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Processo 08B877 Data do documento 10 de abril de 2008 Relator Salvador Da Costa

SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA | CÍVEL

Acórdão

DESCRITORES

União de facto > Usucapião > Compropriedade > Quota ideal > Registo

predial > Casamento > Comunhão de adquiridos > Simulação > Prova testemunhal

SUMÁRIO

1. Não está vedada a prova testemunhal sobre a situação em que a aquisição do prédio por compra foi feita por uma pessoa que vivia em união de facto e que sempre considerou que tal prédio também pertencia à outra pessoa que com ela vivia naquela situação, e como tal se comportou, além do mais, por não se tratar de acordo simulatório.

2. Tendo essas pessoas, quando viviam naquela situação, adquirido aquele prédio por usucapião, devem considerar-se quantitativamente iguais as respectivas quotas no concernente direito de propriedade e ilidida a presunção derivada do registo predial de que o prédio pertencia à adquirente.

3. Contraído posteriormente casamento entre elas no regime de comunhão de bens adquiridos, manteve-se a situação de compropriedade mencionada sob 2 em quadro de bens próprios.

TEXTO INTEGRAL

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

I

AA intentou, no dia 6 de Fevereiro de 2003, contra BB, acção declarativa de apreciação, com processo ordinário, pedindo a declaração de serem comproprietários do prédio misto sito na Quinta de ..., freguesia e concelho de Murça, na proporção de metade, e a determinação do cancelamento do registo predial, sob o fundamento de ter sido comprado com dinheiro de ambos, em igual proporção, de o terem passado a

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usufruir e o haverem adquirido por usucapião.

A ré, na contestação, afirmou que o prédio foi comprado e a casa nele implantada foi construída com dinheiro exclusivamente seu.

Elaborada a especificação e a base instrutória e realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 5 de Julho de 2006, por via da qual a acção foi julgada procedente.

Apelou a ré, e a Relação, por acórdão proferido no dia 15 de Outubro de 2007, negou-lhe provimento ao recurso.

Interpôs a apelante recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - a sentença está incompleta e é inexequível, devendo o tribunal pronunciar-se sobre a percentagem de cada uma das quotas, uma vez que o recorrido pediu a declaração de ser comproprietário na proporção de metade;

- a falta de pronúncia nesta matéria gera a nulidade da sentença, nos termos do artigo 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil;

- provado que a recorrente participou na compra com mais dinheiro do que o recorrido e que não reconhecem ser proprietários em partes iguais, a decisão está em oposição com os fundamentos ou não especifica os fundamentos de facto em que se apoia, o que implica a sua nulidade, nos termos do artigo 668º, nº 1, alíneas b) e c), do Código de Processo Civil;

- a entender-se ser a compropriedade em partes iguais, tal entendimento estaria em colisão com o facto de a recorrente comparticipar com mais dinheiro e de ambos não reconhecerem a compropriedade em partes iguais, o que implicaria a nulidade da sentença, nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 668º do Código de Processo Civil;

- tal entendimento contrariaria também o artigo 1403º, nº 2, do Código Civil por estar provado ser a comparticipação em dinheiro da recorrente maior do que a do recorrido e de ambos não reconhecerem a compropriedade em partes iguais, o que tornaria a sentença nula, nos termos do artigo 668º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil;

- o conluio dado como provado no sentido de a recorrente outorgar na escritura sob acordo de os prédios serem de ambos, porque não há documento que o comprove, só pode ter sido dado como provado por efeito da prova testemunhal;

- como a prova testemunhal é inadmissível, face ao disposto nos artigos 393º e 394º do Código Civil, ocorre outra nulidade, que torna não provado o dito acordo, e, consequentemente, a compropriedade;

- deve a sentença ser revogada, e a recorrente absolvida do pedido, ou declarada a nulidade da sentença, e ordenar-se a repetição do julgamento.

Respondeu o recorrido, em síntese de alegação:

- está em causa saber se a propriedade foi adquirida por ambas as partes com recursos de ambas, para ambas, e se sempre foi possuída por ambas como coisa deles;

- a sorte da acção não depende do relacionamento entre o recorrido e outrem;

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maior dispêndio físico;

- o recorrido e a recorrente exerceram conjuntamente a posse como comproprietários do prédio, pelo que são comproprietários dele em partes iguais, nos termos da presunção decorrente do artigo 1403º, nº 2, do Código Civil.

II

É a seguinte a factualidade considerada assente no acórdão recorrido:

1. O autor, casado com CC sob o regime da comunhão geral de bens, com três filhas, e a ré, conheceram-se em Moçambique, em 1968, e, por volta do ano de 1970, passaram a viver juntos como conheceram-se fosconheceram-sem marido e mulher.

2. Face à revolução de 25 de Abril de 1974 e à sua repercussão em Moçambique, o autor e ré abandonaram aquele País e fixaram a sua residência na vila de Murça, na casa dos pais dela, sendo que, no dia 2 de Março de 1975, naquela Vila, nasceu um filho de ambos, de nome DD.

3. Quando autor e ré vieram de Moçambique para Murça, as suas condições económicas eram precárias, e ele emigrou então, primeiro para a Alemanha, depois para França, países onde permaneceu escassos meses, apenas conseguindo empregos temporários.

4. Em Maio de 1975, emigrou o autor para a Suíça, começando a trabalhar na cadeia de hotéis Fassbind Hotels, em Lausanne, e, em finais desse mês, a ré juntou-se-1he, deixando o filho de ambos aos cuidados dos avós maternos, e, em Novembro de 1979, deixou aquele emprego, passando a trabalhar na Clínica de Montchoisi, AS, em Lausanne, auferindo a remuneração mensal de 1 600 francos suíços, ali trabalhando até ao final de Maio de 1987, data em que regressou definitivamente a Portugal.

5. Enquanto emigrantes na Suíça e durante a maior parte do tempo em que ambos aí residiram e trabalharam, a ré auferia rendimentos mensais provenientes do trabalho superiores aos do autor.

6. Desde 1970 até 20 de Abril de 1987, o autor e ré sempre contribuíram para todas as despesas de alojamento, alimentação, vestuário e sustento do filho de ambos, e, entre 1970 e aquela data, residiram em Moçambique, Murça, Suíça e, novamente, em Murça.

7. Em Janeiro de 1978, autor e ré decidiram comprar os prédios rústicos abaixo indicados e, no dia 17 de Janeiro de 1978, em escrituras públicas outorgadas no Cartório Notarial de Murça:

- VS e BF, por um lado, e BB, por outro, declararam os primeiros vender e a última comprar, por 50 000$, o prédio rústico constituído por monte, sito no lugar do Atalho, freguesia e concelho de Murça, confrontante de nascente com estrada nacional, norte poente com IM e sul com A..., inscrito na matriz predial rústica sob o art. 273.

- IM, por um lado, e BB declararam, aquele vender e esta comprar, por 350 000$, o prédio rústico composto por terra centeia e olival, sito no mesmo lugar do Atalho, freguesia e concelho de Murça, confrontante de nascente com estrada nacional, norte com Carlos José de Sousa, poente e sul com A..., inscrito ma matriz predial rústica sob o artigo 272.

8. Tal compra foi deita com dinheiro de autor e ré, que haviam conseguido juntar à custa do trabalho de ambos, tendo a comparticipação em dinheiro da ré sido superior à do autor, em consequência de auferir um rendimento mensal também superior, com o reconhecimento de que ambos eram comproprietários de

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tais prédios.

9. Em virtude das avaliações fiscais levadas a cabo no concelho de Murça em 1985, foram tais artigos eliminados e em seu lugar foi-lhes atribuído um só artigo - 963 - já que aqueles dois prédios eram juntos e passaram a formar um só prédio por anexação feita aquando da referida avaliação fiscal.

10. Posteriormente à compra, autor e ré decidiram construir uma casa de habitação para aí viverem como marido e mulher e com o filho de ambos, sendo que tal casa foi construída a expensas de autor e da ré, à custa dos rendimentos do respectivo trabalho.

11. Foram o autor e a ré que trataram do projecto de arquitectura, que contrataram o empreiteiro e que escolheram e pagaram os materiais de construção, tendo sido o autor quem mais de perto acompanhou a construção da casa.

12. Desde a aquisição dos prédios, sempre os mesmos, ao longo de 15, 20 e mais anos, foram fruídos por autor e ré em comum, com o conhecimento de toda a gente, sem oposição de ninguém, de forma ininterrupta, na convicção, por ambos, de os prédios lhes pertencerem.

13. Durante esse tempo, autor e ré cortaram o mato, amanharam a terra, surribaram, plantaram vinha, oliveiras, amendoeiras, macieiras, laranjeiras e outras árvores, colhendo os seus frutos.

14. Nesse prédio rústico, já com o artigo matricial nº 963, eles nele construíram a casa de habitação, habitando-a com carácter de permanência, conservando-a, promovendo pequenas obras, ocupando-a com pertences do casal, pagando as respectivas contribuições e impostos, a qual foi inscrita na matriz urbana da freguesia de Murça sob o artigo 1321.

15. Tais prédios encontram-se actualmente descritos na Conservatória do Registo Predial de Murça como prédio "misto, sito na Quinta de São Sebastião, freguesia e concelho de Murça, composto de casa de habitação de rés-do-chão e primeiro andar com a superfície coberta de 113 metros, amendoeiras, oliveiras, terreno sequeiro e vinha, com a área de 18 187 metros quadrados, a confrontar de norte e nascente com A..., sul com C... e poente com estrada nacional 15, inscrito na matriz rústica sob o artigo 963 e urbana sob o artigo 1321", descrito na Conservatória do Registo Predial na ficha 00790.

16. A ligação entre o autor e ré perdurou nas circunstâncias supra descritas até 9 de Março de 1995, data em que casaram um com o outro.

17. A aquisição daquele prédio encontra-se inscrita a favor da ré, com data de 5 de Julho de 1999, mas ela sempre considerou tais bens como sendo de ambos, nunca se opondo a que o autor neles trabalhasse e colhesse os respectivos frutos em nome de ambos para fazer face às despesas do agregado familiar. 18. O divórcio do autor e da ré foi decretado por sentença de 16 de Maio de 2002, no processo que correu termos no Tribunal Judicial de Murça sob o n° 33/2000, confirmada por acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 9 de Dezembro de.2002.

III

A questão essencial decidenda é a de saber se o recorrido deve ou não ser declarado comproprietário na proporção de metade.em relação ao prédio ajuizado.

Tendo em conta o conteúdo do acórdão recorrido e das conclusões de alegação da recorrente e do recorrido, a resposta à referida questão essencial pressupõe a análise da seguinte problemática:

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- está ou não o acórdão recorrido afectado de nulidade?

- deve ou não este Tribunal alterar a decisão da matéria de facto proferida pela Relação?

- existe ou não acordo entre a recorrente e o recorrido que deva irrelevar por ter sido provado por testemunhas contra o disposto na lei?

- suportam ou não os factos provados a solução de direito considerada no acórdão recorrido?

Vejamos, de per se, cada uma das referidas subquestões.

1.

Comecemos pela análise da questão de saber se o acórdão recorrido está ou não afectado de nulidade. A recorrente alegou a nulidade do acórdão da Relação por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito justificativos da decisão, por os fundamentos estarem em oposição com a decisão, e por omissão de pronúncia sobre questões que devia apreciar.

Fundamenta a arguição na omissão de pronúncia na incompletude e inexequibilidade da sentença, por virtude de o tribunal se não ter pronunciado sobre a percentagem de cada uma das quotas.

Motiva a falta de fundamentação e a contradição entre os fundamentos e a decisão na circunstância de o tribunal haver considerado a igualdade de quotas na compropriedade não obstante ser maior a sua participação monetária na compra e no não reconhecimento das partes daquela igualdade de quota. Refere-se à sentença, naturalmente por erro de expressão, pretendendo porventura referir-se ao acórdão, porque este Tribunal só dele pode conhecer no recurso, e não da sentença proferida no tribunal da primeira instância.

Expressa a lei ser o acórdão da Relação nulo quando careça de fundamentação de facto e ou de direito ou deixe de se pronunciar sobre questões de que devia conhecer (artigos 668º, nº 1, alínea b) 716º, nº 1, do Código de Processo Civil).

A Constituição e a lei ordinária estabelecem que as decisões judiciais que não sejam de mero expediente devem ser fundamentadas (artigos 205º, nº 1, da Constituição e 158º, nº 1, do Código de Processo Civil). O acórdão deve representar a vontade abstracta da lei ao caso particular submetido à Relação, pelo que, sem fundamentação de facto e ou de direito não se consegue esse escopo nem se permite às partes por ele afectadas o conhecimento do seu acerto ou desacerto, designadamente para efeito de interposição de recurso.

Mas uma coisa é a falta absoluta de fundamentação e outra a fundamentação insuficiente, errada ou medíocre, e só a primeira constitui o fundamento de nulidade a que se reporta a alínea b) do nº 1 do artigo 668º do Código de Processo Civil.

O vício de nulidade a que se reporta a alínea c) do nº 1 do artigo 668º e o n.º 1 do artigo 716º do Código de Processo Civil é o que ocorre quanto os fundamentos de facto e de direito invocados conduzirem logicamente ao resultado oposto àquele que integra o respectivo segmento decisório.

Isso significa que os fundamentos de facto e de direito do acórdão devem ser logicamente harmónicos com a pertinente conclusão ou decisão, como corolário do princípio de que o acórdão deve ser fundamentado de facto e de direito, e que tal se não verifica quando haja contradição entre esses fundamentos e a

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decisão nos quais assenta.

Mas uma coisa é a contradição lógica entre os fundamentos e a decisão da sentença ou do acórdão, e outra, essencialmente diversa, o erro de interpretação dos factos ou do direito ou a aplicação deste, que não raro se confunde com aquela contradição.

Expressa a lei que o tribunal deve, por um lado, resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (artigos 660º, n.º 2, 1ª parte e 713º, n.º 2, do Código de Processo Civil).

As questões a que se refere o referido normativo não se consubstanciam em argumentos ou razões de facto e ou de direito, dado o tribunal ser livre na interpretação e aplicação aos factos das normas jurídicas (artigo 664º do Código de Processo Civil).

Com efeito, elas centram-se nos pontos fáctico-jurídicos que estruturam as posições das partes na causa, designadamente os que se prendem com a causa de pedir, o pedido e as excepções.

No caso de o acórdão da Relação estar afectado por nulidade decorrente da contradição entre os fundamentos e a decisão, este Tribunal deve supri-la; nos outros casos invocados pela recorrente, verificados que sejam, deve o processo ser remetido à Relação para operar o respectivo suprimento (artigo 731º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

Nas conclusões do recurso de apelação, impugnando a decisão da matéria de facto, a apelante apenas requereu a ampliação da base instrutória e a alteração da decisão da matéria de facto relativamente aos pontos quinto a decimo-sétimo daquela peça processual.

Resulta do acórdão recorrido que a Relação conheceu das referidas questões, que julgou improcedentes, com ampla motivação, em quadro de lógica conformação entre o decidido e a respectiva motivação. No que concerne à questão de direito, a Relação expressou que a procedência da apelação implicava a prévia modificação dessa decisão no sentido pretendido pela apelante, e que, tendo improcedido essa questão, a decisão de direito devia manter-se, porque, como na sentença, entendia verificados os requisitos da aquisição pelo apelado, em compropriedade com a apelante, dos prédios identificados, e que remetia para a sentença quanto nos fundamentos de direito nela explanados.

Perante este quadro, a conclusão é no sentido de que, ao invés do que a recorrente alegou, não está o acórdão recorrido afectado de nulidade por falta de fundamentação, contradição entre os fundamentos e a decisão ou omissão de pronúncia.

2.

Prossigamos com a análise da subquestão de saber se este Tribunal deve ou não alterar a decisão da matéria de facto proferida pela Relação.

Alegou a recorrente ter a Relação feito deficiente análise crítica das provas, designadamente ao considerar provado ter ela e o recorrido haverem concorrido com dinheiro para a compra dos prédios ou que tenham decidido construir a casa.

Pretende que se considere não provado que ela e o recorrido decidiram construir a casa de habitação e que a mesma foi erigida com dinheiro de ambos, que ele tratou do projecto, contratou o empreiteiro, escolheu e pagou os materiais de construção e acompanhou a mesma em nome próprio.

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Salvo em casos excepcionais legalmente previstos, o Supremo Tribunal de Justiça apenas conhece de matéria de direito (artigo 26º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro -LOFTJ).

Nessa conformidade, como tribunal de revista, a regra é a de que o Supremo Tribunal de Justiça aplica definitivamente aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido o regime jurídico que julgue adequado (artigo 729º, n.º 1, do Código de Processo Civil).

Excepcionalmente, pode sindicar o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa cometido pela Relação se houver ofensa de disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou fixe a força probatória de determinado meio de prova (artigos 722º, n.º 2 e 729º, n.º 2, do Código Civil).

Assim, só pode conhecer do juízo de prova sobre a matéria de facto formado pela Relação quando esta deu como provado um facto sem produção da prova por força da lei indispensável para demonstrar a sua existência, ou quando ocorrer desrespeito das normas reguladoras da força probatória dos meios de prova admitidos no nosso ordenamento jurídico de origem interna ou externa.

Em consequência, o erro na apreciação das provas e a consequente fixação dos factos materiais da causa, isto é, a decisão da matéria de facto baseada em meios de prova livremente apreciáveis pelo julgador excede o âmbito do recurso de revista.

Os mencionados factos, cujo juízo de prova a recorrente põe em causa, resultaram de meios de prova de livre apreciação pelas instâncias, a que se reporta o artigo 655º, nº 1, do Código de Processo Civil.

Por conseguinte, sem prejuízo do que a seguir se vai referir a propósito da proibição da prova testemunhal, não pode este Tribunal sindicar e, consequentemente, não pode alterar a decisão da matéria de facto proferida pela Relação.

3.

Continuemos com a análise da subquestão de saber se existe ou não acordo entre a recorrente e o recorrido que deva irrelevar por ter sido provado por testemunhas contra o disposto na lei.

O recorrente alegou ser a prova testemunhal do acordo dela e do recorrido inadmissível, face ao disposto nos artigos 393º e 394º do Código Civil, e, consequentemente, ocorrer nulidade, com a consequência de dever ser considerado não provado, tal como a compropriedade.

Considerou o facto de ambos se haverem conluiado para os prédios ficarem em nome dela com o reconhecimento de que eram de ambos, que na realidade não está provado.

A prova por testemunhas é admitida em todos os casos em que não seja directa ou indirectamente afastada (artigo 392º do Código Civil).

Se a declaração negocial, por disposição da lei ou estipulação das partes, houver de ser reduzida a escrito ou necessitar de ser provada por escrito, não é admitida a prova testemunhal (artigos 393º, nº 1, do Código Civil).

Também não é admitida a prova por testemunhas quando o facto estiver plenamente provado por documento ou por outro meio com força probatória plena (artigo 393º, nº 2, do Código Civil).

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do documento (artigo 393º, nº 3, do Código Civil).

É ainda inadmissível a prova por testemunhas se tiver por objecto convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo dos documentos particulares mencionados nos artigos 373º a 379º do Código Civil, sejam ou não anteriores ou contemporâneas à sua formação (artigo 394º, nº 1, do Código Civil).

Acresce que tal inadmissibilidade está prevista em relação ao acordo simulatório e ao negócio dissimulado, quando invocado pelos simuladores (artigo 394º, nº 2, do Código Civil)

Nessas situações também não são admissíveis presunções judiciais (artigo 351º do Código Civil).

Do elenco dos factos provados, com alguma conexão com o que a recorrente alegou, apenas consta que a aquisição prédio ajuizado se encontra inscrita a seu favor desde 5 de Julho de 1999 e que ela sempre considerou ser de ambos e que nunca se opôs a que o recorrido nele trabalhasse e colhesse os respectivos frutos em nome de ambos para fazer face às despesas do agregado familiar.

Tais factos não significam qualquer contrato ou acordo em relação aos quais não seja admissível a prova testemunhal.

Em consequência, é destituída de fundamento legal a alegação da violação pelas instâncias do disposto nos artigos 393º ou 394º do Código Civil.

4.

Atentemos agora na problemática de saber se os factos provados comportam ou não a solução de direito considerada no acórdão recorrido.

O tribunal da primeira instância e a Relação motivaram a decisão do litígio no facto de a recorrente e o recorrido, vivendo em união de facto, como se marido e mulher fossem, haverem adquirido de comum acordo, com o dinheiro de ambos, os prédios ajuizados e neles haverem edificado a sua casa de habitação, em conjunto e a expensas de ambos, na convicção de serem seus donos, continuada e ininterruptamente, até ao presente, por mais de trinta anos.

A partir desse quadro de facto, as instâncias consideraram, por um lado, que a recorrente e o recorrido adquiriram em conjunto o prédio em causa por usucapião, por via da soma das posses deles e dos anteriores possuidores.

E, por outro, que, por virtude da extinção do casamento que se seguiu à mencionada união de facto, cada um era titular do direito de propriedade sobre o mencionado prédio na proporção de metade.

Independentemente da contribuição monetária da recorrente e do recorrido para a compra dos prédios e a construção da casa de habitação, os factos provados revelam uma situação de posse formal conjunta deles sobre aquelas coisas, envolvida de domínio de facto e de intenção de se comportarem como comproprietários, não titulada, publica e pacifica e de boa fé, por tempo suficiente para a aquisição do referido direito de propriedade por usucapião (artigos 1251º, 1256º, nº 1, 1258º 1259º, nº 1, 1260º a 1262º, 1263º, alínea a), 1267º, nº 2, 1287º, 1288º, 1291º, 1296º e 1316º e 1316º do Código Civil).

Eles adquiriram em comum o referido direito de propriedade sobre o mencionado prédio, ou seja, em compropriedade, presumindo-se quantitativamente iguais, por não resultar o contrário do título constitutivo – a usucapião – as respectivas quotas (artigo 1403º do Código Civil).

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casamento, sem convenção antenupcial celebrado pela recorrente e pelo recorrido, dissolvido cerca de sete anos depois de ter sido celebrado (artigos 1717º e 1722º, nº 1, alínea a), do Código Civil).

Está, por isso, ilidida a presunção de propriedade a que se reporta o artigo 7º do Código do Registo Predial (artigo 350º, nº 2, do Código Civil).

5.

Finalmente a síntese da solução para o caso-espécie decorrente dos factos provados e da lei.

O acórdão recorrido não está afectado de nulidade, seja por falta de fundamentação, seja por contradição entre ela e a decisão, seja por omissão de pronúncia.

Por falta de competência funcional para o efeito, não pode este Tribunal alterar a decisão da matéria de facto proferida pela Relação, porque baseada em prova de livre apreciação.

A prova testemunhal admitida a qualquer dos factos sobre que incidiu não infringiu qualquer normativo de direito probatório material.

Os factos provados suportam legalmente a solução de direito considerada no acórdão recorrido no sentido de o recorrente ser comproprietário do prédio ajuizado na proporção de metade e de ter ficado ilidida a presunção de titularidade do direito decorrente da lei do registo predial.

Improcede, por isso, o recurso.

Vencida, é a recorrente responsável pelo pagamento das custas respectivas (artigo 446º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

IV

Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso e condena-se a recorrente no pagamento das custas respectivas.

Lisboa, 10 de Abril de 2008.

Salvador da Costa (relator) Ferreira de Sousa

Armindo Luis

Referências

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