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Perspectivas dos recursos humanos e medicina do trabalho sobre stress no trabalho: um estudo exploratório

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Academic year: 2021

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RESUMO

Este trabalho tem como objecto as percepções de stress no trabalho de profissionais de Recursos Humanos e de Medicina do Trabalho, e baseia-se no conceito de teorias leigas e nas ideias da teoria da atribuição. Procuram-se os significados atribuídos ao conceito de stress por aqueles profissionais, actores organizacionais que podem de facto decidir como e quando intervir, de forma a explorar se o modo como eles pensam influencia aquilo que fazem em termos de intervenções preferencialmente realizadas. Foram realizados dois estudos. No primeiro, realizaram-se entrevistas semi-estruturadas a 6 profissionais de Recursos Humanos e a 4 profissionais de Medicina do Trabalho de diversas empresas. Foi ainda pedido a estes profissionais que avaliassem a utilidade de um conjunto de intervenções e que indicassem quais já haviam sido realizadas nas empresas a que pertencem. Os dados do segundo estudo foram recolhidos através de questionários online, aos quais responderam 21 estudantes das áreas de RH e 8 profissionais das mesmas áreas. Este questionário focava-se igualmente nas percepções de stress e na avaliação da utilidade das mesmas intervenções.

Os resultados indicam que aqueles profissionais não assumem a responsabilidade directa de lidar com o stress no trabalho, justificando-o pela existência de um conjunto de obstáculos à sua acção e pela crença de que o stress é inevitável. Não foi encontrada uma relação directa entre a utilidade atribuída às intervenções em stress e a sua real implementação. As perspectivas dos estudantes tendem a estar mais próximas das “boas práticas” defendidas na literatura. Apresenta-se uma discussão dos resultados e sugerem-se algumas pistas para futuros estudos.

Palavras-chave: stress no trabalho, Recursos Humanos, teorias leigas, atribuições causais

Classificações APA: 3600 – Industrial & Organizational Psychology; 3660 – Organizational Behavior; 3670 – Working conditions & Industrial Safety

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ABSTRACT

The present study is aimed at HR Managers and Work Health professionals perceptions of work stress. Based on lay theories and attribution theory ideas, the meanings and ideas of the professionals who may actually decide how and when to intervene on work stress are explored, in order to understand if the way they think about it shapes or influences what they do, namely the kind of interventions they choose to do. Two different studies were made. On the first study, semi-structured interviews were conducted with a sample of 6 HR Managers and 4 Work Health professionals from several companies. These professionals were later asked to evaluate the perceived utility of some interventions. Data gathering on stress interventions that have been done on those companies was also collected. The data from the second study was gathered by an online survey, answered by 21 HR students ans 8 HR professionals. They were also asked about the meaning of stress and to evaluate the utility of the same interventions.

Results show that those professionals do not take personal responsibility for managing work stress, a standpoint justified by the existence of a series of perceived obstacles and by the idea that stress is inevitable. A direct relationship between the perceived utility of stress interventions and its implementations was not found. Students tend to have opinions that are more in line with the “good practices” found in the literature. Implications of these findings are discussed and suggestions for further studies are given.

Key words: work stress, Human Resources, lay theories, causal attributions

APA Classifications: 3600 – Industrial & Organizational Psychology; 3660 – Organizational Behavior; 3670 – Working conditions & Industrial Safety

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Como se explica que quando preciso apenas de um par de mãos tenha de lidar com um ser humano?

Henry Ford

Os planos são apenas boas intenções, salvo quando degeneram imediatamente em trabalho duro.

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AGRADECIMENTOS

Este trabalho não é de todo o resultado de um investimento exclusivamente individual. Ao longo dos meses em que foi pensado e passado à prática houve um conjunto de pessoas que, de uma forma ou de outra, contribuíram para que fosse terminado com persistência e relativa tranquilidade.

Em primeiro lugar, gostaria de agradecer de forma sincera à minha orientadora, a Professora Doutora Sílvia Silva. Pelas sugestões de melhoria que tornaram o trabalho muito mais rico, pela capacidade de incentivo nas alturas de maior “nevoeiro” e, acima de tudo, pela disponibilidade constantemente demonstrada.

Da mesma forma, esta investigação não seria possível sem a colaboração dos participantes, que disponibilizaram alguns minutos do seu tempo para partilharem aquilo que pensam comigo. O resultado deste trabalho é, acima de tudo, deles.

Não poderia deixar também de expressar a minha gratidão pelas pessoas que me ajudaram na concretização de contactos para as entrevistas, nomeadamente o Professor Graça Martins e a Drª. Ângela Crespo. Como tive oportunidade de lhes dizer atempadamente, demonstraram claramente que são, de facto, os afectos que movem o mundo.

À minha Família, que não se rege por limites de consanguinidade, devo as refeições reparadoras de fim de semana, a paciência para “raivinhas” menos controláveis, a capacidade de ouvirem, vezes sem fim, as mesmas dúvidas, os mesmos anseios e os mesmos pequenos triunfos. São as pessoas que são a nossa Casa. E eu tenho a sorte de a minha ser voltada a sul e com imensos quartos.

E ao Nuno, porque, no final do dia, sabemos que vai tudo correr bem quando conseguimos estar confortavelmente em silêncio. Acredito que são os quotidianos que nos definem. O melhor de tudo é saber que os nossos estão agora no início.

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INTRODUÇÃO 1

2.ENQUADRAMENTO TEÓRICO 2

2.1 O stress no trabalho 2

2.2 Intervenções e resultados 7

2.3 Teorias leigas e atribuições causais 12

3.MÉTODO 29 3.1. Estudo 1 29 3.1.1 Participantes 29 3.1.2 Instrumentos 30 3.1.3 Procedimento 32 3.2. Estudo 2 35 3.2.1 Participantes 35 3.2.2 Instrumentos 35 3.2.3. Procedimento 36

3.3 Qualidade dos estudos 37

4.RESULTADOS 39 4.1. Estudo 1 39 4.2. Estudo 2 64 5.DISCUSSÃO E CONCLUSÕES 71 6. REFERÊNCIAS 81 ANEXOS 85

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INTRODUÇÃO

Aquilo que os seres humanos pensam tem a capacidade de influenciar aquilo que escolhem fazer, em termos comportamentais. Esta ligação aparece reflectida em diferentes cenários e contextos de vida das pessoas, e tem sido estudada pela área da psicologia cognitiva.

Relativamente ao stress no trabalho, é possível que aquilo que se pense acerca deste conceito e a forma como é conceptualizado tenha repercussões a vários níveis. Desde logo, ao nível da própria experiência de stress individual e das estratégias de coping para lidar com ele. Para além disso, também ao nível organizacional, em termos da decisão de intervir ou não intervir nesta questão, de quais as intervenções preferencialmente realizadas e da avaliação da utilidade das mesmas.

Os Recursos Humanos e a Medicina do Trabalho são actores organizacionais indissociavelmente ligados às questões da saúde ocupacional. As suas funções e lugar na estrutura organizacional dão a estes profissionais o potencial para pensar as questões do stress no trabalho, para avaliar os seus níveis, para sugerir e implementar intervenções e programas relacionados com este fenómeno e para influenciar a própria cultura organizacional no sentido de valorizar esta temática. No entanto, a revisão da literatura efectuada não permitiu encontrar estudos realizados com estes profissionais, com o intuito de procurar precisamente aquilo que pensam sobre o stress no trabalho.

Para além destas considerações, importa referir a escassez de estudos qualitativos acerca do stress ocupacional. O foco quase exclusivo em abordagens quantitativas, no âmbitodos estudos na área da saúde ocupacional,é considerado como algo que limita as perguntas colocadas pelos investigadores e, consequentemente, o conhecimento acerca deste fenómeno. Assim, é importante que os investigadores tenham em consideração o(s) significado(s) de stress e saúde e o alcance das intervenções a este nível, em organizações concretas, procurando perceber como eles interferem na escolha de determinadasintervenções e na avaliação que é feita relativamente à sua utilidade.

No presente trabalho foram realizados dois estudos. No primeiro estudo, procuram-se as perspectivas daqueles que mais directamente estão relacionados com a saúde e bem-estar no trabalho, tendo sido realizada entrevistas a profissionais de Recursos Humanos ede Medicina do Trabalho. São estes, como já foi referido, que podem ter um papel decisivo de influência e de construção de significados na área da saúde ocupacional. O segundo estudo,

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realizado através de questionários online, tem como objectivo, por um lado, procurar novos dados junto de profissionais de RH no sentido de saber se há variabilidade e informação divergente relativamente ao primeiro estudo. Por outro lado, no segundo estudo foram também inquiridos estudantes, sendo queesta investigação representa igualmente uma tentativa de compreender se o pensamento de quem ainda não está a exercer a função profissional é semelhante àquilo que é referido por quem já a exerce.

Procura-se, assim, dar resposta a duas necessidades existentes na área da investigação acerca do stress no trabalho. Em primeiro lugar, à necessidade de estudar os significados associados ao conceito de stress através de uma abordagem qualitativa. Em segundo lugar, à necessidade de apreender as visões de profissionais muito específicos: aqueles que mais directamente estão relacionados com a saúde e bem-estar no trabalho, nomeadamente os profissionais de RH de medicina do trabalho.

Este trabalho divide-se em quatro grandes secções. Inicialmente é apresentado um breve enquadramento teórico, onde se explicitam os conhecimentos actuais sobre o stress no trabalho, bem como alguns estudos próximos daquele que aqui é apresentado. De seguida, descreve-se a metodologia de investigação utilizada em ambos os estudos para, posteriormente, se descreverem os resultados obtidos. Finalmente, as conclusões são apresentadas e discutidas, salientando-se aspectos interessantes para trabalhos futuros.

2. ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2.1 O stress no trabalho

A proliferação de estudos sobre o conceito de stress não foi acompanhada por uma definição partilhada pela comunidade científica (Chambel, 2005). Dentro das definições de stress, existem abordagens distintas que se focam também em aspectos diferentes do conceito de stress.

Em primeiro lugar, aparecem conceptualizações que encaram o conceito como um estímulo, ou seja, como condições adversas do meio, externas ao indivíduo e que geralmente implicam situações novas e intensas que requerem mudanças rápidas e inesperadas.

Outras definições apontam para o conceito de stress como uma resposta do organismo, em termos fisiológicos e psicológicos, perante os estímulos considerados stressores. Esta conceptualização advém da tradição médica de Seyle (1980, cit. in Ramos, 2001).

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3 Genericamente,este autor defende que os organismos, perante um agente novo, produzem uma resposta não-específica, designada Síndrome Geral de Adaptação. Este reflecte um reajustamento do organismo, uma reacção de defesa relativamente ao agente stressor. O facto de ser uma reacção não específica implica que esta seja provocada tanto por estímulos agradáveis como desagradáveis e que apresente sempre as mesmas características e manifestações, variando apenas no grau.

Estudos posteriores aos de Selye (Lazarus e Folkman, 1984), numa óptica mais psicológica, colocaram o foco na pessoa em situação, ou seja, no impacto psicológico do stress nos indivíduos e nas suas capacidades percebidas para lidar com a situação. Desta forma, considera-se que existe permanentemente uma avaliação cognitiva do balanço entre as exigências impostas pelo meio ambiente e o poder que a pessoa sente que tem para lidar com elas.O modo como cada um avalia cognitivamente o ambiente e os seus próprios recursos é um factor fundamental da experiência de stress. A pessoa avalia o impacto que as transacções com o ambiente podem ter no seu bem-estar, os recursos actuais e potenciais de que dispõe e os resultados das acções empreendidas e a empreender. Esta avaliação resulta de um conjunto de factores descritos pela Teoria Cognitiva (Beck & Emery, 1985), dos quais são exemplos a experiência passada, algumas características intrínsecas relativas ao processamento da informação ou as crenças, mais ou menos nucleares, dos indivíduos.

Actualmente, e no seguimento dos trabalhos de Lazarus, a maioria dos estudos do stress nas organizações adopta uma concepção interaccionista em que o stress pode ser, então, definido como “um tipo particular de relação entre a pessoa e o(s) seu(s) meio(s), marcada

pela percepção das exigências que cobrem ou excedem os seus recursos de coping e que pode perigar o seu bem-estar; Esta discrepância – entre o que a pessoa sente que lhe é pedido e o que julga poder dar – é sinalizada pelo organismo, em toda a sua globalidade e totalidade, isto é, aos níveis fisiológico (imunológico, neuronal, hormonal), psicológico (emocional, cognitivo, comportamental) e social (família, trabalho, comunidade)” (Ramos, 2001, p. 57).

Deve-se ainda aos estudos de Syele a distinção entre stress negativo, ou distress, e o stress positivo, ou eustress. O primeiro é regra geral aquele que povoa o discurso social e leigo (Rydstedt, Devereux e Furnham, 2004) acerca deste conceito, integrando o vocabulário comum da sociedade. Relaciona-se com um grau elevado de stress que é experienciado como desagradável, indesejável e bloqueador da acção. No entanto, em determinadas situações (e em níveis adequados) pode-se falar de eustress, stress experienciado como agradável (ou pelo menos como não desagradável) e que pode funcionar como uma alavanca da motivação e da

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acção. Segundo Ramos (2001), o stress, por definição, é neutro, revelando apenas uma relação não harmoniosa e um necessário investimento na aprendizagem, invenção e desenvolvimento de respostas psicológicas para a estabilização das trocas com o meio.

Vários foram os autores que se debruçaram sobre o estudo do stress no trabalho, procurando desenvolver explicações e modelos teóricos que o enquadrassem e fornecessem aos investigadores e pessoas que intervêm na área um quadro de referência para as suas investigações e acções. A motivação para investir nesta linha de pesquisa advém de algumas constatações basilares. Em primeiro lugar, as organizações que são financeiramente saudáveis são, com uma probabilidade elevada, aquelas que têm sucesso na manutenção e retenção de colaboradores talentosos que se caracterizam por uma boa saúde, física e psicológica (Cooper e Cartwright, 1994). Por outro lado, um número elevado de estudos acerca do stress no trabalho encontrou relação entre este e várias consequências: a prevalência de doenças coronárias, o esgotamento mental, insatisfação no trabalho, acidentes, absentismo, falta de produtividade, problemas familiares, entre outros.

Por último, a simples observação de alguns dados estatísticos é suficiente para evidenciar a importância dos estudos focados no stress no trabalho (Ramos, 2001).No nosso país, o segundo lugar no ranking de queixas associadas ao trabalho é ocupado pelo stress e pela fadiga; 1 em cada 4 trabalhadores europeus afirma sofrer de stress e as principais causas de morte (nomeadamente doenças e ataques de coração, situações cancerígenas e acidentes) associam-se a estilos de vida de stress.

Desta forma, estudar o stress no trabalho e as intervenções possíveis procura dar respostas à necessidade de manter uma força de trabalho saudável, motivada e produtiva, evitando consequências gravosas para o indivíduo e custosas para a organização.

Os trabalhos relacionados com o stress ocupacional têm procurado identificar as principais causas que estão na sua génese. Segundo Murphy (1995), o modelo actualmente utilizado pela NIOSH1 para guiar a investigação acerca do stress no trabalho lista um conjunto de factores organizacionais potenciadores de stress e que podem ser organizados em cinco grandes categorias, a partir das ideias de Cooper e Marshal (1978). Estes autores definiram seis grandes categorias de stressores organizacionais, sendo que o modelo da NIOSH trata uma delas (factores extrínsecos ao trabalho) separadamente de todas as outras. Estas categorias correspondem também ao factor “stress ocupacional” encontrado na organização de Danna e Griffin (1999). Uma vez que tal categorização tem tão ampla adesão da

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5 comunidade científica, será adoptada no presente trabalho para organizar a referência (necessariamente breve) aos factores organizacionais indutores de stress.

A primeira categoria diz respeito aos factores intrínsecos do trabalho, tanto em termos das suas condições físicas (iluminação, temperatura, organização, ruído, espaço) como das características inerentes ao trabalho (características da tarefa, sobrecarga ou subcarga de trabalho, horários alargados, ritmo de trabalho, trabalho repetitivo, turnos, novas tecnologias). O papel na organização tem sido também alvo de estudos relacionados com o stress ocupacional. Factores como a ambiguidade de papel, o conflito de papéis e a responsabilidade em relação a outras pessoas são recorrentemente referidos como potenciais causas de stress e associados a diversas consequências que serão referidas mais adiante. A terceira categoria integra, sob a designação de estrutura e clima organizacionais, a estrutura da organização, mais ou menos centralizada, o seu clima e cultura (por exemplo, de competitividade), o estilo de gestão, o trabalho em equipa e exigências de interacção e a violência no trabalho – não apenas física como também psicológica, nomeadamente a descriminação, exclusão ou o assédio. A lista de factores organizacionais potencialmente criadores de stress não estaria completa se não fizesse referência às relações interpessoais (com colegas, superiores ou subordinados), reflexo de toda a complexidade implicada nas relações humanas, nas suas emoções e nas mais variadas teias de comunicação. O quinto factor, desenvolvimento da

carreira profissional relaciona-se com a insegurança (cada vez mais uma realidade), com as

diferentes fases – início de carreira, manutenção da carreira, transições horizontais e verticais (Shein, 1971) fim da carreira, e com questões de formação insuficiente e situações de avaliação do desempenho.

Por último, importa referir alguns factores extrínsecos ao trabalho que nem por isso são menos relevantes: articulação trabalho-família, acontecimentos importantes ou traumáticos de vida, microstressores (pequenas questões e acontecimentos frustrantes comuns às transacções com o ambiente) e macrostressores (stressores de nível social como a taxa de pobreza, as politicas governamentais, etc.).

No que diz respeito às variáveis individuais que influenciam o stress, Ramos (2001), num trabalho de síntese, refere um conjunto de factores, nomeadamente a personalidade, o locus de controlo, a auto-estima, as expectativas de auto-eficácia, a avaliação cognitiva, as crenças religiosas, os estilos de coping,a competência,a afectividade negativa, o suporte social e determinadas características demográficas, entre outras. Estes factores permitem explicar a razão pela qual pessoas diferentes têm reacções díspares perante stressores idênticos,

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influenciando o modo como cada indivíduo avalia a situação indutora de stress e, consequentemente, a sua resposta de stress.

Em termos organizacionais, as consequências de níveis elevados de stress experimentados pelos membros de uma organização, resultantes da interacção entre factores organizacionais e a influência de certas variáveis individuais, podem ter elevados custos associados. Assim nos Estados Unidos, o absentismo, quebras de produtividade, indemnizações, processos em tribunal, seguros e despesas de saúde em consequência de situações de stress tem um custo anual de mais de 150 biliões de dólares (Pelletier e Lutz, 1990, cit. In Ramos, 2001). Em Portugal, dados do IDICT apontam para 3 mil milhões de euros gastos com acidentes de trabalho e cerca de 300milhões em subsídios e pensões de doença (Ramos, 2001). Sendo que nem todas estas situações são um efeito directo do stress, uma grande percentagem delas insere-se nesse grupo. Perante este tipo de dados, alguns autores chegam a afirmar que “elevadas taxas de stress entre os colaboradores podem

comprometer a eficácia organizacional, impedindo a sua viabilidade, rentabilidade ou liderança no mercado” (Peiró e Salvador, 1993, cit. in Chambel, 2005).

Ainda em termos das consequências, são múltiplas aquelas que se encontram ao nível dos indivíduos, sendo que níveis de stress elevados e prolongados se manifestam no domínio da saúde (Ramos, 2001), entendida em sentido lato e em conformidade com a definição da OMS2.Assim, ao nível individual, as consequências negativas do stress podem ser encontradas ao nível fisiológico, psicológico e social. De uma forma muito breve, e citando apenas alguns exemplos, podem ser referidas, como consequências ao nível fisiológico, o aumento da frequência cardíaca e da tensão arterial e muscular – com as consequentes dores musculares -, aumento do colesterol, problemas ao nível do sistema imunitário, com inibição do seu funcionamento, e do sistema digestivo, bem como perturbações de sono e da sexualidade. Já ao nível psicológico, as consequências do stress são múltiplas: labilidade afectiva, perturbações alimentares, irritabilidade e mau humor, ansiedade difusa, tristeza e/ou angústia, dificuldades de memória, concentração e de tomada de decisão, entre outras. Por último, destacando também a dimensão social da resposta de stress, encontram-se dificuldades conjugais, problemas ao nível da comunicação, isolamento, absentismo ou abandono da profissão, pouco investimento, interesse e rendimento profissionais, etc. Estes factores, tendo origem no sujeito, têm imenso impacte na própria organização.

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Para a Organização Mundial de Saúde, a saúde pode ser definida como um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença.

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7 Uma vez que o corpo e a mente humanas são um “sistema de vasos comunicantes”, todas as consequências negativas do stress têm um efeito aditivo ou multiplicativo, espalhando-se pelas diversas áreas da vida dos indivíduos e não se circunscrevendo apenas ao universo laboral. É precisamente no sentido de se combaterem as consequências do stress no trabalho que um conjunto de intervenções foram pensadas e desenvolvidas.

2.2 Intervenções e resultados

Se as organizações procuram criar ou manter nas melhores condições possíveis o bem-estar físico, social e psicológico dos seus elementos, então é fundamental investirem em políticas relacionadas com a saúde (Cooper e Cartright, 1994). Este investimento, seja feito por razões de cariz mais economicista (aumento da produtividade, diminuição do absentismo, prevenção contra acções legais) ou de cariz mais humanista (com o foco na satisfação e bem-estar dos trabalhadores per se), tem sido uma constante no mundo empresarial e industrial, assumindo a forma de programas diversos, com alvos variados e maior ou menor sucesso.

As intervenções ligadas à redução dos níveis de stress experimentados pelos indivíduos podem ser categorizadas em dois eixos: um primeiro, que define o alvo da intervenção (o indivíduo/ a organização) e um outro que se refere à estratégia de prevenção dessa mesma intervenção (primária, secundária ou terciária).

Segundo a definição de Ivancevich e colaboradores (1990, cit. In Ramos, 2001), as intervenções ao nível do stress são “qualquer actividade, programa ou oportunidade iniciada

por uma organização que se focaliza em reduzir a presença de stressores relacionados com o trabalho ou em assistir os indivíduos a minimizar os efeitos negativos da exposição a esses stressores” (p.181). Esta definição reflecte claramente o primeiro eixo mencionado: intervenções ao nível individual e intervenções ao nível organizacional.

As intervenções mais comuns são aquelas que se encontram ao nível individual, e cujo objectivo central é aumentar e fortalecer as estratégias de coping dos indivíduos. Geralmente designadas por “treino em gestão do stress”, ocorrem frequentemente em contexto de formação experiencial e focam-se em áreas como a educação para o stress (o que é o stress, como se manifesta, importância das percepções individuais), as estratégias cognitivas (reestruturação cognitiva, identificação e substituição de pensamentos automáticos negativos, etc.), as estratégias para redução da activação fisiológica (relaxamento muscular progressivo, técnicas de respiração, meditação. etc.), as estratégias de desenvolvimento de competências e

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alteração de hábitos de trabalho como a assertividade, negociação, gestão do tempo ou organização pessoal, competências interpessoais/comunicação3 (Ramos, 2001, Murphy, 1995, Schabracq, 2005, Beck e Emery, 1985, Servan-Schreiber, 2003). Em comum, todas estas estratégias se direccionam para o modo como os indivíduos percebem ou reagem a situações e ambientes stressantes, implicitando que aquelas são uma realidade perene e inalienável e que o combate às suas consequências negativas é da responsabilidade de cada um.

Em termos de resultados, alguns autores defendem convictamente este tipo de abordagem, particularmente as estratégias cognitivas, salientando os seus benefícios para a redução da ansiedade, perturbações de sono, queixas somáticas, níveis de tensão arterial e muscular (e.g. Van der Klink, Blonk, Schene & van Dijk, 2001). No entanto, para outros autores (Briner & Reynolds, 1999) este tipo de intervenções têm resultados pouco significativos, que tanto podem ser positivos como negativos.

Para além disso, o recurso exclusivo a este tipo de intervenções, trazendo ou não benefícios para os indivíduos (o que pode resultar não tanto do tipo de técnicas utilizadas como de variáveis tão distintas como o tipo e grau de queixas, a qualidade da formação ou a motivação dos indivíduos para aprender as estratégias de coping) traduz uma posição bastante confortável para as organizações, ao responsabilizar os indivíduos pelos seus sintomas de stress. Assim, sendo intervenções cujos custos são relativamente reduzidos e não implicando mudanças estruturais nem profundas (por exemplo, ao nível da cultura), não são dirigidas às origens organizacionais do stress: as causas mantêm-se e o que se procura é alterar o modo como elas são vivenciadas e geridas pelos indivíduos (e.g. Cooper & Carthright, 1994, Ramos, 2001; Murphy, 1995; Munz, Kohler e Greenberg,2001). Desta forma, intervir no stress no trabalho apenas ao nível individual é reforçar a ideia falaciosa de que, se as organizações são compostas por indivíduos, então a alteração dos indivíduos leva à alteração da organização, descurando a interacção iterativa entre estas duas entidades.

No outro extremo, as intervenções ao nível das organizações, ou os programas de gestão organizacional do stress, focalizam-se na alteração das condições organizacionais fontes de stress de maneira a minimizar as consequências negativas a elas associadas. A este nível destacam-se a alteração de características organizacionais (estrutura, selecção, programas de formação, etc.), a alteração das características do papel (redução da

3 Consideramos que as intervenções focalizadas nas competências interpessoais, nomeadamente nos padrões de comunicação das pessoas que constituem a empresa, podem ser entendidas como intervenções organizacionais, se houver uma alteração profunda na cultura da empresa a este nível, que introduza mudanças de segunda ordem (Caetano, 2001). Assim, consideramos que, se a intervenção ao nível das competências interpessoais permitir alterações no ambiente social, pode ser entendida como uma intervenção organizacional.

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9 ambiguidade, da sobrecarga, aumento da participação na tomada de decisão ou do nível de autonomia) e a alteração das características da função (reestruturação do trabalho, por exemplo) (Newman e Beehr, 1979).

Em termos de resultados, parece haver benefícios individuais (não apenas no que diz respeito à redução de respostas emocionais de stress, como também ao aumento da sensação de controlo dos indivíduos), redução do conflito e ambiguidade de papéis, maior identificação com as tarefas e menor número de erros cometidos e também financeiros, em termos de relação custo-benefício. No entanto, tal como acontece relativamente aos resultados positivos das intervenções ao nível individual, existem também autores que não partilham desta onda de entusiasmo relativamente aos bons resultados encontrados nas intervenções organizacionais. Briner e Reynolds (1999) consideram que existem problemas metodológicos e conceptuais na grande maioria dos estudos relacionados com o stress no trabalho e que os resultados das investigações acerca das intervenções organizacionais para redução do stress não são unívocos, apesar de a literatura ter a tendência a sugerir que estes tipos de intervenções são mais eficazes. Também para Cox, Karanika, Griffiths, Houdmont, (2007), estes estudos estão revestidos de problemas metodológicos e de construção do design experimental.

Biron, Cooper e Bond (2009) reforçam a ideia de que não existem dados empíricos suficientemente robustos para avaliar o impacte das intervenções ao nível organizacional, sendo que defendem a realização de mais estudos a este nível. Os autores dizem ainda que as revisões da literatura efectuadas neste campo apontam para resultados inconsistentes, quando se comparam intervenções ao nível organizacional e individual. Assim, concluem que, se

work related interventions have the potential for positive effects but it is difficult to predict

specifically which outcomes are likely to be affected by which changes (p. 448), então urge

pensar nos mediadores e moderadores potencialmente influentes no sucesso ou insucesso destas intervenções.

Perante este tipo de considerações, alguns autores(e.g. Munz e cols., 2001; Noblet e Lamontagne, 2009) defendem que os programas de combate ao stress no trabalho devem ser dirigidos ao interface indivíduo/ organização. De facto, considerando que existe uma relação recíproca entre indivíduos e organizações, não é possível desenhar qualquer tipo de intervenção que não tenha em consideração a interacção permanente entre estas duas entidades. Desta forma, se os stressores organizacionais afectam negativamente o bem-estar das pessoas, os indivíduos menos equilibrados e com problemas de saúde afectam a vitalidade e a produtividade das organizações. Daí que “a assunção da interdependência entre a saúde

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organizacional e individual [seja] uma das premissas basilares sobre a qual se sustém qualquer intervenção de redução do stress” (Ramos, 2001, p. 188).

O segundo eixo refere-se ao momento escolhido para realizar a intervenção, que reflecte o tipo de prevenção que cada intervenção traduz. Existem diferentes intervenções em stress no trabalho, que se distinguem por serem dirigidas a diferentes fases do processo de stress (Cooper e Carthright, 1994), tendo como objectivos abrandar, parar ou inverter a sua progressão (Ramos, 2001).

Assim, as intervenções ao nível da prevenção primária acontecem antes da instalação de perturbações relacionadas com o stress, orientando-se para a redução das fontes organizacionais de stress e do seu impacte no indivíduo e, ao mesmo tempo, para o fortalecimento da resistência deste. Este tipo de intervenção pode impulsionar uma mudança de cultura e concretiza-se, a título de exemplo, em alterações nos horários de trabalho, na carga e no ritmo de trabalho, no ambiente social e no conteúdo das tarefas. É também neste “bloco” que se incluem as técnicas de relaxamento, o exercício físico, programas de alteração alimentar, etc. Os poucos estudos empíricos acerca deste nível de prevenção têm sido consistentes na demonstração do seu carácter positivo, principalmente a longo prazo (Cooper e Carthright, 1994).

A prevenção secundária tem como alvo os primeiros indícios de perturbações, procurando detectá-los precocemente de forma a ser possível controlá-los, minimizando as suas consequências. O objectivo deste nível de prevenção é, então, o “controlo de danos”, procurando aumentar a resistência individual e munir as pessoas de ferramentas importantes para a adaptação a determinadas características do meio, que se assumem como uma realidade inalterável.

Por último, a prevenção terciária ocorre quando as intervenções têm como objectivo dar assistência a indivíduos que sofram já das consequências negativas e perturbações associadas ao stress no trabalho, minimizando o seu desconforto e os custos organizacionais associados. Assim, encontram-se, por exemplo, os programas de assistência aos trabalhadores (Employee Assistance Programs - EAP’s - originários dos Estados Unidos da América e primeiramente direccionados para problemas de abuso de substâncias por parte dos colaboradores (Murphy, 1995), que incluem aconselhamento/ psicoterapia, e ainda o recurso a cuidados médicos. Existem algumas evidências do sucesso destas intervenções, que alastram a domínios extra-trabalho (Cooper e Carthright, 1997).

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11 Cruzando estes dois eixos, outros autores classificam os programas de prevenção do stress em quatro quadrantes, em função do alvo da intervenção e do nível de prevenção (Geurts e Grundemann, 1999): Nível de Prevenção Primária Secundária/terciária A m bi en te d e tr ab al ho Quadrante 1

Intervenção nos factores organizacionais de stress (mudança do conteúdo do trabalho, participação nas decisões, flexibilização dos horários,...)

Quadrante 2

Semelhantes às do quadrante 1, mas realizadas por haver indivíduos com sinais de stress.

A lv o da in te rv en çã o In di du o/ gr up o Quadrante 3

“Treino em gestão do stress” e “programas de prevenção da saúde” (promoção de estratégias de coping, exercício físico,

técnicas de gestão de stress)

Quadrante 4

Intervenções individualizadas (cuidados médicos, psicoterapia, aconselhamento)

Quadro 1 – Quatro quadrantes das intervenções(Geurts e Grundemann, 1999)

O quadro reproduzido proporciona uma visão de conjunto interessante das intervenções em stress no trabalho. Em Portugal, segundo Ramos (2001), as intervenções mais frequentes são as que se inserem do âmbito do quadrante 3 e que são dirigidas a grupos de indivíduos, nomeadamente o exercício físico e o “treino em gestão do stress”.

No entanto, pode considerar-se que as intervenções apresentadas no quadrante 3 enquanto estratégias de prevenção primária, não são exclusivas desse mesmo quadrante. Assim, tal como é referido para as intervenções no ambiente de trabalho, o treino em gestão de stress ou os programas de promoção da saúde podem ser implementados como prevenção primária mas também como prevenção secundária, quando os indivíduos apresentam já alguns sinais e sintomas de stress. Desta forma, parece que as intervenções primárias, secundárias ou terciárias podem não ser distintas entre si tanto em termos de “conteúdo”, mas essencialmente em termos do timing em que são aplicadas e na intenção com que nelas se investe. Neste sentido, o facto de em Portugal serem mais comuns as intervenções em treino de gestão de stress não traz qualquer informação acerca da intencionalidade destes programas em termos de prevenção e, por acréscimo, acerca das concepções de stress e das percepções de

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responsabilidade organizacional em termos de saúde e bem-estar dos colaboradores que lhes subjazem.

Em termos gerais, as organizações realizam essencialmente intervenções ao nível individual, sendo raras as direccionadas para a redução dos stressores organizacionais. Existem também consideravelmente mais estudos publicados acerca dos benefícios e custos das intervenções secundárias e terciárias. Esta tendência parece reflectir um conceito idiossincrático e subjectivo de stress (Cooper e Carthright, 1994), como algo relacionado exclusivamente com a avaliação cognitiva dos indivíduos. Assim, as organizações, ao mesmo tempo que mostram que “fazem alguma coisa”, evitam situações mais complexas, mais caras e mais radicais. Para além disso, alguns autores consideram que esta discrepância se deve ao facto de os responsáveis pela saúde em contexto laboral, sendo na sua maioria psicólogos ou médicos, se restringirem às suas áreas de conhecimento, não avançando para intervenções de mudança organizacional (Cooper e Carthright, 1994). Contudo, existe ainda uma diferença interessante entre prevenção secundária e terciária, havendo uma tendência geral para intervir mais ao nível secundário, sendo que o nível terciário é encarado por algumas organizações como algo que, por diversas razões, está fora do seu âmbito de acção (Gyllensten, 2005).

2.3 Teorias leigas e atribuições causais

Apesar de o stress no trabalho ser, como já foi descrito, um fenómeno com consequências gravosas tanto para o indivíduo como para a organização, e de haver já um corpo considerável de literatura focada nas intervenções possíveis, existem poucos relatos de intervenções bem sucedidas neste âmbito (Noblet e Lamontagne, 2009). Coloca-se, portanto, a questão de tentar perceber o que leva a que estas intervenções sejam ou não adoptadas e o que condiciona o seu sucesso. Para além disso, como referem Dewe e O’Driscoll (2002), pouco se sabe acerca do que é considerado uma intervenção eficaz, tanto para quem a promove como para quem é alvo dela: aumento de produtividade, aumento do bem-estar subjectivo, diminuição da sintomatologia fisiológica?

É defendido neste trabalho que o facto de se considerar o stress no trabalho como um assunto relevante, de se adoptar determinada intervenção específica para o combater ou o modo como os resultados dessas intervenções são avaliados decorre em grande parte daquilo que quem as programa ou quem as vive pensa relativamente ao próprio conceito de stress, às suas causas, consequências e ao papel da organização.

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13 Neste sentido, também Perrewé e Zellers (1999) defendem que a investigação acerca do stress ocupacional se deve centrar não tanto na avaliação dos stressores objectivos mas essencialmente nas atribuições feitas pelos indivíduos relativamente a esses mesmos stressores e nas consequentes emoções associadas. Se Biron, Cooper e Bond (2009) alertam para o interesse de procurar variáveis mediadoras e moderadoras do sucesso dos projectos de intervenção em stress, Perrewé e Zellars (1999) sugerem que as atribuições causais percebidas relativamente às causas do stress ocupacional e as emoções associadas possam ser precisamente uma destas variáveis mediadoras, neste caso entre a avaliação primária do sentimento de stress feita pelos indivíduos e a consequente avaliação das diversas estratégias de coping disponíveis. Perrewé e Zellars (1999) propõem assim um modelo de stress ocupacional baseado nas ideias de Lazarus (1984) e na teoria da atribuição (Weiner, 1979) que procura explicar o tipo de coping preferencialmente utilizado pelos indivíduos em função das atribuições causais relacionadas com o stress em termos da sua internalidade/externalidade e da percepção de controlabilidade e em função das emoções subsequentemente geradas por estas atribuições. Não estando isentos de críticas (para uma revisão, ver Frese e Zapf, 1999), sugerem que, quando as atribuições causais implicam o sentimento de controlo sobre a situação e um consequente sentimento de culpa, os indivíduos se sentiriam mais motivados para procurar activamente alterar a situação por se sentirem responsáveis por ela (coping focado na resolução de problemas). Pelo contrário, pessoas que sentem que não detêm qualquer controlo sobre a situação ou que os seus recursos são insuficientes, tenderiam a distanciar-se e evitar o stressor, alterando apenas o modo como interpretam a situação (por exemplo, focando-se exclusivamente nos elementos positivos do trabalho) e não a situação em si (coping focado nas emoções).

Assim, é possível que a própria decisão de intervir ou não no stress no trabalho por parte de quem tem possibilidade de sugerir, planear e efectuar as intervenções, possa decorrer da crença de que é da responsabilidade da organização fazê-lo, e não apenas do próprio indivíduo. Neste sentido, as organizações mais comprometidas com as intervenções em stress serão aquelas que consideram que está nas suas mãos e faz parte das suas responsabilidades ter em conta o stress dos seus colaboradores e que colocam este assunto no topo das suas prioridades. Independentemente das crenças acerca da responsabilidade organizacional ou individual, crenças relativas ao facto de o stress ser um fenómeno bom ou mau entram também em jogo na escolha das intervenções a realizar – se considerar o stress como algo inexoravelmente mau, então terei maior tendência a querer eliminá-lo ou controlá-lo do que se

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o considerar como algo inerente ao trabalho e que inclusivamente pode potenciar o desempenho e a motivação.

Por último, a própria detecção da existência de stress no local de trabalho é totalmente dependente do modo como se percepciona o significado do conceito – como um estímulo, como uma resposta ou como a interacção entre a situação e a avaliação cognitiva que o indivíduo dela faz. Assim, alguém que considere que a ergonomia ou a segurança se relacionam positivamente com o aumento ou redução de stress estará alerta para as situações em que haja alguma falha nestas questões, contrariamente a alguém que considere que o stress é um conjunto de reacções emocionais exacerbadas, como a irritabilidade ou a cólera. Este último indivíduo, possivelmente não considerará que o facto de haver postos de trabalho com deficiências ergonómicas aponte para a existência de stress e poderá apenas detectá-lo quando se verifique uma degradação do ambiente de trabalho.

Contudo, não existem muitas pesquisas e investigações acerca do modo efectivo como as organizações ou os seus empregados percepcionam o stress no trabalho e as intervenções a esse nível, sendo que esta lacuna pode estar na base do pouco êxito de algumas das intervenções realizadas.Sem um conhecimento em profundidade do(s) significado(s) de stress para as pessoas envolvidas nessas intervenções, dificilmente se compreende o modo como esses significados interferem com a escolha de determinadas intervenções, com o comprometimento com as mesmas e com a avaliação que é feita relativamente à sua utilidade e interesse. Desta forma, de modo a compreender o complexo processo de stress organizacional, é importante desenvolver pesquisas que se foquem no modo como os eventos são avaliados, bem como nas cognições, atribuições e emoções a eles associados (Harkness, 2005).

Nas palavras de Furnham (1997), while it may be argued that it is much more

important and useful to study what actually causes work stress than what people think causes stress, it is quite possible that lay theories play an importat role in the aetiology and reporting of stress (p. 68).

As teorias leigas em ciências sociais traduzem-se em explicações implícitas, informais e “não científicas” de fenómenos comportamentais. Estas teorias existem paralelamente às explicações explícitas e formais dadas pelas teorias científicas e apresentam sobreposições com elas, sendo que a sua função é a criação de relações de causa-efeito que permitam facilmente atribuir responsabilidades, avaliar a culpa ou elogiar o comportamento de alguém (Kinnman, 2005). Estas explicações da realidade moldam as expectativas e o

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15 comportamento das pessoas, podendo actuar como profecias que se auto-cumprem. Assim, tem-se, por exemplo, verificado que as crenças dos pacientes relacionadas com a saúde interferem e condicionam as suas decisões em termos de que médico consultar, do cumprimento das suas instruções e dos comportamentos relacionados com a promoção da saúde (Furnham, 1997).

Relativamente ao stress, a mesma variabilidade a que se assiste no campo científico, em que não existe um consenso forte dentro da comunidade acerca do significado preciso deste conceito, é reflectida nas concepções leigas do mesmo, havendo igual dispersão no modo de compreender o stress (Pollock, 1988, cit in Kinnman, 2005).

A importância do conhecimento do conteúdo das teorias leigas relacionadas com o stress é reforçada por dois factores fundamentais. Por um lado, o conceito de stress é utilizado recorrentemente nos nossos dias de formas diversas (nomeadamente como a causa de um amplo conjunto de doenças e mal-estar, como a consequência de um ritmo de vida e trabalho acelerado, uma “epidemia com custos económicos”, como algo necessário e inerente ao quotidiano, etc.) e em diferentes contextos, que vão desde o consultório médico até às revistas de divulgação com maior ou menor qualidade e rigor. Assim, uma vez que proliferam as “vozes” e discursos sobre o stress, considera-se que o modo como este é percebido e gerido no contexto das próprias organizações não é apenas baseado nos conhecimentos científicos mas também em factores políticos e sociais (Lewig e Dollard, 2001). Por outro lado, a própria definição interaccionista de stress (Lazarus e Folkman, 1984) adoptada neste trabalho, refere que nenhum elemento do ambiente externo pode ser identificado com um stressor sem se considerar a avaliação individual, enquanto processo de negociação activa entre o ambiente externo e os objectivos e crenças do indivíduo. Desta forma, a percepção subjectiva e avaliação de um potencial stressor são condicionantes inalienáveis da experiência de stress e das acções e comportamentos individuais face a essa experiência. Desta forma, as teorias leigas podem ser teoricamente conceptualizadas como um dos aspectos desta avaliação cognitiva referida por Lazarus (Rydstet et al., 2004).

Se os Recursos Humanos (RH) e a Medicina do Trabalho (MT) são actores organizacionais que podem ter uma maior probabilidade de promover as intervenções em stress no trabalho, interessa assim tentar compreender o que pode influenciar a motivação destes actores para efectivamente realizarem ou prescreverem essas mesmas intervenções e para escolherem determinadas intervenções em detrimento de outras. Neste sentido, para além do conceito de teorias leigas, a teoria da atribuição (Weiner, 1979) é igualmente importante

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para enquadrar algumas considerações, tal como foi utilizada por Perrewé e Zeller (1999) na construção de um modelo teórico relacionado com a escolha de estratégias de coping pelos colaboradores, em função da atribuição causal realizada relativamente aos stressores. A premissa básica desta teoria é a de que os indivíduos procuram explicações para os acontecimentos importantes que vivem e que observam. O mesmo é dizer que os seres humanos buscam permanentemente compreender as causas do seu comportamento e do comportamento dos outros. Associada a esta ideia, a teoria da atribuição defende que a percepção ou atribuição de causas diferentes aos acontecimentos gera também diferentes

outcomes, desde respostas comportamentais, até respostas emocionais e juízos de valor acerca de si e dos outros.

Assim, se de facto importa perceber o que pensam os RH e MT acerca do stress no trabalho, a sua percepção acerca do que podem ser as causas deste fenómeno pode ter uma relevância particular na compreensão daquilo que por eles é ou não feito relativamente àquela questão.

Seguindo as ideias de Weiner4 (1979), encontram-se três dimensões essenciais das atribuições causais feitas pelos indivíduos5. Uma das dimensões engloba a classificação das causas em causas internas e em causas externas. Uma vez que esta teoria se foca nos indivíduos isoladamente, a dimensão interna-externa reflecte as atribuições feitas a causas percepcionadas como inerentes e indissociáveis da pessoa ou a causas que lhe são alheias, respectivamente.

Relativamente ao stress no trabalho, as causas atribuídas aos indivíduos são internas quando se referem, por exemplo, à predisposição genética, à personalidade, à sua maior ou menor capacidade de utilizar estratégias de coping, etc. que influenciam a magnitude da sua resposta de stress. Já as causas externas são todas as outras cuja génese se não se encontra no indivíduo e equivalem de certa forma à concepção de stress como um estímulo. No entanto, e para objectivos do presente trabalho, é relevante introduzir uma outra divisão, uma vez que se assume pela comunidade científica que existem dois grandes grupos de causas do stress no

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Este autor trabalhou a questão da teoria da atribuição essencialmente em contexto escolar, no sentido de explorar a sua influência não só no desempenho mas também na motivação dos alunos. Não é objectivo do presente trabalho fazer uma revisão exaustiva dos contributos de Weiner ou de outros autores relevantes para esta teoria, nem debruçar-se sobre algumas questões conceptuais por ele levantadas (e.g. conceito de locus de controlo), mas sim procurar enquadrá-la no âmbito da presente reflexão acerca das percepções sobre stress no trabalho. Neste sentido, algumas das ideias expostas pelo autor não serão abordadas.

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Cada dimensão será abordada separadamente por objectivos de estruturação lógica do texto. Contudo, é a compreensão conjunta das três dimensões e dos seus interfaces que traz permite uma leitura e compreensões mais ricas.

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17 trabalho: as causas relacionadas com o indivíduo e as causas organizacionais, já referidas anteriormente. Neste sentido, e encarando o problema da perspectiva do indivíduo, para além de considerar as causas individuais internas, também se justifica dividir as causas “externas” ao indivíduo em dois grandes blocos. Um primeiro bloco que englobe todas as causas externas mas que se relacionem apenas com a vida dos indivíduos específicos e não com a organização (pequenos problemas familiares, acontecimentos importantes de vida como o divórcio ou o nascimento de um filho) – causas individuais externas- e um outro grande bloco relacionado com as causas organizacionais. Dentro destas, estão aquelas que são internas à organização (organização do trabalho, tipo de função, relações interpessoais, hierarquia, sistema de recompensas, etc.) – causas organizacionais- e as que lhe são externas, relacionadas acima de tudo com a sociedade actual no sentido mais lato (o consumismo, o trânsito, as condições económicas globais, etc.) – causas externas.

Em termos de consequências das atribuições causais a aspectos mais internos ou externos, Weiner (1979) refere a sua ligação com a afectividade e com a magnitude de determinadas reacções emocionais dos indivíduos perante a percepção de sucesso ou de fracasso académico ou profissional. Se poderia ser um caminho de investigação interessante pensar as reacções emocionais dos trabalhadores ou das hierarquias perante situações de stress vividas ou observadas em função das atribuições internas ou externas de causalidade (nas quatro possibilidades referidas: causas individuais internas, causas individuais externas, causas organizacionais e causas externas), não é esse o foco do presente trabalho e, portanto, não será aprofundado o pensamento de Weiner acerca destas questões.

No entanto, ressalve-se que parece plausível que esta dimensão da atribuição esteja relacionada com o conceito de responsabilidade, no que diz respeito ao stress no trabalho. Assim, é possível equacionar que pessoas que atribuam ao stress acima de tudo causas organizacionais considerem que a responsabilidade de lidar com ele seja da própria organização, bem como pessoas que atribuam ao stress causas maioritariamente individuais internas a atribuam ao próprio indivíduo. Para além disto, é também possível que a percepção de causas externas ao indivíduo e à organização possa também ser a génese de crenças relacionadas com a responsabilidade individual de gerir o stress. Apesar de não serem causas directamente ou exclusivamente relacionadas com o indivíduo também não são causas que possam ser imputáveis à organização. Neste sentido, recorrendo à ideia da utilização retórica do termo stress (Barley e Knigth, 1992), é possível que os indivíduos com posições hierárquicas mais elevadas considerem que todas as causas que não sejam internas à

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organização não sejam da sua responsabilidade, o que, mesmo que se considere que existem algumas causas organizacionais para este fenómeno, aumenta em muito o número de situações em que a responsabilidade é atribuída aos indivíduos e pode eventualmente explicar os resultados dos estudos apresentados previamente acerca desta questão.

De ressalvar ainda que existem questões de ideologia pessoal que podem influenciar estas atribuições causais. Independentemente de se considerarem causas organizacionais ou de se considerarem causas individuais (internas ou externas), os RH ou os MT podem assumir que a organização tem sempre uma responsabilidade ao nível social e moral de facilitar o combate ao stress por parte dos seus colaboradores ou que, pelo contrário, essa missão se encontra fora do seu âmbito de acção. De qualquer forma, a dimensão internalidade/externalidade pode influenciar de alguma forma a alocação da responsabilidade de gerir o stress no trabalho.Pensando as causas do stress no trabalho nas quatro dimensões referidas, existe uma área muito menor de causas exclusivamente organizacionais – e portanto, em teoria, sob a sua responsabilidade - do que de causas que sejam externas à organização e, assim, com maior facilidade de rejeitar a responsabilidade de intervir nelas.

Uma outra dimensão da teoria da atribuição diz respeito à estabilidade ou instabilidade das causas percebidas, ou seja, à eventual possibilidade de essas causas serem alteradas e modificadas por acção do tempo ou de qualquer outro agente. Assim, causas estáveis serão todas aquelas que são imutáveis e que existem independentemente do contexto ou do indivíduo e, pelo contrário, as causas instáveis são todas aquelas que podem ser alvo de alterações. De notar que Weiner refere que as propriedades percebidas de uma causa têm sempre um carácter de avaliação subjectiva que deve ser tido em consideração. Assim, por exemplo, o humor (mood) pode ser considerado por um indivíduo como uma causa estável (assumindo que o humor de uma pessoa é um traço) ou como uma causa instável, se for encarado como um estado. Torna-se assim importante contextualizar as atribuições realizadas em termos de estabilidade para que o seu significado possa ser compreendido.

Quanto ao stress no trabalho, objecto de reflexão desta investigação, a ideia anterior é igualmente válida. Por exemplo, e assumindo claramente uma avaliação subjectiva, “a pressão incutida pelas chefias, os objectivos exageradamente exigentes” pode ser encarada como uma causa estável (no seguimento de um raciocínio do tipo: “num sociedade competitiva como a nossa, temos que ter sempre estes objectivos, senão a empresa morre”) ou instável, se vier no seguimento de um pensamento do género: “algumas chefias exigem demasiado dos colaboradores, na lógica do produzir cada vez mais, e essas criam-lhes stress”. No presente

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19 trabalho optou-se por não procurar classificar as atribuições causais dos participantes nesta dimensão, precisamente devido ao carácter extremamente subjectivo que este juízo implicaria. Contudo, parece relevante problematizar esta dimensão, essencialmente para enquadrar a reflexão realizada e eventualmente abrir caminho a novas e futuras investigações.

Por último, refira-se a dimensão controlabilidade/ incontrolabilidade. Grosso modo, as causas das situações vividas e/ou observadas podem ser atribuídas a factores que estão sob o controlo das entidades que as enquadram ou, pelo contrário, a factores que não estão sob a influência dos indivíduos. Na teoria da atribuição, e contrariamente às duas dimensões já referidas que implicam inferências acerca do próprio indivíduo (ou da organização, neste caso específico, no sentido em que quem fala o pode fazer em nome da empresa), esta dimensão é caracterizada como sendo a única que permite fazer julgamentos acerca do outro e, consequentemente, como influenciando as reacções e comportamentos manifestados em relação a esse outro. Uma vez que a decisão, por parte dos RH ou dos MT,de intervir ou não intervir no stress no trabalho é dirigida essencialmente aos outros, esta é uma dimensão muito importante para a compreensão do modo como aquilo que os RH e MT pensam acerca do stress influencia aquilo que podem fazer e que efectivamente fazem.

De facto, verifica-se que o comportamento de ajuda tem uma maior probabilidade de acontecer quando a causa percebida de necessidade é, por um lado, externa ao indivíduo e, por outro, não está sob o controlo do indivíduo. Assim, é possível que exista uma maior motivação para intervir no stress no trabalho precisamente quando se considera que os colaboradores experienciam stress devido a causas que lhes são alheias (ou seja, causas organizacionais) e quando estas mesmas causas não são percepcionadas como controláveis pelos indivíduos. Já causas organizacionais que possam ser percepcionadas como controláveis pelos próprios indivíduos terão possivelmente menor probabilidade de ser encaradas como objecto de intervenção e de ajuda por parte da organização.

Esta ideia leva de novo a ponderar a questão da responsabilidade percebida. Deste modo, se por um lado, como já foi equacionado, no que diz respeito à internalidade/ externalidade, apenas uma em quatro combinações possíveis de causas (causas organizacionais) tem maior probabilidade de se relacionar com a percepção de responsabilidade organizacional (e consequentemente de gerar o investimento organizacional em intervenções a este nível), dentro destas causas organizacionais apenas algumas delas serão percepcionadas como incontroláveis pelos indivíduos, o que afunila ainda mais a gama de situações em que existe alguma probabilidade de haver intervenção por parte da

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organização. De facto, a auto-percepção de controlo aparece relacionada com a procura activa de informação e com a liberdade de escolha. Esta questão pode ser ainda pensada considerando que a auto-atribuição da responsabilidade aumenta a probabilidade de o indivíduo (ou, para a presente reflexão, a organização) agir bem como o sentimento de “gostar” de o fazer.

No entanto, é importante ressalvar que a avaliação de uma causa em termos de controlabilidade ou incontrolabilidade não é isenta de um grau de subjectividade a considerar. Assim, é possível pensar esta dimensão desde que se saiba de forma clara qual é a avaliação de controlabilidade/ incontrolabilidade que é efectivamente feita pelos indivíduos relativamente a causas particulares. Dois indivíduos diferentes, por diversas razões, podem considerar uma mesma causa (por exemplo, as condições ergonómicas ou as relações entre colegas) controlável ou incontrolável. Uma vez que este estudo não permite controlar e identificar estas atribuições, e por se considerar ser difícil e arriscado assumir atribuições “absolutas” (uma determinada causa ser sempre, em qualquer contexto e para qualquer indivíduo uma causa controlável ou incontrolável), e tal como relativamente à dimensão estabilidade/ instabilidade, não será considerada na análise dos resultados, deixando de novo uma pista para futuras investigações.

Apesar de haver um número considerável de trabalhos acerca das conceptualizações de stress (fora do trabalho) (Kinnman, 2005), as investigações acerca das teorias leigas acerca do stress no contexto de trabalho e das intervenções neste âmbito são bem reduzidas.

No entanto, alguns autores têm procurado perceber quais são, efectivamente, as teorias leigas, os discursos dominantes e as atribuições causais relativamente ao stress nas organizações e que consequências é que estas variáveis têm na vivência de stress, nas políticas seguidas pelas organizações e nas eventuais intervenções realizadas a este nível. Esta busca torna-se mais interessante quando se considera, por um lado, o facto de haver várias mensagens disseminadas pelos media, por vezes contraditórias acerca do stress (ex. o stress é responsável por doenças graves vs. o stress é uma força motivadora ou o stress deve-se a condições desfavoráveis de trabalho vs. os indivíduos podem eliminar o stress através de determinadas estratégias, etc. (Lewig e Dollard, 2001) e, por outro lado, um conjunto de estereótipos relacionados com este conceito, mais ou menos partilhados pelos indivíduos nas organizações – quem não se mostra stressado é considerado menos empenhado no trabalho, por exemplo (Harkness, 2005).

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21 Até à data, a revisão da literatura permitiu localizar cinco estudos sobre esta tematica, sendo que relativamente a um deles (Sharpeley e Gardner, 2001) não foi possível aceder à fonte original.

Furnham (1997) realizou um estudo com 134 trabalhadores de diversas áreas, com o intuito de investigar as teorias leigas acerca do stress ocupacional. Foi pedido aos participantes para completarem um questionário dividido em quatro partes indicando o grau em que concordavam ou discordavam de um conjunto de frases relacionadas com o stress no trabalho. As quatro partes do questionário correspondiam à divisão dos itens em quatro categorias: causas, manifestações, consequências e modos de aliviar o stress. Através da realização de uma análise factorial, o autor reportou a emergência de factores específicos dentro de cada uma destas categorias. Assim, relativamente às causas de stress ocupacional surgiram cinco factores: Conflito e Satisfação com o trabalho (responsável por 21% da variância); Desenvolvimento da Carreira - posição hierárquica, anos de serviço, etc. - e Subgrupos demográficos – relacionados com pertencer a uma minoria dentro da organização -, cada um deles percebido como causas moderadas de stress; por último-, Perigo e Intimidação - perigo físico ou assédio – e Autoridade. Estas causas são essencialmente causas organizacionais.

Pelo contrário, relativamente às manifestações de stress, os factores que emergiram deste estudo são claramente psicológicos: Intolerância e falta de paciência, Ansiedade e medo de interacção, Negação (referindo-se essencialmente ao abuso de substâncias como forma de “fugir” aos problemas), Depressão e intolerância e Perda de energia e concentração. Também as consequências de stress no trabalho, agrupadas em quatro factores, remetem maioritariamente para a dimensão psicológica: Consequências físicas e externas (relacionadas com “mau aspecto” físico e com absentismo), Desânimo e falta de controlo, Auto-destruição e Perca de auto-estima.

Por último, os modos de aliviar o stress parecem poder ser divididos de novo em quatro factores: Controlo interno (“força de vontade”), Auto-ajuda, Procura de ajuda profissional e Vergonha (no sentido de propulsionar a busca da resolução da situação). Todos estes factores partilham o facto de, independentemente de as causas do stress serem percebidas como maioritariamente organizacionais, colocar a responsabilidade de resolução da situação no próprio indivíduo, tal como as consequências e manifestações de stress já tinha sido pensadas neste enquadramento.

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De notar que este estudo foi realizado apenas com trabalhadores. É o próprio autor que, numa referência a investigações futuras, refere que the beliefs of employers as to what

causes stress may be quite different from the ideas of employees (p. 77).

Harkness (2005) foi outra autora que procurou perceber de que modo o stress ocupacional é percebido pelos trabalhadores, optando por realizar uma investigação qualitativa recorrendo à análise de discurso. A autora realizou focus groups com um grupo de 22 secretárias canadianas, colocando um conjunto de questões divididas em dois grandes blocos: um primeiro bloco focado nas imagens de stress no trabalho das participantes, nos momentos em que o stress é sentido e nas mensagens veiculadas pela sociedade acerca deste fenómeno e um segundo bloco relacionado com a resposta das participantes ao modo como o stress é descrito pelos media, com as consequências da ausência de stress e com as suas experiências relativamente à expressão de emoção no contexto de trabalho. Os seus resultados são bastante interessantes e revelam a existência de duas grandes “linhas de pensamento” relativamente ao stress no trabalho que resultam num dilema. Assim, por um lado, as participantes do estudo indicaram que sentir stress no trabalho é algo absolutamente normal, sendo que o oposto seria mais estranho. Para além disso, consideram que muitas vezes o desempenho e eficácia dos trabalhadores dentro das organizações são avaliados precisamente pela “quantidade” de stress demonstrado. Por outro lado, a segunda grande “linha” implica a noção de que mostrar que se está sob stress no trabalho, ou seja, mostrar incapacidade de lidar com este fenómeno, é considerado anormal e inaceitável, sendo algo que revela que a pessoa é frágil ou incompetente. Apesar de referirem que os indivíduos, para serem considerados eficazes e “fortes” devem conseguir demonstrar que conseguem eles próprios desenvolver estratégias de coping, estas secretárias reportam ainda que é da responsabilidade das chefias ter em consideração a questão do stress, melhorando as condições de trabalho, essencialmente porque este é um assunto com implicações para a saúde dos trabalhadores. Já as soluções efectivamente oferecidas pelas organizações em que trabalham e popularizadas pelos media (fazer pausas, planear e gerir o tempo, etc.) são desvalorizadas e consideradas irrealistas, para além de que o facto de as utilizar implica a criação de um rótulo de “causador de problemas”. Para estas participantes a chave do problema reside na comunicação e respeito no local de trabalho.

Perante estes resultados, a autora conclui que, por um lado, o discurso acerca do stress é socialmente aceite e utilizado como forma de demonstrar emoções negativas ou desconforto no trabalho, sem causar tumulto ou ofender a organização e as chefias. É assim uma forma de

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Tabela 1. Temas das perguntas do guião da entrevista
Tabela 2. Síntese dos principais resultados
Tabela 5. Consequências específicas de stress no trabalho
Tabela 6 – Atribuição da responsabilidade por lidar com o stress
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Referências

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