• Nenhum resultado encontrado

O Logo e a Educação Matemática

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2019

Share "O Logo e a Educação Matemática"

Copied!
7
0
0

Texto

(1)

ISCTEM, Maputo, 1,2 e 3 Março 2007

O Logo e a Educação Matemática

P. Carvalho*,1,A. Osório˜1,S. Alves›1,I. Miranda•1

1Instituto de Estudos da Criança - Universidade do Minho, Braga, Portugal

“Uma linguagem de programação para crianças”. Será o Logo apenas isso? Porque será ainda hoje a visão de Papert objecto de alguma polémica no mundo da educação? Será a filosofia Construcionista totalmente desprezável na educação matemática, ou as mudanças na cultura do conhecimento que o seu autor reclama são demasiado desafiadoras para que possam ser aceites? A tendência para ver o Logo como “apenas mais um recurso tecnológico na sala de aula” pode significar que ainda resistimos a olhar para o seu grande potencial de mudança, enquanto filosofia de ensino.

Com o intuito de suscitar alguma reflexão sobre a educação matemática, pretendemos partilhar algumas constatações e inquietações que encontrámos ao implementar o Logo e ao reflectir sobre os seus princí-pios.

Para tal, começamos por tentar resumir os traços essenciais da filosofia Construcionista, ou filosofia Logo, suscitando alguma reflexão e algum contraste com a escola tradicional. Em seguida, para ilustrar contextos da sua aplicação, apresentamos dois estudos em curso e um terceiro já finalizado.

Palavras-chave: Logo, Educação, Construcionismo

1. O Logo

Um bom ponto de partida para começarmos a tentar compreender o Logo será constatarmos que a apren-dizagem das crianças tem maior sucesso e eficácia quando elas aprendem de forma informal inúmeras habilidades como aquelas que têm já adquiridas quando entram para a escola. Papert (1988) chama a este processo “aprendizagem natural” ou “aprendizagem piagetiana”, dado que ele se apoia numa dinâmica em que as intuições são testadas e melhoradas sucessivamente num processo cíclico, tal como descreveu Piaget.

Segundo Papert (1988), é no momento da entrada para educação formal que o sucesso deste tipo de aprendizagem sofre um forte revés: as crianças são pressionadas a abandonar as suas intuições e a aceitar teorias científicas “já prontas”.

Papert valoriza de tal forma a aprendizagem natural que vem desde há décadas desenvolvendo esforços no sentido de contribuir para que ela se alargue à escolaridade. Olhando esse percurso desde a década de 60 no MIT (Massachusetts Institute of Technology) assistimos à criação da linguagem de programação Logo. Nessa época, Seymour Papert, um matemático que já tinha colaborado com Piaget em Genebra (Suiça), veio para os Estados Unidos onde, juntamente com Marvin Minsky, fundou o Laboratório de Inteligência Artificial do MIT. Alí, juntamente com os seus colaboradores, Papert criou a primeira versão do Logo em 1967.

Nos anos 70, o Logo já era usado, principalmente, no MIT e em alguns centros de pesquisa, que desen-volviam trabalhos junto às escolas elementares locais.

O Logo não atraiu apenas grande interesse, como foi também alvo de polémicas que ainda hoje são per-ceptíveis (Mayer, 2004). Vejamos alguns aspectos do Logo que deram origem a discussões e também a resistências.

* e-mail: paulojfrcarvalho@net.sapo.pt

(2)

ISCTEM, Maputo, 1,2 e 3 Março 2007

Em primeiro lugar, Papert (1988) coloca o professor no lugar de coaprendiz; ou seja: considera funda-mental que o professor se disponha a aprender em tempo real, lado a lado com os seus alunos, em vez de se limitar a trazer para escola aprendizagens já prontas.

Será totalmente descabida esta posição? Vejamos como concebe Resnick, citada por Schoenfeld (1992) o processo de aprendizagem e reflictamos sobre o papel do professor de acordo com esta concepção: tor-nar-se um bom pensador em qualquer domínio será mais uma questão de adquirir hábitos e disposições de interpretação e sentido prático do que adquirir um conjunto específico de conhecimentos. Segundo esta autora, a aprendizagem é um processo que se configura social e culturalmente: os valores da comu-nidade envolvente são interiorizados, determinando em larga medida, um quadro referencial próprio dos indivíduos dessa mesma comunidade, conferindo aos sujeitos uma forma particular de ver o mundo. Então, de acordo com esta perspectiva, também os ambientes educativos que privilegiam a predisposição para aprender serão importantes no desenvolvimento de atitudes face à aprendizagem.

Se a predisposição para aprender também se aprende e se isso acontece segundo um processo de sociali-zação/aculturação, em que sentido se exercerá a influência de um professor que “já sabe tudo” e que não se predispõe a aprender aos olhos dos seus alunos?

Em segundo lugar Papert, defende um ensino orientado por princípios matéticos1, necessida-des/interesses locais e pessoais em vez de um ensino orientado por currículos nacionais na sua concepção mais fechada2. Papert repudia o ensino programado, onde se ensinam e avaliam matérias e procedimen-tos de forma discreta segundo métodos e sequências que se supõe serem as melhores, sem que as crian-ças possam tomar decisões sobre o que aprender e como aprender.

Para além destes apelos já de si dissonantes da cultura escolar tradicional, Papert aponta ainda dois caminhos não menos incómodos: O recurso intensivo à tecnologia no quotidiano escolar e a obrigatorie-dade de realização de “obra” como produto do trabalho matemático. Para compreendermos melhor o que isto significa vejamos quais são para aquele autor os princípios a que a matemática escolar deve obedecer para que seja susceptível de as crianças a aprenderem:

• Continuidade: a matemática deve ter uma relação de continuidade com o conhecimento e experiência individual de cada um, permitindo com ela o estabelecimento de um sentimento de afeição;

• Poder: a matemática deve dar poder ao aluno para desenvolver projectos que correspondam às suas necessidades e aos seus interesses e que não poderiam ser conseguidos sem ela. É este aspecto que confere o carácter Construcionista ao Logo;

• Ressonância cultural: os conteúdos matemáticos devem fazer sentido num contexto social mais amplo. Ou seja: para que a matemática seja apropriável não pode ser apresentada às crianças como sendo apenas importante para elas. Elas precisam de constatar que os pais, os professores e a comu-nidade em geral se interessam e utilizam a matemática que lhes é proposta.

As mudanças nas práticas que Papert suscita são de tal modo drásticas que por si só poderiam justificar as resistências encontradas, mas o seu apelo estende-se também ao nível cultural. Por exemplo, Papert rejeita a ideia de que “é preciso aprender matemática para praticar matemática” e prefere uma outra: “é fazendo matemática que se aprende matemática”. A expressão de Hersh citada por Thompson (1992) pode ilustrar a visão que os alunos de facto terão da matemática que lhes é oferecida: “First comes the score, but the music never follows” (p. 128).

Outro aspecto de relevo a salientar na cultura Logo é a defesa de um mundo de conhecimento sem as tradicionais barreiras entre as disciplinas. Tal como refere Papert (1988),

Malabarismo e escrever um ensaio parecem ter pouco em comum se olharmos o produ-to. Mas o processo de aprender essas duas habilidades tem muito em comum. Ao criar um ambiente intelectual cuja ênfase está no processo, nós damos às pessoas com habili-dades e interesses diferentes algo com que elas possam conversar entre si. Ao desenvol-ver linguagens expressivas para falar sobre o processo e ao reformular velhos

conheci-1Princípios bons para aprender.

(3)

ISCTEM, Maputo, 1,2 e 3 Março 2007

mentos em termos dessas mesmas linguagens podemos ter a esperança de tornar trans-parentes as barreiras que separam as disciplinas. (p. 218-219)

Cremos que o verdadeiro valor do Logo raramente é apreciado, limitando-se muitos autores em sublinhar as aquisições sob o ponto de vista cognitivo que as crianças conseguem quando trabalham com a lingua-gem Logo, como se este fosse apenas mais um recurso tecnológico, desprezando a filosofia de ensino que lhe está subjacente.

De facto, esta constatação confirma a visão que Papert tem da utilização que hoje é dada aos computado-res pelas escolas: continuamos a ver o computador a “ensinar” as crianças e não o contrário: o contacto das crianças com os computadores não mudou em nada o que elas pensam de si mesmas enquanto apren-dizes, ou a forma como enfrentam e solucionam os seus problemas. Essencialmente os computadores são hoje vistos pelos professores apenas como uma forma mais eficaz e apelativa de continuarem a transmitir conhecimentos aos alunos.

Hughes (1990, p. 126) considera que, quando o computador é utilizado desta forma (como tutor), a moti-vação das crianças se encontra essencialmente no meio através do qual a tarefa é desenvolvida (o ambiente computacional) e não na actividade matemática em si. Portanto, o que Hughes nos mostra é que continua a ser a motivação extrínseca a impulsionadora da actividade e não a motivação intrínseca tal como defende o ideal construtivista.

Papert (1988) propõe contextos de aprendizagem (Micromundos), onde se aprende matemática da mes-ma formes-ma que se aprende umes-ma língua estrangeira no país em que ela se fala. Nestes contextos as crianças são encorajadas a construir e melhorar as suas teorias intuitivas. As intuições das crianças são requisitos suficientes para praticar matemática e para realizar obra. Nestes contextos é possível conseguir realiza-ções interessantes para as crianças, como desenhos, jogos robots, etc. Nessa dinâmica a criança consegue ultrapassar o papel passivo, conformado e neutro que a escola tradicional lhe concede: “E ao ensinar o computador a ’pensar‘, a criança embarca numa exploração sobre a maneira como ela própria pensa. Pensar sobre modos de pensar faz a criança tornar-se num epistemólogo, uma experiência que poucos adultos tiveram” (p. 35).

2. TRÊS ESTUDOS COM LOGO

2.1 Actividades com LOGO na Educação Pré–escolar: Apreensão do espaço topológico

No âmbito de uma dissertação de mestrado em ensino e aprendizagem da Matemática está a desenvolver-se um projecto de intervenção com o intuito de investigar qual o contributo da Linguagem LOGO na aquisição da apreensão do espaço, tanto topológico como euclidiano. Com actividades realizadas por crianças em contexto pré-escolar, iniciou-se uma intervenção cujos objectivos consistem em: i) explorar as potencialidades pedagógicas do LOGO na apreensão do espaço, através da familiarização da tecnolo-gia pelas crianças com o uso da tartaruga do solo Roamer; ii) promover a resolução de problemas rela-cionando o Logo com o espaço (topológico e euclidiano); iii) promover na criança a descoberta e a assi-milação das suas aprendizagens, valorizando os seus erros, incentivando-a a avaliar as suas acções e melhorá-las; iv) interligar naturalmente as actividades com Logo com outras actividades educacionais e promover novos interesses e projectos de grupo, enriquecendo as crianças pessoalmente.

Deste modo, numa perspectiva construtivista, pretende-se proporcionar actividades, no sentido de as crianças construírem o seu próprio conhecimento, explorando, descobrindo, opinando, resolvendo e formulando problemas, com uma abordagem positiva ao erro, sem medo de agir, num verdadeiro proces-so de interacção com os pares.

As actividades são realizadas sempre activamente com e pelas crianças, de forma a promover a criativi-dade, a imaginação, o espírito crítico, a função simbólica, o poder de decisão, ultrapassando as dificulda-des passo a passo. Faz-se um acompanhamento constante dos procedimentos que efectuam, reformu-lando os erros e sintetizando as tarefas, com a utilização de diálogos, registos gráficos e fotográficos, anexando-os ao portefólio de cada criança.

(4)

ISCTEM, Maputo, 1,2 e 3 Março 2007

• Caracterização da tartaruga tridimensional (Roamer) e a sua funcionalidade (como se compõe). Comparação de uma tartaruga (ser vivo) com o robot Roamer;

• Dramatização da tartaruga (vida e história) e os caminhos que vai traçar seguindo as setas que tem que visualizar;

• Exploração de noções espaciais relativamente ao próprio corpo; ao corpo de um amigo e relativa-mente a outro ponto referencial;

• Jogo de comandos auxiliado de cartões com as primitivas;

• Invenção de primitivas pelas crianças, com registo gráfico;

• Actividades livres explorando livremente o Megalogo;

• Comandar a tartaruga num espaço delimitado contando os passos que dá para se deslocar espacial-mente (para trás/frente; direita/esquerda, em cima/baixo);

• Dramatização da história da “Lebre e da Tartaruga”, tendo como personagens duas tartarugas do solo (com acessórios de disfarce, elaborados com as crianças) comandadas pelas crianças;

• Estimativa de distâncias num determinado percurso, trabalhando noções de mais/menos; longe/perto; direita/esquerda; frente/atrás;

• Associação da lateralidade à estimativa de graus (virar esquerda/direita n graus), auxiliando com círculos do tamanho da carapaça da tartaruga com a amplitude dos ângulos graus previamente escri-tos (360º; 180º; 90º), permitindo o comando da mesma através da visualização dos algarismos dis-postos conforme o ângulo.

Esta actividade permite ainda trabalhar as noções de inteiro, metade, divisão em partes, relativamente à unidade.

Na sequência das primeiras observações, esta exploração de actividades com LOGO tem resultado em pleno, havendo uma relação muito íntima entre as crianças e a tartaruga: i) denotam sentimentos de cari-nho, entusiasmo, prazer, inquietude, desinibição, emoção e até saudade, relativamente à Roamer; ii) deliciam-se a ensinar a Roamer a andar para a frente, a “virar/rodar” n graus, a contornar obstáculos para chegar a um determinado local; iii) identificam/digitam os números e apercebem-se, com entusiasmo, que sabem comandar e programar a tartaruga autonomamente.

O mágico desta intervenção está também na oportunidade de as crianças trabalharem ludicamente, quer as aprendizagens informais que possuem, quer as formais, que são proporcionadas num clima aberto, de diálogo, de camaradagem ou seja, de forma não tradicional, estravazando os seus sentimentos, os seus saberes, tentando consecutivamente, até encontrar soluções e/ou criar mais problemas. Deste modo, as aprendizagens tornam-se mais significativas e naturais, num processo flexível na construção de conhe-cimentos, em que cada criança é sujeito activo da sua aprendizagem, tendo em conta os seus ritmos, interesses e necessidades.

A Educadora/Investigadora assume-se como uma orientadora de actividades desafiadoras e promotoras de processos de pesquisa, promovendo o alargamento da capacidade de análise crítica e da motivação para a procura de estratégias de resolução dos seus problemas, de uma forma colaborativa com os seus colegas, com troca de saberes e opiniões e por tentativa-erro, permitindo a autoavaliação dos procedi-mentos.

O fascínio pelo mundo dos robots parece proporcionar às crianças a excitação da investigação e da aprendizagem. A tartaruga funciona como um objecto para “pensar com”, que canaliza a natural curiosi-dade das crianças e potencializa as suas aptidões para explorar, descobrir e construir a partir da sua pró-pria experiência. Com a exploração da Roamer, utilizando a Linguagem LOGO, as crianças aprendem noções matemáticas de forma lúdica, dialogando acerca da resolução de problemas, encontrando solu-ções.

2.2 O Logo na iniciação à Geometria: estudo de caso numa turma do segundo ano de escolaridade do 1.º ciclo do ensino básico

(5)

ISCTEM, Maputo, 1,2 e 3 Março 2007

alunos do 1º C.E.B., quando envolvidos em tarefas relacionadas com a iniciação à Geometria. Tenciona-se deTenciona-senvolver estas actividades numa perspectiva de resolução de problemas e de actividades de inves-tigação, assim como, proporcionar actividades interdisciplinares e fomentar a motivação, o interesse e a curiosidade por novas questões.

Este estudo está a ser desenvolvido numa Escola Básica do 1.º Ciclo do concelho de Esposende, com uma turma do 2.º ano de escolaridade. A turma em questão tem 16 alunos, 12 rapazes e 4 raparigas, com idades compreendidas entre os 7 e os 8 anos. Estes alunos eram provenientes de várias turmas, uma vez que no ano lectivo anterior foram repartidos pelas três turmas existentes na escola (2º, 3º e 4º anos). Tra-ta-se de alunos que demonstram gosto pela escola. No entanto, metade da turma, revela dificuldades na aprendizagem, essencialmente na correcção ortográfica, raciocínio lógico-matemático, cálculo mental, métodos de estudo e trabalho, métodos de gestão pessoal dos materiais e do tempo. Também mostram falta de hábitos de trabalho em grupo, embora já realizem trabalhos em grupo desde o princípio deste ano lectivo, o que não é suficiente para superar dificuldades que esta dinâmica impõe.

Nesta investigação começou-se por propor à turma um conjunto de actividades de carácter interdiscipli-nar, para serem desenvolvidas, em grupo, através da linguagem de programação Logo, ao longo de várias sessões. As referidas actividades resultam da elaboração de um projecto desenhado pelos alunos com a orientação da professora, em que se incluem tarefas relacionadas com:

- pesquisa/recolha de informação sobre o Rancho Folclórico da localidade; - iniciação à linguagem Logo;

- definição de um projecto comum.

Com a conclusão deste projecto pretende-se fazer emergir/valorizar as potencialidades do Logo e averi-guar possíveis alternativas para inovar as práticas de ensino, tendo em vista contribuir para uma educa-ção matemática mais condizente com as necessidades dos alunos.

2.3 Logo e educação matemática: um estudo de caso no 4.º ano de escolaridade

Com este trabalho pretendeu-se dar um contributo para uma reflexão sobre o ensino da matemática no 1.º Ciclo do Ensino Básico. A falta de relevância da matemática escolar para os seus alunos constitui um importante problema identificado por diversos autores. Esse problema pode equacionar-se da seguinte forma:

O ensino da matemática é pouco relevante no plano pessoal e social.

Tendo tomado contacto com trabalhos de Seymour Papert e com a linguagem/filosofia Logo, propuse-mo-nos abordar a problemática em causa, através de uma intervenção pedagógica com recurso ao Logo. O estudo que realizámos orientou-se em torno das seguintes questões:

• De que forma poderá a filosofia Logo ajudar a matemática escolar a aproximar-se das preocupações e interesses das crianças e da comunidade envolvente?

• Como poderá a implementação da filosofia Logo ajudar os professores a questionar importantes concepções sobre a matemática e o seu ensino?

• Como pode a implementação da filosofia Logo atender às finalidades do Currículo Nacional?

2.3.1 Aspectos metodológicos O trabalho baseou-se num estudo de caso.

A recolha de dados teve seis componentes essenciais: observação participante; registo de áudio/vídeo; registo do trabalho dos alunos; registo de incidentes críticos; testemunho escrito da professora da turma e notas de campo.

(6)

ISCTEM, Maputo, 1,2 e 3 Março 2007

Para tal, recorremos ao programa informático NUD*IST e baseámo-nos na sugestão de Bogdan & Biklen (1994, p. 220-245). Seguimos um processo cíclico em que podemos distinguir quatro fases distintas:

• Análise do conteúdo dos textos identificando neles tópicos (padrões de comportamento, frases, for-mas dos sujeitos pensarem e acontecimentos);

• Atribuição de códigos (categorias de codificação) aos diferentes tópicos encontrados;

• Análise das notas de campo com vista à identificação de unidades de texto relacionadas com cada um dos tópicos encontrados e sua integração em ficheiros de dados de apenas uma única categoria, referenciando-os também de acordo com a fonte de onde foram retirados (1.ª sessão, 2.ª sessão, etc.);

• Análise de cada um desses ficheiros, procurando regularidades, contradições e outros tipo de rela-ções entre as categorias em análise.

2.3.2 Contexto de estudo

Uma turma do 4.º ano de escolaridade com 20 alunos, na qual se incluía um rapaz com Necessidades Educativas Especiais. A turma dispunha de um computador disponível para todos e o aluno com NEE utilizava um portátil.

A intervenção estendeu-se ao longo de 15 sessões e consistiu em propor à turma o contacto com o Logo gráfico, seguindo a filosofia de ensino Construcionista.

2.3.3 Resultados

No percurso dos alunos podemos distinguir quatro fases que se sucederam não por imposição dos investigadores, mas em consequência de tomadas de decisão conjunta:

• Exploração livre do Logo;

• Inclusão do aluno com Necessidades Educativas Especiais e definição do objectivo comum;

• Trabalho em torno do objectivo comum (Ponte da Lagoncinha);

• Articulação do trabalho dos diferentes grupos. Do trabalho matemático dos alunos resultou aquilo a que Papert (1988) chama – “a obra”.

A “obra” é muito mais do que o produto de um trabalho matemático. Ela encerra em si um percurso de um

gru-po de pessoas que abraçou um projecto e lutou gru-por ele, vivendo momentos (alguns, intensos) de entu-siasmo, de desânimo, de inconformismo e de coesão.

A nossa experiência confirma que a implementação da Filosofia Logo contribuiu para uma maior apro-ximação entre os interesses/preocupações das crianças e a matemática que a escola lhes ofereceu. As crianças foram capazes de se mobilizar espontaneamente, embora nem todas as famílias se tivessem interessado de forma evidente pelo trabalho escolar, nomeadamente aquelas que não tinham computador em casa. A dificuldade em verificar o Princípio da Ressonância Cultural, (que Papert considera o mais difícil de alcançar), terá estado na base deste resultado.

Verificámos também que a nossa experiência como professores nos conduziu a importantes confrontos internos entre as nossas concepções e as constatações que fazíamos.

Por último, constatámos que a actividade das crianças esteve permanentemente orientada para as grandes finalidades do currículo de Matemática. Elas viveram um modelo de aprendizagem sinuoso, problemáti-co e desafiador.

2.3.4 Conclusão

(7)

ISCTEM, Maputo, 1,2 e 3 Março 2007

A análise dos resultados leva-nos a concluir que a cultura Logo pode contribuir em boa medida para que a actividade matemática se torne mais relevante para os alunos, e faça mais sentido no contexto social envolvente.

Como consequência desta conclusão consideramos que o Logo é seguramente uma interessante proposta que deve merecer a maior atenção por parte de quem se preocupa com a educação matemática. Os argu-mentos dos investigadores nos domínios afectivo, social/cultural e outros que explorámos convergem para a hipótese de que vale a pena tentar compreender Papert e os seus princípios Construcionistas apesar de encontrarmos importantes resistências à sua implementação.

Considerações finais

Nesta comunicação apresentamos, de modo breve, a linguagem Logo e ilustramos a sua aplicação através de duas experiências em curso e dos resultados de um projecto já concluído. Com esta partilha de expe-riências e reflexões, esperamos contribuir para uma divulgação da linguagem Logo, como uma “ferra-menta” das Tecnologias de Informação e Comunicação que suscita desafios em todas as dimensões, do complexo processo educativo. Mais do que linguagem, Papert propôs uma filosofia de educação. No entanto, apesar da riqueza e do sucesso de experiências como as que descrevemos, constatamos que a sua adopção generalizada está longe de ser uma realidade. Contudo, não é impossível, bastando, como demonstramos, permitir às crianças um dizer um fazer, por exemplo, com a ajuda de uma tartaruga, no chão ou no écran de um qualquer computador.

Referências

[1] S. Papert, Logo, computadores e educação, (Editora Brasiliense, São Paulo, 1988). [2] R. E. Mayer, American Psychologist, 59, 1. (2004).

[3] A. H. Schoenfeld , in Douglas A. Grows (ed.), Handbook of research in mathematics teaching and learning. (Mac Millan, New York, 1992), 15 [334-370].

[4] A. G. Thompson (1992), In Douglas A. Grows (Ed.). Handbook of research in mathematics teaching and lear-ning. (Mac Millan, New York, 1992), 7 [127-146].

[5] M. Hughes, (1990). In Grieve, R., & Hughes, M. (Eds.). Understand children: essays in honour of Margaret Donaldson. (Blackwell, Oxford,1990), 7 [121-139].

Imagem

Fig. 1  A “obra”

Referências

Documentos relacionados

O Museu Digital dos Ex-votos, projeto acadêmico que objetiva apresentar os ex- votos do Brasil, não terá, evidentemente, a mesma dinâmica da sala de milagres, mas em

nhece a pretensão de Aristóteles de que haja uma ligação direta entre o dictum de omni et nullo e a validade dos silogismos perfeitos, mas a julga improcedente. Um dos

Equipamentos de emergência imediatamente acessíveis, com instruções de utilização. Assegurar-se que os lava- olhos e os chuveiros de segurança estejam próximos ao local de

Tal será possível através do fornecimento de evidências de que a relação entre educação inclusiva e inclusão social é pertinente para a qualidade dos recursos de

Completado este horário (09h do dia 24 de fevereiro), a organização encerra os revezamentos e fecha a área de troca, não sendo mais permitida a entrada de nenhum atleta

Nesse contexto, o presente estudo foi realizado com o intuito de avaliar o crescimento e o desempenho econômico de plantios de Eucalyptus dunnii em diferentes sítios no

A espectrofotometria é uma técnica quantitativa e qualitativa, a qual se A espectrofotometria é uma técnica quantitativa e qualitativa, a qual se baseia no fato de que uma

A maneira expositiva das manifestações patológicas evidencia a formação de fissuras devido a movimentação térmica das paredes, Figura 9, que não foram dimensionadas com