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Prosódia e enunciação na clínica com bebês

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Academic year: 2021

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10 - Prosódia e enunciação na clínica com bebês 10 - Prosódia e enunciação na clínica com bebês -quando a entoação diz mais do que se queria dizer--quando a entoação diz mais do que se queria dizer-11

Julieta Jerusalinsky Julieta Jerusalinsky

Em 1969, Jakobson, em seu livro

Em 1969, Jakobson, em seu livro  Linguagem  Linguagem infantil infantil e e afasiaafasia, aponta um fenômeno que, aponta um fenômeno que denomina como

denomina como língua de babáslíngua de babás, para designar o modo peculiar que os adultos têm de falar com os, para designar o modo peculiar que os adultos têm de falar com os  bebês

 bebês e e crianças crianças pequenas,pequenas, utilizando uma fala que se adapta às possibilidades lingüisticas doutilizando uma fala que se adapta às possibilidades lingüisticas do infante (...), aproximando-se às suas particularidades fonéticas, léxicas e gramaticais

infante (...), aproximando-se às suas particularidades fonéticas, léxicas e gramaticais22..

Atualmente no Brasil o termo

Atualmente no Brasil o termo manhêsmanhês33 tem sido amplamente utilizado para denominar otem sido amplamente utilizado para denominar o

modo com que as mães costumam falar

modo com que as mães costumam falar com seus bebêscom seus bebês44: com uma entoação que se caracteriza pela: com uma entoação que se caracteriza pela

grande incidência dos picos prosódicos, pela sintaxe simplificada, pelo uso de diminutivos, pela grande incidência dos picos prosódicos, pela sintaxe simplificada, pelo uso de diminutivos, pela evitação de encontros consoantais -freqüentemente suavizados por substituição de fonemas-, pela evitação de encontros consoantais -freqüentemente suavizados por substituição de fonemas-, pela repetição silábica e pelo uso de um registro de voz mais alto que o habitual.

repetição silábica e pelo uso de um registro de voz mais alto que o habitual.

Então, se há algo que caracteriza a fala das mães quando elas se dirigem ao seu bebê, é a Então, se há algo que caracteriza a fala das mães quando elas se dirigem ao seu bebê, é a  prosódia, o amplo uso da musicalidade que aco

 prosódia, o amplo uso da musicalidade que acompanha aquilo que se tem a dizer. Espontaneamempanha aquilo que se tem a dizer. Espontaneamentente  –ou

 –ou seja, seja, a a partir partir do do seu seu saber saber inconscienteinconsciente- - as as mães mães fazem fazem uso uso da da prosódia, prosódia, da da entoação, entoação, numnum momento em que aquilo que é dito ainda não pode ser entendido pelo bebê, na medida em que nele momento em que aquilo que é dito ainda não pode ser entendido pelo bebê, na medida em que nele estão apenas começando a inscrever-se as leis fonéticas, sintáticas e gramaticais da língua.

estão apenas começando a inscrever-se as leis fonéticas, sintáticas e gramaticais da língua. Ao acompanhar o que é dito

Ao acompanhar o que é dito por picos prosódicos, por uma musicalidade, a mãe por picos prosódicos, por uma musicalidade, a mãe produz umaproduz uma erotização no ato da escuta e

erotização no ato da escuta e da fonação: o bebê, se é da fonação: o bebê, se é efetivamente convocadefetivamente convocado por esta voz, o por esta voz, dirige odirige o seu olhar à mãe, respondendo com uma excitação psicomotora ampla. A mãe não só fala com esta seu olhar à mãe, respondendo com uma excitação psicomotora ampla. A mãe não só fala com esta sintaxe simples e com esta entoação peculiar, ela também costuma acompanhar esta fala por uma sintaxe simples e com esta entoação peculiar, ela também costuma acompanhar esta fala por uma rica expressão facial e movimentação dos lábios, convocando o bebê não só

rica expressão facial e movimentação dos lábios, convocando o bebê não só a escutá-la, mas a olhá-a escutá-la, mas a olhá-la. Quando a mãe silencia, dando espaço para que venha a fonação do bebê –sustentando para ele a la. Quando a mãe silencia, dando espaço para que venha a fonação do bebê –sustentando para ele a matriz dialógica-, o bebê produz ali suas vocalizações que se dirigem ao outro, que advém no matriz dialógica-, o bebê produz ali suas vocalizações que se dirigem ao outro, que advém no intervalo, nessa brecha que o outro sustenta para ele. Isto é amplamente observável já no segundo intervalo, nessa brecha que o outro sustenta para ele. Isto é amplamente observável já no segundo mê

mês s de de vivida da do do bebebêbê, , coconfnfigigururanando do o o quque e os os lilingngüiüiststas as chchamamam am de de “c“comompoportartamemento nto dede revezamento”.

revezamento”.55

Esta produção, perfeitamente observáve

Esta produção, perfeitamente observável em bebês tão l em bebês tão pequenos, vem demostrar que a voz épequenos, vem demostrar que a voz é um objeto oral primordial

um objeto oral primordial66..

Ma

Mas s é é funfundamdamenental tal que que tal tal proprosódsódia ia conconvocvocanante te estesteja eja artarticuiculadlada a a a uma uma altalternernânânciacia sustentada pela mãe ao dirigir-se ao bebê para que se produza o enlaçamento do bebê no ato da sustentada pela mãe ao dirigir-se ao bebê para que se produza o enlaçamento do bebê no ato da enunciação. A mãe fala e faz um intervalo na medida em que supõe o bebê como sujeito que tem enunciação. A mãe fala e faz um intervalo na medida em que supõe o bebê como sujeito que tem algo a dizer, sustenta ali a suposição de um desejo no bebê, sustenta ali a alteridade. Temos aí a voz, algo a dizer, sustenta ali a suposição de um desejo no bebê, sustenta ali a alteridade. Temos aí a voz,

11Este texto foi apresentado no V encontro nacional sobre o bebê –Belo Horizonte, 2004. Contou com aEste texto foi apresentado no V encontro nacional sobre o bebê –Belo Horizonte, 2004. Contou com a

interlocução da psicanalista Ângela Vorcaro e a

interlocução da psicanalista Ângela Vorcaro e a leitura crítica dos colegas do Laboratório leitura crítica dos colegas do Laboratório de Psicopatologiade Psicopatologia Fundamental PUC-SP coordenado pelo Prof. Manoel Berlinck.

Fundamental PUC-SP coordenado pelo Prof. Manoel Berlinck.

22Roman Jakobson (1969),Roman Jakobson (1969), Lenguaje Infantil y afasia Lenguaje Infantil y afasia, Buenos Aires, Ayuso, pág. 24 e 25., Buenos Aires, Ayuso, pág. 24 e 25.

33Os termos geralmente utilizados em inglês sãoOs termos geralmente utilizados em inglês são motheresemotherese ee baby-talk baby-talk e, em francês,e, em francês, parler bébé parler bébé..

44Acerca doAcerca do manhêsmanhês, ver as pesquisas de Silvia Ferreira (2001) e de Erika Parlato (2001), ambas apresentadas no, ver as pesquisas de Silvia Ferreira (2001) e de Erika Parlato (2001), ambas apresentadas no

Congresso internacional de psicanálise e clínica de bebês, Curitiba,

Congresso internacional de psicanálise e clínica de bebês, Curitiba, junho de 2001.junho de 2001.

55Benedicte de Boysson BardBenedicte de Boysson Bardie (1998). ie (1998). O papel da prosódia na emergênO papel da prosódia na emergência da linguagem como estruturacia da linguagem como estrutura

intencional dentro e a partir de uma estrutura biológica,

intencional dentro e a partir de uma estrutura biológica,  A inteligência anterior à palav A inteligência anterior à palavrara, , org. org. Michel Michel Soulé,Soulé, Porto Alegre, Artes Médicas, pág. 22.

Porto Alegre, Artes Médicas, pág. 22.

66Laznik, M.C. (2000). A voz como primeiro objeto da pulsão oral,Laznik, M.C. (2000). A voz como primeiro objeto da pulsão oral,  Estilos da clínica Estilos da clínica, n.8, São Paulo, USP – , n.8, São Paulo, USP – 

Instituto de Psicologia. Instituto de Psicologia.

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a voz como objeto da pulsão oral que produz laço com o outro e que também assume o sentido de a voz como objeto da pulsão oral que produz laço com o outro e que também assume o sentido de chamado de um sujeito.

chamado de um sujeito.

Vale a pena recordar que a palavra

Vale a pena recordar que a palavra vozvoz está etimologicamente relacionada com o termoestá etimologicamente relacionada com o termo voxvox do latim, que significa tanto vocalizar na língua quanto produzir um chamado. Daí os termos do latim, que significa tanto vocalizar na língua quanto produzir um chamado. Daí os termos invocação

invocação, , quque e imimplplicica a chchamamar ar os os dedeususeses;; evocaçãoevocação, , quque e imimplplicica a chchamamar ar à à lelembmbrarançnça; a; ouou convocação

convocação, que implica chamar entre pares. Enquanto o termo, que implica chamar entre pares. Enquanto o termo  phone phone, do grego, do qual se, do grego, do qual se derivam

derivam  fonação fonação,, afoniaafonia,, disfoniadisfonia,, cacofoniacacofonia, refere-se especificamente à produção do som, o, refere-se especificamente à produção do som, o termo

termo vozvoz implica que a produção sonora seja tomada como implica que a produção sonora seja tomada como chamado.chamado.  Nessa direção,

 Nessa direção, podemos dizer podemos dizer que é que é a mãe a mãe que “dá que “dá a a voz” ao voz” ao bebê ao bebê ao tomar suas tomar suas fonaçõesfonações como um chamado. Se a mãe toma

como um chamado. Se a mãe toma o grito do bebê apenas como um som, o grito do bebê apenas como um som, apenas discrimina em queapenas discrimina em que nota da escala musical o som foi emitido, em lugar de perguntar “que foi, nenê?”, ou seja, de nota da escala musical o som foi emitido, em lugar de perguntar “que foi, nenê?”, ou seja, de  produzir uma interroga

 produzir uma interrogação pelo enigma do dção pelo enigma do desejo que supõesejo que supõe ao bebê, tereme ao bebê, teremos ali apenas a dimeos ali apenas a dimensãonsão da

da  phone phone, mas não a da, mas não a da voxvox. É preciso que a vocalização como puro objeto acústico caia, seja. É preciso que a vocalização como puro objeto acústico caia, seja recalcada em seu estatuto puramente acústico para ganhar um sentido enigmático e ser tomada na recalcada em seu estatuto puramente acústico para ganhar um sentido enigmático e ser tomada na dimensão de um chamado no laço com o outro. É justamente a partir da instauração de um enigma dimensão de um chamado no laço com o outro. É justamente a partir da instauração de um enigma do desejo que a criança se tornará falante na tentativa de a ele responder.

do desejo que a criança se tornará falante na tentativa de a ele responder.

Por isso, ainda que o bebê de poucos meses não tenha condições de entender o sentido do Por isso, ainda que o bebê de poucos meses não tenha condições de entender o sentido do que está sendo dito, dado que ele não nasce com a língua previamente inscrita, ele já começa a ser  que está sendo dito, dado que ele não nasce com a língua previamente inscrita, ele já começa a ser  tomado no funcionamento da linguagem. A musicalidade presente na fala da mãe, seus picos tomado no funcionamento da linguagem. A musicalidade presente na fala da mãe, seus picos  prosódicos e

 prosódicos e seus silêncios seus silêncios vêm sublinhar vêm sublinhar inconscienteminconscientemente ente certos pontos certos pontos significativos do significativos do que que éé dito. Algo ali convoca o bebê

dito. Algo ali convoca o bebê, produz marca nele, inscriçã, produz marca nele, inscrição, não pela o, não pela força do estímulo perceptivoforça do estímulo perceptivo recebido de modo aleatório do meio, mas justamente pelo que fica sublinhado a partir da tela recebido de modo aleatório do meio, mas justamente pelo que fica sublinhado a partir da tela significante do Outro.

significante do Outro.

Fica então claro que a voz não vale ali enquanto puro estímulo sonoro, esse estímulo não Fica então claro que a voz não vale ali enquanto puro estímulo sonoro, esse estímulo não tem por que deixar marca ou ser diferente do ruído das buzinas que vêm da rua ou até mesmo das tem por que deixar marca ou ser diferente do ruído das buzinas que vêm da rua ou até mesmo das vozes do rádio (indiferenciação que aliás percebemos em crianças com graves patologias de vozes do rádio (indiferenciação que aliás percebemos em crianças com graves patologias de constituição psíquica), a não ser que esteja articulado ao enigma do desejo, a não ser que introduza constituição psíquica), a não ser que esteja articulado ao enigma do desejo, a não ser que introduza  para o bebê

 para o bebê a interrogação “a interrogação “ isso fala, o que isso quer de mim?isso fala, o que isso quer de mim?7 7 .. Aí a voz deixa marca, deixa comoAí a voz deixa marca, deixa como

rastro a produção de um enigma para o bebê. Neste caso, ainda que o bebê não tenha o domínio da rastro a produção de um enigma para o bebê. Neste caso, ainda que o bebê não tenha o domínio da língua, ele já está confrontado com o enigma do desejo e, portanto, com o que é próprio do língua, ele já está confrontado com o enigma do desejo e, portanto, com o que é próprio do funcionamento humano na ordem da

funcionamento humano na ordem da linguagem.linguagem.

Mas como podemos ler os efeitos desta estrutura que se precipitam como inscrições no Mas como podemos ler os efeitos desta estrutura que se precipitam como inscrições no  bebê?

 bebê?

Justamente uma questão que tem ocupado os lingüistas é a de interrogar se o balbucio dos Justamente uma questão que tem ocupado os lingüistas é a de interrogar se o balbucio dos  bebês guarda

 bebês guarda alguma relação alguma relação com a língua matecom a língua materna e como esta rerna e como esta relação vai sendlação vai sendo estabelecido estabelecida.a. Ma

Mas, s, anantes tes de de proprossesseguiguir, r, é é preprecisciso o fazfazer er um um pepequequeno no escesclarlareciecimenmento to acacercerca a do do queque entendemos por língua materna, uma vez que tal termo tem dado margem a certas confusões entendemos por língua materna, uma vez que tal termo tem dado margem a certas confusões teóricas na interlocução entre lingüística e

teóricas na interlocução entre lingüística e psicanálisepsicanálise. Tal . Tal termo é amplamente usado na lingüísticatermo é amplamente usado na lingüística  para definir a língua compartilhada por uma cultura na qual o infante é criado, em contraposição às  para definir a língua compartilhada por uma cultura na qual o infante é criado, em contraposição às

demais línguas que, a partir

demais línguas que, a partir daí, ficarão situadas como estrangeiras. Se tomamos tal daí, ficarão situadas como estrangeiras. Se tomamos tal questão desde aquestão desde a ótica da constituição do sujeito, a língua materna coloca a sujeição a uma lei no laço da mãe com o ótica da constituição do sujeito, a língua materna coloca a sujeição a uma lei no laço da mãe com o  bebê

 bebê  –a  –a língua língua materna materna é é aquela aquela na na qual, qual, para para aquele aquele que que fala, fala, a a mãe mãe foi foi interditadainterditada88 pela  pela leilei

 paterna. Enquanto o

 paterna. Enquanto o manhêsmanhês implica um certoimplica um certo particularismo particularismo99 de linguagem compartilhada entre ade linguagem compartilhada entre a 77 Como fica situado a partir do “Como fica situado a partir do “Che VuoiChe Vuoi?” (o ?” (o que queque queresres?) apont?) apontado por Jacqado por Jacques ues LacLacan (1960an (1960),),

Subversión del sujeto y dialéctica del deseo,

Subversión del sujeto y dialéctica del deseo,  Escritos 2 Escritos 2, Buenos Aires, Siglo Veintiuno, pág. 794; e como, Buenos Aires, Siglo Veintiuno, pág. 794; e como retoma Contardo Calligaris (1983).

retoma Contardo Calligaris (1983). Hipótese sobre o fantasma, Porto Alegre, Artes Médicas, pág. 26. Hipótese sobre o fantasma, Porto Alegre, Artes Médicas, pág. 26.

88Charles Melman (1989).Charles Melman (1989). Imigrantes, Imigrantes, São Paulo, Escuta, pág. 32.São Paulo, Escuta, pág. 32.

99Retomamos aqui a discussão levantada por Saussure ente duas Retomamos aqui a discussão levantada por Saussure ente duas forças que se enfrentam na forças que se enfrentam na aquisição daaquisição da

linguagem pela criança: “o espírito particularista” e

linguagem pela criança: “o espírito particularista” e a “força unificadora”. Discussão que é a “força unificadora”. Discussão que é retomada por retomada por  Jakobson para situar a

Jakobson para situar a língua de babáslíngua de babás.. Ferdinand de Saussure (1922). Curso

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mãe e o bebê com a utilização de termos que nem sempre fazem parte da legalidade da língua, mãe e o bebê com a utilização de termos que nem sempre fazem parte da legalidade da língua, ainda que o uso de alguns deles acabe se generalizando -como mamá, nenê, naná para designar a ainda que o uso de alguns deles acabe se generalizando -como mamá, nenê, naná para designar a mamadeira, o bebê, o dormir, no Brasil.

mamadeira, o bebê, o dormir, no Brasil. Há ainda o termo

Há ainda o termo alínguaalíngua cunhado por Lacan para situar o modo singular em que o sujeitocunhado por Lacan para situar o modo singular em que o sujeito se representa no ato da fala. Para ser falante não basta incorporar as regras gramaticais e repeti-las se representa no ato da fala. Para ser falante não basta incorporar as regras gramaticais e repeti-las corretamente,

corretamente, o ato de falar implica uma forçagemo ato de falar implica uma forçagem (sic)(sic) da linguagem, esse movimento deda linguagem, esse movimento de desaco

desacomodaçmodação e ão e incomincomodaçãodação o que confunque confunde os de os lingülingüistas e istas e que surge como alínguque surge como alíngua diante daa diante da  falha na captura de sentido in

 falha na captura de sentido instaurado a partir da metáfora pastaurado a partir da metáfora parternarterna..1010

 Nesse

 Nesse sentido sentido podemos podemos pensar pensar que que oo mamanhêsmamanhês é uma produção materna no intuito deé uma produção materna no intuito de recobrir parcialmente para o bebê a inevitável castração que a

recobrir parcialmente para o bebê a inevitável castração que a língua comporta, mas que, ao mesmolíngua comporta, mas que, ao mesmo tempo, fica situado como um efeito de tal castração. Evoco, a partir disso, uma pixação que foi tempo, fica situado como um efeito de tal castração. Evoco, a partir disso, uma pixação que foi feita anonimamente na porta uma clínica de crianças

feita anonimamente na porta uma clínica de crianças1111: : ““o morno vazio das coisas”o morno vazio das coisas”, seguida da, seguida da

assinatura “

assinatura “os sujeitos”.os sujeitos”. É esta operação de um certo recobrimento que fica em jogo noÉ esta operação de um certo recobrimento que fica em jogo no mamanhêsmamanhês:: o de tornar

o de tornar o vazio das coisas produzido pela interdição da o vazio das coisas produzido pela interdição da língua um pouquinho mais morno.língua um pouquinho mais morno.  Não

 Não por por acaso acaso –como –como obseva obseva Jakobson- Jakobson- esse esse modo modo de de falar falar próprio próprio da da língua língua de de babásbabás muitas vezes também se faz presente no trato íntimo dos amantes. Isso deixa evidente o quanto a muitas vezes também se faz presente no trato íntimo dos amantes. Isso deixa evidente o quanto a marca do infantil no adulto, o seu fantasma e o que ele procura recobrir da interdição, fica em jogo marca do infantil no adulto, o seu fantasma e o que ele procura recobrir da interdição, fica em jogo no laço amoroso, seja ele

no laço amoroso, seja ele no exercício da maternidade ou no laço no exercício da maternidade ou no laço conjugal.conjugal.1212

A questão acerca da relação entre o

A questão acerca da relação entre o balbucio dos bebês e a língua balbucio dos bebês e a língua materna recebeu diferentesmaterna recebeu diferentes respostas a partir das diferentes concepções teóricas de aquisição da linguagem.

respostas a partir das diferentes concepções teóricas de aquisição da linguagem. 1313 Exemplo disso éExemplo disso é

o

o procprocedimeedimento nto expeexperimenrimental tal compcomparatiarativo vo realirealizadzado o pelo grupo pelo grupo de de pesqpesquisa de uisa de BeneBenedicte dedicte de Boysson Bardie, ao tomar o balbucio de bebês de diferentes nacionalidades e submeter tais Boysson Bardie, ao tomar o balbucio de bebês de diferentes nacionalidades e submeter tais  balbucios à análise

 balbucios à análise comparativa de lingüistas comparativa de lingüistas e de e de adultos leigos com adultos leigos com as mesmas as mesmas línguas maternaslínguas maternas que os bebês. Conclui-se a partir de tal procedimento que, em mais de 70% dos casos, tais adultos que os bebês. Conclui-se a partir de tal procedimento que, em mais de 70% dos casos, tais adultos reconheciam claramente o balbucio de bebês com 8 meses pertencentes à sua mesma língua reconheciam claramente o balbucio de bebês com 8 meses pertencentes à sua mesma língua materna.

materna.1414

Como aponta Jakobson,

Como aponta Jakobson, os verdadeiros inícios da linguagem infantil estão precedidos por os verdadeiros inícios da linguagem infantil estão precedidos por  um período em que um bebê é capaz de articular uma soma de sons que nunca se encontram um período em que um bebê é capaz de articular uma soma de sons que nunca se encontram reunidos simultaneamente em uma só língua

reunidos simultaneamente em uma só língua- caracterizando o que se convencionou chamar de- caracterizando o que se convencionou chamar de  balbucio proprioceptivo. Mas, logo que

 balbucio proprioceptivo. Mas, logo que a criança entra a criança entra na etapa lingüistica,na etapa lingüistica, tais sons desaparecemtais sons desaparecem de seu estoque fônico

de seu estoque fônico..1515

É em torno dos 6 meses de vida que os bebês começam a produzir balbucios com valor  É em torno dos 6 meses de vida que os bebês começam a produzir balbucios com valor  lingüístico, ou seja, balbucios que já implicam uma seleção dos fonemas da língua Até essa idade lingüístico, ou seja, balbucios que já implicam uma seleção dos fonemas da língua Até essa idade os bebês árabes, chineses ou franceses

os bebês árabes, chineses ou franceses1616 balbuciam de modo relativamente semelhante. A partir daíbalbuciam de modo relativamente semelhante. A partir daí

os balbucios passam a se diferenciar, ao

os balbucios passam a se diferenciar, ao mesmo tempo em que vai mesmo tempo em que vai sendo progressivamesendo progressivamente perdidante perdida a capacidade de produzir fonemas que não fazem parte

a capacidade de produzir fonemas que não fazem parte da língua materna.da língua materna.

Roman Jakobson (1969), obra citada, pág. 24. Roman Jakobson (1969), obra citada, pág. 24.

10

10 Ver: Alfredo Jerusalinsky (2002) seminário “A metáfora paterna e sua relação com a alíngua, proferido naVer: Alfredo Jerusalinsky (2002) seminário “A metáfora paterna e sua relação com a alíngua, proferido na

DERDIC –PUC/SP, 18/03/2002, inédito. DERDIC –PUC/SP, 18/03/2002, inédito.

11

11Trata-se do Centro Dra. Lydia Coriat em Buenos Aires.Trata-se do Centro Dra. Lydia Coriat em Buenos Aires. 12

12Jakobson, idem.Jakobson, idem. 13

13Noemi Giulianni. Aulas sobre a aquisição da linguagem proferidas na FEPI, Buenos Aires, 1996.Noemi Giulianni. Aulas sobre a aquisição da linguagem proferidas na FEPI, Buenos Aires, 1996. 14

14Benedicte de Boysson Bardies (1984). Dicernable differences in Benedicte de Boysson Bardies (1984). Dicernable differences in lhe babbling of infants lhe babbling of infants accordig to targetaccordig to target

leguage,

leguage, Journal of child language Journal of child language, p-p. 1-15., p-p. 1-15.

15

15Jakobson, obra citada, pág. 31 e 32.Jakobson, obra citada, pág. 31 e 32. 16

16 A A pespesquiquisa sa escescolholheu eu bebbebês ês insinserieridos dos em em taitais s línlínguaguas s uma uma vez vez que que as as mesmesmas mas aprapreseesentantam m difdifereerençançass

consideráveis entre si: a primeira apresentando forte faringolização; o chines ou cantonês sendo uma língua tonal consideráveis entre si: a primeira apresentando forte faringolização; o chines ou cantonês sendo uma língua tonal sem sistema de acentuação e sem articulação secundária; e o francês que difere do chinês nos últimos dois sem sistema de acentuação e sem articulação secundária; e o francês que difere do chinês nos últimos dois aspectos. São línguas que também diferem desde o aspecto fonético: o árabe apresenta uma grande variedade de aspectos. São línguas que também diferem desde o aspecto fonético: o árabe apresenta uma grande variedade de realizações consonatais e uma relativa pobreza vocálica, distinguindo-se do chinês

(4)

Vale destacar que a idade em que se produz o advento do balbucio de valor lingüístico é a Vale destacar que a idade em que se produz o advento do balbucio de valor lingüístico é a mesma em que ocorre o início do

mesma em que ocorre o início do estádio do espelhoestádio do espelho1717, este momento em que fica evidente como o, este momento em que fica evidente como o

 bebê,

 bebê, para para constituir-se, constituir-se, para para constituir constituir o o seu seu Eu, Eu, refere-se refere-se ao ao Outro, Outro, aliena-se aliena-se à à imagem imagem que que oo Outro lhe oferece. Aliena-se também, podemos dizer, às articulações sonoras que fazem parte da Outro lhe oferece. Aliena-se também, podemos dizer, às articulações sonoras que fazem parte da língua em que é tomado pelo outro, tendo que trilhar um longo caminho para poder vir a língua em que é tomado pelo outro, tendo que trilhar um longo caminho para poder vir a apropriar-se dela.

se dela.1818

 Não por

 Não por acaso, em acaso, em crianças que crianças que apresentam graves apresentam graves patologias de patologias de constituição psíquica constituição psíquica queque implicam um fracasso no estabelecimento do estádio do espelho –ou seja, deste reconhecimento e implicam um fracasso no estabelecimento do estádio do espelho –ou seja, deste reconhecimento e constituição do Eu a partir

constituição do Eu a partir da alienação ao Outro-, freqüentemente encontramos a produção de umada alienação ao Outro-, freqüentemente encontramos a produção de uma sér

série ie de de vocvocalializazaçõeções s que que esestão tão tão tão forfora a da da leglegalialidadade de da da línlíngua gua que que temtemos os difdificuiculdaldade de dede diferenciá-las auditivamente, de reproduzi-las e até mesmo de inscrevê-las nos r

diferenciá-las auditivamente, de reproduzi-las e até mesmo de inscrevê-las nos registros clínicos.egistros clínicos. Mas, antes mesmo da produção do balbucio de valor lingüistico, já podemos encontrar em Mas, antes mesmo da produção do balbucio de valor lingüistico, já podemos encontrar em  bebês com meno

 bebês com menos de seis meses em francs de seis meses em franca constituição o progrea constituição o progressivo enriquecimenssivo enriquecimento da modulaçãoto da modulação das vocalizações. O choro ininterrupto do recém-nascido diante de algum desconforto físico passa das vocalizações. O choro ininterrupto do recém-nascido diante de algum desconforto físico passa  progressivame

 progressivamente nte a a ser ser substituído substituído por por choros choros com com intervalos. intervalos. Na Na medida medida em em que que o o choro choro já já sese instalou em um circuito de demanda com a mãe, o bebê chora e espera ser respondido. Suas instalou em um circuito de demanda com a mãe, o bebê chora e espera ser respondido. Suas  produções vocais também

 produções vocais também vão variando vão variando quanto à quanto à intensidade, ao intensidade, ao ritmo e ritmo e à entoação à entoação na medida na medida emem que o ato da vocalizaçã

que o ato da vocalização o instala-se efetivamente cominstala-se efetivamente como um jogo erógeno no laço com o outro.o um jogo erógeno no laço com o outro.

Enquanto o balbucio de bebês com dez meses caracteriza-se por ser mais segmentado, com Enquanto o balbucio de bebês com dez meses caracteriza-se por ser mais segmentado, com mais articulação fonética e com uma certa diminuição da entoação, em torno dos oito meses o mais articulação fonética e com uma certa diminuição da entoação, em torno dos oito meses o  balbucio dos

 balbucio dos bebês apresenta-se bebês apresenta-se no no auge auge do do uso uso de de parâmetros entoativos parâmetros entoativos e e organização temporalorganização temporal das vocalizações semelha

das vocalizações semelhantes às da língua ntes às da língua utilizada pelos adultos que os rodeiam.utilizada pelos adultos que os rodeiam. 1919

O corpo do bebê é, em primeira instância, um

O corpo do bebê é, em primeira instância, um receptáculo temporal receptáculo temporal  -como aponta Jean-como aponta Jean Bergès. Se inicialmente comparece uma ritmicidade nos ciclos biológicos do bebê, tais ritmos Bergès. Se inicialmente comparece uma ritmicidade nos ciclos biológicos do bebê, tais ritmos tornam-se homotéticos à ritmicidade da presença e a ausência da mãe e à oferta e recusa que ela tornam-se homotéticos à ritmicidade da presença e a ausência da mãe e à oferta e recusa que ela  produz

 produz dos dos objetos, objetos, estabeleceestabelecendo ndo deste deste modo modo um um ritmo ritmo nos nos ciclos ciclos vitais vitais do do bebê. bebê. Uma Uma dasdas  primeiras marcas

 primeiras marcas do Outro do Outro que podemos lque podemos ler na er na produção do produção do bebê é bebê é a a inscrição desta inscrição desta estrutura queestrutura que supõe uma temporalidade ritmada das funções e seu

supõe uma temporalidade ritmada das funções e seu funcionamento: seja em fome-saciedade, sono-funcionamento: seja em fome-saciedade, sono-vigília,

vigília, repouso-atividarepouso-atividadede2020e até mesmo na ritmicidade que comparece nas vocalizações.e até mesmo na ritmicidade que comparece nas vocalizações.

Ao cantar uma cantiga para um bebê do primeiro quatrimestre, ao falar-lhe

Ao cantar uma cantiga para um bebê do primeiro quatrimestre, ao falar-lhe emem mamanhêsmamanhês, já, já  podemos

 podemos perceber perceber o o efeito efeito produzido produzido pelo pelo ritmo ritmo e e entoação entoação neste neste bebê bebê engajado engajado no no laço laço com com oo outro.

outro. A partir  A partir da melodia da melodia que outro que outro lhe dirige, lhe dirige, ele já ele já experimenta experimenta a tensão a tensão da antecipação da antecipação que oque o andamento da cantiga lhe permite supor e surpreende-se com a alteração neste andamento.

andamento da cantiga lhe permite supor e surpreende-se com a alteração neste andamento.2121Ele jáEle já

experimenta ali um prazer no ritmo, ainda que não entenda o sentido, pois as escanções temporais experimenta ali um prazer no ritmo, ainda que não entenda o sentido, pois as escanções temporais da voz e sua musicalidade produziram marca no corpo capturando o bebê numa primeira

da voz e sua musicalidade produziram marca no corpo capturando o bebê numa primeira matrizmatriz  simbolizante

 simbolizante..2222

Assim, os bebês, num momento em que ainda nem sequer têm plenamente organizada uma Assim, os bebês, num momento em que ainda nem sequer têm plenamente organizada uma seleção dos fonemas da língua, contam com o ritmo e a entoação de suas vocalizações como uma seleção dos fonemas da língua, contam com o ritmo e a entoação de suas vocalizações como uma

17

17 JacqJacques Lacan (1949). El ues Lacan (1949). El estaestadio del dio del espeespejo como formador del jo como formador del yo tal yo tal como se nos como se nos revelrevela en a en lala

experiencia psicoanalítica,

experiencia psicoanalítica, Escritos 1,Escritos 1, Buenos Aires, Siglo Veintiuno.Buenos Aires, Siglo Veintiuno.

18

18 PoiPois, s, comcomo o apoaponta nta JaJakobkobson son (ob(obra ra citcitadaada, , págpág. . 32)32), , ao ao ententrar rar na na etaetapa pa linglingüísüístictica a a a cricriançança a perperde de aa

 possibilidade de

 possibilidade de produzir não produzir não só todos só todos aqueles sons que aqueles sons que não fazem não fazem parte da parte da língua falada língua falada em seu em seu entornoentorno , mas , mas também muitos dos sons comuns ao seu balbucio e à língua falada pelos adultos, apesar do modelo que esta também muitos dos sons comuns ao seu balbucio e à língua falada pelos adultos, apesar do modelo que esta representa para ele.

representa para ele. Será então preciso que, a partir da alienação, a Será então preciso que, a partir da alienação, a criança possa realizar a separação - traduzidacriança possa realizar a separação - traduzida em termos de aquisição fonológica por uma possibilidade de apropriar-se daquilo que provém do Outro.

em termos de aquisição fonológica por uma possibilidade de apropriar-se daquilo que provém do Outro.

19

19Benedicte de Boysson Bardie (1984), artigo Benedicte de Boysson Bardie (1984), artigo citado.citado. 20

20Jean Bergès (1988), função estruturante do Jean Bergès (1988), função estruturante do prazer,prazer, Escritos da Criança Escritos da Criança, n.2, Porto Alegre, Centro Lydia, n.2, Porto Alegre, Centro Lydia

Coriat, Segunda edição, pág. 54. Coriat, Segunda edição, pág. 54.

21

21Ângela Vorcaro (2001), O organismo e a Ângela Vorcaro (2001), O organismo e a linguagem maternante: hipótese de trabalho sobre as condições dolinguagem maternante: hipótese de trabalho sobre as condições do

advento da fala e seus sintomas

advento da fala e seus sintomas, trabalho apresentado no Congresso internacional de , trabalho apresentado no Congresso internacional de psicanálise e clínica depsicanálise e clínica de  bebês, Curitiba, junho de 2001.

 bebês, Curitiba, junho de 2001.

22 22Idem.Idem.

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 primeira

 primeira diferenciação diferenciação importante importante para para a a produção produção sonora sonora em em seu seu caráter caráter de de laço laço com com o o outro.outro. En

Enququananto to do do lalado do da da mãmãe, e, cocom m a a prprododuçução ão dodo mamanhêmamanhês, s, ficfica a evevididenente te a a imimpoportârtâncncia ia dada musicalidade que acompanha a fala nesta tentativa de convocar, de engajar o bebê no prazer da musicalidade que acompanha a fala nesta tentativa de convocar, de engajar o bebê no prazer da voca

vocalizalização, ao ção, ao mesmmesmo o temptempo o em em que, inconscque, inconscienteientementemente, , aproaproxima sua xima sua fala à fala à posspossibiliibilidadedade lingüística do bebê. Neste jogo de identificações - em que a mãe aproxima sua fala à possibilidade lingüística do bebê. Neste jogo de identificações - em que a mãe aproxima sua fala à possibilidade lingüística do bebê - encontramos claramente o que Jakobson aponta ao afirmar que o bebê é lingüística do bebê - encontramos claramente o que Jakobson aponta ao afirmar que o bebê é umum imitador imitado

imitador imitado2323..

É certo que, quando alguém já

É certo que, quando alguém já está plenamente instalado como sujeito falante na linguagem,está plenamente instalado como sujeito falante na linguagem, quando já tem um domínio fonético, sintático e gramatical da língua, a prosódia vai exercendo um quando já tem um domínio fonético, sintático e gramatical da língua, a prosódia vai exercendo um  papel cada vez

 papel cada vez mais restrito mais restrito na produção de na produção de sentido, ainda que sentido, ainda que sempre tenha um sempre tenha um papel decisivo napapel decisivo na distinção da modalidade das

distinção da modalidade das frases –de interrogação, asserção ou frases –de interrogação, asserção ou exclamaçãoexclamação..

Por outro lado, também é bastante freqüente na ironia o uso do parâmetro de entoação para Por outro lado, também é bastante freqüente na ironia o uso do parâmetro de entoação para intencionalmente subverter o sentido do enunciado. Por exemplo, ao afirmar:

intencionalmente subverter o sentido do enunciado. Por exemplo, ao afirmar:  Bonito, hein! Bonito, hein! ouou QueQue beleza!

beleza! sobre sobre algo algo que que foi foi considerado considerado “moralmente “moralmente feio”, feio”, ouou Claro! É isso mesmo! Tens toda aClaro! É isso mesmo! Tens toda a razão!

razão! quando não se concorda com nada do que quando não se concorda com nada do que o interlocutor está a o interlocutor está a afirmar.afirmar. Contaram-me, neste sentido, uma brincadeira interessante feita por um

Contaram-me, neste sentido, uma brincadeira interessante feita por um grupo de amigos quegrupo de amigos que se reunia periodicamente para cantar e tocar músicas. Depois de algumas reuniões em que já se reunia periodicamente para cantar e tocar músicas. Depois de algumas reuniões em que já estavam cansados de se ouvir cantando o mesmo repertório surgiu

estavam cansados de se ouvir cantando o mesmo repertório surgiu uma brincadeira: cantar os tangosuma brincadeira: cantar os tangos em ritmo de samba. Isto evidentemente produziu muitos efeitos cômicos, pois a letra dramática do em ritmo de samba. Isto evidentemente produziu muitos efeitos cômicos, pois a letra dramática do tango ficava um tanto alterada, subvertida pelo ritmo do samba. É claro que nem todo samba é tango ficava um tanto alterada, subvertida pelo ritmo do samba. É claro que nem todo samba é alegre e nem todo tango é dramático, há exceções. O interessante é pensar o que pode se produzir  alegre e nem todo tango é dramático, há exceções. O interessante é pensar o que pode se produzir  como efeito de significação a

como efeito de significação a partir deste entrecruzamento entre letra e partir deste entrecruzamento entre letra e música.música.

Já não como ato intencional, mas como formação do inconsciente, temos a voz que vacila, Já não como ato intencional, mas como formação do inconsciente, temos a voz que vacila, que fraqueja, que desafina, como pequenos atos da psicopatologia cotidiana que demonstram como que fraqueja, que desafina, como pequenos atos da psicopatologia cotidiana que demonstram como a voz e sua entoação no ato da enunciação podem trair o locutor, revelando mais do que se queria a voz e sua entoação no ato da enunciação podem trair o locutor, revelando mais do que se queria dizer. Prova disso é o orador que, antes de falar, produz um pequeno ruído para limpar a garganta, dizer. Prova disso é o orador que, antes de falar, produz um pequeno ruído para limpar a garganta, como quem tenta precaver-se desta possível “traição” da voz em relação ao que

como quem tenta precaver-se desta possível “traição” da voz em relação ao que ele tem intenção deele tem intenção de comunicar.

comunicar.2424

 Na direção

 Na direção de tomar de tomar a prosódia implicada a prosódia implicada no ato no ato da enunciação como da enunciação como aquilo que aquilo que pode, por pode, por  momentos, vir a subverter o sentido de um enunciado, evoquemos uma cena freqüentemente momentos, vir a subverter o sentido de um enunciado, evoquemos uma cena freqüentemente testemunhada na clínica: a da criança que transgride as normas a todo momento enquanto a mãe diz testemunhada na clínica: a da criança que transgride as normas a todo momento enquanto a mãe diz “não faz, meu filho!” com um tom tão suave, tão suplicante e risonho, que o não do enunciado, “não faz, meu filho!” com um tom tão suave, tão suplicante e risonho, que o não do enunciado, longe de fazer função de interdição, convoca à permissividade, é um sim. Temos aí, pela prosódia, longe de fazer função de interdição, convoca à permissividade, é um sim. Temos aí, pela prosódia, um não que diz sim

um não que diz sim e que vem revelar o gozo da mãe implicado na transgressão do filho.e que vem revelar o gozo da mãe implicado na transgressão do filho. Se ficamos simplesmente atentos ao que foi

Se ficamos simplesmente atentos ao que foi enunciado, em lugar de escutar o que enunciado, em lugar de escutar o que comparececomparece no ato da enunciação, perdemos a possibilidade de realizar tal

no ato da enunciação, perdemos a possibilidade de realizar tal leitura clínica.leitura clínica.  Neste

 Neste entrecruzamento entrecruzamento entre entre o o que que é é dito dito e e a a entoação entoação que que se se apresenta apresenta no no ato ato dada enunciação, comparecem algumas questões bastante próprias da clínica com bebês e crianças enunciação, comparecem algumas questões bastante próprias da clínica com bebês e crianças  pequenas. Isto

 pequenas. Isto porque, não porque, não só para só para os os bebês, mas bebês, mas também para também para as crianças, as crianças, que ainda que ainda não podem,não podem,  por sua condição psíquic

 por sua condição psíquica, deslizar pelos significantes com o mesmo dea, deslizar pelos significantes com o mesmo desembaraço que um adultosembaraço que um adulto, a, a entoação outorga um peso fundamental ao que é

entoação outorga um peso fundamental ao que é dito.dito.

Isso fica claro, por exemplo, nas diversas vozes que é preciso fazer para representar os Isso fica claro, por exemplo, nas diversas vozes que é preciso fazer para representar os  personagens das estórias

 personagens das estórias infantis: afinal, infantis: afinal, quem se quem se assustaria com assustaria com um lobo um lobo mau que mau que falasse em falasse em vozvoz aguda? Sem sua entoação grave e forte, o

aguda? Sem sua entoação grave e forte, o lobo nem parece tão mau lobo nem parece tão mau assim...assim...

Tomaremos alguns recortes da clínica com bebês e crianças pequenas para, a partir deles, Tomaremos alguns recortes da clínica com bebês e crianças pequenas para, a partir deles,  pontuar

 pontuar alguns alguns desdobramentodesdobramentos s do do entrecruzamenentrecruzamento to entre entre enunciado enunciado e e entoação entoação no no ato ato dada enunciação:

enunciação:

23

23Roman Jakobson (1969), obra citada, pág. 24.Roman Jakobson (1969), obra citada, pág. 24. 24

(6)

-- RaRafafaelel, , um um memeninino no cocom m popoucuco o mamais is de de ququatatro ro ananosos, , tetem m um um brbrinincacar r exextrtrememamamenentete

estereotipado

estereotipado. Em . Em alguns momentos, diz frases alguns momentos, diz frases feitas recortadas de propagandas, apresenta falasfeitas recortadas de propagandas, apresenta falas ecolálicas e refere-se a si mesmo na

ecolálicas e refere-se a si mesmo na terceira pessoa. No final da sessão, Rafael, freqüentemente,terceira pessoa. No final da sessão, Rafael, freqüentemente, não quer ir embora, o que faz da hora da despedida um momento importante da sessão e que não quer ir embora, o que faz da hora da despedida um momento importante da sessão e que ocupa um tempo considerável desta. Em certa sessão, quando lhe digo “Está na hora de ir  ocupa um tempo considerável desta. Em certa sessão, quando lhe digo “Está na hora de ir  embora... tchau... até outro dia!” e começo a guardar os brinquedos, Rafael se agarra a um deles, embora... tchau... até outro dia!” e começo a guardar os brinquedos, Rafael se agarra a um deles, que não quer guardar, e diz

que não quer guardar, e diz “outro dia, outro dia!” num tom extrema“outro dia, outro dia!” num tom extremamente exasperado.mente exasperado.

“Outro dia! Parece que é muito difícil esperar até outro dia, né, Rafael?”, lhe digo. Então ele me “Outro dia! Parece que é muito difícil esperar até outro dia, né, Rafael?”, lhe digo. Então ele me olha, larga a caixa e

olha, larga a caixa e consegue ir embora.consegue ir embora. Ainda que o seu enunciado repita o que

Ainda que o seu enunciado repita o que eu disse, ainda que ele precise tomar as minhas eu disse, ainda que ele precise tomar as minhas palavraspalavras  para poder falar, ele produz a

 para poder falar, ele produz a enunciaçãenunciação com uma entoação própria que o com uma entoação própria que deixa clara a oposiçãodeixa clara a oposição ao meu enunciado. Reconhecer isso, reconhecer ali seu desejo, procurando produzir alguma ao meu enunciado. Reconhecer isso, reconhecer ali seu desejo, procurando produzir alguma alteridade, ainda que de modo bastante rudimentar, é fundamental para o desfecho desta cena e alteridade, ainda que de modo bastante rudimentar, é fundamental para o desfecho desta cena e  para a possib

 para a possibilidade de saída ilidade de saída de uma posiçãde uma posição ecolálica.o ecolálica.

Temos aí o exemplo de um mesmo enunciado que, pela entoação que comparece no ato da Temos aí o exemplo de um mesmo enunciado que, pela entoação que comparece no ato da enunciação, pode assumir dois sentidos opostos, numa tentativa rudimentar da criança de fazer  enunciação, pode assumir dois sentidos opostos, numa tentativa rudimentar da criança de fazer  oposição, de tentar descolar-se da fala do outro.

oposição, de tentar descolar-se da fala do outro.

-- MarianaMariana2525 é uma pequena menina com pouco menos de três anos. Ela é extremamente bonita eé uma pequena menina com pouco menos de três anos. Ela é extremamente bonita e

simpática, segundo a descrição do pediatra que a encaminha. O pediatra, um tanto fascinado simpática, segundo a descrição do pediatra que a encaminha. O pediatra, um tanto fascinado com o aspecto da menina, afirma que não consegue entender o que há de errado com ela, e por  com o aspecto da menina, afirma que não consegue entender o que há de errado com ela, e por  qu

que e afafininal al elela a tetem m atatrarasosos s em em alalgugumamas s de de susuas as aqaquiuisisiçõçõeses, , popor r exexememplplo, o, no no cocontntrorolele esfincteriano.

esfincteriano.

Quando a recebo na primeira sessão, Mariana chega sorridente e entra na sala de mãos dadas Quando a recebo na primeira sessão, Mariana chega sorridente e entra na sala de mãos dadas com a sua mãe. Olha para mim e logo para a estante de brinquedos, dizendo “Uiii! Olha que com a sua mãe. Olha para mim e logo para a estante de brinquedos, dizendo “Uiii! Olha que lindo!”, numa entoação rica em picos prosódicos. Logo ela se dirige à estante, pega um lindo!”, numa entoação rica em picos prosódicos. Logo ela se dirige à estante, pega um  brinquedo, o

 brinquedo, o coloca no coloca no meu meu colo e, colo e, quando começo quando começo a a tentar tentar desdobrar alguma desdobrar alguma cena com cena com ela ela ee com o brinquedo, ela exclama novamente “Uiii! Olha que lindo!”, pega outro brinquedo na com o brinquedo, ela exclama novamente “Uiii! Olha que lindo!”, pega outro brinquedo na estante e o traz até o meu colo. Assim se sucede a sessão, até que tenho tantos brinquedos que estante e o traz até o meu colo. Assim se sucede a sessão, até que tenho tantos brinquedos que eles começam a cair do meu colo, e sem que nada do que tenha dito ou feito tenha produzido eles começam a cair do meu colo, e sem que nada do que tenha dito ou feito tenha produzido algum desdobramento da cena com os brinquedos ou com a fala de Mariana para além do “Ui! algum desdobramento da cena com os brinquedos ou com a fala de Mariana para além do “Ui! Olha que lindo!”.

Olha que lindo!”.

A cena transcorrida é digna de evocar as passagens do livro

A cena transcorrida é digna de evocar as passagens do livro  A  A invenção invenção de de Morel Morel ..2626 NestaNesta

história fantástica, um fugitivo náufrago acorda em uma ilha aparentemente deserta até que história fantástica, um fugitivo náufrago acorda em uma ilha aparentemente deserta até que descobre e passa a observar ao longe a vida dos exóticos moradores de uma casa. Tais descobre e passa a observar ao longe a vida dos exóticos moradores de uma casa. Tais  personagens

 personagens, , faça faça chuva chuva ou ou sol, sol, vento vento ou ou frio, frio, mantêm mantêm os os mesmos mesmos rituais: rituais: tomar tomar o o mesmomesmo drinque, estabelecer as mesmas conversas e ouvir a mesma música com uma pontualidade drinque, estabelecer as mesmas conversas e ouvir a mesma música com uma pontualidade estarrecedora

estarrecedora. Inicialmente, o . Inicialmente, o náufrago, que teme ser náufrago, que teme ser descoberto, mantém-se escondidodescoberto, mantém-se escondido, até , até que,que,  pouco a pouco, ve

 pouco a pouco, vencido pela solidão, resolvncido pela solidão, resolve arriscar algumas aproximae arriscar algumas aproximações, mas surpreendeções, mas surpreende-se-se  pelo modo

 pelo modo radical em radical em que é que é ignorado, sem que ignorado, sem que sua fala sua fala ou presença sejam ou presença sejam capazes de alterar capazes de alterar oo desencadeamento da cena. Resolve, a partir de então, revelar o enigma que o cerca, não sem desencadeamento da cena. Resolve, a partir de então, revelar o enigma que o cerca, não sem antes duvidar do que seus olhos vêem e

antes duvidar do que seus olhos vêem e seus ouvidos escutam.seus ouvidos escutam. A

A falfala a de de MaMariarianana, , papara ra aléalém m da da apaaparenrente te enentoatoaçãção o simsimpátpática ica digdigna na de de sedseduziuzir r quaqualqulquer er  interlocutor, não tem, de fato, o efeito simbólico de uma convocatória. Esta fala não se dirige interlocutor, não tem, de fato, o efeito simbólico de uma convocatória. Esta fala não se dirige efetivamente ao outro em uma condição de alteridade, ela não abre espaço à matriz dialógica e efetivamente ao outro em uma condição de alteridade, ela não abre espaço à matriz dialógica e tampouco permite que possa ser desdobrada e sustentada simbolicamente a partir de um objeto tampouco permite que possa ser desdobrada e sustentada simbolicamente a partir de um objeto

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25Julieta Jerusalinsky (2002).Julieta Jerusalinsky (2002). Enquanto o futuro não vem-psicanálise na clínica interdisciplinar com bebêsEnquanto o futuro não vem-psicanálise na clínica interdisciplinar com bebês

(2002), Salvador, Ágalma, pág. 163. (2002), Salvador, Ágalma, pág. 163.

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(7)

qualquer, uma cena do brincar. Uma vez que a fala é pronunciada, a cena é cortada e retorna-se qualquer, uma cena do brincar. Uma vez que a fala é pronunciada, a cena é cortada e retorna-se ao ponto em que ela é novamente pronunciada, sem que ocorra ali nenhum deslizamento ao ponto em que ela é novamente pronunciada, sem que ocorra ali nenhum deslizamento significante a partir de sua fala ou a partir do que é tomado da fala do outro. Trata-se aí de uma significante a partir de sua fala ou a partir do que é tomado da fala do outro. Trata-se aí de uma holófrase, desta fala cristalizada,

holófrase, desta fala cristalizada, unívoca, que não propicia articulação.unívoca, que não propicia articulação.

Ela foi marcada pelo Outro, mas esta marca não se estabelece como enigma que lhe permita Ela foi marcada pelo Outro, mas esta marca não se estabelece como enigma que lhe permita  produzir um saber e en

 produzir um saber e então articular uma fala e desdobtão articular uma fala e desdobrar um brincar. Esta holófrase faz urar um brincar. Esta holófrase faz um signom signo que se coagula, que não a representa na série para outro significante. Isso que ela diz é o que ela que se coagula, que não a representa na série para outro significante. Isso que ela diz é o que ela é:

é: ela é o objeto lindo a ser olhadoela é o objeto lindo a ser olhado e só.e só. Em certo momento do

Em certo momento do atenatendimedimento de nto de MariaMariana a na a mãe conta que a mãe conta que a menimenina fica na fica bastabastante temponte tempo com o seu cunhado que gosta de admirá-la e que tal

com o seu cunhado que gosta de admirá-la e que tal cunhado, muitas vezes, briga com os pais decunhado, muitas vezes, briga com os pais de Mariana, desautorizando-os na frente dela. A mãe, por sua vez, tem grande temor deste cunhado Mariana, desautorizando-os na frente dela. A mãe, por sua vez, tem grande temor deste cunhado mais velho, que

mais velho, que abusou dela quando ainda era abusou dela quando ainda era pré-adolescentepré-adolescente..

O trabalho clínico implicou poder permitir que os pais, ao exercerem suas funções, tirassem O trabalho clínico implicou poder permitir que os pais, ao exercerem suas funções, tirassem Mariana da posição de objeto incestuoso oferecido ao olhar do tio, e de que ela, por sua vez, Mariana da posição de objeto incestuoso oferecido ao olhar do tio, e de que ela, por sua vez,  pudesse vir a ocu

 pudesse vir a ocupar novos lugares, espar novos lugares, estendendo sua catendendo sua cadeia significante e, portadeia significante e, portanto, também o seunto, também o seu  brincar.

 brincar.

Como vemos, isto que marcou Mariana não é aleatório, está encadeado à serie significante Como vemos, isto que marcou Mariana não é aleatório, está encadeado à serie significante  parental.

 parental. Mas Mas tal tal inscrição, inscrição, tal tal letra, letra, não não operou operou para para ela ela como como um um enigma enigma do do desejo, desejo, não não sese inscreveu como esta brecha a partir \da qual ela pudesse situar-se efetivamente como sujeito inscreveu como esta brecha a partir \da qual ela pudesse situar-se efetivamente como sujeito falante. Tal inscrição operou como holófrase, fazendo dela o

falante. Tal inscrição operou como holófrase, fazendo dela o próprio objeto de gozo do próprio objeto de gozo do Outro.Outro. Temos neste caso a incidência de uma entoação rica em picos prosódicos, mas a letra que Temos neste caso a incidência de uma entoação rica em picos prosódicos, mas a letra que comparece por trás da música, o modo em que operaram as inscrições primordiais em Mariana comparece por trás da música, o modo em que operaram as inscrições primordiais em Mariana não lhe permitiram efetivamente estabelecer uma convocatória ao outro sustentado em um não lhe permitiram efetivamente estabelecer uma convocatória ao outro sustentado em um funcionamento de alteridade.

funcionamento de alteridade.

-- Sabrina é uma pequena menina com pouco mais de dois anos. Sua produção é extremamenteSabrina é uma pequena menina com pouco mais de dois anos. Sua produção é extremamente

 pobre, não fala e é capaz de ficar longo tempo da sessão raspando objetos no chão ou parede da  pobre, não fala e é capaz de ficar longo tempo da sessão raspando objetos no chão ou parede da sala de modo a produzir um barulho estridente que parece incomodar a todos, menos a ela. Ela sala de modo a produzir um barulho estridente que parece incomodar a todos, menos a ela. Ela tem síndrome de Williams,

tem síndrome de Williams,2727 mas tal comprometimento orgânico não justifica o seu quadromas tal comprometimento orgânico não justifica o seu quadro

clí

clínicnico o e e ficfica a evevideidente nte a a incincidêidêncincia a de de proprobleblemas mas na na conconstistituituição ção psípsíququicaica. . A A mãmãe e falfalaa animadamente e produz uma série de picos prosódicos ao se

animadamente e produz uma série de picos prosódicos ao se referir à filha.referir à filha.

É preciso dizer que essa mãe tem algo de insuportável para a maior parte dos integrantes da É preciso dizer que essa mãe tem algo de insuportável para a maior parte dos integrantes da equipe médica, que nota uma absoluta discrepância entre a entoação melodiosa e alegre com equipe médica, que nota uma absoluta discrepância entre a entoação melodiosa e alegre com que a

que a mãe fala da filha e o estado de Sabrina, que chmãe fala da filha e o estado de Sabrina, que chega, quase sempreega, quase sempre, suja e malcheirosa às, suja e malcheirosa às sessões.

sessões.  No

 No início início de de uma uma das sessões, das sessões, percebo que percebo que Sabrina está Sabrina está particularmente irritadiça. particularmente irritadiça. QuandoQuando me detenho a olhá-la, percebo que tem tantos piolhos que eles caminham pela sua testa e pelas me detenho a olhá-la, percebo que tem tantos piolhos que eles caminham pela sua testa e pelas sobrancelhas. A mãe percebe o que estou observando e diz: “Ela está com piolinhos!”, no tom sobrancelhas. A mãe percebe o que estou observando e diz: “Ela está com piolinhos!”, no tom melodioso e alegre que costuma usar. “Não são piolinhos, são piolhos e parece que eles estão melodioso e alegre que costuma usar. “Não são piolinhos, são piolhos e parece que eles estão incomodando muito a sua filha!”, respondo, num tom

incomodando muito a sua filha!”, respondo, num tom um tanto grave.um tanto grave.  Nesse mome

 Nesse momento a mãe comento a mãe começa a chorar e, peça a chorar e, pela primeira vez, fala dla primeira vez, fala da dificuldade que a dificuldade que tem de lidar tem de lidar  com a filha. Diz que sente que Sabrina ficou muito tempo descuidada e que agora quer se com a filha. Diz que sente que Sabrina ficou muito tempo descuidada e que agora quer se ocupar dela, mas que não sabe por

ocupar dela, mas que não sabe por onde começar.onde começar. O corte abrupto que a intervenção produz neste

O corte abrupto que a intervenção produz neste mamanhêsmamanhês abre a possibilidade de que a mãeabre a possibilidade de que a mãe  possa começar a

 possa começar a falar das falar das efetivas dificuldades que efetivas dificuldades que encontra com a encontra com a sua filha sua filha e com e com o exercícioo exercício da maternidade.

da maternidade.

Afinal, a quem se dirige o

Afinal, a quem se dirige o mamanhêsmamanhês que esta mãe produz? Em primeiro lugar, é precisoque esta mãe produz? Em primeiro lugar, é preciso marcar que é um mamanhês que se apresenta fora do tempo na relação com Sabrina. Em marcar que é um mamanhês que se apresenta fora do tempo na relação com Sabrina. Em

27

27Ver a este respeito Foster O. e outros (1995). Dossier sobre síndrome de Williams, Escritos de la Infancia , n.Ver a este respeito Foster O. e outros (1995). Dossier sobre síndrome de Williams, Escritos de la Infancia , n.

5, Buenos Aires, Centro Lydia Coriat. 5, Buenos Aires, Centro Lydia Coriat.

(8)

segundo lugar, o uso dos picos prosódicos quando a mãe fala com Sabrina parece querer mais segundo lugar, o uso dos picos prosódicos quando a mãe fala com Sabrina parece querer mais  produzir um efeito no

 produzir um efeito no espectador da espectador da cena do que cena do que na própria Sabrinana própria Sabrina..

Diante de uma menina que não é reconhecida pelo pai e que, devido aos seus problemas Diante de uma menina que não é reconhecida pelo pai e que, devido aos seus problemas orgânicos e psíquicos, tampouco é reconhecida pelo social, essa jovem mulher não consegue orgânicos e psíquicos, tampouco é reconhecida pelo social, essa jovem mulher não consegue situar-se como mãe. A prosódia que se

situar-se como mãe. A prosódia que se oferece ao espectador enquanto a menina testemunha emoferece ao espectador enquanto a menina testemunha em seu corpo e sua produção um extremo abandono, mais do que efetivamente articular um gozo seu corpo e sua produção um extremo abandono, mais do que efetivamente articular um gozo  perverso

 perverso desta desta mãe mãe com com a a filha filha –suspeita –suspeita que que produz produz tanto tanto incômodo incômodo nos nos diferentesdiferentes  profissionais-, denun

 profissionais-, denuncia uma absoluta impossibcia uma absoluta impossibilidade da mãe de situar-se em relaçilidade da mãe de situar-se em relação a Sabrina.ão a Sabrina. A prosódia da mãe se coloca como um apelo ao interlocutor, um pedido de que a reconheça A prosódia da mãe se coloca como um apelo ao interlocutor, um pedido de que a reconheça como mãe, certifique que ela é

como mãe, certifique que ela é capaz de ocupar esse lugar.capaz de ocupar esse lugar. Essa jovem, que até então não se

Essa jovem, que até então não se ocupava de Sabrina, tenta começar a fazê-lo produzindo umaocupava de Sabrina, tenta começar a fazê-lo produzindo uma colagem imaginá

colagem imaginária. ria. Ela tenta reproduzir com a meEla tenta reproduzir com a menina certos estereótipnina certos estereótipos culturais acerca daos culturais acerca da maternidade, tais como falar com voz melodiosa, bater palminhas festejando toda e qualquer  maternidade, tais como falar com voz melodiosa, bater palminhas festejando toda e qualquer  situação (mesmo as que não merecem festejo algum), decorar, de uma hora para outra, o quarto situação (mesmo as que não merecem festejo algum), decorar, de uma hora para outra, o quarto da filha etc.

da filha etc.

Assim, o espetáculo que se dá a

Assim, o espetáculo que se dá a ver reproduz uma certa “pantomima de maternagem”. Nestever reproduz uma certa “pantomima de maternagem”. Neste movimento claudica um ponto de articulação fundamental para o exercício da função materna: a movimento claudica um ponto de articulação fundamental para o exercício da função materna: a articulação deste simbólico e imaginário ao real do corpo do filho.

articulação deste simbólico e imaginário ao real do corpo do filho. O corpo de Sabrina passa muito

O corpo de Sabrina passa muito longe da fala desta mãe, longe da fala desta mãe, não é tomado, recortado, articulado,não é tomado, recortado, articulado, ou seja, erotizado por esta fala.

ou seja, erotizado por esta fala.

Essa tentativa, inicialmente imaginária, de apropriação do lugar de mãe lança essa jovem Essa tentativa, inicialmente imaginária, de apropriação do lugar de mãe lança essa jovem mulher a ficar muito atenta ao que se passa nas sessões. O primeiro movimento que faz é o de mulher a ficar muito atenta ao que se passa nas sessões. O primeiro movimento que faz é o de  procurar comprar brinquedos que sejam parecidos com

 procurar comprar brinquedos que sejam parecidos com os que são os que são oferecidos a Sabrina duranteoferecidos a Sabrina durante as sessões. Ao constatar que não é isso o que interessa à menina, passa a procurar repetir com as sessões. Ao constatar que não é isso o que interessa à menina, passa a procurar repetir com ela as pequenas brincadeiras que observa que faço com Sabrina. Num terceiro momento, a mãe ela as pequenas brincadeiras que observa que faço com Sabrina. Num terceiro momento, a mãe co

começmeça a a a forformulmular ar pepergurguntantas, s, taitais s cocomo: mo: “Qu“Quais ais bribrinqunquedoedos s dedevo vo comcompraprar?”r?”. . É É pospossívsívelel começar a desdobrar falas acerca do que ela mesma gostava de brincar quando menina, quais começar a desdobrar falas acerca do que ela mesma gostava de brincar quando menina, quais dessas brincadeiras poderiam interessar a Sabrina, até que

dessas brincadeiras poderiam interessar a Sabrina, até que é ela quem começa a é ela quem começa a estabeleceestabelecer umar uma  pequena brinc

 pequena brincadeira corporal que adeira corporal que efetivamente a impefetivamente a implica e convoca lica e convoca sua filha.sua filha.

O que é próprio no exercício da função materna é o trabalho permanente de recobrir o real do O que é próprio no exercício da função materna é o trabalho permanente de recobrir o real do organismo do bebê - sua psicomotricidade absolutamente desorganizada, seu olhar estrábico, suas organismo do bebê - sua psicomotricidade absolutamente desorganizada, seu olhar estrábico, suas fezes, suas regurgitações, seus gritos - com um simbólico que erogeniza este corpo e que permite fezes, suas regurgitações, seus gritos - com um simbólico que erogeniza este corpo e que permite constituir uma imagem ideal à qual o bebê possa espelhar-se. Por isso é justamente diante do olhar  constituir uma imagem ideal à qual o bebê possa espelhar-se. Por isso é justamente diante do olhar  estrábico que a mãe diz: “cadê esses olhinhos lindos da mamãe?”. É por isso também que as fezes e estrábico que a mãe diz: “cadê esses olhinhos lindos da mamãe?”. É por isso também que as fezes e melecas viram “caquinhas” e as

melecas viram “caquinhas” e as regurgitações, “queijinhos”regurgitações, “queijinhos”..  A

 A voz voz impõe impõe silêncio silêncio ao ao real real do do corpocorpo2828 --aponta Melman. Poderíamos dizer que é a voz daaponta Melman. Poderíamos dizer que é a voz da

mãe que impõe silêncio ao real do corpo do bebê, ordenando uma série de manifestações orgânicas mãe que impõe silêncio ao real do corpo do bebê, ordenando uma série de manifestações orgânicas que, caso contrário, teriam um

que, caso contrário, teriam um caráter de obscenidade.caráter de obscenidade. O parâmetro entoativo implica não só

O parâmetro entoativo implica não só o engajamento do bebê a um o engajamento do bebê a um funcionamenfuncionamento ritmado. Ato ritmado. A entoação utilizada pela mãe também é modulada pela interpretação que ela faz dos afetos

entoação utilizada pela mãe também é modulada pela interpretação que ela faz dos afetos 2929 que oque o

 bebê experime

 bebê experimenta corporalmente. A mnta corporalmente. A mãe não só modãe não só modifica os parâmetros difica os parâmetros de entoação que entoação quando ela estáando ela está  brava ou

 brava ou quando está quando está a fa fazer um azer um carinho, mas carinho, mas também quandotambém quando  fala como  fala como se se estivesse estivesse a falar a falar pelopelo bebê

bebê num momento em que ele ainda, de fato, não pode fazê-lo. Assim, a prosódia da mãe senum momento em que ele ainda, de fato, não pode fazê-lo. Assim, a prosódia da mãe se

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28Charles Melman (1985). Novos Estudos Sobre o ICharles Melman (1985). Novos Estudos Sobre o Inconscientenconsciente, Porto Alegre, Artes Médicas, pág. 76., Porto Alegre, Artes Médicas, pág. 76. 29

29Tomamos aqui o termo afeto tanto no sentido mais intuitivo que descreve o estado atual de nossosTomamos aqui o termo afeto tanto no sentido mais intuitivo que descreve o estado atual de nossos

sentimentos, quanto pela sua articulação com a

sentimentos, quanto pela sua articulação com a pulsão.pulsão.

“Se a pulsão não aparece

“Se a pulsão não aparecesse sob a forma de afeto, nada poderíamos ssse sob a forma de afeto, nada poderíamos saber sobre ela” - Freud aber sobre ela” - Freud (1915). O(1915). O Inconsciente, O. C., Rio de Janeiro, Imago. Citado por Chemama (1993). Dicionário de psicanálise, Porto Inconsciente, O. C., Rio de Janeiro, Imago. Citado por Chemama (1993). Dicionário de psicanálise, Porto Alegre, Artes Médicas, pág. 10.

Referências

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