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Literacia da informação na universidade: um contributo para a construção de competências de docentes do ensino superior

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Academic year: 2021

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Literacia da informação na universidade: um contributo para a

construção de competências de docentes do ensino superior

Tatiana Sanches

Universidade de Lisboa, Instituto de Educação, UIDEF, Portugal, tsanches@fpie.ulisboa.pt

Maria Manuel Borges

Universidade de Coimbra, CEIS20, Portugal, mmb@fl.uc.pt

Resumo

O presente estudo procura dar um contributo para a inclusão de competências em literacia da informação na formação de novos docentes das Instituições de Ensino Superior (IES), visando afirmar este campo disciplinar, flexível e integrador, ao propor a sua inclusão como área de desenvolvimento profissional. Num contexto informacional em ampla mudança, a literacia da informação é ainda mais relevante para suprir necessidades de aprendizagem, mas igualmente na docência e investigação. Os docentes são instados a atualizarem-se para formar e orientar os seus estudantes em múltiplos saberes, incluindo a capacidade de lidarem com informação, pelo que a formação nestas competências deve ser uma prioridade. São essas necessidades concretas dos docentes das IES quanto a conteúdos, formatos e avaliação que devem ser ajustados a cada situação específica, devendo ter como base modelos já experimentados e é precisamente aqui que a flexibilidade e abrangência da literacia da informação deve ser integrada. Existem preocupações internacionais que procuram assegurar uma cobertura apropriada das competências em informação nos programas de formação de docentes das IES. Face à lacuna existente na formação estruturada desta matéria em Portugal, apresenta-se uma proposta curricular para uma disciplina de opção, no âmbito de uma pós-graduação em pedagogia universitária, dirigida a novos docentes. O trabalho visa assim cumprir o duplo objetivo de disseminação da literacia da informação em contexto universitário, a partir da formação dos professores das IES, contribuindo para a sua capacitação em competências informacionais, mas igualmente na estruturação de matérias transferíveis para os estudantes e adaptáveis às diversas áreas disciplinares.

Palavras-chave

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1. Introdução

Nas primeiras duas décadas do século XXI temos assistido, em Portugal, à expansão das Instituições de Ensino Superior (IES), o que vem mobilizando uma grande massa de estudantes e de profissionais técnicos, investigadores e docentes. A especialização profissional e a transfiguração de empregos estimularam a criação de novos cursos superiores, para os quais professores de diversas áreas convergiram e se adaptaram, contribuindo decisivamente para as novas configurações da oferta formativa. Ao mesmo tempo, no contexto internacional foram feitos esforços de convergência para a certificação e avaliação da formação superior, dos quais resultaram políticas públicas nacionais e europeias (confluentes no processo de Bolonha). Neste contexto, a profissão docente das IES tem lidado com múltiplos desafios: o ensino deixou de estar centrado no professor para estar centrado no aluno; existe mais acesso à informação, maior escolha e diversidade de cursos e modalidades de formação superior; assiste-se a uma integração da era digital nas ferramentas pedagógicas e nos processos de aprendizagem; e criaram-se e adaptaram-se formações para ambientes online, só para mencionar alguns exemplos. A explosão de informação, não só impressa, como em contexto digital tornou-se numa área fértil para explorar, transmitir, e divulgar informação, permitindo-se, através desta, aprender e ensinar, transformar, investigar, e criar novo conhecimento. As premissas da qualidade do ensino superior tornam-se ainda mais urgentes, quando, desde há duas décadas e com cada vez maior relevância, se vem debatendo o lugar social, económico e político do ensino superior, o seu impacto na formação de cidadãos e a profissionalização dos seus docentes, com vista a uma qualificação generalizada desta área (Ambrósio, 2001; Fry, Ketteridge, Marshall, 1999; Ó, Almeida, Viana, Sanches, Paz, 2019). Desta forma compreende-se o ânimo no debate em torno da formação pedagógica dos docentes das IES que, de certa forma, tem também procurado ser uma resposta aos desafios e ao confronto com as “condições de exequibilidade e pertinência das mudanças enunciadas, mas também com o seu próprio domínio das competências pedagógicas necessárias à transformação curricular que lhes era sugerida ou imposta” (Esteves, 2011, p.1).

2. Competências requeridas aos professores universitários

A 11 de novembro 1997 a UNESCO emanou a Recomendação relativa ao Estatuto do Pessoal Docente do Ensino Superior (UNESCO, 1997) onde abordava, entre outros aspetos, as principais definições e conceitos desta área, os seus princípios orientadores, os objetivos e políticas educativas que a devem enquadrar, os direitos, deveres e responsabilidades institucionais, bem como os direitos, liberdades, deveres e responsabilidades individuais dos docentes do ensino superior. Trata-se de uma declaração fundadora que procura garantir os princípios para a qualidade dos sistemas de educação superior. Aí se refere que os avanços no ensino superior assentam nas qualificações e conhecimentos dos docentes do ensino superior, bem como nas suas qualidades humanas, pedagógicas e técnicas, sustentadas pela liberdade académica, responsabilidade profissional, colegialidade e autonomia institucional.

Benito e Cruz (2005) referiam-se às mutações operadas no Espaço Europeu do Ensino Superior, sublinhando que a centralidade do processo educativo passou da responsabilidade de ensinar do professor para a aprendizagem do aluno. Em Portugal, em termos de competências a desenvolver no ensino superior as funções consagradas e expressas na Lei de Bases do Sistema Educativo Português podem ser agregas em três áreas: a primeira, a investigação, a segunda consistindo na compreensão do mundo e disseminação da cultura e a terceira aglutinando a formação de profissionais (Esteves, 2011). Estas três áreas têm concorrido pela atenção e interesse dos professores, de forma algo contraditória ou mesmo competitiva.

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A formação dos docentes do ensino superior emerge como uma preocupação institucional, assistindo-se a diversas modalidades organizativas em volta do globo: formação pós-graduada, integrada ou não na formação base, formação facultativa ou obrigatória, formação mais direcionada para aspetos pedagógicos ou distribuída igualmente por temas como gestão, avaliação e políticas, quadros de competências chave para os docentes, prémios e formas de garantia de qualidade e certificação institucional – são modalidades que os países encontram para corresponder às crescentes necessidades de operacionalizar a área do desenvolvimento profissional docente (Aramburuzabala, Hernández-Castilla, Ángel-Uribe, 2013; Ó, Almeida, Viana, Sanches, Paz, 2019).

Zabalza (2007) já se tinha debruçado sobre a importância das competências no professor do ensino superior que, sinteticamente organizou em torno de conhecimentos (conteúdos disciplinares a ensinar e processos de ensino-aprendizagem a eles relativos), habilidades específicas (comunicação, didática, avaliação) e atitudes próprias dos professores como formadores (disponibilidade, empatia, rigor intelectual, ética profissional, entre outras). Este modelo abriu portas à investigação nesta área. No seu trabalho, Mendonça, Paiva, Padilha e Barbosa (2012) argumentam que as competências devem ser vistas como um todo integrado, comtemplando os requisitos necessários para lidar com atividades de pesquisa, extensão, avaliação, gestão, tecnologias e relações interpessoais. Focando-se na área pedagógica e aludindo ao ensino superior, Svinicki e Mckeachie (2014) argumentam que um ensino eficaz exige mais do que a aquisição de habilidades ou competências por parte do professor. Tendo em vista uma adaptação às necessidades educacionais de cada turma em particular, e a cada momento específico, o professor deve compreender os fundamentos teóricos do ensino e da aprendizagem, mas escolher as metodologias que melhor se adaptem às suas próprias práticas. E, acrescentam os autores, o mais interessante é que existe sempre espaço para a criatividade e o crescimento, tendo em conta que o foco está na aprendizagem do aluno. Mais recentemente Rivilla, Cabezas, Navío, e Domínguez (2019) elencam algumas aptidões requeridas aos professores universitários, particularmente para aqueles contactam pela primeira vez com esse papel. Ser criativo, crítico, conselheiro, amigo do estudante, empático, respeitoso, motivador, paciente, entusiasmado; ter personalidade, carisma, persuasão e habilidades de escuta, paixão pelo ensino, autoridade, senso de diversidade, comunicação e gestão de TIC, entre outras componentes, são características positivas sublinhadas pelos investigadores. Em termos de competências mais importantes, estes autores destacam o planeamento, a comunicação, o design digital / media, a avaliação, a inovação e a investigação, detalhando, para este último tópico, que a atualização contínua é fundamental, nomeadamente nos processos de pesquisa que envolvem o conhecimento atualizado de bibliografia e a leitura e consulta de artigos científicos.

No estudo que agora se apresenta, é de particular importância o contexto da sociedade da informação, em que as alterações têm maior impacto na aprendizagem e se fundam exatamente nas trocas de informação, ou seja na forma como o conhecimento é gerado, mas também como se procura, se seleciona e se utiliza a informação que o sustenta. Daí que a perícia para lidar com a informação se torne numa competência fundamental para qualquer cidadão no século XXI e em particular para aqueles profissionais cuja matéria-prima assenta exatamente na informação e no conhecimento. Na esteira destes objetivos, Peres, Miranda, Simeão (2015, p. 219) destacavam a importância de preparar alunos e professores para o “acesso, uso criativo de informação em diversos suportes, promovendo o uso estratégico de conhecimentos básicos nas tarefas académicas”. Também Silva e Farias (2019), a este propósito, se debruçam sobre as competências a desenvolver pelos docentes do ensino superior, desta vez no que respeita à

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necessidade premente de, no capítulo da orientação, dominarem uma série de competências para darem apoio efetivo aos seus orientandos, nomeadamente “levantamento bibliográfico, leituras, debates, coleta de dados, produção escrita, apresentações em seminários, etc.”, necessidades que obrigam à mobilização de “um conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes relativas a uma eficaz interação com a informação que possibilite solucionar problemas e tomar decisões”, sustentando as autoras o desenvolvimento em competências em informação (Silva & Farias, 2019, p. 52). De facto, ao analisarem a perspetiva dos orientadores face às competências informacionais necessárias para prosseguir o trabalho de investigação, elas concluem que os orientadores consideram basilares no processo de pesquisa as que respeitam ao “reconhecimento de fontes de informação que oportunizam maior facilidade na busca, além do uso correto da informação” (Silva & Farias, 2019, p. 65).

3. Literacia da informação como competência fundamental

O ensino centrado no estudante requer o uso de recursos de aprendizagem baseados em informação impressa, digitais e multimédia. Bibliotecas digitais, bases de dados e repositórios facilitam a reutilização de conteúdos de investigação, permitindo o acesso a uma variedade de fontes e potenciando a formação de pensamento crítico e a criação de ideias mais complexas, ao mesmo tempo que incentivam os alunos a usar os recursos e reinterpretá-los (McGill, 2017). Para desenvolver todas estas competências é utilizada a literacia da informação, um constructo teórico-prático que envolve as habilidades para lidar com a informação de forma adequada e significativa. No ano 2000, a American Library Association (ALA, 2000), através da sua secção Association of College and Research Libraries, definiu este conceito, explicando que um indivíduo capacitado com competências em informação deve ser capaz de determinar a necessidade de informação e a sua extensão, aceder à informação de forma eficiente e eficaz, avaliar a informação e as suas fontes criticamente, incorporar a informação selecionada na sua base de conhecimentos, usar a informação eficazmente para cumprir um objetivo específico, compreender as implicações económicas, legais e sociais em torno do uso da informação e saber acedê-la e usá-la ética e legalmente.

Mais recentemente o conceito de Literacia de Informação foi atualizado, tendo havido, no que concerne especificamente ao ensino superior, uma importante mudança. Em 2016, a Association of College and Research Libraries (ACRL, 2016) adotou a Framework for Information Literacy for Higher Education. Produto de um trabalho intenso para redefinir o conteúdo e as habilidades requeridas para lidar com a informação, esta nova estrutura conceptual acrescenta a descoberta reflexiva da informação, que compreende como a informação é produzida e valorizada ao usar-se a informação na criação ética e legal de novos conhecimentos. A principal diferença neste documento é uma mudança de comportamento em relação a uma teoria mais filosófica de conceitos nucleares - ideias que podem ser encontradas em qualquer disciplina e atuam como uma estrutura para garantir sua compreensão mais ampla - mas também maneiras de pensar e praticar a aprendizagem dentro da mesma disciplina. Outra diferença diz respeito a objetivos específicos de aprendizagem baseados em tarefas (como aceder a informações necessárias ou avaliar criticamente as informações e as suas fontes). Por isso, nesta nova Framework, são introduzidas seis molduras conceptuais, que representam ideias abrangentes e aplicáveis às diversas disciplinas académicas (ACRL, 2016; Fisher, 2017; Swanson, 2017): • A autoridade, que se constrói e é contextual;

• A criação de informação como um processo; • A informação tem valor;

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• A pesquisa como processo iterativo;

• A comunicação académica como plataforma de diálogo; • A pesquisa como exploração estratégica.

No contexto do ensino superior, a necessidade de desenvolver competências em literacia da informação é incontornável, atendendo aos objetivos que este nível de ensino tem subjacentes (Lopes, Sanches, Andrade, Antunes, Alonso-Arévalo, 2016). Para Esteves (2016, p.37) “pode considerar-se como muito positiva a enorme quantidade de informação hoje disponibilizada a todos e o acesso cada vez mais fácil ao conhecimento muito extenso aí armazenado. Em contrapartida, tal fenómeno trouxe adversidades: a abundância excessiva de informação torna-a indigerível por um só indivíduo; torna-a qutorna-alidtorna-ade (rigor, vtorna-alidtorna-ade) dtorna-a informtorna-ação disponível é muito desigual.” E de facto, um dos principais desafios dos professores prende-se com uma consciencialização do seu papel na orientação para a seleção criteriosa de informação, que assenta no desenvolvimento do pensamento crítico (veja-se, a este propósito, o exemplo explanado por Cruz, Nascimento & Dominguez, 2019). É partindo da consciência do meio social e das suas capacidades pessoais e profissionais que os docentes devem atuar, transmitindo o conhecimento disciplinar ao mesmo tempo que desenvolvem, nos estudantes, capacidades de investigação, promovendo melhor aprendizagem, investindo na lecionação de estratégias de pesquisa, contribuindo para o uso ético e informado do conhecimento e induzindo experiências de autoria e comunicação nos alunos. É, pois, legítimo considerar que o papel dos professores passe também pela promoção da aprendizagem da literacia da informação, procurando incitar nos estudantes as atitudes e disposições necessárias para o desenvolvimento e prática de competências que lhes permitam ser melhores aprendentes no contexto académico, mas também ao longo da vida.

Importa referir que não é novo o estudo da literacia da informação como competência fundamental para os professores, havendo autores já se dedicaram a esta matéria e a matérias complementares (vide, por exemplo, Schrum, Niederhauser, Strudler, 2016; Sanches, 2017; Ödalen, Brommesson, Erlingsson, Karlsson & Fogelgren, 2019). Alguns autores têm referido a importância de se abordar a literacia da informação enquanto competência a lecionar na formação de professores, devido às funções exercidas na prática profissional: é que a orientação e supervisão de estudantes abarca frequentemente uma tutoria à sua investigação, isto é, um acompanhamento de perto ao estudante durante a elaboração dos seus trabalhos académicos, particularmente os que envolvem pesquisa de informação. Brinkley et al. (1999) já aludiam à necessidade de supervisionar o trabalho de escrita dos alunos, nomeadamente apontando linhas orientadoras que ajustassem os objetivos e as expectativas relativamente aos resultados. E acrescentavam que esta orientação é não só uma enunciação de requisitos a cumprir, como significa uma ajuda efetiva se os docentes ilustrarem com exemplos, elencarem casos, fizerem a demonstração das metodologias e técnicas. Shipman, Bannon e Nunes-Bufford (2015) referem-se exatamente a esta questão, apresentando interessantes conclusões que relacionam os hábitos de busca e utilização de informação dos professores em serviço com a formação realizada anteriormente, por ocasião da sua formação inicial, afirmando assim que os resultados da formação em literacia da informação são persistentes, acompanhando os professores ao longo do seu desempenho profissional.

Em termos globais, assiste-se a um reconhecimento da importância da literacia da informação como competência a integrar na formação de professores, formadores e educadores. Esta sensibilidade expressa-se não apenas no relato de experiências e estudos como os mencionados,

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como no questionamento prospetivo de interventores, e nas reflexões teóricas que este tema tem despoletado. A título de exemplo, de referir o estudo prático de Godbey (2018) que se dedica a averiguar melhorias na proficiencia em literacia da informação de futuros professores, ou a reflexão teórica Perzycka (2015) que fundamenta a importância do estudo e aplicação da literacia da informação de uma forma mais consistente, a partir da análise profunda das condições que a constituem, bem como do diálogo com a teoria, de que as práticas poderão beneficiar. De mencionar ainda o inspirador trabalho de Maybee, Bruce, Lupton & Pang (2018) que explana sobre o design do currículo cujos conteúdos são interligados ao envolvimento intencional com a informação. Isto é, embora os professores do ensino superior possam usar informação de forma sofisticada para o ensino das suas disciplinas, eles podem não estar habituados a ensinar os alunos a usar de maneira criativa e reflexiva a informação no trabalho académico. E esse é também o papel dos docentes ao embeberem a literacia da informação nos seus programas de ensino.

4. Caracterização do Estudo

A observação dos estudos anteriores sustenta a integração de competências em informação no currículo dos professores das IES. Estas competências vão acrescentar maior capacidade de intervenção no ensino, porque não só beneficiarão o papel de transmissores de informação dos docentes, como permitem que eles próprios desenvolvam as formas como se atualizam. O estudo que agora se apresenta pretende explorar estas características e a forma como os professores se podem preparar no que diz respeito a esse duplo objetivo: por um lado, sabendo pesquisar, selecionar, organizar, avaliar e apresentar informação, de forma ética e legal, terão melhores condições de a transmitir; por outro, porque as competências em informação permitirão aos seus alunos lidar com ambientes de aprendizagem em constante evolução. A reflexão pretende assim evidenciar o impacto da literacia da informação no contexto educativo e de aprendizagem, analisando trajetórias a explorar pelos professores. Nesta linha de pensamento, Cowan e Eva (2016) evidenciam que ao munir-se os professores do ensino superior com ferramentas e competências para ensinarem literacia de informação aos seus estudantes, estaremos a abordar a questão da aprendizagem de uma maneira mais holística, encorajando-os nas suas próprias tarefas de ensino e investigação. E concluem as autoras: comunicar, encorajar, educar e infiltrar a literacia da informação são contributos multifacetados para ir ao encontro das necessidades dos docentes. E esta aproximação é vantajosa porquanto contribui de forma significativa para passar do coligir de informação para a criação de conhecimento. A Universidade de Lisboa é maior Universidade portuguesa. Situada na capital, congrega 18 Escolas (Faculdades e Institutos) e serve uma população de cerca de 50.000 alunos, com perto de 3.500 professores e 2.500 funcionários. Esta grande universidade possui áreas de ensino e investigação em unidades autónomas. O Instituto de Educação é uma das escolas, dedicada à investigação, formação em educação e formação em Portugal e tem atualmente cerca de 900 alunos. A gestão atual da formação de professores, em particular os do ensino superior, apresenta muitos e complexos desafios. No processo de ensino e aprendizagem, os alunos devem ver como os professores lidam com desafios da informação e os professores devem ser capazes de melhorar as suas práticas de ensino com a tecnologia, no acesso, manipulação e comunicação da informação. Daí o desenho de uma nova oferta formativa que contempla a Pedagogia do Ensino Superior, especialmente vocacionada para os novos docentes deste grau de ensino.

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a. Objetivos

No alinhamento entre as competências requeridas aos professores e os novos princípios da literacia da informação em articulação com a escrita académica, procurou-se desenhar uma proposta curricular integrada numa Pós-Graduação em Pedagogia do Ensino Superior, ministrada pelo Instituto de Educação da Universidade de Lisboa. A proposta tem por base uma reflexão sobre a importância da escrita académica enquanto resultado e produto da reflexão intelectual e do uso de informação. Através de um aporte prático, diversificado e abrangente à temática procura-se responder ao desafio dos que atuam no eixo da transformação da informação em conhecimento, através de propostas concretas para que os alunos possam escrever de forma adequada em contexto universitário. Procura-se, portanto, apoiar os docentes na orientação dos estudantes para a prossecução dos seus trabalhos, da pesquisa à publicação, usando particularmente a literacia da informação.

Especificamente este estudo procura responder às seguintes questões:

1. Como se articula a literacia da informação na escrita de trabalhos académicos? 2. Que aspetos são relevantes integrar nas aprendizagens dos docentes, para que

estes os possam retransmitir?

b. Método

Desenhou-se uma unidade curricular na Pós-Graduação Pedagogia do Ensino Superior, oferecida no ano letivo de 2019/2020 no Instituto de Educação da Universidade de Lisboa, tendo como referência o quadro teórico-conceptual da Framework da ACRL. O objetivo foi o de desenvolver e atualizar as competências relativas ao conhecimento de ferramentas e estratégias para lidar com informação, através do exercício da escrita académica. Neste processo perspetivou-se incorporar atividades, tarefas e avaliações de aprendizagem que requeiram que os aprendentes articulem necessidades de informação; encontrem informação e recursos em ambientes digitais; organizem, processem, analisem e interpretem informação; e comparem e avaliem criticamente a credibilidade e a fiabilidade da informação e das suas fontes; compreendendo o contexto académico e como poderão contribuir para a comunidade científica através da produção escrita e publicação académica.

c. Resultados

De acordo com o projeto de implementação desta proposta, apresenta-se, de forma sumária, a caracterização e a estrutura da nova unidade curricular.

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Quadro 1. Caracterização da unidade curricular «Literacia da Informação para a Escrita Académica»

5. Discussão

A construção de um programa curricular que abrange os diversos aspetos da literacia da informação, mas que ao mesmo tempo apresenta flexibilidade no seu design, permite-nos considerar que, ao ministrarmos estes conteúdos, eles poderão ser transferíveis, no âmbito da prática profissional dos docentes do ensino superior, a quaisquer matérias de ensino. A natureza transdisciplinar da literacia da informação, particularmente quando associada à matéria da

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escrita em contexto académico, permite-nos antecipar uma aplicabilidade prática adequada. Aliás, à semelhança de casos práticos já analisados, como os de Yevelson-Shorsher & Bronstein (2018) ou de Dawes (2019), os programas de ensino de competências em informação que procuram conjugar estas características, parecem obter bons resultados. Acresce ainda a importante colaboração de bibliotecários, sublinhada por estes mesmos estudos, que apresentam vantagens significativas no conhecimento de recursos informacionais de forma aprofundada e cuja experiência deve ser aproveitada para construir insights significativos para os professores do ensino superior. Ao mesmo tempo, considerando evidências qualitativas de um estudo que relaciona o papel dos orientadores e supervisores de estudantes do ensino superior com a literacia da informação (RIN, 2011), parece incontornável que estas competências sejam interligadas com as práticas de escrita académica, sublinhando-se as ligações entre uma e outra, com vista à obtenção de melhores resultados. Com esta proposta de unidade curricular, seguindo as linhas orientadoras do documento de referência para a literacia da informação (ACRL, 2016), procurou-se desenvolver competências eficazes em literacia da informação. Estas passam pela pesquisa de informação para localizar, selecionar, recuperar e avaliar a informação, utilizando uma variedade de fontes e ferramentas (impressas e eletrónicas), discernindo entre fontes académicas e não académicas, entre fontes primárias e secundárias, compilando, categorizando e gerindo citações durante o processo de pesquisa de informação, aplicando um padrão ético e legal no uso de fontes e da informação, avaliando criticamente as fontes e os recursos de informação. Estes pressupostos deverão ser construídos e prosseguidos de forma a alinhar dos conceitos nucleares da ACRL com os resultados esperados nesta unidade curricular (Larsen, Wallance, & Pankl, 2018; Lopes, Antunes, & Sanches, 2018).

6. Conclusões

Pretendeu-se neste estudo articular os propósitos do trabalho de investigação em contexto académico e a resposta às necessidades de informação, desenvolvendo uma consciência pedagógica neste processo. Ao promover-se o trabalho de sistematização e comunicação de informação, a busca de fontes em vários formatos, tanto escritos como orais, possibilita-se a compreensão do processo de investigação, incluindo o uso do erro como estratégia de aprendizagem. Finalmente, ao serem demonstradas disposições, como o espírito investigativo, a resiliência e a confiança para aplicar o conhecimento a novos problemas e situações, estaremos a desenvolver habilidades para usar de forma segura as tecnologias na pesquisa e uso da informação, a desenvolver uma atitude de confiança na resolução de problemas, valorizando conceitos de aprendizagem direcionados ao estudante. Estudos prévios relatam vantagens do ensino-aprendizagem da literacia da informação em contexto académico. Conclui-se que o caso apresentado pode ser usado para estimular a reflexão e a inspiração na formação dos docentes do ensino superior, particularmente os que buscam facilitar e promover melhorias na aprendizagem dos estudantes universitários, em especial no que respeita à literacia da informação, integrando estratégias e ferramentas adaptadas para o desenvolvimento de competências em informação.

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Referências

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