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Políticas Públicas para Desenvolvimento: análise de repasses financeiros da Usina de Irapé e de programas de transferência de renda no Alto Vale do Jequitinhonha-Minas Gerais

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Academic year: 2021

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Políticas Públicas para Desenvolvimento:

análise de repasses financeiros da Usina de Irapé e de programas de transferência de renda no Alto Vale do Jequitinhonha-Minas Gerais

Pedro de Carvalho Costa | Doutorando em Geografia | UFMG Flávia Maria Galizoni | Professora Doutora | UFMG

A implantação de hidrelétricas causa inúmeros impactos socioambientais no local de instalação, culminando no alagamento de vales e desapropriação de pessoas, em sua grande maioria, agricultores familiares camponeses que realizam a reprodução doméstica e agrícola da terra que habitam. Estes impactos são comumente justificados e legitimados pela sociedade pela contrapartida desenvolvimentista, composta por investimentos em infraestrutura, empregos, melhor qualidade de vida de forma geral para as populações atingidas direta e indiretamente. A UHE de Irapé foi implantada no Alto Vale do Jequitinhonha, nordeste de Minas Gerais, entre os municípios de Berilo e Grão Mogol, em setembro de 2006, inundando uma área de 140km² e desapropriando 1500 famílias. Este trabalho teve o objetivo de avaliar o significado da UHE de Irapé para os municípios atingidos através dos repasses financeiros procedentes da geradora energética após 11 anos de funcionamento e dimensioná-los em razão dos repasses financeiros de programas de transferência de renda que atuam no local. Os repasses de Compensação Financeira e ICMS provindo da UHE de Irapé não se demonstraram de grande relevância para a economia dos municípios frente aos valores transferidos de forma descentralizada para parcela da população local procedentes da Bolsa Família e Aposentadoria Rural. Tampouco o desenvolvimento projetado na UHE de Irapé se efetivou.

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Introdução

O modelo brasileiro de aproveitamento dos recursos hídricos para geração de energia elétrica culminou na desapropriação de centenas de milhares de pessoas e no alagamento de vastas terras férteis, a maior parte deles em territórios camponeses, significando o privilegiamento desta forma de geração de energia sobre alternativas disponíveis de apropriação do espaço (SIGAUD, 1992). A UHE de Irapé foi construída no alto curso do Rio Jequitinhonha entre ou municípios de Grão Mogol e Berilo, localizados na porção nordeste de Minas Gerais, e custou pouco menos de R$2 bilhões de reais. Finalizada em 2006, a UHE Irapé criou um lago de aproximadamente 140 km². As 1.200 famílias reassentadas pela empresa geradora, CEMIG, compunham complexa e rica diversidade camponesa, na qual se destacam modos específicos de produção de alimentos pelo trabalho familiar, de gestões comunitária de recursos da natureza e o íntimo contato de conhecimento com a terra onde vivem, que compõem complexas formas de dinâmicas e organizações sociais (RIBEIRO et al, 2005).

Comunidades camponesas tradicionais foram as mais comprometidas em todo processo da Usina e possuem características do trabalho familiar, da relação com a natureza fundamentada em um grande acervo de conhecimento e da gestão comunitária. Esta configuração, comumente interpretada como estigma de baixo dinamismo econômico foi um dos fundamentos para legitimar e destinar a região para grandes projetos de desenvolvimento modernizantes. A partir de 1970, e embalados até os dias atuais, estes tipos de programas criaram grandes expectativas de criação de empregos temporários, elevar a produtividade com intensificação da exploração de recursos naturais, busca por erradicar os indicadores de (RIBEIRO et al, 2007). A construção da barragem de Irapé segue a lógica desenvolvimentista conferida há mais de quatro décadas, cujos efeitos são temas polêmicos e complexos.

O objetivo deste trabalho foi analisar o legado do projeto desenvolvimentista projetado sobre a UHE de Irapé em forma de repasses financeiros para os municípios atingidos após onze anos de funcionamento frente aos repasses procedentes de projetos de transferência de renda para população elegível que habita o local.

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Métodos

A represa da UHE de Irapé alagou territórios de sete municípios localizados no alto curso do Rio Jequitinhonha: Grão Mogol, Cristália e Botumirim, Berilo, José Gonçalves de Minas, Leme do Prado, e Turmalina. O marco temporal do estudo foi compreendido entre setembro de 2006, início da operação da hidrelétrica, e agosto de 2016, completando-se 11 anos financeiros.

Foram utilizados dois dados de repasses financeiros pela UHE de Irapé: Compensação Financeira (CF); ICMS. A CF é um repasse mensal entre a UHE, União, Estado e municípios atingidos. Para a última esfera, o rateio segue a proporção da represa que cada município abriga. Foram levantados dados de todos os municípios atingidos, contudo, enfocou-se a análise para os municípios de Cristália e Berilo, por receberem a maior (27,5%) e a menor (5%) parte do rateio, respectivamente. Este repasse serve para compensar os municípios pelas externalidades provocadas pela instalação de uma usina hidrelétrica pagando pelo uso ambiental para desenvolvimento de uma atividade econômica (SILVA, 2007). Estes dados foram extraídos da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). Como forma de mensuração destes repasses para os municípios, realizou-se o levantamento do Fundo de Participação dos Municípios (FMP) para comparação no mesmo período. A arrecadação de ICMS se dá pela produção e distribuição de energia e é realizada apenas para o município de Grão Mogol, onde se localiza o complexo energético. Os valores repassados pela CEMIG para Grão Mogol pela UHE de Irapé são confidenciais passíveis de consulta, contudo o acesso não foi autorizado. Assim, estes dados foram extraídos do Relatório de Avaliação de Desempenho Ambiental (RADA) feito pela ÁGUA E TERRA/CEMIG em 2009 que analisa o comportamento desta arrecadação e de dados coletados junto à prefeitura de Grão Mogol. A escolha pelo uso destes dados quantitativos se baseia em fundamentos qualitativos, isso significa que se optou em dimensionar este legado a partir de repasses financeiros, cuja escolha foi pautada naquilo que observou como o legado vivo da UHE de Irapé.

A escolha pela Bolsa Família e Aposentadoria Rural está relacionada à identificação do perfil da população atingida direta ou indiretamente por Irapé, ou seja, remanejada do local habitado, ou afetada pelas transformações socioeconômicas,

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culturais e espaciais, e por serem em grande parte elegível a estes programas de transferência de renda.

Resultado e Discussão

O repasse de CF teve em seu primeiro ano financeiro (set/2006 a ago/2007) com o pagamento de R$2,5 milhões de reais pagos aos sete de municípios. No sexto ano de repasses foram pagos aproximadamente R$4 milhões de reais, o ápice de arrecadação dos municípios, e logo seguido de um ano cujos repasses chegaram à R$2,5 milhões, uma diferença de 37%. Confere-se para o último ano financeiro de análise o repasse de aproximadamente R$1,5 milhão de reais.

Cristália recebeu no primeiro ano financeiro aproximadamente R$ 3 milhões de reais por meio do FPM e pouco mais de R$700 mil reais pela CF. Esta última arrecadação representava significativos 25% da primeira, e esta razão se manteve acima da marca de 20% até o sexto ano financeiro. No último ano de análise, 2017, o município recebeu mais de R$7 milhões de reais pelo FPM, e aproximadamente R$430 mil reais pela CF, razão estava em quase 6%.

Para Berilo a maior razão entre CF e FPM foi de 3,5% no primeiro ano financeiro de funcionamento da usina, e nos anos consecutivos se manteve acima de 2,5%, até o sexto ano financeiro, quando declinou para menos de 1% no último período de análise. Se no primeiro ano Berilo recebeu R$131.633 reais pela CF e quase R$4 milhões pelo FPM, no último ano financeiro recebeu R$78.579 reais pela primeira e R$9,8 milhões pelo Fundo.

O ICMS arrecadado por Grão Mogol, desde os últimos três anos, foi de R$12 milhões de reais ao ano, equiparando assim ao FPM para o último exercício financeiro. Segundo a prefeitura, este repasse significa bastante para Grão Mogol, que consegue realizar investimentos em educação e saúde, além de proporcionar infraestrutura para a cidade, principalmente pela contrapartida em empréstimos. Em análise aos programas de transferência de renda, tomando o ano de 2007 como referência inicial, observa-se que os valores repassados pelo Programa Bolsa Família passaram a marca de R$6 milhões de reais, o dobro do repasse pela CF no mesmo período. Se a evolução da CF nos anos seguintes segue o comportamento analisado anteriormente – apresentando variação e nos últimos dois anos uma

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diminuição anual – o repasse pelo Programa Bolsa Família apresenta grande crescimento até de 2014, ano que foram repassados R$16 milhões de reais, e o crescimento diminuiu. Se em 2007 a CF equivalia a 50% ao repasse pelo Bolsa Família, entre 2012 e 2013, este percentual estava abaixo de 30% e em 2017 a razão entre os dois não passava 10%.

No ano de 2006, os sete municípios atingidos continham mais de 4.700 beneficiários de aposentadorias, que recebiam o total de quase R$21 milhões de reais, em que 89,35% do número de beneficiários são da clientela rural, e recebem 84,89% dos repasses. Em 2010, os municípios apresentaram 5.631 beneficiários, os quais receberam R$ 35 milhões de reais, em que a clientela rural representava 87,44% e 83,87%, respectivamente. E, até novembro de 2017, tinham 7.866 de benefícios, sendo 6.455 da clientela rural, ou seja, 82% do total. Os valores transferidos pela aposentadoria rural foram de R$67 milhões de reais, 77% do total.

Conclusões

Os legados alavancados pela UHE de Irapé são relativos, escassos e insignificantes frente ao tamanho custo e impactos de sua implantação. Além de serem proporcionalmente inferiores às transferências de Bolsa Família e Aposentadoria Rural, os repasses provindos da UHE se concentram na administração-pública e não possuem transparência de seu investimento. A entrada de recursos nos municípios atingidos através da população elegível aos programas de transferência de renda se demonstrou maior do que pela funcionamento da UHE de Irapé no local.

Referências Bibliográficas

ÁGUA E TERRA PLANEJAMENTO AMBIENTAL/CEMIG. Relatório de Análise de Desempenho Ambiental. Belo Horizonte: SUPRAM, 2009.

RIBEIRO, E. M., ARAUJO, D. P., GALIZONI, F. M., FREITAS, C. S., & AYRES, E. B. Uma estimativa preliminar das receitas monetárias e não-monetárias de agricultores familiares do vale do Jequitinhonha. Desenvolvimento territorial, segurança alimentar e economia solidária. São Paulo: Alínea, p. 229-251, 2007.

SIGAUD, L. O efeito das tecnologias sobre as comunidades rurais: o caso das grandes barragens. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 7, n. 18, p. 18-28, 1992.

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