudos sobre o Comportamento Motor (GECOM) **** Universidade de São Paulo/Grupo de Estudos sobre o Desenvolvimento da Ação e Intervenção Motora

RESUMO

De acordo com a literatura, crianças com problema de co-ordenação correspondem de 5% a 6% das crianças nor-mais. O termo adotado pela Associação Americana de Psi-quiatria corresponde a Transtorno no Desenvolvimento da Coordenação (APA1 1995). São diversos os testes utilizados

para a identificação desse problema. Um dos testes mais utilizados no mundo para a identificação de crianças com dificuldades motoras é o Movement Assessment Battery for Children (MABC). Esse teste ainda não foi suficiente-mente aplicado no Brasil. O presente estudo tem como objetivo investigar a aplicabilidade do teste MABC para a identificação de crianças com Transtorno no Desenvolvi-mento da Coordenação. Além disso, buscou-se investigar também as possíveis relações entre os problemas de coor-denação motora e a classe sócio-econômica das crianças. Tomaram parte deste estudo 43 crianças na faixa etária en-tre 9-10 anos de idade. O teste possibilitou a avaliação de destreza manual, habilidades com bola, equilíbrio estático e dinâmico. Os dados referentes à prevalência das crianças foram compatíveis entre escola pública e privada. Entretan-to, a natureza das dificuldades motoras depende de fatores econômicos.

DESCRITORES

: Transtorno das habilidades motoras. Educação física e treinamento. Inclusão social.

ABSTRACT

In accordance with literature, children with coordination problem correspond to 5% 6% of the normal children. The term adopted by the American Association of Psychiatry corresponds to the Developmental Coordination Disorder (DCD) (APA1 1995). The tests used for the identification

of this problem are diverse. One of the most used tests in the world for the identification of children with motor di-fficulties is the Movement Assessment Battery for Children (MABC). This test was not applied in Brazil yet. This present study has as objective to investigate the applicability of the test MABC for the identification of children with Develo-pment Coordination Disorder (DCD). Moreover, it also intends to investigate the possible relations between the problems of motor coordination and the partner-economic classroom of the children. Thus, 43 children with 9-10 years of age were selected. The test made possible the evaluation of manual dexterity, abilities with ball, static and dynamic balance. The data appointed that the prevalence of the children is compatible between public and private schools. However, the nature of the motor difficulties depends on economical factors.

DESCRIPTORS

: Motor skills disorder. Physical education and training. Social inclusion.

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INTRODUÇÃO

O desenvolvimento motor é marcado pela simila-ridade entre os seres humanos. Entretanto, existem casos que ultrapassam os limites dentro do que é determinado normal para o desenvolvimento. Assim, surgem as pessoas que são consideradas muito habili-dosas ou muito desajeitadas.

Pessoas com muita habilidade motora vêm sen-do estudadas pelos pesquisasen-dores sen-do treinamento esportivo. Por outro lado, as crianças consideradas desajeitadas normalmente são alvo de investigação por parte de pesquisadores da área da aprendiza-gem motora, da educação e psicologia. Os problemas motores enfrentados pelas crianças com dificuldades motoras acabam sendo atribuídos a desordens de ordem psicológica ou neurológica (Missiuna10 1994).

Porém, existem crianças que não têm nenhum diag-nóstico psicológico ou neurológico, mas que, reco-nhecidamente, apresentam problemas motores. No início, essas crianças eram chamadas de atrapalhadas, desajeitadas. Posteriormente, elas foram classificadas como portadoras de um transtorno no desenvolvi-mento motor. Desde o início do século XX já se vem estudando sobre essa síndrome, todavia somente na década de 60 pesquisadores se aprofundaram nos es-tudos e apontaram evidências sobre a problemática.

O Transtorno no Desenvolvimento da Coorde-nação (TDC) pode acarretar alguns problemas para a criança, uma vez que o nível de proficiência moto-ra é um elemento importante pamoto-ra a integmoto-ração no grupo social. Essa desordem, até onde se sabe, não tem nenhum diagnóstico, nem evidências de ordem psicológica e neurológica, ou seja, é uma síndrome restrita às funções motoras. A criança diagnosticada com transtorno do desenvolvimento da coordenação tem dificuldade para exercer as atividades básicas da vida diária, como abotoar uma camisa, amarrar o ca-darço do tênis, manipular e transportar objetos ou locomover-se pelo ambiente (Santos et al.14 2004;

Pe-tersen e Oliveira13 2004). No recinto escolar,

reco-nhecidamente essas crianças apresentam problemas de caligrafia e de interação com o grupo. Grande par-te das vezes, trata-se daquela criança que está sempre isolada do grupo e não tem muito contato com os colegas ou então pode se tornar a mais “bagunceira” da turma para obscurecer suas reais dificuldades. As crianças portadoras dessa desordem normalmente

se afastam das atividades esportivas coletivas e pro-curam atividades individuais (Jogmans et al.6 2003).

Alguns estudos mostraram que as crianças conside-radas TDC apresentam grande probabilidade de se tornarem indivíduos tímidos, com autoestima baixa e, na adolescência, com possibilidade de apresentarem problemas de agressividade e de ordem acadêmica.

É fundamental que todos os profissionais envolvi-dos com a área da educação conheçam os possíveis impactos dessas dificuldades, bem como os possíveis fatores de ordem social, cultural e econômica que permeiam o problema. Portanto, prevalece a neces-sidade de estudos que possibilitem investigar essas crianças. Considerando-se que o seu problema seja de natureza motora e com impacto nas atividades da vida diária, a discussão da relação entre os problemas de coordenação e as características do ambiente me-recem mais atenção.

De acordo com os vários trabalhos essas crian-ças podem ou não ser identificadas, dependendo do contexto ambiental. Além disso, essa discussão tam-bém não pode deixar de levar em consideração as possíveis influências sócio-culturais e econômicas no desenvolvimento motor. Recomenda-se que a criança receba determinados estímulos em certos períodos da vida, nos quais ela estaria mais vulnerável à apren-dizagem, conhecido como períodos críticos. Grande parte das vezes, o meio econômico e social acaba re-presentando uma variável determinante no processo de desenvolvimento motor.

De acordo com Gallahue e Ozmun4 (2001), o

de-senvolvimento motor é uma alteração contínua no comportamento motor ao longo do ciclo de vida. O desenvolvimento seria fruto de uma interação entre organismo e ambiente; portanto, quando se tem um ambiente favorável pode-se ter melhor aproveita-mento no desenvolviaproveita-mento motor. O organismo ex-ploraria os recursos contidos no meio ambiente para construir seu próprio comportamento e, assim, tare-fas e ambiente moldariam e seriam moldados pelas ações dos indivíduos (Perrotti e Manoel12 2001).

O desenvolvimento motor na infância caracteriza-se pela aquisição de um amplo espectro de habilida-des motoras, o que possibilita à criança um amplo do-mínio do seu corpo em diferentes posturas (estáticas e dinâmicas), locomover-se pelo ambiente de várias formas (andar, correr, saltar, etc.), manipular objetos

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e instrumentos diversos (receber uma bola, arremes-sar uma pedra, chutar, escrever, etc.), estabilização (giros, apoios, rolamentos, etc.). Essas habilidades básicas são requeridas para a condução de rotinas diárias em casa e na escola, como também servem a propósitos lúdicos, tão característicos da infância. As-sim, a criança reuniria condições para combinar esses padrões, ou seja, seria capaz de correr e saltar, cor-rer e chutar, saltar e bater, etc. (Santos et al.14 2004,

Böhme3 1988; Jiménez e Ugrinowitsch 2002).

Essas habilidades básicas são vistas como alicerce para a aquisição de habilidades motoras e especializa-das na dimensão artística, esportiva, ocupacional ou industrial (Tani18 1988).

A restrição das tarefas e do meio ambiente são exemplos de aspectos que afetam os processos de desenvolvimento e os padrões fundamentais do mo-vimento. As experiências anteriores da criança cor-respondem a outro fator importante. Magill7 (1998),

por exemplo, sugere que a aprendizagem ocorre com maior eficiência em alguns períodos de vida e para a aquisição de novas habilidades motoras é fundamental que, anteriormente, criança tenha ultrapassado ade-quadamente outras experiências anteriores.

Tani18 (1998) destaca que as características do

ambiente podem ser muito influenciadas por opor-tunidades oriundas do contexto sócio-econômico e cultural.

Dentre esses fatores, vale ressaltar que os de ordem econômica e cultural podem exercer grande influência. Um dos principais aspectos é a renda fa-miliar, porque, quando se tem salário muito baixo, se tem dificuldade de ter boa educação, a alimentação é inadequada, a habitação é precária e se tem um baixo nível de qualidade de vida e a criança pode ser limi-tada numa série de possibilidades (Marcondes9 1981,

Bee2 1996, Stabllini Neto et al.16 2005). O

rendimen-to mensal familiar está intimamente relacionado com o nível de instrução dos pais, com uma condição de moradia melhor, uma alimentação mais adequada. No entanto, quando se tem no maior rendimento mensal, pode-se propiciar melhor condição de vida.

De acordo com Papalia e Olds11 (2000), a pobreza

traça uma típica trajetória de sofrimento psicológico para os adultos, resultando em problemas na criação dos filhos. Alguns estudos vêm mostrado que famílias consideradas de baixa classe econômica são compos-tas por um número muito maior de pessoas quando

comparadas com a média populacional, com menor intervalo de tempo entre um filho e outro e a mo-radia nem sempre tem acomodações adequadas para todos. Com relação à moradia, o saneamento bási-co, que muitas vezes é precário, pode trazer diversos problemas de saúde, pelo fato do abastecimento ir-regular, e as instalações sanitárias têm relação dire-ta com o nível de saúde da população (Marcondes9

1981). Portanto, o saneamento é fundamental para evitar algumas doenças que podem interferir no de-senvolvimento de uma criança.

Existe forte argumento na literatura de que pais que vivem em condição de pobreza, conversam me-nos com seus filhos e, na maioria das vezes, não têm condições de oferecer entretenimento que estimule o desenvolvimento intelectual. De modo geral, esses pais são mais rígidos com castigos físicos e mais auto-ritários, o que contribui de forma considerável para minimizar a tomada de decisão por parte das crian-ças. Normalmente, observam o mau comportamento das crianças e ignoram o bom comportamento. Assim seus filhos acabam tendo problemas sociais, emocio-nais e comportamentais (Bee2 1996, Papaliae Olds11

2000). Esses fatos podem estar relacionados com a criação que esses pais podem ter recebido na sua in-fância.

Malina e Boucahrd8 (2003), entretanto, enfatizam

que a criação permissiva de pais de baixa classe eco-nômica pode contribuir para maior liberdade para a prática de atividade motora por parte dos filhos. Na idade escolar, as crianças de classe econômica baixa apresentavam maior liberdade de movimento, quan-do comparadas com crianças de classes mais favore-cidas. Assim, assume-se que com a maior liberdade das crianças de classes economicamente mais baixas haveria a oportunidade de aprimorar habilidades mo-toras. Por outro lado, reconhece-se que as crianças de família de classe econômica favorecida têm opor-tunidade de vivenciar atividades motoras em contex-to sistematizado, como acontece nas “escolinhas de esporte” ou nos programas extra-curriculares dos colégios particulares.

Invariavelmente, quando se levam em consideração questões dessa natureza, a identificação de crianças com dificuldades motoras em diferentes contextos, tomando-se como base o critério sócio-econômico, é de grande relevância. O estudo de Sugden e Wri-ght17 (1998), por exemplo, avaliou a lista de checagem

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do teste ABC do movimento em escolas do Singa-pura. As escolas eram organizadas e administradas por quatro zonas, sendo escolhidas cinco escolas de cada zona. Foram selecionadas 212 crianças de 6 a 9 anos de idade, assegurando-se o mesmo número de meninos e meninas. Foi evidenciado um alto nível de correlação, num montante de 120 listas de checagem, no que diz respeito ao teste e ao re-teste que ocor-reu duas semanas após a aplicação do teste. Apesar da correlação dos componentes, houve uma exceção para meninas de oito anos na seção 2 da lista que ana-lisava a criança em movimento e o ambiente estável.

Esse estudo mostrou que os professores tiveram dificuldade de comentar sobre as atividades que esta-vam fora do contexto escolar. Por exemplo, 30% dos professores não conseguiram comentar as atividades com bloco, pinos, e quebra-cabeça, assim como 50% foram incapazes de responder se as crianças utiliza-vam brinquedos com pedal (carrinho, moto ou bici-cleta). Portanto, os autores admitiram que há alguns itens da lista de checagem que necessitam serem ajus-tados de acordo com a realidade cultural.

Segundo os autores, os resultados foram consi-derados satisfatórios para serem usados em Singapu-ra, pois foram identificados 4,72% de crianças tendo problemas de movimento e 10,85% como grupo de risco, e esses resultados foram úteis para que profes-sores e autoridades escolares ficassem atentos aos problemas que certas crianças enfrentavam e, até o momento, recebiam pouca atenção.

Considerando o âmbito nacional, Souza et al.16

(2004) aplicaram o teste Movement ABC na na região de Manaus, buscando traçar um perfil das crianças das zonas rurais e urbanas. Foram aleatoriamente sele-cionadas 240 crianças de sete e oito anos de idade de ambos os sexos, sendo 195 da zona urbana e 45 da zona rural. Os ambientes sócio-culturais e eco-nômicos das crianças e oportunidades eram a rigor diferentes. Por exemplo, as crianças da região rural tinham condições precárias tanto nas residências quanto nas escolas, onde nem sequer havia quadra para a realização das aulas de educação física, que não ocorriam com freqüência, enquanto que nas escolas da zona urbana havia uma estrutura física apropriada para as crianças, pois dispunham de biblioteca, pátio, quadra esportiva coberta e com aulas de educação física com frequência.

De acordo com as zonas em que moravam, as crianças tinham oportunidades diferentes em relação ao ambiente, porque a zona rural era composta pelas áreas da Rodoviária, localizada à beira da estrada, ao passo que a Ribeirinha era localizada à beira de um rio onde o acesso só ocorre por meio de barco ou canoa. As crianças utilizavam o rio para realizarem tarefas motoras relacionadas à higiene pessoal, para brincar e pescar. Além disso, elas tinham o hábito de colher frutas nas árvores, local também utilizado para brincarem. Portanto, era o local onde desenvolviam o seu repertório motor, o que indica um ambiente, ob-viamente, diferenciado das crianças da zona urbana.

As crianças da zona urbana apresentavam um am-biente mais favorável à aprendizagem de algumas ha-bilidades manuais e com bola, pelo fato de terem nas escolas computadores, ludoteca, playground, quadras e pátios e um profissional de educação física minis-trando aula para elas, possibilitando-lhes novas expe-riências motoras.

Souza et al.15 (2007) observaram que as crianças

das zonas rurais e urbanas tinham uma diferença só-cio-econômica muito grande e, mesmo assim, obtive-ram resultados semelhantes nos testes.

Com relação à porcentagem, foram identificados 4,4% das crianças da zona rural como sendo TDC e na zona urbana 11,8% de crianças diagnosticadas como TDC. No entanto, esses resultados possibilitam dizer que o teste ABC do movimento não é abrangente o suficiente em diferentes ambientes, visto que se espe-ra encontespe-rar, com o teste, em torno de 5% ou 6% da população como sendo TDC.

Com relação aos resultados, não foi encontrada nenhuma diferença quando comparadas às zonas ru-rais e urbanas e suas subzonas, e o autor concluiu que, apesar de terem sido verificadas porcentagens diferentes nas três categorias, os resultados permiti-ram concluir que crianças de ambientes diversificados obtiveram desempenho semelhante no teste ABC do movimento em outras partes do mundo (Souza et al.15

2007).

Contudo, ainda persistem dúvidas acerca da apli-cabilidade do teste Movement ABC em crianças bra-sileiras. Outro aspecto diz respeito ao impacto do contexto sócio-econômico (ambiental) no processo de desenvolvimento motor de crianças com dificulda-des motoras. Em especial, é possível que sejam

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iden-tificadas crianças com dificuldades motoras tanto em classes mais favorecidas quanto nas menos, porém é esperado que existam diferenças na natureza das dificuldades motoras encontradas nesses grupos. As-sim, o presente trabalho teve por objetivo investigar a aplicabilidade da bateria motora do teste Movement ABC, bem como verificar as possíveis associações de crianças com dificuldades motoras com a classe só-cio-econômica.

MATERIAL E MÉTODO

A amostra correspondeu a 43 crianças de 9 e 10 anos de idade, regularmente matriculadas nas esco-las públicas e privadas da região da Zona Norte da cidade de São Paulo. Foi solicitado aos professores generalistas e de educação física que selecionassem as crianças que apresentassem dificuldades de mo-vimento. Foi informado aos professores que teriam que selecionar as crianças que apresentassem proble-mas em tarefas de manipulação, tarefas com bola e tarefas de equilíbrio. A participação das crianças teve o consentimento de seus pais ou responsáveis, e de seus respectivos estabelecimentos de ensino.

O teste aplicado foi o Movement ABC, que é divi-dido em quatro versões. Cada versão corresponde a uma faixa etária (4-6 anos, 7-8, 9-10, 11-12). Todas as versões apresentam tarefas de destreza manual, habi-lidades com bola e equilíbrio estático e dinâmico. No presente estudo, a versão utilizada correspondeu à faixa etária de 9-10 anos. As tarefas utilizadas corres-ponderam à movimentação de pinos, rosquear porca no parafuso e tracejar uma flor (Destreza Manual); recepção de uma bola de tênis com as duas mãos, lançamento de um saco de feijão em uma caixa alvo (Habilidade com Bola); equilíbrio em uma só perna sobre uma placa (Equilíbrio Estático); saltitar por qua-drados e equilibrar uma bola sobre a placa de madeira (Equilíbrio Dinâmico).

Os escores no teste têm como base uma escala de zero a cinco. O escore zero indica o sucesso e o escore cinco o insucesso. A identificação das crianças leva em consideração a soma de todos os escores. Após a aplicação do teste, as crianças que apresen-taram na soma de todos os escores um desempenho igual ou superior a 13.5 foram classificados com TDC. As crianças que obtiveram escore inferior a 13.5 fo-ram consideradas normais.

Como forma de verificar os possíveis impactos

dos contextos econômico e sócio-cultural sobre o processo de desenvolvimento motor, foi aplicado um questionário sobre o nível de atividade física. Além disso, foi realizada uma entrevista com cada criança identificada com TDC para possibilitar uma análi-se sobre a natureza das atividades cotidianas desanáli-ses grupos. Mais especificamente, o questionário corres-pondeu a questões fechadas que pretendiam mapear a renda familiar. O levantamento sócio-econômico possibilitou a divisão das crianças estudadas em dois grupos com características diferentes: Escola Pública e Privada. Outro aspecto investigado correspondeu ao nível de atividade física praticado pelas crianças. Em especial, as questões foram direcionadas à com-preensão da natureza da atividade física praticada, do contexto em que ocorre a prática, assim como da frequência e duração das atividades praticadas.

RESULTADOS

Os resultados foram analisados tomando-se como base a classe econômica. Desse modo, procurou-se diferenciar os dados obtidos em escolas públicas e privadas.

Figura 1 - Prevalência de crianças com Transtorno no

Desen-volvimento da Coordenação em função da classe econômica.

É possível observar (Figura 1) que a Escola Públi-ca apresentou um percentual de 5.24% das crianças identificadas com Transtorno no desenvolvimento da Coordenação. Por outro lado, na Escola Privada a porcentagem chegou a 2.66%. A média entre escola pública e privada atingiu 4.16%. Essa porcentagem foi calculada a partir do total de alunos que estavam de-vidamente matriculados nas escolas e que possuíam a mesma faixa etária dos alunos testados.

A condução de uma análise de variância para dados não paramétricos de Krukal Wallis não apontou

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dife-renças entre os grupos de Escola e Pública e Privada, o que sugere a mesma prevalência do problema.

nação.

A Figura 3 apresenta os valores de média do es-core parcial de destreza manual. Na escola pública, as crianças identificadas com Transtorno no desenvolvi-mento da Coordenação tiveram uma média de 9.35. E com relação à escola particular, as crianças com Transtorno no Desenvolvimento da Coordenação ti-veram a média de 8.6. Pode-se notar que as crianças das escolas públicas apresentaram uma média supe-rior à das crianças da escola particular: Kruskal Wallis X2 (2, n=43) = 72,24 p=0,001.

Deve ser lembrado que o escore parcial em des-treza manual é composto por três tarefas, quais se-jam: a) tarefa de mover o pino; b) tarefa de rosquear o parafuso; c) tracejar a flor. Vale ressaltar ainda que os escores mais altos sugerem maior dificuldade mo-tora, conforme o teste Movement ABC.

A análise pormenorizada do desempenho em cada tarefa de manipulação não indica diferenças entre os grupos. Porém, nota-se uma tendência das crianças de escola pública de apresentarem desempenho inferior na tarefa de mover os pinos quando comparadas às crianças de escola privada. Por outro lado, no que diz respeito à tarefa de rosquear as porcas no parafuso as crianças de escola privada apresentaram desempenho inferior ao das crianças da escola pública. Finalmente, quando comparadas na tarefa de tracejar a flor, as crianças da escola pública apresentaram escores mais altos, o que sugere pior desempenho das crianças da escola privada.

Figura 2 - Prevalência entre gêneros em função da classe

econômica.

Com relação ao percentual entre meninos e me-ninas identificados com Transtorno no Desenvolvi-mento da Coordenação, nota-se que, na escola pú-blica, houve uma prevalência maior de meninos. No entanto, na escola privada, o número de meninas foi superior ao de meninos. A condução de uma análise de variância para dados não paramétricos indicou que houve diferença substancial na prevalência do proble-ma em meninos, na comparação entre Escola Pública e Privada: Kruskal Wallis X2 (2, n=43) = 42,27, p=0,002.

Um fator que deve ser levado em consideração é que as crianças participantes dos testes foram seleciona-das pelos professores generalistas e por professores de educação física. Na escola privada, houve a parti-cipação de todos os professores. Neste caso, foram selecionadas para o teste as crianças que estavam apresentando dificuldade nas tarefas em sala de aula e nos contextos típicos de aulas de educação física. Nas escolas públicas, o processo de seleção envolveu apenas as professoras generalistas. Uma das premis-sas é que as professoras de Escola Pública podem ter indicado crianças com problemas de comportamento e não exatamente com algum problema de

coorde-Figura 3 - Escores de destreza manual das crianças com

TDC em Escolas Públicas e Privadas.

Figura 4 - Escores de Habilidades com Bola de crianças

com TDC de escola Pública e Privada.

Conforme a Figura 4, nas tarefas com bola exis-te diferença nítida nas habilidades com bola entre os grupos. Crianças que foram identificadas como TDC nas escolas públicas atingiram uma média de 4.7, en-quanto que para as de escola privada a média foi de 4,4. A análise de variância para dados não

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paramé-tricos de Kruskal Wallis apontou diferenças entre os grupos Kruskal Wallis X2 (2, n=41) = 89,34 p=0,000.

A tarefa motora das habilidades com bola é com-posta por duas tarefas, quais sejam: a) lançar a bola na parede com uma das mãos e receber com as duas; b) lançar o saco de feijão.Comparando o escore obtido em cada uma das tarefas, as crianças da escola públi-ca tiveram melhor desempenho na tarefa de lançar e receber a bola, e na tarefa de jogar o saco de feijão na caixa as crianças da escola privada tiveram me-lhor desempenho. Esses resultados podem estar re-lacionados às oportunidades que são oferecidas pelo ambiente que essas crianças frequentam, o que leva a pensar no papel do contexto escolar no desenvol-vimento motor.

p=0,000.

Esses achados também despertam uma discussão a respeito dos possíveis impactos do contexto sócio-cultural nos indivíduos, e sobre suas possíveis associa-ções com fatores de ordem sócio-econômica.

Reconhecidamente, uma das variáveis de grande impacto para o entendimento do papel do contexto das crianças no desenvolvimento motor refere-se à possibilidade de prática de atividade motora em con-textos sistematizados fora do ambiente escolar. Em especial, isso seria representado pela participação em programas de natação ou escolinhas de esporte.

Figura 5 - Escores de equilíbrio estático e dinâmico de

crian-ças com TDC de Escola Pública e Privada.

No que diz respeito à variável equilíbrio, as crian-ças da escola pública tiveram uma média de 4,6 e as de escola privada uma média de 5,7. Mais especifica-mente, foram encontradas diferenças estatisticamen-te significativas entre os grupos Kruskal Wallis X2 (2,

n=40) = 12,21 p=0,002.

Essa capacidade de equilíbrio estático e dinâmico é caracterizada por três tarefas, das quais uma cor-responde a equilíbrio estático e duas a equilíbrio di-nâmico. A tarefa de equilíbrio estático corresponde a equilibrar-se sobre uma placa de madeira e a de equilíbrio dinâmico é composta pela tarefa de saltitar pelo quadrado e equilibrar a bola de tênis numa ban-deja de madeira.

Quando analisadas separadamente por tarefa, no equilíbrio estático não houve diferença entre as crianças das duas escolas. Por outro lado, no que diz respeito a equilíbrio dinâmico, as crianças de escola pública apresentaram um desempenho consideravel-mente superior Kruskal Wallis X2 (2, n=39) = 51,53

É possível notar que os alunos das escolas públicas estão frequentando menos atividade motora fora do contexto escolar (Figura 6). Os dados sugerem que 90% dos alunos identificados com TDC não partici-pam de nenhum programa sistematizado de atividade motora. No entanto, 75% das crianças de escola pri-vada praticam. Invariavelmente, essa diferença entre as crianças da escola pública e privada estaria relacio-nada à condição sócio-econômica em que as crianças se enquadram. A aplicação de uma análise de

variân-Figura 6 - Crianças que praticam atividade física fora do

contexto escolar.

Figura 7 - Natureza de atividade motora sistematizada

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cia apontou diferenças significativas entre os grupos

Kruskal Wallis X2 (2, n=42) = 11, 23 p=0,000.

Os dados também indicam que as crianças de es-cola privada praticam atividades esportivas de natu-reza individual. É possível observar, ainda, que todas as crianças com TDC de escola privada praticam ati-vidade física fora do contexto escolar. A modalidade mais recorrente corresponde à natação que, por se tratar de uma modalidade caracterizada por habilida-des motoras fechadas, não envolve grande demanda de timing. Essa constatação vai ao encontro de dados presentes na literatura, que sugerem preferência de crianças com dificuldades motoras pela participação em contextos de prática de modalidades esportivas individuais, nas quais, em geral, prevalece mais esta-bilidade ambiental (Petersen e Oliveira13 2004). Por

outro lado, dentre os alunos da escola pública que re-alizam atividade motora, nenhum pratica modalidades individuais. A modalidade mais procurada é o futebol. Vale destacar que, apesar da modalidade esportiva do futebol ser caracterizada por habilidades motoras abertas, a escolha pode estar associada às oportuni-dades que derivam da condição sócio-econômica dos indivíduos.

classificadas como TDC da escola privada, nota-se que 100% praticam atividades extracurriculares no âmbito da própria escola, local com ampla estrutura para a prática de modalidades esportivas. Além disso, 25% dessas crianças praticam também em clubes o que configura uma ampliação do envolvimento com a prática esportiva. A escola pública não proporciona às crianças a oportunidade de praticar modalidades esportiva de forma extracurricular. Portanto, todas elas praticam atividades em parques municipais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não existe influência do contexto sócio-econô-mico na prevalência de crianças com dificuldades motoras. A comparação das duas escolas não indi-cou diferenças na quantidade de crianças identificadas com dificuldades motoras por meio do instrumento utilizado.

Entretanto, foi detectada uma influência na nature-za das dificuldades motoras encontradas nas crianças. Essas diferenças poderiam ser atribuídas a diferenças sócio-culturais da escola, que, por sua vez, podem es-tar associadas às diferenças de contexto econômico. Em especial, as crianças das escolas particulares apre-sentaram mais dificuldades motoras em habilidades de manipulação, ao passo que as das escolas públicas, em tarefas de manipulação.

Outro aspecto diferenciador corresponde justa-mente à tipologia de prática corporal das crianças. As crianças de escola pública geralmente praticam atividades extracurriculares de natureza coletiva, fun-damentalmente em contextos de estabelecimentos públicos. Por outro lado, as crianças de escolas pri-vadas apresentam tendência de praticar modalidades esportivas individuais em contextos de escolinhas de esporte, academias ou clubes privados.

O presente estudo se propôs a mapear também a quantidade de prática semanal de atividade motora. De modo geral, constatou-se que nas crianças de es-cola privada a frequência média corresponde a duas vezes por semana, com duração de aproximadamente uma hora por dia. Por outro lado, na escola pública a prática ocorre uma vez por semana, aos finais de semana e dura em torno duas horas.

Procurou-se investigar, ainda, o local utilizado para praticar atividades motoras. Dentre as crianças

Figura 8 - Quantidade semanal e duração das sessões de

prática de crianças com TDC de Escola Pública e Privada.

Figura 9 - Local de prática das atividades realizadas pelas

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Tais constatações despertam a reflexão sobre os projetos pedagógicos das escolas, sobre as possibili-dades de intervenção motora por meio das aulas de Educação Física. A escola, de modo geral, necessita rever seu papel. No que tange especialmente à Esco-la Pública, verifica-se a necessidade de se repensar o papel desse contexto, cuja proposta seria prioritaria-mente voltada para a inclusão e que operacionalmen-te pode contribuir para a exclusão social.

Esses dados também vão ao encontro da ideia de que o contexto sócio-econômico desempenha um pa-pel primordial no desenvolvimento motor das

crian-ças, dadas as oportunidades criadas pelos contextos sistematizados associados à condição de supremacia econômica.

Futuros estudos devem retomar o problema, verificando a prevalência numa região maior da cida-de cida-de São Paulo, servindo-se cida-de um número maior cida-de escolas e alunos investigados. Esses trabalhos devem atribuir atenção especial aos possíveis impactos dos contextos de intervenção e suas possíveis relações com a qualificação dos profissionais e com a realidade sócio-econômica.

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Referências

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