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A Febre Urinosa

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Academic year: 2021

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(1)

Manoel Ferreira da Silva Couto Junior

A FEBRE

URINOSA

DISSERTAÇÃO INAUGURAL

APRESENTADA A

ESCOLA MEDICO-CIltURGICA DO PORTO

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TYP. UNIVERSAL DE NOGUEIRA. & CACERE3

347 —Rua do Almada —317 1884

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Manoel Ferreira da Silva Couto Junior

A FEBRE

URINOSA

DISSERTAÇÃO INAUGURAL

APRESENTADA Á

ESCOLA MEDICO-CIKURGICA DO PORTO

P O I ^ T O

TYP. UNIVERSAL DE NOGUEIRA & CÁCERES

317 — Rua do Almada — 347

(4)

ESCOLA MEDICO - CIRÚRGICA DO PORTO

Director

CONSELHEIRO, MANOEL MARIA DA COSTA LEITE

Secretario

RICARDO D'ALMEIDA JORGE

CORPO GATHEDRATICO

LENTES CATHEDEATICOS

t.* Cadeira—Anatomia descri­

2 » olalL" l i , "1, ' , • / • ■ • J o a o P e r e i r a D i a s Lebre. 3» olt ™ ~ wf.,O,.08l,a • • í A n , o n l° d'Azevedo Maia. a. cadeira — Historia natural

dos medicamentos. Mate­

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Anl0Ui0 J û^i m de *<*"» Caldas

6.» C a l T r a ­ Panos," doenças P e d r° A U g U S' ° D Í 3 S­ das mulheres de parto e

7.» o t e X : i n t w: D r­ A 8 0 8 t i n h u A» * » « ° d» Souto. 8 » C a d e í r lh ena—U t i 0 a i^e r n a A n t o n i o d'Oliveira Monteiro. 9 • C a d l l r » ~ o l i n . T m­ C a • M a n 0 e l Rod'­igies da Silva Pinto.

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U.» Cadeira 1 Medicina" legal! M ï n°e l d e J M U 8 A n'n n e* L e m o s­ hygiene privada e publica

12.» C a d S r l ­ P a l h o l o g i a geral, ^ * ■ * f' A y r 6 8 d e G < m v e i a °8 0 r ,° ­ semeiologia e historia me­

PharmtrU I U i d i o A?™s pereira do Valle.

t­narmacia I s i d o r o d a F o n 6 e c a M o u r a LENTES JUBILADOS

medica . . . í D r' J o s e P e r e i r a E e i' ­

• < João Xavier d'Oliveira Barros. „ , (. José d'Andrade Gramacho. fcecção cirúrgica i Antonio Bernardino d'Almeida. Pharmacia Conselheiro Manoel M. da Costa Leite, rnarmacia F e I i x d a F o n s e c a M o n r a

LENTES SUBSTITUTOS Secção medica . . . J Vicente Urbino de Freitas.

' 1 Antonio Placido da Costa.

Secção cirúrgica J Augusto Henrique d'Almeida Brandão. l Ricardo d'Almeida Jorge.

LENTE DEMONSTRADOR

(5)

A escola não responde pelas doutrinas expendidas na Dis-sertação e enunciadas nas proposições.

(Regulamento da Escola de 23 d'abril de 1840, art. 155.°)

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(7)

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A MINHA IRMA

A MEU CUNHADO

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Á MEMORIA

DE

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A MEU T I O

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JOSÉ BENTO RAMOS PEREIRA

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MEUS PARTICULARES AMIGOS

Franklin (Bastos

(Daniel Antonio (Pereira

Joaquim José Marques a Abreu Junio

Francisco Joaquim Marques d'Abreu

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A' MEMORIA

DOS MEUS CONDISCÍPULOS

"Antonio d'^lmeicta 1. ç jjascontellos

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Pedro Augusto Dias

Manuel de Jesus Antunes Lemos

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(17)

Uma das operações que o cirurgião mais usual-mente pratica é o catheterismo. Operação considerada geralmente das mais simples, recorre-se a ella a cada momento, sem a mais ligeira precaução, ignorando ou esquecendo completamente os accidentes sérios que se lhe podem seguir.

D'estes, o mais grave, é inquestionavelmente a febre urinosa, assumpto que nos propomos estudar na nossa dissertação.

Não pretendemos, n'este trabalho, desfazer as trevas que reinam sobre a pathogenese da affeccão; tal ten-tativa seria muito superior ás nossas forcas. Satisfa-zendo a lei, teremos apenas em vista aproveitar mais ou menos, lembrando a gravidade e frequência d'esta doença e, por conseguinte, a necessidade de empregar todos os esforços, para evitar uma tão grave complica-ção.

Tal é o fim do nosso trabalho e a única pretensão que temos em vista.

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ETIOLOGIA

Os accidentes, que constituem o objecto do nosso trabalho, não são infelizmente raros. A frequência das lesões urinarias e da intervenção cirúrgica, no seu tra-tamento, dá a explicação do facto.

Um simples catheterismo, ou qualquer outra ope-ração praticada sobre as vias urinarias, é a causa mais frequente da affecção. Todavia estes accidentes mani-festam-se, por vezes, no decurso das lesões dos órgãos urinários, independentemente de qualquer intervenção cirúrgica.

N'um certo numero de casos, a simples introduccão d'um catheter, praticada sem a menor difficuldade, é bastante para provocar o apparecimento da doença. Entretanto, se a febre urinosa é determinada pelo ca-theterismo mais simples, mais hábil e prudentemente

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praticado, é certo que a introducção forcada do cathe-ter é, debaixo d'esté ponto de vista, muito mais peri-gosa.

Guyon exprime-se, a este respeito, do modo seguin-te : Touseguin-tes les fois que vous serez obligés de met-tre de la force pour introduire une bougie, toutes les fois que vous fatiguerez le canal par des séances trop rapprochées, par des instruments trop gros, dans pres-que tous ces cas, il y aura de la fièvre et d'autant plus que votre chirurgie aura été plus mécanique.» (1)

Phillips, Marx e outros pathologistas, não são d'essa opinião. Para elles, qualquer operação, por mais sim-ples ou complicada que seja, pôde igualmente ser a origem dos accidentes urinosos. Marx tenta corroborar a sua opinião, amimando que esses accidentes se des-envolvem, ás vezes, nas operações mais simples, ao pas-so que outras mais graves, determinando traumatismos consideráveis sobre as vias urinarias, podem deixar de provocar o apparecimento da doença (2).

O que se acaba de 1er, não são senão factos parti-culares, e, como taes, não podem servir de base á opi-nião de Marx. Veremos, no decurso do nosso trabalho, que ha operações que influem mais ou menos podero-samente sobre a manifestação mórbida que nos occupa. Se, effectivamente, se realisam esses factos referidos por

(1) F. Guyon—Leç. cl. sur les maladies des voies urinai-res (1881-pg. 499).

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aquelle pathologista, se ha operações graves sem ori­ ginarem estes accidentes e se, algumas vezes, os mais simples catheterismos as determinam, é isso dependen­ te d'esse quid desconhecido a que chamamos predispo­ sição.

A febre urinosa é frequentemente determinada pela dilatação temporária ou permanente do canal da ure­ thra. Guyon observou­a, n'um sexto dos casos d'essa ope­ ração. E' quasi sempre o primeiro typo que se desen­ volve; as formas graves são excepcionaes.

Alguns pathologistas teem restringido e quasi com­ pletamente abandonado a pratica da urethrotomia in­ terna, attribuindo á operação a frequente manifestação da febre urinosa, com resultados por vezes funestíssi­ mos. A auctoridade que, n'este nosso trabalho, invoca­ mos a cada momento, Guyon affirma que, não obstante, na pratica da urethrotomia interna, ter encontrado a febre urinosa n'um terço dos casos operados, todavia esta manifesta­se, quasi sempre, na sua forma benigna, sendo o caracter grave, na maioria dos casos, a conse­ quência de violências exercidas sobre a urethra, pela in­ troducção forçada d'uma sonda muito grossa, após a incisão.

A sonda permanente é, porém, indispensável, depois da operação. Introduzida convenientemente, sem attri­ to pronunciado, longe de provocar a febre, é, ao con­ trario, um meio importante para a prevenir.

Bem differentemente do que affirma Civiale (1), é a

(i) M. Civiale — Traité des maladies des organes genito­ urinaires.

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lilhotricia a operação que mais certamente determina os accidentes urinosos. A febre é aqui quasi inevitável. Ë rara a operação de lithotricia em que não tenhamos a luctar contra aquella complicação. Quasi certa nas primeiras sessões, a sua frequência vae porém dimi-nuindo, á medida que o tratamento se vae adiantando.

t a forma benigna que, n'estes casos, se desenvolve

mais commummente, apesar de não ser rara qualquer das formas graves da doença.

A súbita evacuação d'urina, depois d'uma distensão muito prolongada da bexiga, a passagem difficil d'um calculo, coágulos, areas, etc., etc., emûm, toda e qual-quer irritação ao longo da urethra, são outras tantas causas, que influem, mais ou menos poderosamente, no desenvolvimento da febre urinosa.

Marx e outros attribuem também uma grande in-fluencia ao resfriamento do doente, após qualquer ope-ração das vias urinarias.

Perdrigeon pretende que os indivíduos nervosos, que temem o catheterismo, como uma operação muito dolorosa, são mais sujeitos a estes accidentes, do que aquelles que são pouco impressionáveis. Guyon não tem o mesmo modo de vêr, dizendo-nos não ter observado aquella complicação, praticando a operação da urethro-tomia interna em indivíduos muito impressionáveis e medrosos. Marx, compulsando um grande numero de observações, julga não poder dar conclusão alguma a este respeito.

A febre urinosa é muito pouco frequente na mulher. A laTgura e a pouca extensão da urethra n'aquelle

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se-— 7 se-—

xo, tornando fáceis as explorações; o pequeno numero de doenças, que, n'elle, affectam este canal, e, por conse-guinte, a frequência relativamente muito menor com que somos obrigados a proceder ao catheterismo, são as cau-sas principaes a que podemos imputar esse facto.

Sobre este ponto, é certamente muito exagerada a opinião de Guyon; para este auctor «nous rencontre-rons, chez la femme, la même physionomie clinique, dans l'évolution du symptôme fièvre, la même impres-sionabilité du sujet, la même facilité et la même inten-sité dans la production des accès (1).»

A influencia da idade sobre a producção da affeccão, é pouco importante ; comtudo os velhos, sujeitos ás doenças antigas do apparelho urinário, hão de cer-tamente estar mais expostos aos accidentes d'esta or-dem.

Âs doenças chronicas dos órgãos urinários são, de certo, as causas mais importantes. Ainda que, geralmen-te, sejam só causas predisponentes, são de tanto valor e de tanta força, que bastam, em certos casos, para dar origem á manifestação mórbida de que tratamos, sem a concorrência da mais ligeira causa determinante. A clinica tem demonstrado que as doenças franca-mente agudas dos órgãos urinários não se acompanham d'esta complicação. As cystites, as prostatites, a reten-ção súbita da urina, os abcessos urinosos, emfim, to-das as lesões inflammatorias aguto-das to-das vias urinarias,

(1) Loc. cit.

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— 8 —

ou são apyreticas, ou acompanhadas de febre de cara-cter mui diverso do da affecção que nos occupa. Se, al-gumas vezes, os accessos de febre urinosa têm sido ob-servados n'esses casos, não é a essas lesões que de-vem ser imputados, mas a outras lesões preexistentes mui différentes d'essas.

São as doenças chronicas dos órgãos urinários, que, na sua evolução, são frequentemente acompanhadas de febre urinosa. Os apertos d'urethra, a hypertrophia da prostata, os cálculos, as neoplasias dos órgãos uriná-rios (cancro, tubérculos, etc.), determinando perturba-ções na micção e outras lesões consecutivas nos órgãos urinários, são as condições que podem originar a febre urinosa, em qualquer das suas formas.

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PATHOGENIA

A primeira theoria sobre a pathogenia da febre rui-nosa data de 1833, época era que Yelpeau notou pela primeira vez a existência dos abcessos das articula-ções. «Une forme d'arthrite à noter, diz elle, est celle qu'on observe quelquefois à la suite du cathéterisme ou des opérations sur l'urèthre. L'un des mes malades qui me l'ont offerte, tourmenté depuis longtemps par une coarctation uréthrale, était pris d'un violent accès de fièvre à chaque tentative que je faisais pour lui in-troduire une bougie. Le soir d'un de ces essais, le trem-blement et la fièvre furent acompagnés de très vives douleurs à l'articulation tibio-tarsienne gauche, la sup-puration fut très rapide (1).»

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Passado algum tempo, no terceiro volume das suas

Leçons cliniques, o mesmo professor falia arada d'estes

accidentes, tentando dar d'elles uma explicação. Diz o seguinte : «L'urine est un des liquides les plus dange-reux de l'économie et qui produit les ravages les plus affreux, quand il est épanché dans les cavités séreuses, infiltré dans le tissu cellulaire. Serait-il donc étonnant que quelques-uns de ses principes forcés, on ne sait comment, de rentrer dans le torrent de la circulation, par suite de l'opération du cathéterisme, pratiquée dans certaines conditions peu ou mal connues, ne devinssent la cause de tous ces phénomènes? Je n'insistirai pas plus longtemps, car il serait trop facile de s'égarer dans

le champ des hypothèses.»

O illustre cirurgião hesitava, não affirmando a sua theoria d'uma maneira positiva; e, posto que tivesse descoberto as relações entre os accidentes urinosos e as alterações do apparelho urinário, as suas ideias não fo-ram adoptadas pela maior parte dos patho logis tas.

Havendo-se observado, em alguns casos de febre uri-nosa, a inflamrnação das veias da urethra, imputaram alguns cirurgiões, e entre elles Chassaignac, á phlébite os accidentes urinosos observados.

Em breve, este modo de vór, completamente aban-donado, foi substituído pela theoria de Reybard (1) e Bonnet (2) (de Lyon) que tentavam explicar a doença (1) Traité pratique des rétrécissements du canal de l'urè-thre, 1833.

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11 —

pelo esgotamento nervoso por via reflexa, estado aná-logo ao do shock, com que os inglezes explicam os acci-dentes geraes após os grandes traumatismos.

Tal era o estado da questão, quando em 1853, Per-drigeon, discípulo de Velpeau, estuda na sua these de doutoramento o assumpto de que tratamos : o que, para o professor, era apenas hypothèse, 6 considerado por Per-drigeon, como a única explicação plausivel dos acciden-tes febris, consequência do catheterismo. «L'introduction d'une certaine quantité d'urine dans le sang est donc, pour nous, la cause qui donne lieu aux accidents fébri-les intermittents déterminés par le cathéterisme.» Taes são as palavras com que Perdrigeon affirma o seu modo de vêr a este respeito. Não obstante, porém, exprimir-se d'um modo positivo, apresenta mais adeante a seguinte duvida: «Sera-ce par l'absorption d'urine toute formée au moyen des vaisseaux lymphatiques ou veineux (de la vessie, de l'urèthre, peut-être même du rein) ; sera-ce par défaut d'élimination des principes qui doivent composer l'urine, principes qui sont toujours contenus dans le sang et que les glandes rénales sont chargées d'en extraire incessamment? (1)»

A viciação do sangue pela urina é, pois, para o au-ctor d'estas linhas, a causa dos accidentes consecutivos ao catheterismo. Apesar de não resolver a questão do modo como essa viciação se vem a produzir, apresenta todavia, pela primeira vez, o enunciado das duas

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des theorias sustentadas mais tarde por cirurgiões dis-tinctissimos — a theoria da absorpção e a theoria

re-nal.

Maisonneuve, de Saint Germain (1), Sedillot (2) e outros pathologistas adoptaram, em breve, a primeira d'essas theorias, como a mais rasoavel para a explica-ção dos accessos urinosos. Porém, ao passo que estes distinctos cirurgiões defendiam com enthusiasmo a theo-ria da reabsorpção urinosa, Verneuil, em 1856, de-pois de ter observado lesões renaes na autopsia d'um doente morto de febre urinosa, reconhece que a causa da doença é a perturbação da funcção renal e, por con-seguinte, a falta de depuração do sangue determinada pelo estado de soífrimento do rim.

Um pouco mais tarde, M. Uron, na Gazette médicale

de Lyon, (1858) explica apathogenese daaffecção, pelo

estado nervoso em que os doentes se encontram, depois do catheterismo, estado que suspenderia a secreção uri-naria, como qualquer das outras secreções. Todavia o próprio auctor declara não considerar esta explicação, senão como uma simples theoria. Adeante, attribue a doença a uma reacção do organismo determinada pela irritação do tecido cicatricial produzida pelo catheter, regeitando assim absolutamente a reabsorpção directa da urina.

Em 1860, Civiale, no seu Traité des maladies des

(1) De la fièvre urothrale. These de Paris 1861.

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— 13 —

organes genito-urinaires, faz a distincção entre a febre

espontânea e provocada; e, reconhecendo a analogia dos accidentes nos dois casos, apresenta, como origem da doença, a reabsorpcão da urina estagnada. Emfim, de-pois de ter notado as arthrites e abcessos consecutivos ao catheterismo, torna-se completamente ecléctico, ci-tando, no grupo das causas da febre urinosa, a nephri-te, a phlébinephri-te, a infecção purulenta e a reabsorpcão urinosa.

Em pouco tempo a theoria renal, confirmada por nu-merosas autopsias, foi quasi que geralmente adoptada; todavia, ao passo que Phillips (1), Mauvais (2) e Marx (3), propugnadores enthusiastas d'esta theoria, a defendiam com ardor, Reliquet (4) e Gosseliu (5) vieram affirmar de novo a reabsorpcão pela mucosa urethral lacerada, insistindo o segundo d'esses pathologistas sobre a

alte-ração da urina, como desempenhando papel

importan-tíssimo, na producção dos accidentes. É verdade que Gosselin não rejeita a theoria renal ; considera os casos, em que a nephrite intervém, como menos frequentes, sem deixar comtudo de admittir, para explicar alguns d'elles, uma uremia cirúrgica resultante das alterações renaes.

(i) Traité des maladies des voies urinaires, 1860. (2) Des accidents fébriles etc.. These de Paris, I860. (3) Des accidentes fébriles etc.. These de Paris, 1861. (4) Traité des opérations des voies urinaires, 1871. (5) Clinique chirurgicale de la charité, 1873.

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Ê este também o modo de pensar de Girard (1) ; á reabsorpção urinosa seriam devidas as formas benignas da doença, emquanto que as graves seriam a conse-quência da uremia.

Em 1881, Guyon no seu esplendido livro Lee. cl.

sur les maladies des voies urinaires, adopta as duas

theorias, como iudispensaveis para a interpretação de lodos os factos clinicos. Condemna o exclusivismo dos sectários de cada uma d'ellas, reconhecendo que ambas assentam em bases solidas.

Duplay (2) molda a sua opinião na maneira de vér de Guyon, afflrmando que ambas as theorias tem expe-riências era seu favor e que ambas são necessárias pa-ra explicarem todos os factos.

,As experiências de Cl. Bernard e Barreswill (3) mos-tram que, depois da ablação dos rins, o sangue liça so-brecarregado de uma quantidade d'uréa muito supe-rior á normal, resultando d'ahi, em virtude da elimina-ção d'esté principio pelo tubo digestivo, as diversas perturbações digestivas que se observam nos animaes que soffreram tal operação.

Além d'estas experiências, que parecem dar elemen-tos á theoria renal, outras se realisaram também em apoio da theoria opposta. Os trabalhos de Kiiss e Susi-ni (4) teem de facto demonstrado que, se a mucosa

ve-il) These de Paris—1873. (2) Pathologie externe, 1884.

(3) Lee sur les liquides de l'organisme, 1859. (4) These do Strasbourg, 1867.

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sical no estado de saúde não absorve, o mesmo se não dá, nos casos em que o seu epithelio está alterado.

Considerando, pois, ambas as theorias admissíveis, Duplay interpreta as différentes formas clinicas da febre urinosa, do seguinte modo :

O accesso franco determinado pela introducção d'um catheter muito grosso, ou mal conduzido, que tenha pro-duzido uma laceração do canal, não poderia, segundo o sábio professor, ser devido á reabsorpção da urina. «Comment supposer, diz elle, que cette mince éraillure a pu être la porte d'entrée d'un empoisonnement si ra-pide par l'urine, celle-ci fut-elle altérée, alcaline et am-moniacale, alors qu'il ne se manifeste point, quand une infiltration d'urine a largement envahi le tissu cellu-laire.» (1)

Para estes casos, reconhece, como única acceitavel, a theoria renal, attendendo a que a autopsia tem re-velado, algumas vezes, congestões renaes intensas, bem como um augmento na proporção da uréa no sangue e diminuição correspondente na urina excretada. No entretanto, confessa que a excitação do catheter apenas poderia determinar essa intensa congestão, nos casos em que o rim já estivesse affectado. Em outras circum-stancias, nunca se produziria esse effeito. Emfim, pergun-ta qual a razão por que, dadas as mesmas causas d'excitaçao, não se desenvolve sempre o accidente? Ca-la-se n'este ponto, nada affirmando de positivo.

A incerteza, porém, não persiste, quando tenta ex-il) Loo. cit.

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plicar os accessos perniciosos. Para estes, o estado de doença renal preexistente, influenciado pela excitação reflexa, dá inquestionavelmente a explicação mais plau-sível do accidente; para o typo contimio-remittente, ainda a theoria renal é invocada.

Á forma chronica da doença interpreta-a já Duplay d'um modo différente. A inflammação chronica da muco-sa vesical daria a esta um grande poder absorvente. Haverá então a absorpção lenta, que explica o estado febril ligeiro, por que a forma chronica se manifesta; e, como os rins soífrem também, qualquer excitação, por mais insignificante que fosse, produziria, pelo mecanis-mo da congestão renal, os accidentes graves e, algumas vezes, a morte rápida observada frequentemente, no de-curso da forma lenta da doença.

Termina depois o illustre pathologista, mostrando a conveniência de adoptar ambas as theorias, por isso que ambas são indispensáveis para a interpretação de todos os factos.

Não terminaremos a exposição dos différentes tra-balhos, que teem sido apresentados sobre este assumpto, sem fallarmos da discussão que, em [abril d'este an-no, se realisou, na Sociedade Medico-cirurgica de Edim-burgo, discussão esta, em que tomaram parte medicos e cirurgiões de comprovado merecimento.

Andrew Clark, um dos mais considerados dos me-dicos que entraram n'essa discussão, reconhece que trez elementos influem conjunctamente na génese da doença por elles denominada catheter fever; 1,° uma

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— 17 —

irritação direcla ou reflexa do systema nervoso; 2.° uma alteração nas funcções geraes do organismo, nos seus différentes órgãos e tecidos, mas, sem duvida, especialmente nos rins, em virtude das intimas rela-ções d'estes órgãos com a urethra e bexiga directamen-te irritadas; 3.° finalmendirectamen-te, a entrada no sangue d'a-gentes sépticos levados pelo catheter ou por qualquer outro instrumento empregado na operação.

Os drs. Patrick Watson, Stewart, Chienne, Amnan-dale e Wyllie, todos consideram, do mesmo modo, a pa-thogenia da doença, aconselhando, como tratamento preventivo, o emprego dos différentes agentes antise-pticos. Com estas precauções dizem que nunca obser-varam caso algum de febre urinosa. Todavia Bramwel e Duncan, apesar de reconhecerem, em muitos casos, a septicemia, como causa da affecção, não são de opinião que ella seja sufficiente para os explicar a todos. Na opinião do primeiro d'estes pathologistas, alguns casos da doença serão devidos ao shock, outros á uremia, podendo qualquer d'estas condições actuar isoladamen-te ou combinada com a septicemia. Para Duncan, a par d'esta e do elemento nevrotico, a inflammação da re-gião tem uma influencia poderosa na producção do ac-cidente.

Taes são as variadas theorias que teem sido apre-sentadas para elucidar esta questão, que, apesar de tantos trabalhos, ainda hoje se conserva mergulhada n'uma enorme confusão e obscuridade.

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tra-— 18 tra-—

balho. Temos de emittir uma opinião è confessamos que somos incompetentes para o fazer. Não será para admi-rar que assim succéda, quando é certo que pessoas mais auctorisadas, tanto pela sua intelligencia, como pela pratica enorme que possuem, não trepidam em re-conhecer que o estudo d'esté assumpto ainda está in-completo, julgando por conseguinte impossível allirmar positivamente uma theoria.

No entretanto, seja-nos permittido apresentar a nossa insignificante opinião, relativamente ao assumpto de que tratamos.

Quer admitíamos a absorpção directa, quer a eli-minação insufficiente dos elementos da urina, as tlieo-rias urinosas são inacceitaveis. Experiências bastante repetidas teem provado á evidencia que a injecção d'u-rina no sangue não dá origem a accidente algum.

Demais, autopsias numerosas demonstraram que as lesões renaes não são essenciaes á febre urinosa. Se existem algumas vezes, não existem sempre, e, por con-seguinte, não as podemos considerar, como causa da doença. Além disso, no accesso franco e mesmo nas outras ; variadas formas da affecção, as congestões renaes, ás vezes observadas, serão preexistentes ou consecuti-vas ao accesso ?

Quanto a nós, repetimos, parece-nos que nenhuma d'estas theorias pôde satisfazer ; ha factos que as des-troem pela base, tomando-as por tanto inadmissiveis.

Depois de tudo, e, apezar da nossa poaca competên-cia, permitta-se-nos appellar para a theoria infecciosa, apesar de não termos, por emquanto, dados precisos

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— 19 —

para a Armarmos positivamente. Inclinamo-nos para ella, não deixando, ao mesmo tempo, de confessar que tem pontos por onde pôde ainda ser atacada. Comtudo, se assim a julgamos, estamos porém convencidos que será ella que, com o caminhar da sciencia, virá um dia a dar uma explicação cabal d'um dos mais obscu-ros pontos da pathologia.

Se analysarmos, com effeito, o quadro symptomati-co da affecção, resymptomati-conheceremos immediatamente a gran-de analogia que tem com o d'où trás doenças infeccio-sas; e, sendo assim, não terá a doença uma explicação rasoavel, se a attribuirmos á entrada no organismo d'um agente d'essa ordem ?

Vejamos como interpretamos os factos por esta theo-ria.

O catheterismo é uma operação que praticada, como elemento de diagnostico, ou com um fim therapeutico, é geralmente determinada por padecimentos chronicos do apparelho urinário. Ora, em quasi todas estas doenças, ha demora mais ou menos prolongada da urina na bexiga. Este liquido altera-se dentro em pouco e pôde modificar-se de tal modo, que micro-organismos pathogenicos, transportados do exterior por meio do catheter mal limpo, alli vão encontrar um meio apro-priado e favorável ao seu desenvolvimento.

Estes micróbios, multiplicando-se com rapidez, po-dem produzit os accidentes urinosos, de varias formas. Ou caminham lenta, gradual e progressivamente ao longo das vias urinarias, até chegarem aos rins, onde determinam as lesões que a autopsia tem, muitas

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ve [ 2 0 ve

-zes, revelado ; ou são absorvidos peía mucosa vesico-urethral inflammada ou ferida, e, penetrando na tor-rente circulatória, alteram a constituição do sangue, provocam a reacção febril mais ou menos intensa, determinam phlegmões e outras formas de inílamma-ção, em diversos pontos do organismo em que se ac-cumulam ou depositam, e podem, finalmente, determi-nar ainda lesões renaes mais ou menos graves, no mo-mento de serem eleminados com a urina.

Mas, repetimos, não é nossa intenção desenvolver este assumpto. A doutrina infecciosa da febre urinosa, não assenta, por emquanto, em factos bastante numero-sos e rigorosamente observados e, ainda que os argu-mentos analógicos a seu favor tenham bastante peso, não é a nós que compete cortar o nó gordio de tão intrincada questão.

/ ; /

(36)

SYMPTOMAS

A observação clinica tem permittido reconhecer duas formas distinctas com que a febre urinosa se pôde apre-sentar— a forma aguda e a forma chronica ou lenta. Na primeira, veemrse, de ordinário, os symptomas da affeccão manifestarem-se bruscamente, com uma certa intensidade e evolução rápida, ao passo que, na forma chronica, as manifestações são pouco intensas, por ve-zes apenas apreciáveis e de duração indeterminada.

Na forma aguda ainda a affeccão se apresenta com aspectos diversos, variáveis não só no quadro sympto-matico que manifestam, como no prognostico mais ou menos grave que cabe a cada um d'elles. Distinguimos, pois, na descripção que vamos fazer três typos dis-tinctos, com que a febre urinosa se manifesta, na sua forma aguda —o typo benigno ou franco, o typo

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Typo d'aocessos francos.—Á similhança do

accesso palustre, o da febre urinosa d'esté primeiro ty-po compõe-se de très estádios : arripio, calor e suor.

O arripio, na maioria dos casos, manifesta-se d'um modo brusco, sem prodromos ; todavia, como nas fe-bres, é algumas vezes precedido de symptomas premo-nitórios, taes como : mal estar indefinido mais ou me-nos prolongado, cansaço, abatimento, inappetencia, etc., etc.

Depois de manifesto, o arripio pôde tomar formas variadas. Umas vezes, apenas perceptível, durando al-guns instantes, apresenta em casos excepcionaes uma intensidade e duração consideráveis, chegando a per-sistir por espaço de trez horas. Nos casos mais com-muns, a sua duração quasi nunca excede trinta a qua-renta minutos.

N'este primeiro estádio, raro c que simplesmente haja sensação de frio ; quasi sempre se notam tremo-res geraes com bater de dentes; o fácies altera se ; o doente está pallido; a respiração é anciosa; o pulso pequeno e frequente, por vezes irregular; excepcional-mente, a cyanose da face com arrefecimento das extre-midades tornam o caso verdadeiramente assustador.

O thermometro collocado no recto ou na axilla mar-ca uma elevação considerável de temperatura, logo após a manifestação do arripio. Tem-se observado 40° e 41°, sendo, por conseguinte, a sensação do frio um phenomeno puramente subjectivo.

Tal é o primeiro estádio. A este succède o calor que se vae desenvolvendo gradualmente, havendo

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uma verdadeira phase de transição entre este e o ar-ripio. Os arripios, cada vez menos frequentes e inten-sos, alternam com accessos de calor ao principio ape-nas sensíveis, mas que se vão accentuando, á medida que os arripios diminuem de intensidade e frequên-cia.

O estádio de calor estabelece-se positivamente ; o pulso é agora cheio e frequente; a respiração mais ampla e menos anciosa, todavia frequente ainda; ha peso de cabeça, por vezes, cephalalgia intensa; a pel-le é secca e árida ; os olhos injectados e a face viva-mente congestionada, dão á physionomia um aspecto absolutamente différente do do periodo precedente.

A intensidade e duração do calor são variáveis, apresentando, como o arripio, differenças notáveis.

Emflm o terceiro estádio sobrevem; a pelle apenas húmida ao principio, em breve se cobre de suores abun-dantes, com um cheiro ammoniacal característico ; o mal-estar dissipa-se gradualmente; a respiração deixa de ser difficil ; o pulso diminue de força e frequência e, a não ser uma certa fadiga agora accusada pelo doente, tudo volta ao estado em que estava, antes de se haver manifestado o accesso.

A temperatura, que se havia conservado elevada desde a phase inicial do accidente, começa a descer, depois do apparecimento da diaphorese; a deferves-cencia, em geral franca, completa-se em poucas horas.

0 accesso franco é de ordinário único, principal-mente quando todos os seus estádios se foram succe-dendo regularmente ; casos ha todavia em que se vêem

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apparecer, nos dias seguintes, um ou maior nume-ro d'acessos, o ultimo dos quaes terminado por suores abundantes annuncia, quasi sempre, a cura do doente. Quando assim succède, os accessos tomam ordina-riamente o typo quotodiano ou duplo terção;o typo terção é excessivamente raro.

Tal é a forma mais simples do accesso do primei-ro typo ; mas é raprimei-ro que os symptomas se limitem ao que fica exposto ; na maioria dos casos, se não sempre, surgem complicações, todavia pouco graves, da parte do apparelho pulmonar, circulatório, digestivo e ner-voso.

Às perturbações do apparelho pulmonar consistem principalmente n'uma dyspnea intensa, acompanhada d'um sentimento d'oppressao sobre o esterno, sem que os différentes meios de exploração physica, nos deno-tem nada que possa pertencer a uma lesão do

appare-lho respiratório.

Da parte do apparelho circulatório, observa-se uma irregularidade notável no rythmo cardiaco. As pulsa-ções são, por vezes, intermittentes e estas irregularida-des e intermittencias são independentes de qualquer le-são do coração, por isso que a auscultação nada nos revela de anormal n'este órgão.

Estes symptomas cardio-pulmonares manifestam-se com o accesso e desapparecem com elle. Salvo nos in-divíduos mal dispostos e enfraquecidos, nunca se obser-vam antes do accidente e raramente persistem, depois

da defervescencia.

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capital. Na occasião do accesso, mesmo nos dias que se seguem ao seu apparecimento, a lingua torna-se sec-ca e cobre-se d'uma sec-camada pultacea. Se esta não tem grande importância, debaixo do ponto de vista do pro-gnostico, não succède já o mesmo relativamente á sec-cura, quando este symptoma é muito pronunciado e coincide com um arripio violento e prolongado, o que, desde logo, nos fará temer qualquer das formas graves da febre urinosa aguda.

A saliva é acida, e, não obstante ser raro observar-se n'este typo a estomatite parasitaria, chamada farfa-lho, esta, todavia, póde-se manifestar, sem alterar de modo algum o prognostico benigno da affeccão.

O estômago revela-nos as suas perturbações func-cionaes por nauseas, vómitos e amargos de bocca, devi-dos a regurgitações acidas, que sobrevoem a miúdo. Os vómitos são de ordinário alimentares ou biliosos, raras vezes pituitosos, manifestando-se, em geral, durante pou-co tempo; em casos excepcionaes^jorém, repetem-se com uma insistência notável, durante um tempo mais ou menos longo.

O intestino denota o seu soffrimento por uma diar-rhea excessivamente fétida e abundante, ora passagei-ra, observando-se apenas no dia do accesso, ora pro-longada, persistindo durante os dias seguintes.

Temos, finalmente, a occupar-nos das perturbações nervosas, que frequentemente sobreveem com o accesso. Estas manifestam-se, quasi sempre, debaixo da forma de delírio, variável quanto á sua intensidade e quanto ao momento do seu apparecimento. Tranquillo e vago

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delírio) attinge, ás vezes, proporções medonhas ; é vio-lento e furioso, sendo, por consequência, necessário vi-giar de perto o doente. E' no período inicial do accesso que o delírio apparece, de ordinário ; outras vezes, apenas se nota no segundo estádio, persistindo em am-bos os casos até ao fim do accesso e terminando com elle.

Accessos perniciosos - Nos accessos do typo

pernicioso, ou a intensidade dos trez estádios é estraor-dinaria, ou um d'elles predomina, d'um modo accen-tuado, sobre os outros dois.

Umas vezes (forma indeterminada), os estádios vão-se succedendo uns aos outros, exactamente do mesmo modo que no typo precedente ; aqui, porém, a intensi-dade com que elles se manifestam é extraordinária : a um arripio violentíssimo, succède um calor igualmente intenso, que termina por suores abundantes, frios e viscosos, no meio dos quaes sobrevem a morte.

Outras vezez (forma algida) é o primeiro estádio que predomina; a anciedade que o acompanha é con-siderável ; a face torna-se lívida, em breve se observa a cyanose da face; as extremidades arrefecem e o doente succumbe, sem que a reacção se tenha mani-festado.

0 predomínio do segundo estádio constitue a forma

suffocante do typo pernicioso ; n'esta, durante o calor,

sobrevêm perturbações consideráveis do apparelho res-piratório, reveladas principalmente por uma dyspnea profunda, que compromette em pouco tempo a vida do doente.

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No typo pernicioso da febre urinosa, outras formas se podem ainda observar, posto que menos nitidas que as precedentes, e são : a forma typhoïde, caracterisada pelo apparecimento, após o calafrio, de symptomas re-veladores d'uma considerável adynamia : cephalalgia intensa, estupor, indifferenca, por vezes delírio, dores abdominaes, etc.; é, em summa, o quadro symptoma-tico da febre typhoide, com a qual se não deve con-fundir; a forma tetânica, em que a morte se dá no meio de contracções musculares violentas ; a forma

cholerica, revelada por dejecções incoercíveis

abundan-tes, vómitos e violentas caimbras nos membros ; e, finalmente, a forma soporosa, em que se vê sobrevir, depois do arripio, uma somnolencia intensa, á qual, ao principio, ainda é possível subtrair o doente, mas que, mais tarde, se vae accentuando mais, até ao adorme-cimento profundo, de que o doente nunca mais accorda.

Taes são as différentes formas do typo pernicioso ; o prognostico gravissimo de qualquer d'ellas faz con-siderar este typo a mais terrível manifestação da febre urinosa.

Typo continuo-remittente—A febre urinosa

manifesta-se n'este typo, debaixo da forma d'accessos repetidos, mais ou menos intensos, separados uns dos outros por um estado febril que nunca desapparece.

Depois do primeiro accesso, a defervescencia, que, no accesso franco, é rápida e completa, aqui é demo-rada e imperfeita. O accesso principia por um arripio considerável ; o calor demora-se no seu apparecimento e os suores ou não se desenvolvem, ou apenas se

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ob-- 28 —

servam limitados a certas partes do corpo. A tempera-tura é intensa ; o thermometro marca, desde o começo do accesso, 40° a 41° chegando, todavia, excepcional-mente, a exceder este limite, como n'um caso apresen-tado por Guyon, em que a temperatura attingiu 41°,6.

As complicações, que já descrevemos no primeiro typo, apparecem sempre no typo continuo-remittente, com uma constância e intensidade notáveis.

No dia em que a doença se declara, ou no seguin-te, a lingua mostra-se secca e vermelha ; a saliva é acida e extremamente viscosa, sendo diílicil, em virtu-de da sua viscosidavirtu-de, reconhecer-lhe a reacção pelo papel de turnesol. Ao fim d'alguns dias, quando o es-tado é grave, a lingua toma o aspecto designado pelo nome de lingua de papagaio; cobre-se de fuligem e torna-se negra, escamosa e cornea.

O farfalho manifesta-se rapidamente, logo após os primeiros symptomas do accesso ; a lingua, lábios, a face interna das bochechas e, principalmente, o véo do paladar e pharyngé, cobrem-se de depósitos membrani-formes brancos, pouco adhérentes. A estes symptomas acresce um rubor accentuado da pharyngé e véo do pa-ladar, nos pontos em que esses depósitos deixam a mu-cosa a descoberto. Os doentes referem ahi uma sensa-ção d'ardencia, que lhes chama particularmente a at-tenção, attribuindo elles o quadro symptomatico res-tante á doença da garganta.

Os vómitos e a diarrhea são as perturbações mais importantes do apparelho digestivo. Não se manifestam continuamente ; desapparecem, por um espaço de

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tem-— 29 tem-—

po mais ou menos longo, para reapparecerem, mais tar-de, com força mais ou menos considerável.

As perturbações nervosas, são as observadas no ac-cesso franco ; aqui, porém, tem-se visto, após o delírio, uma prostração e somnolencia seguidas d'um somno pro-fundo, como na forma soporosa do typo pernicioso.

As perturbações circulatórias e respiratórias consis-tem em irregularidades e intermittencias do pulso e n'uma oppressão pronunciadissima, referida pelos doen-tes á região esternal. Se é rarissimo observarem-se le-sões cardio-pulmonares ligadas a esses symptomas, é certo, todavia, que estes, quando intensos, podem termi-nar em verdadeiras lesões do apparelho respiratório. A auscultação denota-nos, effectivamente, algumas vezes, como consequência d'essas perturbações, congestões pul-monares da base e, por vezes, verdadeiras pneumonias.

Da parte dos rins e da bexiga, não é raro o appa-recimento das complicações que passamos a descrever.

As alterações da secreção renal e a dôr espontânea ou provocada, accusada na região lombar, testemu-nham directamente as perturbações dos rins. A dimi-nuição da urina é um dos phenomenos que se obser-va logo no principio do accesso. A quantidade da uri-na excretada uri-nas 24 horas pôde baixar a dous terços, a metade e até a um terço da quantidade normal ; mas esta diminuição, raramente persiste após o ac-cesso, a não ser quando o doente padece já de lesões complexas e adiantadas do apparelho urinário. N'estes casos, o apparecimento do accesso determina a diminui-ção da excrediminui-ção urinaria, diminuidiminui-ção esta que se

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-tiniia a observar d'uni modo persistente, depois do des-apparecimento dos symptomas febris. A analyse da uri-na mostra que a quantidade da urea 6 diminuída d'um modo absoluto, no momento do accesso, o que tem sido comprovado por numerosas experiências de Duplay. Esta alteração, na composição da urina, desapparece também, desde que o accesso termina.

O estado de soffrimento da glândula renal, além das perturbações funccionaes por que se revela, accusa-se ainda por dores mais ou menos intensas, localisadas na região correspondente. Estas dores podem ser espontâ-neas ou provocadas. Às dores espontâespontâ-neas são raras; apenas se observam em casos muito excepcionaes ; quando se manifestam, são, de ordinário, muito intensas. As provocadas pela pressão na região renal, apesar de não existirem sempre, observam-se comludo, segundo Guyon, n'um terço ou n'um quarto dos casos.

Outras complicações menos frequentes do que aquel-las que acabamos de enumerar ainda podem ser ob-servadas, n'este terceiro typo da febre urinosa. Apesar d'algumas vezes se desenvolverem na forma chronica, são o apanágio quasi exclusivo da forma aguda, no ty-po continuo-remittente.

Consecutivamente a febre urinosa, vemos sobrevir, frequentemente, erupções de pelle, que se tornam rapi-damente pustulosas, e que Civiale attribuia á diapho-rese abundante, parte integrante do accesso. Este mo-do de explicar o phenomeno em questão, não nos pa-rece admissível, attendendo a que elle é muito raro e só apparece no typo continuo-remittente, em que os

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suores se desenvolvem em diminuta quantidade. Guyon considera essas erupções como uma manifestação da mesma ordem d'aquellas que tem por sede o tecido cellular e as partes profundas dos membros.

É frequente o apparecimento de indurações phle-gmonosas do tecido cellular sub-cutaneo. Não é raro, ef-fectivamente, vermos o doente queixar-se d'uma dôr localisada em certa e determinada região; o exame d'esta permitte nos perceber um ou mais pontos endu-recidos, irregularmente circumscriptos. Estes endureci-mentos encontram-se, quasi sempre, nos membros supe-riores. N'um caso referido por Guyon, encontrou elle um phlegmão, ao nivel do ramo horisontal da maxilla. A pelle, n'estes pontos, é pouco corada; quasi nunca se observa a suppuração ; resolvem quasi sempre. Estes endurecimentos têm sido observados também, como affirma o mesmo auctor, nos estados puerperaes graves.

Nos membros e nas articulações, desenvolvem-se, ás vezes, dores extremamente vivas, exacerbadas ao mais leve movimento e á menor pressão, sem que, to-davia, se note nem rubor nem tumefacpão. Contraria-mente aos endurecimentos de que falíamos, estas dores observam-se, mais frequentemente, nos membros inferio-res e, particularmente, ao nivel da região solear. Não são continuas; desapparecem espontaneamente, para voltarem depois. Encontram-se, ordinariamente, nos ca-sos de gravidade media, raramente nos gravíssimos.

A par d'estas complicações, relativamente benignas, vemos, algumas vezes, sobrevirem suppurações das partes molles e das articulações. Felizmente são raras;

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umas vezes, muito restrictas, outras vezes, a phle-gmasia invade quasi totalmente um membro; aqui, os tecidossuperficiaes, acolá, os profundos. Aparte affecta-da está vermelha, tumefacta, extremamente dolorosa á pressão mais ligeira, sendo, por conseguinte, impossível a palpação da região doente. Sem que a indammação tenha seguido uma marcha franca, nota-se, nas massas musculares e nas articulações, o apparecimento rápido de pontos fluctuantes e derrames consideráveis. Se se praticam incisões n'estas partes, vê-se sair uma serosi-dade misturada de sangue e, mais tarde, um liquido pu-rulento de má natureza, muito pouco abundante e ex-cessivamente fétido.

Segundo Marx, a ordem de frequência das regiões em que teem sido observados os abcessos dos múscu-los e do tecido cellular é a seguinte: os múscumúscu-los da per-na, da coxa, da região nadegueira, do hypogastro, do antebraço, do braço, da região precordial, fossa iliaca e espaço retro-pharyngeo. D'estas duas ultimas sódes apenas se tem visto um único caso.

Para as articulações a ordem da frequência é esta : articulações do joelho, a da espádua e a articulação tibio-tarsica.

As suppurações articulares são muito mais raras do que as musculares e as do tecido cellular.

Observam-se também, raras vezes, a formação de enormes derrames purulentos nas grandes serosas : no pericardeo, pleuras, peritoneo, etc. São d'uma gravida-de excepcional.

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por vozes, a manifestação de parotidites, surgindo prin-cipalmente no ultimo periodo da febre urinosa d'esté typo. Desenvolvem-se com os mesmos caracteres e symptomas que costumam apresentar, nas doenças in-fecciosas graves, em que ellas, por vezes, apparecem.

Forma chronica — A forma chronica é

caracte-risada por um movimento febril pouco intenso, perma-nente, com ligeiras exacerbações na temperatura. Quer espontaneamente, quer sob a influencia de qualquer manobra cirúrgica, pôde observar-se, de vez em quan-do, a manifestação d'accessos intensos que, ou são únicos, retomando a febre o seu caracter lento e con-tinuo, ou se reproduzem, constituindo d'esté modo o typo continuo-remittente.

A forma chronica é as mais das vezes primitiva ; outras vezes, succède á forma aguda, cujos accessos vão diminuindo de intensidade e frequência, persistindo, após elles, um estado febril pouco intenso, característico da forma lenta.

As perturbações digestivas são aqui o facto domi-nante. 0 appetite diminue, em breve a anorexia é com-pleta ; a lingua cobre-se d'uma camada espessa ama-rellada, persistente durante o dia, porém, mais pro-nunciada de manhã. O doente começa a emagrecer, as forças diminuem e a pallidez dos tegumentos revela-nos uma alteração séria do estado geral.

A côr amarella, que o doente apresenta, é principal-mente manifesta na face e poderia fazer suppôr a exis-tência d'uma icterícia ; a inspecção da conjunctiva^ e face inferior da lingua, não permittirá, todavia, este

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ro. E' um facto revelador d'um estado cachetico pro-nunciado e é com este estado que elle prende.

Á medida que a doenpa progride, o emagrecimento vae-se tornando cada vez maior e os symptomas gás-tricos exacerbam-se também : a lingua secca-se, a se-creção salivar desapparece e o farfalho manifesta-se, confirmando um estado grave.

A suppuracão dos membros e articulações, bem como as erupções pustulosas da pelle são, na forma chronica, absolutamente excepcionaes ; todavia têm-se observado em alguns casos, exactamente com os cara-cteres que lhes marcamos, quando as descrevemos, como complicações da forma aguda.

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DIAGNOSTICO

O diagnostico não offerece difficnldades ; basta es-tarmos prevenidos da possibilidade d'estes accidentes, para que os conheçamos desde logo, n'um doente que tenha soíírido qualquer operação nos órgãos urinários. >Entretanto a primeira questão a resolver, em fren-te d'um arripio consecutivo a qualquer manobra ope-ratória sobre a urethra, é saber se se trata d'um ac-cesso de febre urinosa, ou se esse arripio é a phase inicial da febre que, como nas lesões traumáticas d'ou-tros órgãos, pode acompanhar a lesão traumatica deter-minada na urethra pela operação.

Se, com efeito, a urethra ou as partes circumvisi-nhas estão tumefactas, se ha qualquer corrimento pelo orifício do canal, se algum dos testículos está doloroso, temos muito provavelmente realisada a ultima

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hypo-- 36 —

these. Quando, ao contrario, nada d'isso existe, deve-mos, desde logo, prever a manifestação d'um accesso de febre urinosa.

As duvidas que ainda poderão persistir, dissipar-se-hão em breve, attendendo aos symptomas ulteriores : n'um caso a febre será continua, sem oscillações accen-tuadas, emquanto que no outro observar-se-ha um ac-cesso com os seus trez estados — arripio, calor e suor — seguido d'uma apyrexia ou definitiva, ou interrom-pida pela àpparição d'um novo accesso.

O diagnostico entre a febre urinosa e a infecção palustre estabelece-se sem difliculdade. Os anteceden-tes, o momento da àpparição do accesso, mais ou me-nos subordinado ao da operação, permittirão a perfeita orientação do clinico.

A erysipela ou a infecção purulenta, n'um indivi-duo que apresentasse uma ferida, poder-se-hiara con-fundir com a doença que estudamos; comtudo a confu-são não persistirá por muito tempo, attendendo á mar-cha da affecção.

Reconhecida pois a febre urinosa, resta-nos ainda diagnosticar os seus diversos typos, e ainda determinar, no typo pernicioso, as variadas formas com que elle se manifesta.

A duração do arripio 6 um elemento de grande importância, para distinguirmos immediatamente o typo benigno da doença. N'este, o arripio raras vezes excede quarenta e cinco a sessenta minutos, o que não succè-de com qualquer dos outros, em que o primeiro estado é muito mais prolongado. De resto, a observação

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atten-— 37 atten-—

ta dos symptoraas e marcha da doença, virá confirmar a opinião do pratico e permittirá a fácil distinccão de cada um dos outros typos dos accessos.

Quanto aos erros, que se poderiam commetter com as diversas formas do typo pernicioso, erros que con-sistiriam em tomar a forma pelo fundo, diagnostican-do o cholera, o tétano, a febre typhoide, etc. etc., se-riam tanto mais funestos, quanto é certo que iríamos combater essas suppostas doenças, deixando de parte e despresando completamente o caracter intermittente próprio da affecção. Este engano será todavia difficil, se attendermos aos commemorativos d'uma operação sobre a urethra, à invasão brusca d'aquelles sympto-mas e ao seu desapparecimento ou attenuação conside-rável, durante a apyrexia.

A forma lenta da febre urinosa merece attenção particular do clinico, pôr isso que, pelas suas manifes-tações pouco ruidosas, passa, muitas vezes, completa-mente desappercebida. E' contra esta manifestação qua-si insensível da doença, que devemos estar mais parti-cularmente prevenidos. A marcha quasi sempre insidio-sa da forma chronica illude facilmente o clinico, pre-paranclo-lhe as mais penosas surprezas.

E' o thermometro o único meio seguro de diagnos-tico; em indivíduos, com doenças antigas do appare-lho urinário, nunca devemos dispensar o seu emprego, sob pena de desconhecermos esta séria complicação que, não poucas vezes, prosegue, sem que se manifeste um único accesso.

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continuo-remittente e, excepcionalmente, na forma chro-nica da febre urinosa, surgem algumas vezes complica-ções bastante serias e sobre cujo diagnostico nos demo-raremos um pouco. Queremo-nos referir ás phlegma-sias, seguidas de suppuracão rápida das massas mus-culares, tecido cellular e articulações.

Quando uma articulação é invadida por essas phle-gmasias, a dôr de que o doente se queixa poderia ser tomada por uma dôr rheumatica, tanto mais quanto o doente attribue, algumas vezes, o seu incommodo a um resfriamento. Os antecedentes e a marcha da doença vi-rão promptamente esclarecer o diagnostico. A dôr rheu-matica persistirá por mais ou menos tempo, sem es-sas rápidas suppurações extremamente fétidas e tam características, nos casos de que nos occupamos.

Se um phlegmão diffuse- se viesse produzir acciden-talmente e em qualquer ponto, n'um doente submetti-do a tratamento d'uma affecção das vias urinarias, o diagnostico tornar-se-hia um tanto cliíflcil. Só a marcha mais rápida para a suppuracão dos phlegmões urino-sos poderia elucidar o diagnostico. Depois de pratica-da a incisão, a natureza do pus podia também facili-tate-, pois que o pus dos phlegmões consecutivos a affecções das vias urinarias tem um cheiro particular extremamente fétido, similhante ao do pus dos abcessos urinosos.

A arthrite blennorrhagica poderia ainda ser confun-dida com as collecções purulentas de que falíamos. O diagnostico basear-se-ha ainda sobre a marcha da doença, a rápida suppuracão, a não diminuição do

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cor 3 9 cor

-rimentó blennorrhagico e, finalmente, sobre a persistên-cia dos accessos, após a formação do pus.

Não terminaremos este capitulo sem lembrarmos a necessidade de não descurarmos o diagnostico da mais temivel complicação da. doença. Referimo-nos á ne-phrite com que, frequentemente, temos a luctar. Todas as vezes que estivermos em frente dos accidentes da febre urinosa, nunca esqueceremes a possibilidade d'esta complicação, tratando, com o máximo cuidado, de surprehender os symptomas por que ella se revela.

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PROGNOSTICO

O prognostico é muito variável : extremamente be-nigno, no primeiro typo, é, ao contrario, muito serio, no typo pernicioso ; em qualquer das formas d'esté typo raras vezes o doente consegue sobreviver ao primeiro accesso.

No terceiro typo, o diagnostico é sobretudo depen-dente da natureza das complicações. Em alguns casos, são estas tam ligeiras, que nem sequer indicam o mais leve tratamento. Outras vezes, porém, quando se ma-nifestam a nephrite e as suppurações musculares e articulares, o prognostico é excessivamente grave, por isso .que a morte é quasi sempre consequência d'es-sas complicações.

Entretanto, não obstante caber-lhes um prognostico serio, nem sempre estas complicações determinam a

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moite. Em vinte e seis casos d'esta natureza, Civiale obteve onze curas definitivas ; os restantes foram fataes, á excepção de dois, cujo resultado se ignora, porque os doentes deixaram o hospital, ainda em mão estado. A forma lenta da febre urinosa é, pela sua frequen. cia e gravidade, muito para receiar; a sua marcha in-sidiosa, de symptomas apenas perceptíveis, illude fre-quentemente p clinico que desconheça completamente a doença e a sua gravidade.

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TRATAMENTO

ÎJm dos primeiros cuidados do cirurgião, em frente d'um doente, em que tenha de proceder ao catheteris-mo, ou a qualquer operação sobre as vias urinarias, consiste, principalmente, em preparar o paciente, por qualquer meio, de modo a tornal-o menos apto ao des-envolvimento da manifestação mórbida que estuda-mos e que, não poucas vezes, complica sobremaneira a mais simples operação d'esta ordem.

Todavia, se apesar de tudo, a doença se manifesta, a intervenção do pratico torna-se absolutamente neces-sária. A febre urinosa é uma affecção terrível, por ve-zes tam grave, que a morte sobrevem rapidamente, sem dar .tempo á mais prompta intervenção. Felizmen-te, nem sempre isso succède e um tratamento apropria-do e opportuno consegue frequentemente impedir um resultado funesto.

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O tratamento da febre urinosa é pois preventivo e

curativo.

Tratamento preventivo — Desde que os

accès-sos urinoaccès-sos começaram a ser um pouco mais conheci-dos, quasi todos os cirurgiões recorreram ao sulfato de quinino, como ura agente de grande força, para evitar a affecção. Hoje, ainda a maior parte dos au-ctores aconselham o emprego d'esse antifebril, attribuin-do-lhe vantagens incontestáveis.

O aconito tem sido igualmente empregado, com o mesmo fim. M. James Long de Liverpool, tn'o em-pregado constantemente e declara que, raríssimas ve-zes, foi inefficaz a applicação d'esté medicamento.

Nos individuos muito inpressionaveis, a quem a simples ideia da necessidade de serem algaliados, os leva á maior excitação, o brometo de potássio tem in-dicações bem precisas. O mesmo diremos relativamen-te ás injecções de morphina e ópio, aos clysrelativamen-teres lau-danisados, aos suppositorios de belladona e chloral, nos casos em que, a extrema sensibilidade do canal e o ere-thismo local se opponhara ao livre manejo dos instru-mentos.

Os drs. Patrick Watson e Grainger Stewart, além da medicação acima apontada, aconselham a ministra-ção da digitalis, alguns dias antes de proceder á ope-ração.

Temos enumerado, até aqui, os différentes meios pharmacologicos a que recorreremos, com vantagem, afim de evitarmos os accidentes urinosos. Fallaremos agora das precauções, que temos a tomar antes da

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-operação, durante as manobras operatórias e depois de operado o doente.

As precauções a tomar antes da operação variam com a natureza d'ella. Se a operação for pedida por uma doença da bexiga e que, por conseguinte, tenha-mos de explorar este Órgão ou de operar sobre elle, é absolutamente indispensável o obrigarmos o doente ao repouso mais completo, por espaço d'alguns dias, sem o que não o operaremos. Quando, porém, a explo-ração tiver de ser limitada á urethra, será permitlido pratical-a desde logo, salvo nos casos em que tenha de ser minuciosa e prolongada.

Durante estes dias de repouso, habituaremos os ór-gãos ao contacto dos instrumentos, introduzindo veli-nhas de diâmetros progressivamente crescentes. Estas manobras serão praticadas com todo o vagar e com a maxima doçura e paciência.

Henry Thompson e o professor Chienne, baseando o tratamento na pathogenia que reconhecem para a doença, aconselham a immersão dos instrumentos em agua a ferver, depois do que, serão introduzidos em algodão em rama até esfriarem. O catheter ou outro qualquer instrumento, antes da sua introducção na urethra, será untado com um óleo phenicado, ou outro qualquer agente antiseptico. Fundados nas experiên-cias recentes do Dr. Koch, empregaram, ultimamente, como parasiticida, as soluções de sublimado corrusivo, declarando não terem observado a manifestação da doença, desde qne iniciaram estes meios de

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O professor Amnandale de Edimburgo, reconhecen-do, como causa frequente dos accidentes urinosos, o choque nervoso determinado pelo catheter frio, »recom-menda o aquecimento do instrumento, antes da sua in-troduccão.

Durante a operação, deveremos ter sempre em

vis-ta não fatigarmos o canal, com manobras violenvis-tas e prolongadas. Aqui observaremos os mesmos preceitos indicados para as manobras preparatórias. O vagar, paciência e doçura, no manejo dos instrumentos, são a mais segura garantia do bom resultado da operação. Sobre este ponto, exprime-se admiravelmente Guyon n'estas poucas linhas que se seguem : «La lenteur dans l'action est le plus sur moyen de recueillir les sensa-tions dirigeantes; la patience est l'agent le plus né-cessaire pour triompher des obstacles; la douceur est la seule force, qui permet de mener à bonne fin les entreprises toujours délicates de la partie de la chirur-gie que nous étudions (1).»

A duração das manobras operatórias será tão curta, quanto possível ; o que, de nenhum modo, é incompa-tível com o vagar, que acima aconselhamos.

Desde ha muito que se tem recorrido ao chlorofor-mio, como um agente importante, na prophylaxia da febre urinosa. Está particularmente indicado, segundo Guyon, nos calculosos em que as sessões de lithotri-cia muito prolongadas extenuam consideravelmente o doente.

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Ás injecções hypodermicas de chlorhydrato de mor-phina teem sido igualmente empregadas, nas operações ligeiras # de curta duração. Nas restantes, são de todo insuficientes.

A anasthesia é aqui duplamente indicada : 6 um meio prophylatico de que lançamos mão vantajosamen-te e um adjuvanvantajosamen-te importanvantajosamen-te, facilitando as manobras operatórias.

Depois da operação, todo o cuidado do clinico

con-sistirá em impedir, por todos os meios, o arrefecimento do doente. Aconselharemos todo o agasalho; o leito^se-rà aquecido por meio de botijas com agua quente;

ministraremos bebidas estimulantes, taes como: o chá addicionado com uma certa quantidade d'aguardente, etc., etc.

0 máximo repouso, durante alguns dias, completa o conjuncto de precauções a que, de modo algum, podere-mos fugir, sem grande responsabilidade.

Tratamento curativo — A cura espontânea dos

accessos benignos, frequentemente observada, tem leva-do alguns cirurgiões á abstenção completa no seu tra-tamento. Comtudo, apesar da sua pouca gravidade, algu-ma coisa deveremos praticar, com proveito do doente.

Attendendo a que estes accessos são definitivamente julgados por suores abundantes, todo o empenho do cirurgião consistirá em favorecer o desenvolvimento d'elles, ou mesmo provocal-os, desde o momento em que a diaphorese não corresponda á intensidade dos ou-tros estádios. Para isso, o agasalho, o repouso e as bebi-das quentes, emfim, todos os processos de que nos

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po-— 47 po-—

deremos servir para provocar os suores, serão empre-gados sempre com verdadeira vantagem.

A par d'isto, é indispensável o emprego do sulfa-to de quinino em doses fraccionadas. No fim do accesso, um purgante salino completará o tratamento, evitando a sua repetição, a não ser que nova causa o venha a determinar.

Para a maior parte dos accessos perniciosos, a the-rapeutica é quasi posta de parte, não só pela ineffica-cia do tratamento, como pela rapidez com que a morte sobrevem, sem dar logar a intervenção alguma.

Todavia, sempre que seja possível, nunca cruzare-mos os braços. O sulfato de quinino, em altas doses, deverá ter uma immediata applicacão.

Na forma continua-remittente e na forma chronica, o tratamento será sempre regulado pelo estado das vias digestivas.

Trataremos, primeiro que tudo, de levantar as for-ças do doente, por meio dos tónicos e d'um regimen apropriado. A dieta láctea, principalmente na forma chronica da affeccão, é um meio de que se tem tirado resultados surprehendentes.

No typo continuo-remittente, o sulfato de quinino é ainda um agente poderoso para debellar os accidentes. O mesmo não succède para a forma chronica, em que todos os cirurgiões são accordes em attribuir ao antife-bril uma inefíicacia absoluta.

A febre urinosa exige frequentemente a intervenção cirúrgica, no seu tratamento. Muitas vezes é este o único meio, com que curamos aquella doença. E' o

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que se dá, quando os accidentes reconhecem por causa ura obstáculo qualquer ao livre curso das urinas, como succède nos apertos d'urethra e nos tumores da pros-tata, em que a urethrotomia ou a introduccão d'uma sonda permanente, obviando aos effeitos d'esses obstá-culos, farão desapparecer os symptomas urinosos.

Nos demais casos, a febre 6 uma contra-indicação da intervenção cirúrgica, principalmente quando fo-rem observados symptomas reveladores d'um estado d'alteraçao profunda dos rins. N'estes casos, ou a inter-venção é absolutamente contra-indicada, ou o processo operatório tem de variar: a lithotricia será substituída pela talha, como succède frequentemente, nos casos de forma chronica da febre urinosa, em que é certo o es-tado de soffrimento dos rins. Os accessos francos, pela sua benignidade, nunca contra-indicarão uma opera-ção.

Temos fallado até aqui dos différentes meios de combater os accidentes febris urinosos ; resta-nos ago-ra estudar o tago-ratamento das suas complicações.

As perturbações digestivas, que são quasi certas nos différentes typos da doença, devem ser combatidas pe-la minis tração de pe-laxantes. Muitas vezes, também, os vo-mitivos são seguidos de resultados satisfatórios, acon-selhando Guyon, de preferencia, a ipecacuanha ao tarta-ro-emetico.

Os amargos são extramamente úteis: o Colombo, a genciana e sobretudo a quina devem ser os preferidos. A indicação dominante é principalmente submetter o doente a um regimen apropriado, reparador, sem

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-perturbar ao mesmo lempo as funcções digestivas já compromettidas. A dieta láctea prehenche todas essas condições. A carne crua (pós de carne), os caldos, o vi-nho do Porto, com o regimen lácteo, constituem os elementos d'um regimen sufflcientemente reparador e facilmente assimilável.

Cumpre-nos, porém, lembrar, que as retenções d'u-rina agudas, as hypertrophias congestivas da prostata, contra-indicam, d'um modo formal, o uso do vinho ou de qualquer bebida alcoólica. Algumas vezes é o esta-do mesmo das vias digestivas que não comporta a in-gestão d'esse importantíssimo alimento. Fora d'estas condições, não só deve ser permittido, como até pres-cripto o seu emprego.

A estomatite parasitaria, que não é raro observar-se, será prevenida ou combatida pelas preparações al-calinas. A agua de Vichy, em collutorios e gargarejos, convirá particularmente para estes usos. Na falta d'el-la, as soluções de borax e bicarbonato de soda, serão os meios que a poderão substituir.

A diarrhea, quando demasiado intensa, requer um tratamento adquado. Não é, todavia, uma contra-indica-ção ao emprego dos purgantes; é, pelo contrario, mais uma rasão para os empregarmos regularmente e amiu-dadas vezes.

Os vómitos merecem sempre uma intervenção par-ticular. O gelo applicado interna e externamente, as bebidas gazosas, a nox vomica e as preparações de morphina serão sufflcientes para os combater.

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co-— 50 co-—

meçaremos o seu tratamento pela applicação de cata-plasmes emollientes, frequentemente renovadas. As ven-tosas escarificadas e as emissões sanguíneas locaes al-liviam consideravelmente o doente e são sufficientes, algumas vezes, para impedir o progresso da phlegma-sia. Os purgantes e derivativos poderão, também, ser seguidos de bons effeitos.

Se, apesar de tudo isto, a phlegmasia não cede, a nossa intervenção será mais enérgica.

Nas phlegmasias musculares e nas do tecido cellular, estão perfeitamente indicadas as incisões profundas, mesmo antes de manifesta a íluctuação. D'esté modo, previne se a formação do abcesso, evitando ao doente a abundante suppuração, que o debilitaria considera-velmente.

As phlegmasias articulares são vantajosamente combatidas pela applicação de vesicatórios. Consegue-se, d'esté modo e não poucas vezes, a resolução da in-flammação. Desde o momento que o pus se forme, o único recurso que nos resta é a puncção. Nos casos extremos, principalmente quando a suppuração se esten-de, invadindo as outras articulações d'um membro, a amputação fica indicada, como a única tábua de sal-vação.

Resta-nos fallar do tratamento da nephrite, com-plicação das mais serias e das mais frequentes da fe-bre urinosa. Tanto como consequência d'esta, como preexistente á manifestação urinosa, o seu tratamento merece toda a attenção do pratico.

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-lômbar, acalma consideravelmente as dores ahi referi-das. As ventosas escarificadas serão adjuvantes de incontestável importância. A par disto, recorreremos á

dieta láctea, ao sulfato de quinino, emíim, aos différen-tes agendifféren-tes indicados no tratamento das nephridifféren-tes, so-bre os quaes não insistiremos, enviando o leitor aos

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