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A Formulação Cognitivo-Comportamental dos Sentimentos de Insegurança Denise Amorim Rodrigues e Edson Vizzoni -

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Academic year: 2021

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A Formulação Cognitivo-Comportamental dos Sentimentos de Insegurança Denise Amorim Rodrigues e Edson Vizzoni - E-mail: npcc@npcc.com.br

Inúmeras são as razões pelas quais uma pessoa busca psicoterapia. Os vários tipos de queixas podem ser, genericamente, identificados como dificuldades sexuais, problemas de relacionamento, dificuldades no trabalho, timidez excessiva e outros. A preocupação com o enquadre dessas queixas inespecíficas em uma nosografia anterior a elas é mais acentuada em algumas linhas psicoterápicas, que procuram uma caracterização precisa do comportamento dito neurótico, ou esquizofrênico, ou paranoico, por exemplo. Para cada um desses grupos uma descrição, uma explicação, um diagnóstico e uma descrição do tratamento. Já em outras abordagens, a ênfase recai menos sobre o diagnóstico do que sobre fatores específicos que provocam e, principalmente, mantêm os comportamentos considerados inadequados ou desadaptativos.

No entanto, por menos que o psicólogo esteja voltado para o estabelecimento de unidades nosográficas e diagnósticas, fatalmente ele começa a perceber a recorrência de certos padrões comuns às histórias individuais de seus clientes. Estamos pensando, especificamente, na classe de queixas onde o cliente diz sentir-se incapaz de fazer algo para o que está plenamente capacitado, em termos de habilidades e outras condições. O cliente reclama que não consegue iniciar a atividade que gostaria ou necessitaria fazer ou, se a custo de grande esforço, inicia tal atividade, não consegue manter-se nela. Esse tipo de queixa é bastante comum e eu o tenho encontrado em minha prática clínica, inserido em muitas histórias individuais. É o caso de clientes que reclamam de não conseguirem se aproximar de estranhos, ou até mesmo conhecidos, com medo de serem rejeitados; de como não respondem como desejariam às atitudes desrespeitosas ou agressivas dos outros; que não conseguem emitir ou afirmar suas opiniões em conversas com amigos; que postergam o máximo possível decisões necessárias, chegando a prejudicar suas relações pessoais e seu trabalho. Muitas vezes esses clientes referem-se a si mesmos como inseguros, medrosos e, até os mais extremados, covardes. Esses sentimentos de insegurança, incapacidade e inferioridade, vêm sendo tratados na literatura psicológica já há algum tempo (Adler, in Fadiman e Frager, 1979; Laing, 1979; Kohut, 1988; Bruch e Meyer, 1988). Segundo esses autores, seu achados validam a presunção da universalidade dos sentimentos de insegurança (para a população clínica), os quais estariam positivamente relacionados com depressão, ansiedade sócio-avaliativa e crenças irracionais, o

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que parece corroborar a nossa observação inicial acerca da grande frequência desse tipo de queixa na clínica psicoterápica.

Partindo do que foi exposto até o momento e de minha experiência clínica, apresentarei em seguida uma formulação geral do processo originador dos sentimentos de insegurança.

O indivíduo humano, em sua primeira infância, é indefeso e dependente de outros para o suprimento de abrigo, alimento e afeto. Essa situação de dependência é universalmente experimentada e, mais que isso, mantida e estimulada pelos processos comuns de educação e socialização das crianças na maioria das culturas. A partir de um certo momento, a independência (de desempenho) começa a ser possível e é, então, exigida e estimulada pelos adultos. A maioria das crianças ingressa nessa fase sem grandes dificuldades e até com prazer. Alguns indivíduos, seja por uma suscetibilidade emocional excessiva herdada, seja por uma história repleta de eventos incapacitantes, ou mais comumente, por ambos, não o fazem tão facilmente. Neles permanece uma necessidade exagerada de apoio e aceitação por parte de outras pessoas, a qual acaba por manter ou reproduzir relações dependentes que tiveram, na infância, com adultos significativos (pais, principalmente). A visão que têm de si mesmos inclui elementos como dúvidas quanto às suas capacidades, descrença em seu poder pessoal de influir nos eventos da própria vida, desmotivação para se engajar em atividades novas e exigentes e outros do mesmo quilate. Deles é razoável esperar que relatem sentimentos de insegurança, incapacidade e inferioridade frente a situações da vida comum, onde outros experimentariam pouca ou nenhuma dificuldade. Espera-se também que evitem ou fujam de tais situações com frequência acentuada, culpando-se por sua fraqueza e sentindo-se desesperançados de algum dia terem forças suficientes para deixar de fazê-lo.

Embora questionável, essa formulação do processo contém elementos básicos necessários a uma tentativa de compreensão da gênese e manutenção dos sentimentos de insegurança, inferioridade e incapacidade, incluindo também uma sugestão de como lidar com eles na psicoterapia.

As pessoas buscam organizar suas experiências em um todo compreensivo e coerente. E o fazem através de processos cognitivos, que são "processos de assimilação de experiências, de atribuição de sentido e valor a elas e de sua ordenação em padrões organizados de conhecimento e sentimento". (McDavid & Harari, 1980, p.72). Essa organização de experiências não se dá de

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modo automático, como se o indivíduo fosse um receptor passivo. Ao contrário, as novas experiências são incorporadas às experiências anteriores seletivamente, de modo a atenderem a dois critérios básicos: terem utilidade funcional e estarem em harmonia com experiências passadas. Em suma, ao assimilar novas experiências, o indivíduo incorpora o que lhe é útil e que está de acordo com seu passado, preferencialmente ao oposto. Isto se aplica às percepções individuais em qualquer nível, seja de um objeto, seja de outra pessoa, seja de si mesmo. O último nível, o da percepção de si mesmo, interessa-me particularmente. Através dele a pessoa chega a formar seu autoconceito. McDavid & Harari (op. cit) definem o termo como a estrutura organizada que deriva da experiência que cada pessoa faz de seu próprio eu". O autoconceito é um sistema cognitivo coerente e estável que, à semelhança de todos os sistemas cognitivos, seleciona a aceitação de novas experiências de acordo com uma estrutura de referência, formada a partir das experiências passadas e dos padrões externos. Está, portanto, sujeito a todo tipo de percepções falhas e distorções na compreensão de experiências, como qualquer sistema cognitivo. Se considerarmos que o autoconceito inclui a percepção da forma física da pessoa, da consciência do próprio comportamento e da interação com outros e com o ambiente podemos compreender sua complexidade.

Um último ponto a considerar sobre o autoconceito é o seu aspecto avaliativo. Gostamos ou não do que somos (ou de uma parte do que somos), e o grau em que isso se dá é medida de nossa auto-estima. Um alto nível de auto-estima corresponde a um sentimento de aprovação geral do que percebemos em nós, e o oposto corresponde a um baixo nível de auto-estima. O conjunto de tudo o que alguém desejaria e gostaria de ser é chamado de eu ideal e é comparando-nos com ele que experimentamos sentimentos de insatisfação pessoal.

Como alguém chega a desenvolver baixos níveis de auto-estima? Comparando suas experiências com os padrões culturais de seu grupo de referência e rotulando-as como fracassos, mais que sucessos, pode ser uma resposta. Outra resposta pode ser dada por considerações como as de Seligman (1979) sobre o que ele denominou desamparo aprendido. Através de experiências particularmente frustrantes ou traumáticas uma pessoa poderia aprender que seus comportamentos são insuficientes ou inúteis para mudar ou controlar os fenômenos a que se vê exposto. De acordo com Seligman, tal estado de desamparo levaria a pessoa à desmotivação, passividade, falta de agressividade, deficiências sociais e sexuais e apatia geral. É óbvio que se poderia esperar de um quadro desses que também originasse auto-estima rebaixada.

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Podemos dizer, então, que um baixo nível de auto-estima decorre da percepção de discrepâncias acentuadas entre o que a pessoa desejaria fazer (atendendo ao eu ideal) e o que realmente consegue realizar (eu real). Tal fato geraria uma série de padrões cognitivos típicos como:

• Pensamentos auto-referentes negativos.

• Expectativas negativas quanto ao comportamento futuro.

• Locus de controle distorcido, onde o sucesso está associado ao acaso, enquanto o fracasso está relacionado com a própria pessoa.

• Crenças irracionais.

Poderíamos acrescentar, ainda, a forma distorcida como o indivíduo estabelece padrões causais entre seus comportamentos e os fenômenos, por um lado, e as origens dos mesmos, por outro lado. Tal atribuição de causalidade, no caso de pessoas com profundos sentimentos de insegurança, se dirigiria, preferencialmente, para os dois pólos: forças ambientais e características pessoais. Nesse caso, a pessoa enfatizaria determinadas causas para o seu comportamento e subestima outras, podendo chegar até mesmo a distorcer a informação recebida de modo que ela concordasse com seu padrão de atribuição de causalidade.

Finalmente, um outro conceito que poderíamos considerar como integrador desses vários fatores cognitivos é aquele formulado por Bandura (1977) acerca das expectativas de auto-eficácia, que determinariam quanto esforço a pessoa dispenderá em uma determinada atividade e por quanto tempo ela persistirá em um determinado comportamento, sendo que a persistência é um fator fundamental, uma vez que é ela que permite à pessoa corrigir suas crenças em relação às suas capacidades e habilidades. Assim, Bandura parece supor que as expectativas de auto-eficácia não operam independentemente dos fatores contextuais. Ao contrário, eles parecem estar envolvidos num complexo sistema de retroalimentação onde comportamento, sentimento e cognição interagem continuamente.

Do que expomos até o momento, é razoável pensar que o tratamento dos sentimentos de segurança deveria centrar-se nas mudanças das cognições da pessoa, com ênfase explícita na correção de distorções de locus de controle, atribuição de causalidade e expectativas de auto-eficácia. Além disso, buscamos desenvolver, junto à pessoa, o desenvolvimento de habilidades

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específicas pessoais que a auxiliem a alcançar seus objetivos, enfrentamento de situações consideradas difíceis e persistência frente aos obstáculos que, eventualmente, ocorram. Com esse procedimento geral, temos obtido mudanças comportamentais e cognitivas (em direção a um maior senso de poder pessoal) que levam a pessoa a se sentir mais segura e confiante em suas habilidades e capacidades.

Referências

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