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ESTUDO COMPARATIVO DA ORGANIZAÇÃO TÓPICA DE UMA ELOCUÇÃO FORMAL E SUA RETEXTUALIZAÇÃO

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ESTUDO COMPARATIVO DA ORGANIZAÇÃO TÓPICA DE UMA ELOCUÇÃO FORMAL E SUA RETEXTUALIZAÇÃO

Larissa Minuesa Pontes MAREGA (PG – UEM) Edson Carlos ROMUALDO (UEM)

ISBN: 978-85-99680-05-6

REFERÊNCIA:

MAREGA, Larissa Minuesa Pontes; ROMUALDO, Edson Carlos. Estudo comparativo da organização tópica de uma Elocução Formal e sua Retextualização. In: CELLI – COLÓQUIO DE ESTUDOS LINGUÍSTICOS E LITERÁRIOS. 3, 2007, Maringá. Anais... Maringá, 2009, p. 1540-1551.

1. INTRODUÇÃO

A elocução formal é uma produção lingüística falada e, como tal, apresenta traços e estratégias particulares para sua materialização, se organizando, assim, de uma determinada maneira. Do mesmo modo, o texto escrito também possui uma materialidade própria, apresentando recursos diferenciados que apontam para uma outra organização.

Nesse sentido, o objetivo desse artigo é mostrar os resultados obtidos da análise comparativa de uma elocução formal com sua retextualização, tomando como ponto de partida as noções de topicalidade e organização tópica. Para isso, expomos uma breve explanação sobre o gênero falado elocução formal e, depois, discutimos alguns conceitos-chave que dizem respeito à organização tópica, a saber: tópico, centração, Quadros Tópicos, continuidade e descontinuidade. Em seguida, mostramos a organização de cada texto, no âmbito macroestrutural, resultado da comparação já realizada na perspectiva da organização tópica.

O corpus desse trabalho conta com dois textos. O primeiro é a transcrição da palestra “Sistema de cotas e o direito de acesso à Universidade”, proferida pela Profª. Dora Lúcia de Lima Bertúlio, em 2004, no “VI Encontro – O negro na Universidade: o direito à inclusão”; o segundo é a retextualização dessa elocução formal. 1

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A transcrição e a retextualização da palestra foram realizadas pelo Projeto “Banco de Dados Midiáticos” da Universidade Estadual de Maringá e encontram-se disponíveis no acervo da Universidade Estadual de Maringá para a comunidade acadêmica.

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2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 A ELOCUÇÃO FORMAL

Brait (1999: 106) define elocução formal como uma produção oral de interação face a face, assimétrica e hierárquica, manifestada por palestras, aulas e conferências. A denominação genérica elocução formal se sustenta em termos de uma tipologia textual estabelecida pelo Projeto NURC/SP para os diferentes registros, tendo basicamente como parâmetro a assimetria interacional em relação à conversação espontânea.

A elocução formal é proferida, quase na totalidade, por falantes cultos que, segundo Barros (1999: 42), são pessoas de prestígio, de autoridade, pertencentes a certas classes com instrução e que “utilizam a língua adequadamente em diferentes situações de discurso e de interação verbal”. O falante de uma elocução formal se preocupa com o uso correto de sua fala, porque se preocupa com seu papel social de falante culto.

Em relação à macroestrutura da elocução formal, Brait (1999: 90) divide o texto oral em três partes: introdução, desenvolvimento e conclusão, que em princípio se assemelha à macroestrutura de uma dissertação escrita. A introdução é o tópico inicial, em que o conferencista situa e planeja seu discurso. O desenvolvimento é o trecho mais longo da exposição em que o núcleo temático é detalhado – tópicos e subtópicos seguem uma linha discursiva de forma coesa e coerente. O desfecho une o tema inicial ao ponto de vista do enunciador e à situação específica de interação.

Ao estudar produções faladas, tal como a elocução formal, e mais especialmente ao realizar o processo de transformação do texto falado para o texto escrito, Marcuschi (2003) permite-nos trabalhar com uma série de operações que ultrapassam a simples regularização lingüística, pois envolvem procedimentos de substituição, reordenação, ampliação, redução e mudanças de estilo. Entre as operações apontadas pelos autor, focalizamos aqui as que envolvem a organização tópica, ou seja: a 4ª, responsável pela introdução dos parágrafos e da pontuação minuciosa, porém ainda sem alteração da ordem dos tópicos discursivos, a 8ª, que diz respeito à reorganização tópica do texto e da seqüência argumentativa, e a 9ª, que estrutura as idéias e os argumentos.

Foram contempladas tais operações porque todas elas recaem sobre a organização tópica, perspectiva escolhida para essa análise, mas é importante ressaltar que outros trabalhos também podem ser desenvolvidos a partir das outras operações, realizando outros estudos, como: o estudo da paráfrase, das repetições, dos marcadores discursivos, das inserções etc.

Sabemos que, em qualquer modalidade de língua oral, seja uma elocução formal ou uma conversação espontânea, os participantes têm consciência de que sua produção “converge para algum ponto”. Assim, o tópico discursivo se torna um elemento decisivo na constituição de um texto oral e a estruturação tópica serve como fio condutor, responsável pela tessitura e coerência da organização discursiva. Portanto, a topicalidade se constitui como princípio de organização do discurso.

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2.2 ORGANIZAÇÃO TÓPICA

2.2.1 O TÓPICO

Segundo Koch (1990: 146), entende-se por unidade discursiva “um fragmento textual que se caracteriza pela centração em determinado tema, como um dos subtópicos em que se divide o tópico discursivo global”. De acordo com Pinheiro (2005: 34), o segmento tópico constitui cada conjunto de enunciados tematicamente centrados e se configura como sendo uma unidade de composição do texto. Para Gorski (1994: 34, apud PINHEIRO, 2005: 33), “os tópicos e subtópicos sintetizam fragmentos do discurso, no nível semântico-discursivo, e, nesse sentido, identificam um arquivo”, em outras palavras, os tópicos e subtópicos assinalam o lugar de uma seqüência na organização discursiva, permitindo, assim, ao ouvinte/leitor localizar a posição que eles ocupam no esquema hierarquizado do discurso.

Jubran et al (1990) assinalam como primeira propriedade definidora de tópico, a de centração (conteúdo, assunto ou tema), que abrange os traços de concernência (relação de interdependência semântica entre os enunciados), de relevância (destaque do conjunto de referentes explícitos ou inferíveis) e de pontualização (localização do conjunto). Parece-nos, então, que o tópico tem a função de amarrar o texto, estruturando-o a fim de organizar o discurso, por isso, aquilo “de que se fala” não pode ser desvinculado do “como se fala”.

Pinheiro (2005:34) procura distinguir “tópico discursivo” de “segmento tópico”. Para o autor, enquanto o primeiro se configura como uma categoria analítica abstrata, o segundo se mostra como uma seqüência textual que preenche as propriedades dessa categoria.

De acordo com Gorski (1994:34 apud PINHEIRO, 2005: 33):

Tanto na perspectiva da produção como da compreensão do texto, os tópicos precisam ser apreendidos e controlados para que a comunicação se efetive. Já na perspectiva do analista, além da necessidade de captar o grau de abrangência desses tópicos, é preciso explicitá-lo, conferindo-lhe um rótulo adequado, de modo a recobrir a seqüência discursiva sob seu domínio. O mecanismo de explicitação do tópico semântico-discursivo é semelhante ao processo de identificação do referente que é tópico frasal, no sentido de que se procura saber sobre o que se fala. O que distingue os dois processos é o fato de que, enquanto o tópico referencial é codificado na frase, e, assim, concretamente audível ou visível, o tópico discursivo não é explicitamente codificado. Ele precisa ser depreendido, nomeado.

Uma questão levantada por Pinheiro (2005: 23) é pertinente no que diz respeito à discussão do conceito de tópico:

O fato de não se encontrar necessariamente materializado no texto, mas de ser dele extraído pelo analista, desencadeia a crítica de que a noção de tópico é intuitiva e, dessa forma, apresenta dificuldades de operacionalização. É

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verdade que a comunicação humana supostamente se faz em torno de um tema, um assunto, mas nem sempre é fácil de identificar esse assunto. No entanto, os traços de concernência e relevância que precisam a centração, uma das características do tópico, segundo Jubran et al (1990), se apresentam como um critério concreto a partir do qual o tópico pode ser identificado e depreendido.

Assim, Jubran et al (1990) desenvolveram um procedimento de identificar seqüências discursivas que configuram um tópico discursivo, identificando e delimitando os segmentos tópicos. Segundo os autores, o tópico define-se por uma unidade que comporta, além da propriedade de centração (capacidade de concentrar o assunto ou conteúdo em pauta a um determinado tema), uma segunda propriedade fundamental, a da organicidade.

A organização tópica se manifesta por relações de interdependência que se estabelecem simultaneamente em dois planos: hierárquico (grau de abrangência do assunto – supertópico, subtópico, sub-subtópicos) e seqüencial (continuidade e descontinuidade). O plano hierárquico particulariza os tópicos e dá origem a Quadros Tópicos e o plano seqüencial distribui os tópicos na linha discursiva de forma contínua ou descontínua.

2.2.2 CONTINUIDADE E DESCONTINUIDADE

Jubran et al (1990) asseveram que a continuidade decorre de uma organização seqüencial dos segmentos tópicos, de forma que a abertura de um apenas se dá após o fechamento do outro. A mudança de tópico, nas situações em que não se projetam mais possibilidades de desenvolvimento do tema anterior, caracteriza o processo de continuidade de manifestação tópica na linha do discurso. A categoria de continuidade se define, então, por uma relação de término que ocorre na circunstância específica de esgotamento do tópico anterior e o começo de um novo tópico.

Por outro lado, os autores explicam que a descontinuidade decorre de uma perturbação na seqüência linear do discurso, uma das características de produções textuais faladas. São estes os aspectos que influenciam no processo do fluxo de informação: inserções, rupturas, reparo, reconstrução, repetição, adjunção e elipses.

Jubran et al (1996) definem inserção como um fenômeno responsável pela divisão do tópico em segmentos não-contíguos. A inserção deve ser estudada no princípio da centração, pois é um desvio temático inserido num segmento tópico.

Segundo Koch (1990), a inserção de informações paralelas ou subsidiárias no tema dentro da unidade discursiva pode ser: autocondicionada (quando a iniciativa parte do falante) ou heterocondicionada (quando o interlocutor a solicita). As inserções autocondicionadas, que, em princípio, são as possíveis em palestras, manifestam-se por meio de frases-hóspedes ou segmentos do discurso que promovem suspensões da linha discursiva, afetando o escoamento das informações que tecem coerentemente o tópico discursivo. É um procedimento para que o locutor se coloque no discurso. As frases-hóspedes cumprem o papel de manter o contato com o interlocutor, esclarecer, citar, corrigir, fazer ressalvas e avaliar.

Koch (1990) ressalta que as rupturas sintáticas sem função discursiva interferem na estrutura canônica das sentenças, são resultantes da “perda do controle” da parte do

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falante sobre a organização de seu enunciado. Por outro lado, as rupturas sintáticas com função discursiva, mas que não acarretam uma perda na progressão temática, são aquelas que o falante tenta encontrar a melhor forma de expressar uma informação, em que ele lança mão de várias construções sintáticas. O reparo, por exemplo, constitui-se no truncamento do enunciado e sua conseqüente reformulação de acordo com os objetivos do falante a fim de precisar melhor a informação transmitida. Koch (1996) afirma que o reparo se dá quando, após utilizar uma alternativa de formulação, o falante recorre a uma outra ou, então, faz uso de paráfrases, correções e repetições.

Koch (1990) considera a reconstrução como um fenômeno que também interfere no curso contínuo da progressão temática, provocando, da mesma forma que a inserção, uma retenção do ritmo de escoamento das informações. A reconstrução envolve reelaboração na seqüência discursiva e recorrência da informação dada, provocando uma “patinação” na progressão temática. A reconstrução pode dar-se por mecanismos de repetição ou adjunção.

Segundo a autora, a repetição pode acontecer desde aquela sem variação até a com variação maior, como a variação de palavras, construções, reparos e paráfrases. A repetição por hesitação e por retomada são obstáculos do fluir temático. Entretanto, a repetição pode servir para articular informações já dadas à nova, e de manter, com isso, a relação temática entre duas linhas discursivas. Nesse sentido, por se constituir como ponto de referência para a rearticulação do discurso, a repetição não parece, neste último caso, prejudicar o fluxo informacional.

Com relação à adjunção, Koch (1990) assevera que é a intenção de ênfase que leva o falante utilizar esse mecanismo. A adjunção ocorre quando, no desenvolvimento de uma unidade discursiva, o falante se dá conta da falta de uma informação importante relativa ao assunto em pauta, ou sente a necessidade de enfatizar ou, ainda, reavivar na mente do(s) interlocutor(es) uma informação já presente no universo do discurso, o que o faz acrescentar a posteriori ou representar tais informações sob forma de “adendos”. O afterthough é a categoria prototípica desse tipo de reconstrução.

Segundo Ochs (apud KOCH, 1990: 173), os afterthoughts “caracterizam-se como uma interposição tardia, na linha discursiva, de uma informação antes elidida”. Os afterthoughts diferenciam-se das frases-hóspedes porque a informação trazida pelos primeiros é considerada imprescindível pelo falante, enquanto a das frases-hóspedes é complementar, paralela. Os afterthoughts são mecanismos de acréscimo, explicitação e realce, que exercem não só função informativa, como também função interativa e argumentativa, embora provoquem um retardamento no escoamento do fluxo informacional.

Já as elipses, a autora lembra que elas não dão origem a descontinuidades ou interrupções na progressão temática, na medida em que a informação não explicitada é naturalmente suprida. Há casos, porém, em que o falante deixa de concluir seu pensamento e impossibilita a compreensão por parte do interlocutor.

É no plano seqüencial que tais descontinuidades se evidenciam. Já no plano hierárquico é possível identificar e nomear os tópicos pelo princípio da centração, e além dele, é possível recorrer também à marcação lingüístico-discursiva capaz de delimitar e movimentar os tópicos, isto é, orientar a mudança ou a permanência do tópico em andamento.

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Jubran et al (1990) postulam três formas de mudança de tópico: 1) a introdução de um tópico após esgotamento natural do anterior, configurando-se um caso de continuidade; 2) passagem gradativa de um foco de relevância a outro ou os chamados tópicos de transição que servem como mediadores entre dois tópicos; 3) introdução de um tópico por abandono do anterior, antes que os interlocutores o dessem por encerrado.

O movimento do tópico ocorre quando há um “deslizamento” de um aspecto de um tópico para outro por meio de alguns processos, tais como: usar reformulações alternativas, falar de entidades que possam ser chamadas de membros de mesma classe, expandir um tópico, dar exemplos, fazer sínteses, análises e comparações.

Segundo Goffman (apud JUBRAN, 1990: 370), “as condutas dos participantes de uma interação se submetem a uma expressão verbal que ordena o fluxo das mensagens (...) Os participantes vão captando os sinais emitidos e orientando suas falas segundo o fio condutor (o tópico)”.

2.2.4 MARCAS DE DELIMITAÇÃO TÓPICA

Os segmentos tópicos caracterizam-se como um conjunto de enunciados apresentando começo, meio e fim. Assim, saber identificar as marcas que permitem a delimitação tópica nos possibilita conhecer diferentes formas de se iniciar, bem como de fechar tópicos, além de reconhecê-los.

Os marcadores conversacionais, por exemplo, possuem um grande valor pragmático, pois na medida em que encadeiam coesivamente um texto, eles também o segmentam, agindo como fatores de segmentação (MARCUSCHI, apud JUBRAN, 1990: 374) . Entre os marcadores mais comuns, encontramos: “agora”, “então”, “realmente”, “e tem outra coisa”, “ainda mais porque”, “e depois”, “não é?”, “enfim”, “quer dizer” etc.

Há, também, as marcas prosódicas, que se caracterizam pela entonação, um dos mecanismos mais eficazes aos quais os falantes recorrem para expressar o conteúdo. No início a entonação é ascendente e, no fecho, descendente. Além da entonação, temos as marcas léxico-semânticas, manifestadas em paráfrases, em repetições ou frases feitas.

Existem outras marcas, também recorrentes, como os silêncios e as pausas, bem como as hesitações. Para Maynard (apud JUBRAN, 1990: 375), “o silêncio possibilita o apagamento do foco de fala, facilitando a instauração de novo tópico”. As hesitações se caracterizam pelo alongamento de vogais, pausas, pouca velocidade e ralentamento da fala.

Com o exposto e assim fundamentados teoricamente, mostraremos a seguir os resultados obtidos na comparação da organização tópica da elocução formal e sua retextualização.

3. RESULTADOS OBTIDOS NA COMPARAÇÃO DA ORGANIZAÇÃO TÓPICA DA ELOCUÇÃO FORMAL COM SUA RETEXTUALIZAÇÃO

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Frente ao corpus escolhido, desenvolvemos o trabalho, metodologicamente, da seguinte maneira: primeiramente identificamos e rotulamos os segmentos tópicos a partir do princípio da centração. Em seguida, identificamos as marcas lingüístico-discursivas que delimitavam e orientavam a mudança dos tópicos. Tendo em vista a sistematização dos tópicos, formulamos dois Quadros Tópicos (um da produção oral e outro da escrita), seguindo o plano hierárquico da organização tópica. Dessa forma, conseguimos desenvolver um mapa de segmentos tópicos capaz de recobrir toda a palestra e sua retextualização, ou seja, um mapa de supertópicos, tópicos, subtópicos e sub-subtópicos, ligados semanticamente.

No que diz respeito à composição e à organização da elocução formal, o que se evidenciou, de um modo geral, foram as marcas conversacionais, o raleamento das informações, os truncamentos, as paráfrases, as correções, enfim as descontinuidades. Já a retextualização apresentou uma ordenação mais contínua, linear, seqüencial e objetiva. Ao colocarmos lado a lado os Quadros Tópicos das duas produções, logo percebemos que o primeiro é complexo e ramificado por muitos tópicos, já o segundo apresenta menos tópicos e aparenta mais simplicidade. Vejamos os quadros tópicos2, postos lado a lado:

QT – Elocução Formal QT - Retextualização

Por meio desses Quadros Tópicos, pudemos verificar o plano hierárquico da constituição da elocução formal e da retextualização. Dessa forma, a elocução formal apresentou maior ramificação, ou seja, os tópicos foram dispostos de maneira horizontal, mostrando que o discurso da palestrante se organizou no sentido de abrir cada vez mais tópicos, de expandi-los, utilizando exemplos e comentários. A retextualização, no entanto, apresentou uma disposição mais vertical, significando que um tópico apareceu após o outro, em uma mudança gradativa e sutil.

Observamos, de fato, que na transformação do texto oral para o texto escrito o primeiro aspecto diferenciador foi visual, em outras palavras, a elocução formal

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apresentou um número maior de linhas, enquanto que a retextualização contou com um número bem menor. Com relação aos Quadros Tópicos essa diferença pôde ser confirmada, pois a elocução formal se realizou de maneira a distribuir os tópicos no sentido horizontal e a retextualização no sentido vertical, conforme dito anteriormente. Isso significa que a fala se mostrou mais descontínua que a escrita, ainda que ambas sejam consideradas, do ponto de vista organizacional, coerentes.

A tabela, apresentada a seguir, ilustra a redução dos elementos gerais, que constituem a organização tópica no nível hierárquico. Assim os dois textos se apresentaram macroestruturalmente:

COMPARATIVO

Macroestrutura Elocução Formal Retextualização

Nº. total de linhas 428 220 Nº. de supertópicos 6 5 Nº. de tópicos 16 11 Nº. de subtópicos 25 17 Nº. de sub-subtópicos 18 15 Nº. de sub-subtópicos menores 5 5

A partir dos dados acima, podemos notar que o primeiro traço distintivo entre as duas produções é, justamente, a redução, seja no número de linhas, seja no de supertópicos, seja ainda no de tópicos relacionados. É certo afirmar que muitos subtópicos e sub-subtópicos desapareceram na retextualização e supertópicos foram reestruturados ou renomeados.

Para retextualizar, no que diz respeito à ordenação tópica, foi preciso que alguns subtópicos fossem supridos da transcrição por conta da busca pela objetividade e clareza das informações. Em geral, os subtópicos corresponderam às ramificações menores da cadeia tópica – os exemplos, análises, comentários, restrições do assunto. Dessa forma, na formulação do texto escrito esses segmentos menores foram eliminados. Houve, ainda, a perda do primeiro supertópico da elocução formal, uma vez que essa permite pela presença dos ouvintes e pelo contexto situacional as saudações iniciais, mas na retextualização isso não pôde ser marcado. Assim, o texto escrito manifestou a introdução a sua maneira.

A passagem do texto falado para o texto escrito apresentou, ainda, outro elemento fundamental, além da redução e eliminação: a adaptação. A materialização lingüística do texto falado e do texto escrito é diferente: a primeira é verbal, e a segunda é escrita. Por isso, no momento de retextualizar, a questão organizacional prevaleceu, pelo princípio da centração, na divisão e distribuição dos tópicos em parágrafos. Essa

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foi uma das adaptações mais evidentes que culminou na fácil identificação dos tópicos do texto escrito, porque cada parágrafo representou um tópico.

Observando a elocução formal, no processo da identificação e da nomeação dos tópicos, pudemos perceber como se dá a topicalidade, ou seja, como se inicia, como se termina ou como se passa de um tópico para outro, verificando as marcas lingüístico-discursivas mais recorrentes que alternam de função na medida em que são utilizadas – é o caso do “mas”, funcionando junto a outros como introdutor de tópicos.

Na elocução formal também foram notadas as combinações entre marcadores e elementos coesivos, principalmente com a conjunção “e”. As expressões “acho que” e “daí” foram muito recorrentes na passagem dos tópicos, assim como outras expressões sempre terminadas em “que”. As pausas indicaram, normalmente, o fecho de um tópico, mas indicaram também, o começo. As hesitações apareceram acompanhadas de expressões, marcadores ou pausas. As perguntas analisadas na elocução formal foram entendidas como introdutoras ou finalizadoras de tópicos, isso porque apresentaram um caráter interacional, isto é, ao mesmo tempo em que direcionavam o assunto da palestra, também sugeriam aos ouvintes que eles respondessem mentalmente à questão, refletindo, assim, sobre o que estava sendo exposto.

Jubran et al (1990) classificam as paráfrases como marcas léxico-semânticas que podem delimitar a passagem dos tópicos. Pela análise da delimitação tópica da elocução formal, às paráfrases somamos os exemplos e os enunciados conclusivos, encontrados como pequenos segmentos capazes de inserir novos tópicos.

Ainda com relação à delimitação tópica e mudança de um tópico para outro, o tópico de transição se mostrou bastante recorrente nas duas realizações, tanto na elocução formal como na retextualização. No texto falado, observamos que os tópicos de transição funcionaram como introdutores e mediadores de tópicos e estavam dispostos entre tópicos principais, causando, muitas vezes, o raleamento das informações. No texto escrito, os tópicos de transição foram dispostos em um ou dois parágrafos com as funções de explicar, resumir, adiantar, enfatizar, o parágrafo (tópico) anterior, além de introduzir um novo parágrafo (tópico).

Outra questão importante levantada na observação dos tópicos de transição foi sua adaptação no processo de retextualização. Os tópicos de transição da elocução formal não foram colocados na retextualização em posições intratópicas, mas intertópicas. Os tópicos de transição, enfim, por exercerem função importante dentro da formulação do texto falado e do escrito, foram, em sua maioria, reaproveitados na retextualização, mas alguns que levavam ao raleamento das informações foram modificados para garantir maior objetividade.

Na retextualização, os tópicos, em geral, corresponderam a um parágrafo, o qual abrangeu, além do tópico central, subtópicos e sub-subtópicos. A passagem de um parágrafo para outro e, consequentemente, de um tópico para outro, foi feita por meio de elementos coesivos, a partir da necessidade de expandir o assunto com exemplos ou explicações. Para cada parágrafo, encontramos o desenvolvimento de uma idéia, contudo, ao se expandir tal idéia, sentiu-se a necessidade de formar um novo parágrafo e assim por diante. Às vezes, um subtópico correspondeu a uma das orações que constituíram o parágrafo, outras vezes, uma mesma oração representou dois subtópicos. Tudo dependeu do grau de abrangência do assunto, por exemplo, se aparecesse um elemento novo, então ocorria uma primeira ramificação; se surgisse uma definição, um detalhamento ou explicação desse elemento novo, ter-se-ia uma nova ramificação. Porém, é válido lembrar que a cadeia que se formou pertence ao nível hierárquico,

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mesmo porque se considerarmos o nível seqüencial veremos que cada ramificação representou um bloco dentro do texto – um ou mais parágrafos.

A delimitação, portanto, foi marcada na palestra por diversas possibilidades, algumas das quais mostraram justamente os recursos de formulação e constituição do texto oral: marcadores discursivos, pausas, hesitações, paráfrases, exemplos, enunciados conclusivos, perguntas retóricas, tópicos de transição, entre outros termos. Na retextualização, a delimitação tópica foi marcada, essencialmente, pela paragrafação.

É por isso que a linearidade observada no texto escrito se justificou pela paragrafação, já a descontinuidade na elocução formal foi constatada no plano seqüencial pela intercalação dos tópicos. Mas é preciso salientar que no plano hierárquico do texto oral (Quadro Tópico) ocorre a sistematização dos tópicos pelo princípio da centração e, portanto, os tópicos e subtópicos são ligados semanticamente, não evidenciando tal descontinuidade.

A citação, por exemplo, permaneceu na retextualização devido ao fato de que a elocução formal se aproxima do texto escrito. Assim, em nada foram modificadas as palavras citadas indiretamente pela palestrante.

Já a inserção, enquanto fenômeno de constituição do texto falado, exerceu na retextualização uma função esclarecedora, ou seja, foram reaproveitadas aquelas inserções tópicas que funcionavam na palestra como esclarecimento do tópico em andamento. As inserções tópicas representaram, no plano hierárquico, os subtópicos.

As paráfrases e repetições encontradas em abundância na elocução formal foram eliminadas, tendo em vista a objetividade do texto escrito. Observamos, ainda, que as adjunções do texto oral foram utilizadas para formulação dos tópicos de transição da retextualização, com finalidade de ressalva e esclarecimento. As elipses foram desconsideradas na retextualização, assim como as marcas de oralidade.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Um dos aspectos levantados nesse estudo foi perceber que enquanto modalidade oral, a elocução formal analisada apresentou características da fala, como marcadores conversacionais e dêiticos. No entanto, ela também apresentou características que a aproxima de textos da modalidade escrita, especialmente no que diz respeito à macroestrutura textual.

Nesse momento, é válido observar que a palestrante utilizou um texto de apoio para direcionar sua fala, o que nos possibilitou afirmar que seu discurso foi previamente planejado para seguir uma linha discursiva. Dessa forma, o percurso da palestra seguiu o mesmo percurso, ou seja, a macroestrutura de uma dissertação escrita. Como afirma Koch (1996), a elocução formal é um evento interacional institucionalizado, com objetivos definidos e, por assim dizer, o planejamento temático-composicional a aproxima de um texto escrito.

É valido resgatar, ainda, a definição de Barros (2001) sobre a efetivação ideal da escrita, que nos parece encaixar com a definição de elocução formal (fazendo antes as adequações necessárias entre produtor e receptor do texto): “realizada por uma pessoa, sem alternância entre os papéis de ‘escritor e leitor’, com efeitos de distanciamento e aproximação, sendo formal e assimétrica”. Percebemos, então, uma semelhança entre a definição da realização de um texto escrito com a da elocução formal em estudo.

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Ademais, a organização tópica na elocução formal se mostrou de forma descontínua no sentido seqüencial dos tópicos, descontinuidade essa que não prejudicou o entendimento por parte dos ouvintes. Só podemos entender a topicalidade da elocução formal como sendo contínua se observada por meio do Quadro Tópico, cuja função foi a de, realmente, reagrupar os tópicos identificados para verificar o percurso da palestra, ou seja, reunir os segmentos que antes estavam espalhados no plano seqüencial para reordená-los no plano hierárquico.

Podemos ressaltar e destacar na análise dessa elocução formal o fato de ela ter sido proferida por um falante culto, ou seja, o sujeito em análise se preocupou de alguma forma com sua fala e, talvez por isso, teve um cuidado maior nas escolhas lexicais, embora já apresentasse uma fluência ao falar, tal como supostamente escreveria. Isso nos ajuda a justificar a aproximação da elocução formal com o texto escrito, ainda que macroestruturalmente.

Já a organização tópica da retextualização se realizou basicamente pela estruturação do texto em parágrafos, totalizando 40, sendo cada um responsável por um tópico, ou, no caso de ramificação (subtópicos), cada um ou mais subtópicos também assumiu um parágrafo, e reciprocamente cada parágrafo apresentou um ou mais subtópicos, dentro do tópico central. Os tópicos de transição também foram dispostos em parágrafos, trazendo sempre um comentário do tópico anterior, um esclarecimento ou mesmo introduzindo o tópico seguinte.

É importante ressaltar, ainda, que a retextualização não alterou o conteúdo do texto falado, mas produziu um outro texto. Nela houve redução, adaptação e eliminação, constituindo, assim, uma nova organização.

Finalmente, podemos afirmar que a análise da elocução formal e de sua retextualização, pelo viés da topicalidade, se mostrou muito produtiva, pois possibilitou um entendimento lingüístico-textual no que diz respeito à macroestrutura de um texto oral específico e de compreensão das possibilidades de organização e delimitação tópicas dentro de uma modalidade oral (elocução formal) e de sua retextualização (texto escrito).

REFERÊNCIAS

BARROS, Diana Luz Pessoa de. A propósito do conceito de discurso urbano oral culto: definições e imagens. In: PRETI, Dino (org.). O discurso oral culto. Projetos Paralelos – NURC/SP. 2 ed. São Paulo: Humanitas, 1999.

BRAIT, Beth. Elocução Formal: o dinamismo da oralidade e as formulações da escrita. In: PRETI, Dino (org.). Estudos de língua falada, variações e confrontos. 2 ed. São Paulo: Humanitas, 1999.

JUBRAN, Clélia Cândida A. S. et al. Organização tópica da conversação. In: ILARI, Rodolfo (org.). Gramática do Português Falado. Volume II: Níveis de Análise Lingüística. Campinas: Editora da UNICAMP/FAPESP, 1990.

________. Inserção: um fenômeno de descontinuidade na organização tópica. In: CASTILHO, A. T. (org.). Gramática do Português Falado. Volume III: As abordagens. Campinas: Editora da UNICAMP/FAPESP, 1996.

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Referências

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