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MORADORES DE RUA DE FLORIANÓPOLIS E SUAS HISTÓRIAS DE VIDA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO SÓCIO ECONÔMICO

DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL

MORADORES DE RUA DE FLORIANÓPOLIS E SUAS HISTÓRIAS DE VIDA

1 4- ot

7/2 Teresa Kleba Lisboa Chefe do Depto. de Serviço Sorte'

CSE/UFSC

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO SÓCIO ECONÓMICO

DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL

MORADORES DE RUA DE FLORIANÓPOLIS E SUAS HISTÓRIAS DE VIDA.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Serviço Social da Universidade

Federal de Santa Catarina como requisito para a Obtenção do título de Bacharel em Serviço Social.

Eliete Tania Gabiatti

Orientadora: Prof. Ana Luiza de Lyra Vaz

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ELIETE TANIA GABIA I VI

MORADORES DE RUA DE FLORIANÓPOLIS E SUAS HISTÓRIAS DE N,'IDA

Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do titulo de Bacharel no Curso de Serviço Social, do Departamento de Serviço Social. do Centro Sócio-Econômico,

da Universidade Federal de Santa Catarina.

A Comissão Examinadora é integrada pelos membros:

W

\-k L') Prof. Anki-liza de L Vaz

Orientadora

Assistente Social - Irma Remor Silva Coordenadora do Projeto

Abordagem de Rua

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Gente Humilde

Garoto/Vinícius de Moraes/ Chico Buarque

Tem certos dias em que eu penso Em minha gente

E sinto assim todo o meu peito Se apertar

Porque parece que acontece De repente

Como um desejo de eu viver Sem inc notar

Igual a quando eu passo No subúrbio

Eu muito bem vindo de trem De algum lugar

E aí inc dá uma inveja dessa gente Que vai em frente sem nem ter Com quem contar

São casas simples, com cadeiras Na calçada

E na fichada escrito em cima que É um lar

Pela varai: da, tristes E baldias

Como alegria de não ter Onde encostar

E aí inc dá uma tristeza No meu peito

Feito um despeito de eu não Ter como lutar

E eu que não creio peço a Deus Por minha gente

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Dedico este trabalho a minha família que sempre acreditou em mim, aos meus amigos que me incentivaram e aos moradores de rua que tiveram a bravura de contar suas histórias de vida a urna pessoa desconhecida.

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INTRODUÇÃO

Este trabalho é o resultado de reflexões e inquietações sobre a complexibilidade da questão social "morador de rua adulto", quando do nosso estágio obrigatório realizado no Projeto Abordagem de Rua da Prefeitura Municipal de Florianópolis.Tema esse bastante instigante que muito nos despertou a curiosidade e o desejo de penetrar no seu inundo interior desse segmento para melhor compreendê-lo e aceitá-lo, contudo sem emiti 1-julgamentos.

O interesse em pesquisar sobre tal problemática foi no sentido de saber quem são esses moradores de rua, como vivem, o que pensam e como são vistos e pensados por outros segmentos da sociedade.

Organizamos este trabalho em dois capítulos: No primeiro capítulo abordaremos um pequeno resgate histórico de como a assistência aos pobres era tratada pela igreja e instituições, que através de ações de caridade, amor ao próximo, mantinham o controle, desse segmento populacional, que poderia vir a ser uma ameaça a ordem estabelecida.

Em seguida veremos como a idéia do trabalho passa a ter importância na questão de cada um garantir o acesso à assistência através do salário.

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RESUMO

Para retratar porque algumas práticas de caridade e benevolência ainda hoje permeiam alguns segmentos de nossa sociedade, bem como que só é considerado "normal" quem possui trabalho, foi resgatado um pouco da história a fim de elucidar como essas atitudes eram bastante comuns na antiguidade. realizadas por intermédio da igreja e de instituições de caridade, sendo assim, conseguiam manter a ordem estabelecida pela classe burguesa.

Com as mudanças que o mundo sofreu, principalmente o mundo do trabalho, novas maneiras de pensar na assistência aos pobres foram surgindo. Entre elas a de que cada um deveria garantir a assistência através do trabalho.

Considerando a realidade de nossa cidade, conhecemos um pouco o trabalho que o Projeto Abordagem de Rua presta para a população de rua. esse segmento da sociedade que vive a margem dos considerados mínimos sociais para a sobrevivência.

Assim, visando uma melhor compreensão da vida real, daremos seqüência aos relatos dos diferentes segmentos de nossa sociedade que foram entrevistados, bem como as histórias de vida dos moradores de rua. Apresentam-se as ações empreendidas pelo poder público e pela sociedade ao abordar esta questão.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 6

RESUMO 8

SUMÁRIO 9

CAPÍTULO 1 10

I .1. A BENEFICÊNCIA EM TROCA DA TRANQÜILIDADE E DO CONTROLE SOCIAL 10

1.2. COMO OS DIRIGENTES MUNDIAIS PENSAM o FUTURO Do MUNDO . 18

CAPÍTULO 2 24

2.1. POPULAÇÃO DE RUA: QUEM SÃO ESSES MARGINALIZADOS, OS EXCLUÍDOS HUMANOS 24

2.2. O PROCESSO DE TRABALHO DO PROJETO ABORDAGEM DE RUA 29

2.3. As HISTÓRIAS DE VIDA DE ALGUNS MORADORES DE RUA DE FLORIANÓPOLIS: COMO SÃO VISTOS POR OUTROS SEGMENTOS DA SOCIEDADE

CONSIDERAÇÕES FINAIS 65

REFERÊNCIAS 69

ANEXO A 71

ANEXO B 73

ANEXO C 75

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CAPÍTULO 1.

1.1.A

Beneficência em troca da tranqüilidade e do controle social

Para que possamos compreender as práticas de caridade e assistencialismo que ainda hoje permeiam nas intervenções das instituições públicas e entidades filantrópicas, torna-se fundamental resgatarmos historicamente o seu desenrolar. A literatura nos mostra que desde a idade média o entendimento das intervenções voltadas aos empobrecidos trazia como pano de fundo o controle social. Utilizando-se de atitudes e ações, a classe clominante tinha corno intenção manter o controle da classe dos dominados. Que segundo Balen,(p. 42, 1993):

Desde a antiguidade, a caridade e a beneficência eram utilizadas pelas instituições de caridade e companhias religiosas como atitudes de dominação". A ordem econômico-politico-social, favorecendo a classe dominante burguesa, permitia o domínio sobre as classes, que representavam os dominados, com desvios sociais, (mendicância, loucura e vagabundagem) os quais representavam uma ameaça a ordem vigente.

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II

Como um exemplo caritativo sobre essa questão, Castel ressalta que a hierarquia paroquial, com o pároco e seus "auxiliares", os devotos caridosos e as damas de caridade, usavam uma rede de controle cujo acesso à assistência era medido por mérito. "Os bons pobres" eram os que mantinham assiduidade religiosa, os quais tinham privilégios nas ações de ajuda'.

Essa era uma forma de rotular quem era merecedor ou não; assim dava-se o processo de exclusão ou inclusão na hora de prestar "ajuda" ou receber a "merecida assistência".

As explicações para os ("desajustes sociais") eram buscadas na escolástica. Escritos foram elaborados para ressaltar algumas medidas colocadas em prática para configurar uma política social, (de prestação de "ajuda"), mesmo que precária com o objetivo de promover o crescimento da população, preservar a sociedade dos perigos do segmento social que vinha crescendo. O precário sistema social vigente na idade média não oferecia melhora nas condições de vida das classes menos favorecidas, em oposição à classe burguesa, com isso havia um grande descontentamento das camadas desfavorecidas motivando assim o aumento das contestações na tentativa de mudar a ordem estabelecida. Balen,(1983,p.4). A Igreja por sua vez foi grande legimitizadora do assistencialismo, com a prática da caridade e amor ao próximo. Segundo a escolástica, o Estado sendo um produto de Deus, da qual a igreja foi sustentáculo do sistema burguês. (tudo em nome do amor ao próximo, da caridade e da beneficência).

Sob o antigo regime burguês, três tipos de assistência aos pobres eram praticados: reclusões a casas de caridade e em hospitais gerais, mendigos e indigentes validos. (DONZELOT, 1978, p.58-60)2

CASTEL, R. Ordem Psiquiátrica, p.64

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1)

Já a ação de pedir esmola era utilizada por muitos corno uma prática diária, usando todos os artificios para explicitar a pobreza, utilizando-se dela como um meio de sobrevivência. A outra ação era dirigida aos "pobres envergonhados", com a intenção de proteger os que tinham urna situação "honesta" ou seja, trabalho. Estes recebiam auxilio

mas, o problema era tratado de forma individual e secreta. A situação não era exposta a fim deste não perder o crédito perante as outras pessoas.

Dessa forma as Companhias de caridade burguesa do séc. XVIII, intervinham na realidade social através de medidas assistencialistas e pontuais que cumpriam apenas com presença compensatória e de controle social, para que não houvesse revoltas e contestações, que pudessem vir a abalar a ordem estabelecida; com o objetivo de tirar esses mendigos do alcance do olhar da sociedade, não tornando pública as circunstâncias em que se encontravam.

A partir dai esses mendigos passam a ser vistos de urna nova maneira. A idéia era que quanto mais o indivíduo cuidasse de sua saúde, (corpo) esse teria melhor rendimento e também diminuiria os custos sociais. Como nos ilustra Donzelot, (1978,p. 30-40) quando ressalta que:

No "Séc. XVIII uma conexão entre o campo médico e o campo político-social estabeleceram uma relação entre a produção de riqueza e o trabalho do corpo. Cada um com o objetivo especifico. A medicina voltada ao conhecimento, educação dos filhos sob vigilância e as políticas sociais a fim de diminuir o custo social de sua reprodução de obter um número desejável de trabalhadores com um mínimo de gastos sociais-.

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Nos reportando ainda ao Séc. XVIII percebemos na fala de Balen (1983, p.45) que esta relação reprodução da força de trabalho e assistência assume um novo papel, ressaltando:

Na metade do Séc. XVIII é descoberta uma nova relação entre pobreza, miséria, fome e o trabalho que esta população desfavorecida poderia oferecer em troca de urna assistência.

A idéia era, que a riqueza poderia ser obtida por meio do trabalho. O pobre foi visto corno urna fonte de riqueza para o Estado.

É no período da era industrial, durante o Séc. XVIII e XIX que:

ocorre à escassez de mão-de-obra, há uma repressão generalizada à difusão das atividades ligadas a vagabundagem e

à mendicância, uma vez que esses grupos agora se situam como pertencentes ao exército industrial de reserva, à categoria de lumpemproletariado3 .(MICHELUZZI, 2003, p. 10)

Com o aumento da demanda de mão-de-obra, conseqüentemente propiciou a exploração dessa mão-de-obra barata, que com pouca oferta se via obrigada a trabalhar a qualquer custo e sem a garantia de direitos.

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Esta idéia está fortemente ligada ao desejo de colocar o pobre para trabalhar. O pobre era simbolizado pela figura do indigente, ocupando assim posição estratégica na lógica da política social. Portanto nessa época segundo Balen, (1983. p.46):

Pobre era todo aquele que se encontrava em estado de necessidade". O desperdício das forças de trabalho vivas, os inúteis começam a inquietar os primeiros "filantropos", que não tinham mais o interesse de mantê-los, surge então a necessidade de reintegrá-los ao circulo produtivo; A assistência não é mais considerada como uma questão de política económica do Estado.

Dessa forma o trabalho começa a ser visto corno fonte de riqueza, o qual inspirou a política de assistência, sabendo que os partidários da economia liberal não percebiam ainda sua contradição.

A idéia era que o indivíduo que trabalhasse estaria "protegido", utilizando-se dos direitos trabalhistas e com seu salário deveria se manter. Desta forma o Estado não necessitaria gastar com benefícios "extras". Essa ideologia era e ainda é atual; aquele indivíduo que não trabalha é "vagabundo", não trabalha "por que não quer", sem levar em consideração que mesmo quem trabalha na sua grande maioria não recebe um salário digno, nem suficiente para a subsistência familiar, sendo assim, existe a necessidade de auxílio assistencial.

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estruturais da sociedade capitalista. Passando dessa fori-na a culpalização do indivíduo que está excluído por sua própria vontade. Podendo sozinho promover sua inclusão.

A idéia de liberar o acesso ao trabalho, resultou na verdade com a exploração da classe operária que se sentia pressionada a trabalhar a qualquer custo, onde o rico precisava do pobre para assegurar seu lucro: "o pobre era rico em força de trabalho" a ser explorada. Mesmo com o desenvolvimento contrário da política de assistência no séc XVIII, o interesse do Estado ainda é fortemente ligado na intervenção nas questões da "assistência" a fim de manter a ordem social. Através de cadastramento vigiava minuciosamente os pobres e lhes garantia uma "tutela" completa. (Balen, 1983, p. 55)

Com o desenvolvimento do capitalismo e da indústria nos séc. XVI ao Séc. XVIII, as pequenas economias de agricultura familiar, e de produção manufatureira dos pequenos feudos não conseguiram sobreviver ao desenvolvimento da indústria. Com a implantação do trabalho assalariado, os feudos através do cercamento e outros processos, começam a migrar para a cidade, transformando-se na nova classe social, o proletariado que visavam melhor qualidade de vicia, no campo da educação, saúde, cultura etc. Com a migração do homem do campo para a cidade inicia-se o agravamento dos problemas urbanos, como na área da saúde, educação, transporte e trabalho; bem como a exploração da mão- de -obra feminina e infantil.

Com a transição do modo de produção feudal para o capitalista, alteram-se as relações Estado - Sociedade Civil exigindo-se novas formas de intervenção no campo assistencial. O Estado para legitimar seu poder passa a intervir nesse campo, transformando a prática de assistência em prática de dominação, alterando a concepção de justiça e amor. (ROLIN 1998, p.09)

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I 6

direitos, somente os incapazes para o trabalho (eram as crianças, adolescentes, idosos e deficientes, ou ainda pessoas em situação de miséria absoluta) é que tinham acesso aos mínimos sociais. A lógica era e ainda é que todos deveriam se manter através do trabalho.

Dessa forma o Estado através de organismos e instituições mantêm o controle da sociedade, principalmente o controle da população mais empobrecida, onde o "Estado tratou essas questões, principalmente o Estado Brasileiro, de forma assistencialista e individual. A igreja fazendo ações de filantropia junto à sociedade civil, e o Estado através do trabalho das primeiras damas, tornando a assistência corno um principio alienante, paternalista, excludente e secundário". Reforçando assim a idéia da assistência não ser vista sob o aspecto de política pública.(OLIVEIRA,1999, p.38).

Com as alterações que o mundo sofreu ao longo da história, principalmente o mundo do trabalho, essas alterações refletiram tanto para a mudança de comportamento da sociedade, como também nas políticas públicas, na organização familiar, principalmente no que se refere à economia; onde as pessoas tiveram que se adaptar as novas regras e a realidade exigida pelo mercado, que com o passar do tempo foi agravando os problemas sociais e a exclusão. Com o grande número de mão-de-obra excedente, com o arrocho salarial, a mulher sente a necessidade de se inserir no mercado de trabalho para colaborar com o orçamento familiar, ocorrendo assim alterações na dinâmica familiar.

O mercado de trabalho também começa a exigir mão-de-obra qualificada ao mesmo tempo, impõe regras salariais e empregatícias, devido a grande demanda, ou seja: devido ao "exército de reserva". Na fala de Faleiros, (1993,p.34).

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Da mesma forma que era necessária à manutenção dessa força de trabalho, exploração desta força também era fundamental para que houvesse o processo de acumulação, a mais-valia.

A classe dos dominados vai se constituindo ao longo do tempo como uma ameaça à produção da força de trabalho e a paz social. Com isso os problemas que afetam o conjunto das classes dominadas, são parcialmente, abalizados, classificados, e separados por categorias, que segundo Faleiros (1993,p.34) "nega-se à existência de classes sociais para evitar uma possibilidade de consciência de classe".

Na mesma intencionalidade de manter a ordem, as instituições e empresas, utilizavam - se de doações (bens materiais: produtos alimentícios, favores, etc.) para contornar as insatisfações das classes marginalizadas.

Na realidade essa "doação" está situada também na política de incentivo ao mercado de trabalho, urna vez que a doação é sempre inferior ao salário mínimo, que segundo Faleiros4, a idéia parte do princípio: "os que não trabalham devem ter condições inferiores aos que trabalham", forçando-os assim a buscar emprego.

Com o passar do tempo e o desenvolvimento da produção, instituições modernas, visam incentivar a modernização por intermédio de subvenções públicas, para permitir a "igualdade de oportunidades." As instituições se tornaram vínculos para mediatizar essa "igualdade", pela integração ao modo industrial-urbano-consumidor das populações

consideradas marginalizadas, desintegradas, desfavorecidas. Com isso o trabalho profissional de informação direciona-se para a informação e capacitação destinado a reintegrar a mão-de- obra as novas exigências da acumulação do capital baseado no avanço tecnológico. (FALEIROS,1993,p.40).

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Através de recursos públicos a fim de oferecer "igualdade e oportunidades" a todos os marginalizados a idéia era capacitar as pessoas para o trabalho dentro das novas exigências do mercado devido o avanço tecnológico.

A contrapartida à ausência de políticas públicas é explicitada nas diversas formas de resistência que as camadas desfavorecidas demonstravam em relação à insuficiência das políticas que aconteceram no decorrer da história. Assim é de longa data as insurgências manifestadas contra os efeitos nefastos do sistema capitalista que se apresentam através das lutas sociais dos operários, camponeses, donas-de-casa, organizações políticas, em direção a políticas mais democráticas. Dessa forma as instituições capitalistas foram obrigadas a apresentar modelos reformistas para a educação, agricultura e habitação, etc.

Essa mediação aparece entre instituição e clientela envolvendo táticas de comunicação impregnada de manipulação.

Essas formas de amenizar os problemas de insatisfação através de manipulação geralmente relacionado ao mercado de trabalho são práticas comuns até os dias atuais, onde há uma grande população desempregada, marginalizada; como a demanda é bem maior que a oferta, vem ocasionando maior dificuldade na hora de lutar por melhores condições de emprego, salário, educação, etc; até mesmo garantir os direitos já conquistados ao longo da história que são leis, as quais gerações passadas lutaram,

sofreram torturas e repressão para conquistá-las.

1.2. Como os dirigentes mundiais pensam o futuro do mundo:

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ocasião de um encontro realizado em 1995, num hotel de elite em San Francisco na Califórnia, onde os altos dirigentes mundiais discutiam o futuro do mundo; esses resumiram o futuro em um par de números e um neologismo "20 por 80" e "tittytainment-, uma combinação de entertainment (diversão, entretenimento) e tits (gíria americana para seios ou tetas) Ao falar essa expressão Brzezinski pensou mais no leite da mãe que amamenta. Com uma mistura de diversão anestesiante e alimento suficiente -- o "entretetanimento".

Esses chegaram a conclusão que vinte por cento da população em condições de trabalhar no séc XXI bastariam para manter o ritmo da economia mundial. "Mão- de- obra adicional, não será necessária". Na opinião do magnata Washington Sy Cips . Um quinto de todos os candidatos a emprego daria conta de produzir todas as mercadorias e prestar todos os serviços qualificados que a sociedade mundial poderá demandar". Assim, aqueles 20 % participariam ativamente da vida , do lazer e do consumo — seja em qual for o país. Outros 1% ou 2% poderão ser acrescentados por parte daqueles que herdariam alguma fortuna. E os cerca de 80% das pessoas aptas ao trabalho ficarão sem emprego, esses terão "enormes problemas".

Frente a essas projeções estatísticas, pode-se concluir a extensão dos marginalizados ao mundo do trabalho, urna vez que existe hoje no mercado muita mão-de-obra qualificada em excedente que o mercado não absorve. Dessa forma dificulta a cada dia a intenção tanto das pessoas a ter uma vida melhor como dos profissionais de Serviço Social que trabalham com essas questões, uma vez que a idéia, o discurso dos donos do capital internacional é somente proteger o capital.

E ainda, os dirigentes discutiam as dosagens capazes de manter os supérfluos 4/5 da população entretidos, à custa do esforço do 1/5 privilegiado. Sem contar que está fora de

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cogitação o engajamento social das empresas privadas, dizem que estas já estão assoberbadas pela concorrência global. "O poder público pressupõe que outras organizações não governamentais devam cuidar dos desempregados. Esperam forte colaboração das fundações beneficentes, dos voluntários de Serviços Sociais, das comunidades de bairro e agremiações esportivas de toda espécie, bem como das eventuais alianças entre esses grupos. Para a realização de tais atividades poderiam ser pagos modestos salários, garantindo assim a auto-estima de milhões de cidadãos".

Dentro dessa visão as pessoas, (80%) só terão direitos a sobreviver da caridade dessas instituições ou pessoas de boa vontade, que também terão salários indignos. E ainda dizem mais: "Para os países industrializados, em breve haverá pessoas encarregadas de manter as ruas limpas, a salários próximos a zero, ou gente que encontrará um modesto abrigo como empregados domésticos". (MARTIM,2002,p.I 2). Isso é o que esperam os altos dirigentes mundiais reunidos em San Francisco.

Se esta estatística, ou esta vontade dos dirigentes mundiais se comprovar verdadeiramente, o que podemos esperar do futuro? Como ter garantido uma vida digna de cidadãos?

Como acreditar em um mundo melhor frente ao avanço da irracionalidade capitalista?

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entretenimento, e das entidades beneficentes ou ainda da caridade dos 1/5 dos privilegiados.

Essa tendência à exclusão da grande parte da população em detrimento da minoria é atual na fala de Marx que dizia em 1865:

"A tendência geral da produção capitalista não é de aumentar o nível médio das remunerações, mas sim de reduzi-lo ou achatar o valor do trabalho até o limite min imo."

É o que acontece hoje, urna grande parcela da população com qualificação profissional trabalhando com salários irrisórios, sub empregados. Essas pessoas estão resistindo a essa realidade para sobreviver. No caso da população de rua a situação é ainda pior, pois esses estão à margem, pois na maioria dos casos não preenchem nenhum quesito exigido pelo mercado de trabalho.

No Brasil mesmo com a promulgação da nova constituição em 1988 onde evidencia e legitima direitos e deveres que: No cap. I - Dos Direitos e Deveres individuais e Coletivos e o Art. 5" e cap. II Dos Direitos Sociais Art. 6' , diz que todos são iguais perante a lei e possuem direitos iguais. O que sabemos é que mesmo com todas essas "garantias" positivadas na Constituição Brasileira, temos ciência, de que muitos brasileiros sobrevivem com menos de um salário mínimo mensal para suprir as necessidades familiares do qual bem sabemos não ser possível. Trazendo presente o nosso objeto de estudo no contexto dessa análise, no caso do morador de Rua a situação é ainda mais grave pois nem trabalho possui, distante de ter efetivado os direitos que são "garantidos" em lei.

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^Y)

assistenciais e filantrópicos e através de políticas públicas compensatórias que não atuam nas causas estruturais e conjunturais dessa problemática. Dentro dessas condições, dessa realidade, as questões sociais vão se agravando; como é a questão da violência, do tráfico de drogas, dos assaltos, dos seqüestros, do aumento do uso de drogas e álcool, bem como o aumento do número de desempregados que a cada dia engrossam a camada da população dos excluídos que em muitos casos acabam se tornando "Moradores de Rua".

Portanto os dados do IBGE de 1992 indicavam a existência de 33 milhões de miseráveis no Brasil. Em 2002 este número chegava próximo aos 50 milhões de pessoas vivendo com menos de um dólar por dia. O IBGE também divul ga dados do ano de 2001, sobre a quantidade de favelas no país. A matéria diz: O País das Favelas. Esta matéria ressalta que 23% das Prefeituras do Brasil declararam a existência de favelas em seus municípios, mas que somente 13% dessas favelas possuem cadastros. Isso demonstra mais uma vez a carência da população brasileira (ANEXO A).

Na cidade de Florianópolis esta realidade não é tão diferente, apesar de ser considerada pela mídia nos últimos anos como uma cidade de ótima qualidade de vida, cidade acolhedora, turística ou ainda com a atrativa denominação turística de: "A Ilha da Magia". A verdadeira realidade foi desvelada através dos dados de um estudo realizado pela Secretaria Municipal de Habitação Trabalho e Desenvolvimento Social do município, intitulado Perfil das áreas de interesse social do município (2001), em que constata a existência de mais de 50 bolsões de pobreza, com cerca de 13.000 famílias em Florianópolis.

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Essas estatísticas contradizem a conotação da cidade com ótima qualidade de vida. em que apenas poucos usufruem a parte "mágica".

Contudo, ressaltamos que no meio da classe política do Município de Florianópolis existe a preocupação com esta problemática, quando tornamos conhecimento do Projeto de Lei 9494/2001, do Vereador Nildomar Freire Santos, (Nildão) que apresenta propostas inovadoras na direção da promoção do indivíduo, trazendo um conteúdo democrático e educativo. O mesmo faz urna justificativa para o referido projeto explicitando a situação desta população 6 (ANEXO C).

Ressaltamos que este projeto recebeu parecer contrário da comissão de justiça alegando que este estaria invadindo área de competência exclusiva do Poder Judiciário.

Contudo o que verificamos é um enorme contraste na cidade de Florianópolis, com a existência de território, de exclusão onde se concentra a população pobre, afora aqueles que não possuem local fixo de moradia e que perambulam pela cidade em busca da sobrevivência. Esses chamados de marginais, excluídos, desfiliados, constituem o segmento da população de rua, que hoje expressam grande parte da população em geral, do qual trataremos no capítulo seguinte.

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CAPÍTULO

2.

2.1. População de rua: Quem são esses marginalizados, os excluídos

humanos

O assunto marginalização é bastante falado, questionado na atualidade principalmente quando se trata de pessoas desprovidas dos direitos básicos para a sobrevivência mas, esse tema não é recente como veremos a seguir e também é visto de maneiras diferentes por diversos autores.

Na fala de Brognolli (1996,p.22) ao dizer que:

A atenção ao tema da marginalização não é recente nas ciências sociais na América latina e no Brasil, remontado aos meados da década de 40, após a II Guerra Mundial, quando começaram a surgir os primeiros aglomerados populacionais em áreas periféricas às grandes cidades, formando o núcleo do que viriam a ser as favelas. Desde então diversos estudos vêm procurando dar conta do fenômeno, demonstrando a heterogeneidade das concepções e abordagens utilizadas pela disciplina.

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Por outro lado, na perspectiva Marxista, Kowarich,(1977,p.56) diz que:

O termo marginalidade é designado à condição referente ao modo como o trabalhador se insere no sistema produtivo, sendo considerada a partir de formas particulares de inserções oriundas da dinâmica concreta da criação de excedente econômico.

Particularmente referindo-se ao Brasil na questão da exclusão Brognolli, apoud Olivem,(1994) fala sobre a dimensão que essa questão exerce sobre a vida das pessoas, a qual exclui grande parte da população.

A população excluída do processo de industrialização é tão numerosa no Brasil que excede a necessidade de mão-de-obra de reserva, constituindo, na verdade, uma massa "estruturalmente" miserável, que nunca será absorvida pelo mercado de trabalho e conseqüentemente, não terá acesso a condições de vida e padrões de consumo melhores.

É dentro da idéia de polemizar a trajetória, a diferente forma de viver, de se ver e ser visto como sujeito na sociedade e para entender como a população marginalizada foi pensada e tratada pela própria sociedade e pelas instituições é que estamos abordando esta temática.

De modo geral todo o individuo que não age e não leva urna vida dentro da "normalidade", dos padrões impostos pela sociedade sempre é visto de forma polêmica e

diferente corno se refere: Yasbek, (1993,p.18).

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"6

A subalternidade faz parte do mundo dos dominados, dos submetidos à exploração e a exclusão social, da economia e da política. Supõe como complementar o exercício do domínio ou da direção através de relações político - sociais em que predominam os interesses dos que detêm o poder econômico e de decisão política. Nesse sentido, não podemos abordar indivíduos subalternos isolando-os do conjunto da sociedade.

Essa população marginalizada, explorada sofreu e ainda sofre os mais variados tipos de preconceitos que no caso da população de rua, que se encontra na mais absoluta condição de marginalização Lopes, (1990, p. 15) ressalta que:

Quando se fala de população de rua ninguém tem dúvida de que este segmento social expressa uma situação limite de pobreza, por mais diferente que seja a conceituação que se desenvolva. Não há duvida também que a classe trabalhadora vem sofrendo um processo crescente de empobrecimento na última década, o que amplia significativamente o contingente social que vive em situação de miséria.

Referindo-se a mesma problemática, Rosa, (1994, p.01) em sua pesquisa sobre população de rua de São Paulo fala que nesse contexto:

A pobreza não se reduz somente economicamente mas também sob o aspecto social. Onde a população de rua tem seu lugar demarcado, sendo julgada pela sociedade e em particular pela classe trabalhadora. Numa sociedade capitalista que se organiza com base na compra e venda da força de trabalho, a legitimidade social, a dignidade pessoal se firmam através da ética do trabalho.

Dentro desta visão de que só é digno quem trabalha, quem leva uma vida normal, é que essa população sofre os mais diferentes preconceitos que para Rosa, (1994 p.01 ):

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como desocupadas (como se houvesse trabalho para todos!) e pouco empenhados em vencer as dificuldades impostas pela vida ou pelo mercado; sem direito de andar pela cidade, sentar numa praça sem serem importunados; seus poucos pertences são considerados trastes.

Como resposta a essa realidade muitas são as instituições filantrópicas, instituições da sociedade civil, grupos religiosos, entre outros que movidos pela sensibilidade realizam várias atividades e atendimentos com a intenção de prestar "ajuda" a essas pessoas. Do outro lado, "governos com sua costumeira prática, transferem a responsabilidade e recursos para organizações não governamentais, que realizam atendimento em albergues, delegando poderes à polícia, que coloca em curso operação de recolhimento e limpeza pública (e outras, mais drásticas, dependendo de conjunturas políticas determinadas)" (ROSA,1994,p.01) assim, quase sempre o preconceito prevalece, quase sempre a dádiva, a doação, o favor, o descaso ou o desrespeito:

o preconceito está presente na vida dessas pessoas e se expressa de várias formas e em vários níveis da sociedade são considerados vagabundos, mendigos, migrantes, analfabetos, perigosos, além de desprovidos de capacidade de organização e consciência política e social.

Percebemos que nesse sentido, não é levada em consideração a particularidade dessas pessoas, que em grande parte sofreu limitações desde a inffincia, restrin gindo-os as poucas possibilidades de alcançarem urna vida digna.

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podemos esquecer que hoje, além de todas as exigências que o mercado impõe como capacitação, nível de conhecimento e nível de escolaridade, a questão da aparência conta bastante para a contratação ou não, entre outros fatores no caso dos moradores de rua, o fato de não possuírem endereço fixo é mais uma dificuldade encontrada. Devemos ter consciência que essa população de rua está completamente à margem do mercado formal de trabalho.

Dentro deste contexto, com o intuito de conhecer um pouco mais sobre essa população marginalizada, moradora de rua, sobretudo o morador de rua adulto, é que a elegemos como objeto de estudo do presente trabalho de conclusão de curso. O interesse de abordar a temática do adulto morador de rua surgiu durante o estágio obrivatOrio, que realizamos no projeto Abordagem de Rua no município de Florianópolis.

Através de inquietações e conversas, surgiu o interesse de conhecer quem eram esses moradores de rua, o que traziam de história de vida e que motivos os levou a fazer das ruas um meio de sobrevivência e moradia.

Entre conversas com os profissionais do projeto acima citado, observando os próprios moradores de rua, como também, considerando o modo de pensar da sociedade sobre essa questão, é que surgiu necessidade de realizar entrevistas feitas de forma semi-estruturada, cia qual foi utilizada como metodologia de intervenção o diálogo para conhecer a história de vida de cada um, a fim de saber quem são, o que pensam e como se vêem diante de suas realidades. (respeitando o anonimato de cada pessoa entrevistada).

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Portanto, no item seguinte discorreremos sobre a intervenção do projeto Abordagem de Rua do Município de Florianópolis.

Com o intuito de situarmos o leitor sobre o projeto em que desenvolvemos nossa pesquisa com moradores de rua, passaremos a descrevê-lo, para, em seguida apresentarmos o conteúdo resultante das entrevistas realizadas.

2.2.0 processo de trabalho do Projeto Abordagem de Rua

O Projeto Abordagem de Rua é um projeto da Prefeitura Municipal de Florianópolis, vinculado a Secretaria de Habitação, Trabalho e Desenvolvimento Social, inserido na Gerência da Assistência Social e Divisão de Atenção e Proteção Especial. Este projeto constitui-se numa política de atendimento da esfera municipal de Florianópolis que se destinava ao atendimento de crianças e adolescentes e adultos com equipes atuando separadamente, mas a partir do mês de setembro de 2001 houve um implemento no projeto com aumento do número de técnicos. Portanto o trabalho da abordagem de rua foi uni ficado.

O referido projeto caracteriza-se enquanto proposta de atendimento sócio educativo de inclusão social, tendo como compromisso restabelecer os vínculos familiares, escolares e comunitários de crianças, adolescentes e adultos em situação de rua evitando a exposição dos mesmos aos riscos que a rua oferece.

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Terapêuticas, hospitais, recambiamentos, conselhos tutelares, projetos de atendimentos, visitas domiciliares e escolares.

Esta proposta está baseada no Plano Municipal de Assistência Social de Florianópolis-2003 a 2005, que tem corno missão: "Prestar Serviços de Assistência Social a população, através de Ações continuadas e integradas que promovam o processo de inclusão social, visando melhoria das condições de vida". Com fundamentação na Lei Orgânica de Assistência Social - LOAS e do Estatuto da Criança e do Adolescente — ECA.

Conseqüentemente seu controle social é efetivado pelos referidos conselhos. É uma política pública, aprovada na Câmara Municipal de Florianópolis, sendo que os recursos para a efetivação deste projeto são oriundos do orçamento federal , estadual e municipal.

O segmento populacional que o projeto atende é de crianças, adolescentes e adultos em situação de rua, pedintes, explorados economicamente, explorados sexualmente, usuários de drogas. Adultos que exploram crianças e adolescentes em atos de mendicância, prostituição, tráfico e uso de drogas entre outros.

O projeto como diz o nome: Abordagem de Rua trabalha com abordagens, que podem ser espontâneas ou realizadas a partir de denúncias da população em geral ou órgãos como conselho tutelar e SOS criança, entre outros.

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currículos, carteira de trabalho e em alguns casos dependendo do interesse é auxiliado na inserção ao mercado de trabalho. Também são feitos encaminhamentos para hospitais em caso de doença, casa de passagem para crianças e mães a fim de pernoitar, ter acesso à alimentação e higiene, quando necessário são encaminhados para hospitais psiquiátricos às pessoas com transtornos mentais.

O Projeto Abordagem de Rua, juntamente com o NAF rodoviário, Núcleo de Apoio a Família - rodoviária, criado no mês de novembro de 2003 que, consiste na implantação de um centro de referência em serviços sociais, que atendam as famílias migrantes vulnerabilizadas sócio-economicamente. Bem como, recambiar adultos em situação de rua para a cidade de origem e/ou reintegração familiar.

A equipe do Projeto Abordagem de Rua utiliza-se do diálogo como principal instrumento para tentar resgatar o morador de rua, pois na sua maioria, quando chega na situação de rua é porque já perdeu o vinculo com a família e comunidade que vive. É nesse sentido que o trabalho do projeto tem sua grande importância, sendo que através das abordagens consegue manter esse vinculo. Para essas pessoas o contato é fundamental. para que não percam a referência.

Também as orientações são fundamentais para essa população, que na sua grande maioria, são desprovidos de conhecimento sobre os seus direitos e procedimentos a serem tomados diante das necessidades. Este é outro instrumento bastante utilizado pelos profissionais.

Em todo esse processo devemos levar em consideração a fala da coordenadora do Projeto Abordagem de Rua ao dizer que:

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3.)

No item seguinte abordaremos a questão do morador de rua de Florianópolis, como são vistos e pensados.

2.3.As Histórias de Vida de alguns moradores de rua de Florianópolis:

Como são vistos por outros segmentos da sociedade

Trazendo em cena a pesquisa realizada, veremos na fala dos diferentes segmentos de nossa sociedade como pensam e como são tratados os moradores de rua de Florianópolis e como eles se vêem como parte desta questão tão problemática.

Segundo a visão da Assistente Social, coordenadora do Projeto Abordagem de Rua da Prefeitura Municipal ele Florianópolis ao falar dos diferentes fatores que influenciam para o aumento e aparecimento dos moradores de rua adultos, cita o uso excessivo de álcool ou drogas; decepção amorosa; a perda de familiares, que traz como conseqüência à perda de referencias e a própria história familiar, agravado pelas dificuldades econômicas, devido à perda do emprego entre outros. É o que está refletido nos argumentos de Spozati (2001, p.66) quando discorre que o:

Morador de Rua acaba em situação de exclusão por uma série de perdas: a auto-estima e o rompimento ou fragilidade com os laços familiares. Os olhos discriminadores e preconceituosos vêem o Morador de Rua com repulsa, como estorvo ou como marginal/ bandido, sem levar em conta seu passado. Exemplo que nas ruas de São Paulo, a maioria já teve carteira de trabalho assinada e é alfabetizada.

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A coordenadora lembra ainda, que muitos são mirantes, vieram em busca de emprego, outros vieram para passar um tempo na cidade e acabam ficando nas ruas. Geralmente pela baixa-escolaridade e por estarem na rua não conseguem se inserir no mercado de trabalho. Ressalta que outros fatores comprometem a vida dessas pessoas, como: "a exclusão, o pouco acesso, justamente pelas dificuldades que essa população encontra e a própria falta de conhecimento dos direitos. Mas, tem que levar em consideração que um dos agravantes dos moradores de rua de Florianópolis é a questão da dependência química".

Podemos constatar esta realidade na fala de Jonas, de 50 anos, um alcoolista e usuário de drogas natural de São Paulo, em tratamento há dois anos. O mesmo conta que .já foi gerente de banco mas, perdeu seu emprego por abusar das drogas, e diz:

[...quem está na rua 99% é por dependência química, e 1% é débil mental, (tem transtornos mentais) nunca conheci um morador de rua diferente disso], ou seja, em outra situação.

Da mesma forma citamos Giba 24 anos e Lucas de 58 anos, ao relatar em que as famílias não os aceitam mais em casa por serem alcoolistas. Edu , 30 anos, também vivencia esta situação em decorrência do uso excessivo de álcool e droga. Perdeu o emprego que tinha com carteira assinada; faltava muito ao emprego e quando ia, chegava atrasado.

Percebemos que a dependência torna o indivíduo menos compromissado. É tão forte o controle que droga apresenta que este acaba dando menos importância para sua vida de modo geral.

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diálogo, no respeito, no não julgamento, tentando facilitar o processo de retomada da própria vida. O profissional tem que ter flexibilidade, ter a capacidade de sair do seu ponto de vista e ver com os olhos do outro. Lembra que quando a pessoa chega as ruas é porque desceu ao último degrau, já perdeu o amor próprio, o respeito, enfim, é nesse momento que se dá à importância do trabalho da abordagem, que não se restringe aos encaminhamentos realizados, mas sim, a forma como são tratados, ouvidos, isso faz a diferença. Conta que já conseguiram algumas vitórias, poucas, mas, essas já fazem a diferença. A coordenadora prossegue dizendo:

O Serviço Social deve ver essa questão com coerência.Como profissional não vejo o morador de rua como alguém que deixou sua cidade para ficar na rua e sim corno urna pessoa que está vivendo num momento extremo. Portanto o Assistente Social deve ser ético e fiel aos princípios da pessoa e da profissão. Deve ser coerente com a sua visão de mundo. Ou seja, a pessoa só deve entrar para esta profissão se realmente se identificar com a proposta ético-político do Serviço Social.

Considerando as palavras da coordenadora do projeto Abordagem de Rua Jonas 50 anos, reafirma dizendo:

(...) que quando a pessoa chega a rua não se dá mais conta que está se agredindo bebendo e usando drogas, que está acabando com a vida. Leva a vida pior que bicho. A pessoa não liga se está sujo ou fedendo, perde o sentido de tudo. Chega uma hora que nem a cachaça desce mais, você não agüenta mais beber, é degradante. Você morre.

Ele lembra que tem seqüelas devido à vida que levou por longo tempo. Jonas fuma bastante, e é viciado em calmantes; remédios em geral, pois tem depressão. Sente falta da bebida e da droga, diz que adora a droga. "Infelizmente-.

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A Organização Mundial de Saúde (OMS) reconhece que a dependência química é uma doença pro gressiva, incurável e fatal. Ela porém, é de possível tratamento. Age silenciosamente, debilitando a parte física, espiritual e emocional das pessoas. Tem como característica peculiar, alastrar seus efeitos para toda a família.

Voltando a idéia de que o profissional de Serviço Social deve ser qualificado e comprometido com sua profissão e capaz de compreender as questões sociais que emergem as suas volta é que lamarnoto apoud Netto (1992) se refere:

O Assistente Social é um terminal de políticas sociais, que atua na relação direta com a população usuária. Hoje se exi ge um trabalhador qualificado na esfera da execução, mas também na formulação e gestão de políticas sociais, públicas e empresariais: um profissional propositivo, com sólida formação ética, capaz de contribuir ao esclarecimento dos direitos sociais e dos meios de exercê-los, dotado de uma ampla bagagem de informação, permanentemente atualizada, para se situar em um mundo globalizado.

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Dando prosseguimento a pesquisa, conheceremos Roberto 20 anos, um ex-morador de rua, que tem segundo grau completo mas, que passou algum tempo fazendo malabarismo nas sinaleiras. O mesmo destaca que:

O trabalho do Projeto Abordagem de Rua é ótimo, só agora percebo que a sinaleira não dá futuro para nins.;uém, que o dinheiro que conseguia na sinaleira era momentâneo. As Assistentes Sociais são legais,(mas nem todas) orientam, conversam, ajudam a levantar a estima, falando para a gente voltar a estudar, para a gente cuidar da alimentação, e sempre deixam claro que quando precisarmos de ajuda é só procurá-las.

Roberto lembra que sempre foi muito orgulhoso e nunca quis ajuda de ninuilem. Contou que trabalhou por uns meses no terminal de ônibus velho, vendendo vale transporte, até conseguir algum dinheiro, agora trabalha para ele mesmo. Tem que arrumar dinheiro porque a venda de passes vai acabar com as mudanças que o sistema de transporte vai sofrer, depois vai ter que arrumar outra atividade. Contou também que arrumou uma namorada. Já está namorando há dois meses com uma advogada, a qual conheceu num bar. Falou todo orgulhoso que foi a moça que o abordou e que quando sai de casa se arruma todo bonito. Roberto fala com orgulho que não bebe quando sai, "saio só para observar e me divertir". O mesmo é bastante simpático e educado. Chama todas as pessoas de tio e tia.

Como ponto negativo da proposta do projeto Abordagem de Rua, este diz que deveriam conseguir um local para a pessoa divulgar trabalhos circenses (é o caso dele que faz malabarismo, cospe fogo). Dizendo, "esse trabalho deveria ser liberado".

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Roberto lembra como acontecimento negativo de estar nas ruas, que certa vez um policial ao abordá-lo fazendo malabarismo na sinaleira chutou seu braço, fora isso nunca teve problemas.

Lembramos que a prática de agressões não faz parte da proposta do projeto Abordagem de Rua. Referindo-se a mesma problemática, Jonas 50 anos, também fez um desabafo: Disse que foi reclamar para o um tenente da Polícia a respeito da violència com que os policiais estão tratando e acordando os moradores de rua. "Eles estão sendo acordados aos chutes, isso não é aceitável".

Em resposta, diz que o tenente lhe falou que sente dificuldade em trabalhar com os policiais, principalmente os mais velhos que possui hábitos mais agressivos.

Nesse caso mais uma vez o direito de ir e vir, o respeito ao ser humano está sendo violado, desrespeitado. Pois deveríamos acreditar e confiar que a policia é o órgão garantidor de nossa segurança, o que percebemos é que existem falhas graves aos "direitos" por esse segmento da sociedade.

Antony 33 anos, também está morando na rua, é natural da cidade de Lages. A entrevista com Antony foi realizada embaixo da Ponte Colombo Salles, onde estava sentado conversando com seu amigo Lin, também natural de Lages. Este contou que veio para Florianópolis com dez anos de idade. Lembra: "depois que minha mãe morreu, as coisas ficaram ruins, o pai se casou novamente e a madrasta só dava atenção para 011/111)

dela, eu me sentia rejeitado".

Comenta que nessa época só usava álcool, mas agora também faz uso de maconha. Teve um tempo que conseguiu controlar o vício, mas que por motivos afetivos, decepções amorosas, (inc juntei COm uma mulher errada e viciada) teve uma grande recaída. Ele não

tem filhos, disse que com as pessoas que se envolveu sabia que não compensava ter filhos.

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Atualmente o mesmo vive da lavação de carros e cuida do estacionamento no centro da cidade. Morou certo tempo com a irmã em São José mas não deu certo, "tinha muita cobrança". Hoje só vai para casa da irmã quando quer tomar banho ou tocar de roupa. Diz: "não dá para andar sujo".

Acha que sua irmã já faz bastante em deixá-lo tomar banho em sua casa. Ele tem consciência que está nessa situação porque escolheu essa vida e que o caminho que está seguindo é o da destruição. Sabe que está fazendo coisas erradas. "Às vezes até penso em .fazer coisas melhores... ".(silêncio) Antony pareceu bastante desmotivado, desacreditado, (acomodado). Ao questionarmos se gostaria de tratar-se, disse que tinha interesse, mas no momento que indicamos urna Comunidade Terapêutica, este disse que não podia, pois tinha que trabalhar.

Percebemos certa resistência dos moradores de rua, quando o assunto é fazer tratamento para dependência química.

O mesmo estudou até a segunda série do ensino fundamental e já trabalhou como pintor. Quando perguntamos de que maneira sente-se vivendo na rua, dormindo na rua, uma vez que "poderia" estar em casa. Disse que se sente muito mal vivendo desta forma. Ele diz que deveria ter uma casa para tomarem banho, deixar suas coisas, suas roupas.

Antony é bastante fechado, não quis falar muito e sua expressão é de tristeza. Demonstra culpa por estar nessa situação.

Com o passar do tempo, vivendo na situação de marginalidade, percebemos que a pessoa acaba sem estímulos, desacreditada da possibilidade de sair da situação em que está vivendo. A pessoa acaba internalizando a culpa, o fracasso de não conseguir resolver os problemas que emergem.

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rosto necessidade de conversar. Vil é bastante comunicativo, logo contou que veio para Florianópolis há dez anos, trabalhou no Restaurante Sorrentino como ajudante de cozinha por algum tempo, depois trabalhou em outros lugares, voltou para Curitiba e novamente está em Florianópolis. Diz que na verdade ele vai e volta. Quando vai para Curitiba fica na casa da mãe.

Ele conta que começou a usar maconha por curiosidade. Seu irmão era traficante e um dia este foi preso. Antes de ser preso deixou com ele maconha, corrente (jóias) e armas. Vendo aquela maconha guardada sentiu vontade de experimentar, fumou muito e passou mal, 'fiquei doidão, tudo rodava, foi uma viagem, até a bolsa da minha mãe que estava na parede rodava", acabou gostando. Mais tarde a maconha não fazia mais efeito, começou a usar cocaína, e agora está usando crack. "Quando comecei a usar química fiquei mal educado, grosso, sem paciência".

Fala que tem dias que tem vontade cometer alguma besteira, para ver se alguém vem e acaba com a vida dele também.

A incerteza do futuro e impotência perante a dependência das drogas faz com que a pessoa perca o sentido da vida.

O vazio existencial se manifesta principalmente num estado de tédio. Fenômenos tão difundidos como depressão, agressão e vicio não podem ser entendidos se não reconhecemos o vazio existencial subjacente a eles.(FRANKL,1997,p.97).

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Comenta que quando discutia com sua esposa, esta dizia que não o conhecia mais. Ele havia mudado por completo da época em que se conheceram, há quatorze anos atrás. Nesse sentido que Schnorreberger,(2003,p.23) ressalta que:

Com o passar do tempo, o comportamento dos familiares passa a ter certa semelhança pelo acúmulo dos desgostos, desrespeitos e, ai vem a descrença total. Nesse estágio ninguém mais acredita na recuperação.

O mesmo tem consciência que do jeito que estava não poderia mais conviver com os filhos porque, ia para a rua roubar, assaltar, não queria trabalhar, só queria dormir e mentia muito. A única coisa que ainda não fez, foi roubar em casa. Pois, do pai já roubou até armas.

Vil, muitas vezes culpa o pai por ter deixado a família sem nada. Comenta que a família tinha dinheiro, uma vida boa, mas, o pai se envolveu com mulheres e acabou perdendo tudo. Sua mãe se separou e ficou com nove filhos. Sendo assim, só conseguiu estudar até a sétima serie do ensino fundamental porque sua mãe não conseguiu mais pagar o estudo, "eram nove filhos para sustentar".

Percebemos nos relatos da história de vida de Vil, que este de certa forma está reproduzindo a mesma história do pai, abandonando e fazendo sofrer seus familiares.

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Comenta que a família dele não deu apoio, em três meses que ficou internado, ninguém o visitou, se quer escreveram uma carta. Entende que já incomodou bastante, mas clue ele é viciado, doente, precisa saber de sua família, e que se sente bastante sozinho.

Percebemos que mesmo tendo clareza das perdas que a droga já trouxe e ainda traz para sua vida e, consciente da importância que a família tem e a falta que esta faz para o mesmo, ainda assim, Vil não consegue se desvencilhar das drogas. Em relação à dependência DuPONT, JR (1986,p.53) lembra:

Em todas as idades, tão lo go a dependência de drogas se estabeleceu, é comum os usuários de drogas continuarem com o seu consumo mesmo que ameaçados de prisão, perda de emprego, ou expulsão do convívio com da família.

Muitos dependentes para não assumirem sua dependência culpam os familiares pelo uso da droga ou acreditam que estes sejam os responsáveis.

Ele comenta que na vida teve várias frustrações mas, que a pior foi ter perdido sua mulher, há quatro meses se separaram de verdade. "Ela me deu várias chances. Só de pensar que ela não vai inc querer de volta fico maluco. Eu ainda gosto dela e para ficar perto dos meus filhos só morando com ela. A mãe dos meus .filhos jamais permitiria que eles saíssem de perto. Ela é muito apegada aos filhos e responsável. Eu também sempre fin

carinhoso com meus filhos e fico revoltado, porque eu tenho que ser drogado."

"Saí de Curitiba porque fico com vergonha de mim, não quero que minha mãe e meus filhos que são tudo para mim me vejam dormindo num banco da praça, drogado ou

sujo. Não daria bom exemplo a eles ".Nesse sentido DuPONT, (1986,p.97) lembra:

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responsável e decidido. Ele prefere fuir dos problemas, em vez de resolvê-los.

Nessa fala percebe-se que existe um "respeito" e mesmo vergonha, devido à incapacidade de sair da atual situação, optando pela fuga ao invés de enfrentar o problema. Isso não quer dizer que ele não faça tentativas em busca de tratamento, pois, Vil lembra que há pouco tempo conheceu uma Comunidade Terapêutica "Missão Nova Vida" e mais urna vez resolveu se internar mas, ficou lá por poucos dias. Quando foi levar o lixo que fica próximo a praia avistou um rapaz fumando maconha, não conteve o vício ao sentir o cheiro. Foi até o rapaz e pediu um cigarro. Um colega desta comunidade o entregou para o proprietário. Houve uma discussão que acabou em agressão. A policia foi chamada e Vil saiu do local. O mesmo comenta que o proprietário tem que se tratar, não tem nenhuma habilidade para trabalhar com pessoas doentes, dependentes. E fala: "O cara é um grosso". "Com grossura, desprezo e brigas, não dá. Já chega o desprezo das ruas, Me sinto sozinho pra caramba. A té os animais gostam de carinho. Eu .fico para cima e para baixo, fico

perdido".

Relata que os Moradores de Rua são rejeitados pela sociedade. "A gente vê que as pessoas rejeitam, desviam o caminho, olham estranho pra gente principalmente, os que estão sujos. Não sabem o que pode acontecer no dia de amanhã. Elas podem ter alguém

da Milha drogado, um filho. E aí?".

Vil lembra que quando se está nas drogas e na rua a pessoa chega num ponto da vida que só com ajuda a pessoa consegue sair dessa, porque do contrário acabam fazendo mal para a própria sociedade. "Porque a pessoa rejeitada, fica revoltada. E para conseguir dinheiro a pessoa acaba Metido qualquer coisa".

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contato com sua família, para pedir informações e saber como estão durante o tempo que vai estar internado. E pede que a família ao menos lhe escreva para ele não se sentir tão sozinho. Fala que tem bons motivos para se tratar que é pelos filhos e por ele mesmo. "Enquanto ainda sou novo e tenho boa aparência. Pois para quem 'nora na rua e usa drogas um dia corresponde a um ano de vida a menos". Nesse momento Vil, conta o que fez com o dinheiro que recebeu de urna semana de trabalho:

Nessa semana recebi 240,00 reais, estava trabalhando como ajudante de pedreiro. Ganho 240,00 reais por semana. Então fui até a loja comprar uma bermuda e uma camiseta, sobrei 180,00 reais. Eu cheirei tudo em dois dias.Veja (me mostra o rosto magro) emagreci. Fiquei se café e almoço. Ai fui pedir comida num bar, enquanto o cara foi pegar a comida fiquei pensando, eu tenho família, eles trabalham, eu trabalho, e que vergonha estou pedindo comida. Ai bate o arrependimento mas, depois dá vontade de usar droga e você faz tudo de novo.

Reforçando a fala de Vil no sentido da dependência, DuPONT, (1986,p.52) Ressalta que:

Depois de instada a dependência de droga, muitos dos usuários de drogas realmente abandonam quase todas as demais coisas da vida para manterem a conexão com o tóxico que escolheram. A extrema prioridade dada ao consumo da droga é geralmente constatada nos casos dos fumantes de tabaco e nos bebedores de álcool, e também nos que tornam heroína e cocaína.

Geralmente a sobriedade faz com que a pessoa sinta vergonha das atitudes, geralmente choram, pedem desculpas, ficam arrependidas mas, quando percebem estão novamente cometendo as mesmas atitudes. Está ai, a necessidade de se fazer o tratamento.

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pois, moram com a mãe, devido à separação ficaram "chateados" com o pai.(ele bebia demais) Mas, sei que meus filhos estudaram e estão bem.

Lucas precisa de tratamento, é alcoolista e fuma há muito tempo.° mesmo diz que está lutando contra a dependência, portanto, agora vai ser obrigado a parar, pois está doente, com ulcera.(no dia da entrevista Lucas tremia muito devia ser pela fase de abstinência do álcool). Ele nos contou que participa do Projeto Arco-íris que trabalha direcionado com a prevenção de doenças com pessoas de rua. Comenta que possui bastante amigos na rua, e que são solidários uns com os outros.

Acha que Florianópolis, ainda não é uma cidade tão violenta para quem dorme nas ruas, considerando com outras cidades. "A população até respeita a gente,

a

polícia sempre está pelo centro."

Lucas disse que não é de rua, mas passou algum tempo na rua, segundo ele até receber um dinheiro para pagar o aluguel da casa que mora com algumas pessoas na Tapera. O mesmo diz ter procurado o deputado Afrânio para solicitar uma casa para os moradores de rua, com no mínimo 80 leitos.

Segundo Lucas, Afrânio responsabilizou-se a fazer um projeto para a prefeita. Mas, ainda não sabe qual foi o resultado deste projeto.

Ao certificarmos se a procedência dessa informação era verdadeira, a secretária do deputado Afrânio comentou que não tem conhecimento dessa solicitação.

Lucas foi questionado sobre a possibilidade dos moradores de rua se organizarem coletivamente para irem em busca do mesmo objetivo, este disse que é dificil conversar com eles. Pois, "a maioria só quer beber cachaça."

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Comenta que com o fechamento do Albergue Rosa Maria, a vida dos moradores de rua ficou mais difícil. Hoje eles não têm onde ficar e nem onde tomar banho. Admite que a situação do local estava insustentável. Falou que o problema que acontecia no albergue, era do pessoal que tinha casa no morro, "esses desciam para arrombar carros e fazer arruaça no A lbergue". (Após alguns meses da entrevista e mesmo tendo perdido o contato com Lucas, o qual sempre se encontrava no centro da cidade, perguntamos do mesmo no Projeto Arco-Íris uma das pessoas responsáveis por este local informou que também perderam contato. Acredita que ele deva ter falecido, pois estava bastante doente e não conseguiu deixar de fazer uso do álcool. Nem a família de Lucas tem conhecimento do mesmo).

Nil tem 51 anos de idade, é natural de Florianópolis, mora na rua há 30 anos, disse que não quer saber da família, mas, que ela existe. Sua profissão é Orelha seca (servente de pedreiro). Atualmente desempregado. Ele diz que não recebe ajuda de nenhuma entidade, somente recebe marmita quando sobra comida no batalhão da policia. Costuma tomar banho no Martineli (sede de Remo) "lá deixam a gente tomar banho".

Nil conta que seu sonho é ter uma casa para poder dormir descansado. "Meu corpo dói todo. Nunca durmo tranqüilo, e durante o dia tenho que andar com todos os meus

pertences nas costas".

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Algumas semanas depois da entrevista ao procurarmos Nil na Alfândega para conversar, só encontramos seu irmão, que nos informou que o mesmo havia ganhado uma passagem,(pois procurou a Secretaria de Habitação, Trabalho e Desenvolvimento Social) (SHTDS) para a cidade de Tubarão (SC) e já estava trabalhando numa fábrica de sacolas.

Edu tem 30 anos de idade, é natural da cidade de Tubarão, SC. Estava na Al Kindega com diversos amigos bebendo cachaça. No início da conversa Edu tentou pedir dinheiro, ou melhor, cobrar para conceder a entrevista. Após explicarmos que a proposta desta conversa era conhecer sua história de vida, o mesmo aceitou e acabou se tornando bastante simpático.

Contou que saiu da cidade natal porque seu pai o expulsou de casa, pois usava drogas (maconha) e tomava muita cachaça. Veio para Florianópolis a procura de emprego. Mas, só conseguiu trabalhar um ano e dois meses no Hotel Castelmar como Ajudante de Cozinha, lá tinha carteira assinada. Começou a abusar das drogas e do álcool, chegava atrasado e faltava ao trabalho, conseqüentemente foi demitido. Enquanto tinha dinheiro do acerto de contas ficou em hotel, quando o dinheiro acabou a rua tornou-se sua casa, desde então, não conseguiu mais emprego fixo. Edu somente concluiu o primeiro grau.

Nos contou que está nessa vida há 14 anos, cuida de carros e quando recebe dinheiro dorme em hotel, quando não tem dinheiro, dorme na rua.

Acha que Florianópolis ainda é uma cidade calma para dormir na rua. Diz que só uma vez brigou no carnaval e levou uma facada.

Ao falar da sua infância ele diz que ela foi horrível. "Foi a pior infância gra' alguém poderia ter." Ele tem sete irmãos, seu pai bebia muito, conta que quando o pai

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Quanto a querer fazer um tratamento para a dependência quimica. Edu disse que não tinha necessidade, ele acha que "quando chega a hora à pessoa para".

Essa negação de uma nítida dependência é em geral óbvia para um não usuário de drogas, que muitas vezes se surpreende com as distorções de prioridades por parte dos consumidores de drogas. DuPONT,(1986, p.53)

Edu acha-se responsável pela situação que se encontra, por que foi ele quem entrou no mundo das drogas e do álcool. "Tenho consciência disso".

Geralmente essas pessoas se culpam pela impotência perante a situação que estão, sem se dar conta de que só com tratamento terão a possibilidade de ajudar-se. Edu tem como objetivo, sonho, ter uma casa, casar e ter filhos. Disse que já está guardando dinheiro para isso. Também não quer trabalhar com horários, ser empregado, quer ser autônomo e gostaria de ter um carrinho para vender cachorro quente.

Ele conta que ainda mantém contato com sua família através de telefonemas e lembra que a família tem conhecimento da sua realidade, "sabem que vivo desta maneira". E como é bastante extrovertido brinca:

Como ser humano eu não tenho problemas, sinto-me bem, não tenho preconceito perante as demais pessoas e nem me sinto humilhado, não vou a shopping e nem vou a bares chiques onde olham para a roupa que se está vestindo e o jeito que a pessoa se porta ou fala.

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A questão da higiene mais uma vez fica evidenciada como importante para esta população.

Giba tem 24 anos de idade é natural de Lages, mora na rua há dois anos. Contou que não tem pai nem mãe. Só tem irmãs que moram em outras cidades e já são casadas, por esse motivo não pede ajuda. Suas irmãs são legais mas, elas têm suas familias e ele não quer incomodar. Estudou até a 5 a série, já trabalhou como zelador mas, como faltou ao trabalho por alguns dias foi demitido, não explicitou os motivos.

Fala que morando na rua e sem emprego se sente excluído, diferente da maioria, "quando se trabalha a gente se sente fazendo parte, se sente normal - . (Ele perdeu os documentos, o que dificulta ainda mais na hora de arrumar um emprego, também não tem dinheiro para ir a Lages refazer os mesmos). Na fala de Giba 24 anos percebe-se o quanto o trabalho influencia na dignidade, na eqüidade da pessoa que segundo, Zaluar, (1985, p.120-121) diz que:

[...o trabalho tem seu valor moral vinculado ao status do trabalhador como "ganha-pão" do grupo doméstico e não a execução da atividade propriamente dita. É assim que o trabalhador pobre alcança a redenção moral, portanto, a dignidade moral. Por isso mesmo as quedas salariais dos anos 60 e 80 têm um efeito catastrófico a atingem a única fonte de satisfação moral e material que têm os trabalhadores pobres, solapando a seu status e autoridade na família].

Giba é usuário de maconha, a qual não considera droga, não tem intenção de se tratar porque acha que quando for à hora ele pára. "Quando eu cair na real." Não quis falar mais sobre si mesmo. O tempo todo estava atento ao movimento corno se estivesse esperando alguém. O mesmo estava na Alfândega local onde costuma ficar.

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foi marinheiro. Ele também é alcoolista. Quis saber o que estávamos perguntado e porque seu colega estava sendo entrevistando. O mesmo ficou observando e escutando o tempo todo em silêncio a conversa de Giba.

Matos, diz que na rua não conversam nada de bom, nada de produtivo, é só droga e álcool. "Esse é o mundo que muitos vivem-.

O mesmo parecia urna pessoa esclarecida e educada, que por algum motivo, passou um tempo na rua. Motivos os quais não tornamos conhecimento. Matos, na verdade não estava interessado em saber sobre o trabalho do serviço social, representado nesse caso pelo Projeto Abordagem de Rua. Só estava curioso para saber do que se tratava.

Maria é solteira, tem 24 anos é natural de Florianópolis, morou 12 anos na rua. Agora faz dois meses que a mesma está morando com a mãe. Teve quatro filhos sendo que apenas dois estão vivos (não quis falar sobre a morte dos filhos). No momento trabalha como catadora de papelão nas ruas do Kobrasol. Nos contou que costuma se divertir conversando com os amigos e que freqüenta a Igreja Pentecostal, Deus é Amor. Relatou que quando morava na rua se sentia um lixo mas:

Hoje morando com minha mãe me sinto bem melhor. Penso que o mundo das ruas e com drogas não é vida para ninguém. Tive que perder os filhos para perceber isso. Hoje estou bem melhor. Trabalhando se tem mais dignidade do que esmolando. Sei que tenho direitos e fora das drogas a sociedade procura dar oportunidade para a gente conquistar a cidadania.

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Maria fez uso de cigarro e craque por 12 anos, diz que usava a toda hora, dormid pensando na droga e às vezes nem donnia.Quando não usava sentia-se angustiada, sendo perseguida, saia fora da realidade.

Dando seqüência a pesquisa realizada sobre moradores de rua, tivemos a oportunidade de entrevistar um casal que mantêm contato direto com alguns moradores de rua, por serem proprietários de urna lanchonete no antigo terminal de ônibus da Bahia Sul onde, são bastante solicitados por esta população, para pedir lanches, água, cigarro ou mesmo para guardar seus pertences.

Maria é professora e comerciante, Almeida é comerciante. Na opinião de ambos e através de conversas que costumam ter com essas pessoas, acreditam que o que leva uma pessoa a morar na rua em muitos casos é a desilusão amorosa, geralmente o homem quando traído pela esposa dificilmente consegue passar por esta situação sem cair no álcool ou na droga, muitos por falta de oportunidades não puderam estudar. Também com a modernização, a exigência do mercado de trabalho excluindo quem não é capacitado. Estes ficam sujeitos aos sub empregos e mal remunerados. Para exemplificar citam o exemplo do novo terminal de ônibus.

Essas famílias estavam acostumadas com um padrão de vida, mesmo que simples, a vida delas estava programada, mas, quando em todas as linhas forem implantadas catracas eletrônicas, quando tudo estiver funcionando, muitos cobradores serão demitidos.

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confiança da família, dessa forma cada vez ficam com a auto-estima baixa, começa o

processo de isolamento e sentimento de impotência, onde muitos se vendo nessa situação acabam optando por viver na rua como Ultima alternativa.

Esse mesmo pensamento é apontado por Zaluar (1995,p. 19) quando ressalta que:

Nesse processo, seu papel de provedor sofre urna desqualificação e ele passa a ser alvo de pressão por parte da família, bem como do mercado. Este é um dos caminhos possíveis de chegada até à rua, momento em que o trabalhador, sob essa pressão, rompe os vínculos com a família e o trabalho, atravessando o limiar tênue que no imaginário social estabelece os parâmetros de uma ordem legítima de vida.

O casal lembra que muitas dessas pessoas que estão nas ruas vêm da agricultura, vendem seus pertences e vão para a cidade, pensando em melhorar de vida, melhorar a educação dos filhos, só que se deparam com a exigência do mercado e a pouca oferta de emprego, tendo que se sujeitar a qualquer tipo de trabalho, com salários baixos incapazes de dar conta das necessidades familiares.

Acreditam que o crescimento desordenado das cidades cria todo um problema, que são os bolsões de pobreza. Com o inchamento das cidades as Prefeituras não têm políticas sociais direcionadas para atender essa demanda, não contribuindo para a melhoria da qualidade de vida dessas pessoas.

Por outro lado percebem que a vida desses moradores é de certa forma fácil, tem um lado que os toma habituados a vida que levam; pois ganham dinheiro e alimentação com facilidade, "as pessoas dão esmola para se livrarem, pois incomodam. pelo MUI cheiro, outros dão esmola por piedade".

Referências

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