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30/07 ASPECTOS DA LÍNGUA PORTUGUESA EM POEMAS GALEGOS DOS SÉCULOS XIV E XIX

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ASPECTOS DA LÍNGUA PORTUGUESA EM POEMAS GALEGOS DOS SÉCULOS XIV E XIX

Ester Suassuna Simões (aluna - PET-Letras UFPE) Laís Maria de Melo Álvares Felix Rosal (aluna - PET-Letras UFPE) Paula Antunes Sales de Melo (aluna - PET-Letras UFPE)

CONTEXTUALIZAÇÃO

Quando do reconhecimento da autonomia de Portugal, ocorreu uma mudança na forma como se via a língua naquela região, já que se tinha a necessidade da formação de uma identidade e a língua é, inegavelmente, um componente identitário forte. Assim, o português foi elevado ao status de língua oficial, substituindo o latim, por volta de 1290. Trudgill (1974) afirma que nos lugares onde a língua é uma característica definidora de um grupo minoritário que busca independência, principalmente quando não há outras características relevantes, o fator linguístico pode ter um papel muito importante no movimento político e social existente.

Dessa forma, de acordo com Câmara Júnior (1979), nas áreas em que se falava o mesmo romanço luso – o condado de Portugal e a Galiza – houve uma diferenciação linguística principalmente devido ao contexto político: o primeiro consolidou a Língua Portuguesa e a segunda permaneceu com o galego, subordinada ao domínio Castelhano.

A separação lingüística e política entre a Galiza e Portugal e a aproximação da Galiza com a Espanha fizeram com que, com o tempo, o castelhano fosse assumindo um papel mais importante do que o da própria língua materna na sociedade galega. Do século XIV ao XVI a nobreza autóctone foi sendo substituída por uma nobreza estrangeira e já no século XVI não se encontrava nenhum documento oficial escrito em galego. Esse período de “alienação linguística” inicia-se com a separação política e a posterior separação linguística entre a Galiza e Portugal, e dura até a segunda metade do século XVIII, quando começa uma política de recuperação do galego.

No século XIX, a língua volta a aparecer como uma língua escrita, inclusive no aspecto literário. Esse período da história da língua ficou conhecido como o

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“Ressurgimento” e foi marcado pela tendência de buscar as raízes da cultura galega e pelo surgimento de instituições como a Real Academia Galega, no final do século.

É apenas no final do século XX que o galego é reconhecido legalmente dentro do território espanhol. Após a ditadura franquista, em 1981, é aprovado o Estatuto de Autonomia de Galícia, que garante ao galego o lugar de língua própria e co-oficial da comunidade. Apenas em 1983 é aprovada a Lei de Normalização Linguística que garante a utilização do galego nos âmbitos da educação, administração e meios de comunicação.

Já em 1986, foi formada a “Comissão Galega da Reforma Ortográfica da Língua Portuguesa”. A existência da acima referida Comissão revela a presença de uma corrente de pensamento diferente da que é defendida pela Real Academia Galega e mesmo pelos setores que aprovaram as medidas comentadas no parágrafo anterior: a chamada corrente reintegracionista, que representa o desejo do reconhecimento da lusofonia galega e da unidade entre português e galego. Há, no reintegracionismo, a preocupação com o enquadramento da Galiza no acordo ortográfico da língua portuguesa, além da aproximação cultural da região com os diversos países lusófonos, considerando que a presente situação de separação haveria sido fruto somente de fatores históricos e políticos, e não linguísticos.

Tendo em vista o debate existente sobre a lusofonia galega, e que “a diferenciação no espaço cria o problema de distinguir entre língua e dialeto, que nem sempre os próprios linguistas têm resolvido de maneira uniforme, coerente e decidida.” (CÂMARA JUNIOR, 1979), propusemo-nos a averiguar se em poemas galegos produzidos nos séculos XIV e XIX haveria, de fato, aproximação entre as duas línguas, atentando para as questões identitárias envolvidas nos períodos em questão.

1. METODOLOGIA 1.1 Corpus

Foram selecionados para análise poemas em galego do século XIV e do século XIX. Do primeiro momento, selecionamos poemas de Alfonso Alvarez de Villasandino, Arcediago de Toro e Pedro Vélez de Guevara; do segundo, de Rosalía de Castro, Eduardo Pondal e Antonio Noriega Varella. Escolhemos esses períodos por representarem, respectivamente, o final da época dos trovadores – em que a literatura galega e a portuguesa coincidem – e o ressurgimento da literatura galega, período significativo de busca da identidade cultural na região.

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1.2 Método de Análise

A análise dos poemas foi realizada atentando para aspectos lexicais e estruturais da língua galega em relação à portuguesa, buscando estabelecer um diálogo entre estes e as características literárias dos dois momentos observados. Posto que a ortografia é fruto de convenção, esse aspecto não foi considerado na análise dos dados.

2. LÍNGUA, DIALETO E IDENTIDADE

Há, na definição de língua e dialeto, critérios que variam entre os estudiosos, o que acaba por gerar, por exemplo, o debate ao qual nos referimos, em que separações e delimitações entre línguas estão sendo postas em questão.

De acordo com Câmara Júnior (1979),

Só em função da hierarquia das diferenças é que o problema da variabilidade lingüística pode ser resolvido em qualquer caso. Para uma língua comum que abrange mais de um país, a unidade básica justifica em se falar numa língua única, mas ao mesmo tempo impõe-se a consideração das diferenças dentro da unidade fundamental (p. 9)

Para Trudgill (1974), entre dois dialetos não há uma quebra linguística que permita perceber, por exemplo, quando um falante passa a falar de um dialeto para outro. O autor destaca que a divisão dialetal é muito mais realizada com base em aspectos sociopolíticos do que com base em fatos linguísticos.

Ainda de acordo com o autor, o mesmo problema ocorre com o termo “língua”. Em algumas áreas fronteiriças, por exemplo, o dialeto falado é extremamente similar, e isso é enfatizado pelo fato de os falantes de ambos os lados se compreenderem entre si. Entretanto, a definição de quem fala qual língua é novamente baseada em um aspecto sociopolítico, e não linguístico.

Trudgill também destaca que, atentando para fatos puramente linguísticos, o termo dialeto se refere a diferenças entre tipos de língua em que há distinções no vocabulário, na gramática e na pronúncia.

Hudson(1980) reconhece os problemas presentes nas nomenclaturas “língua”, “dialeto” e “registro”, chegando à conclusão de que a expressão “língua X” não deve ter lugar na Sociolingüística, sendo suficientes a noção de “variedade X” e a observação de que as variantes são mais próximas de algumas que de outras.

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Ainda assim, o autor explica que há sobremaneira três maneiras propostas para separação entre língua e dialeto: uma delas é pelo tamanho, em que a língua seria uma entidade maior e conteria todos os seus dialetos; o problema aí seria a relatividade, e Hudson adianta que não há mecanismos capazes de tornar a distinção língua/dialeto menos relativa.

Outra maneira apresentada por Hudson (1980) é a da atestação da “inteligibilidade mútua”; mas a validade desse método é logo contestada pelo autor, que argumenta que existem diferentes graus de inteligibilidade e nenhuma definição de até que momento se consideraria duas expressões parte de uma mesma língua. A própria relação entre os indivíduos é fator de contestação do método, pois a inteligibilidade depende também, por exemplo, das qualidades do falante e do ouvinte, da motivação de cada um e do contato prévio de cada um com o dialeto padrão. Trudgill também se refere a esse método, considerando-o pouco relevante.

A terceira maneira de se fazer essa distinção seria tomando como base o fator de prestígio social das variantes, sendo a língua detentora do prestígio que falta aos dialetos. A língua seria então, aquela que aparece em textos formais escritos, ou seja, a variedade padrão, resultado de intervenção deliberada da sociedade em um processo chamado de “padronização”. Note-se que uma variedade só funciona socialmente como padrão (e, portanto, língua) se for aceita como tal pela comunidade em que está inserida. Com relação à importância da língua para uma sociedade, Trudgill (1974) considera ser esta um fator muito importante na identificação de um grupo, em sua solidariedade interna e na sinalização da diferença entre este e outros grupos, principalmente quando em conflito.

Mateus (2005) aborda as noções de língua e dialeto aplicadas ao estudo da língua portuguesa. Para a autora, uma mesma língua pode apresentar diversas variantes, inclusive nacionais. As diferenças entre duas variantes ocorreriam em todos os níveis: fonético, sintático, morfológico e, sobretudo lexical. Ela ainda afirma que as variedades nacionais não são uniformes, variando de acordo com a localização geográfica; e denomina essas diferenças dentro de uma mesma variante nacional dialetos.

As diferenças entre as variantes e entre os dialetos, segundo Mateus, podem acontecer externamente ou internamente e, muitas vezes, as mudanças externas podem ocasionar uma mudança interna: “O contacto com outras línguas e com outras realidades sociais, culturais e políticas é uma das principais causas de mudança e de variação, uma causa exterior que provoca alterações internas.” (idem)

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As mudanças ocasionadas pelo contato entre línguas diferentes, para Mateus (idem), provocam mudanças em todos os âmbitos da língua, não apenas no lexical, mas também em níveis mais profundos como o sintático.

Sociolinguistas defendem que o olhar da ciência, em se tratando de língua, se volte para a sociedade, e que comunidades lingüísticas sejam frutos de pesquisa, em lugar de indivíduos isolados. Ao apresentar a noção de comunidade lingüística, Hudson (1980) frisa bem que só o individuo pode se enquadrar como membro de uma dada comunidade. Joseph (2004) atenta para o fato de que as pessoas estão sempre presentes no que falam e compreendem da fala do outro e, então, sua voz é inerente a sua identidade. O autor começa por definir identidade da maneira mais simples possível: a identidade é quem você é. Pode-se pensar identidade no nível do indivíduo, mas logo aparecem questões que envolvem religiões, nações, sexo, etc. O autor defende que as identidades nacional, étnica e religiosa são construídas através da linguagem, e que as línguas são construídas através (às vezes a serviço) dessas identidades. Iglesias-Alvares & Ramallo (2003) destacam a maneira inconsciente em que, na maioria das vezes, as identidades social e individual são construídas durante o processo de socialização para depois serem aos poucos alteradas durante nossas vidas. Destacam que, por ser no discurso que as identidades são construídas, é nele que se deve procurar entendê-las, analisando as estruturas criadas por sujeitos inseridos em um dado contexto histórico.

3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Estabelecemos na análise dos dados que formas ortográficas diferentes reconhecidamente utilizadas para representar fonemas iguais serão consideradas correspondentes; assim será, por exemplo, para ‘nh-’ ou ‘ñ’; ‘lh-’ ou ‘ll’.

3.1 Léxico

É notável que a ortografia das palavras nos poemas se assemelha mais ao espanhol que ao português, mas, com um conhecimento prévio da representação ortográfica nas três línguas (português, espanhol e galego) observa-se que o que ela representa, seus significados sonoros mais além dos signos, são formações muitas vezes típicas da língua portuguesa. Os poemas escolhidos do século XIV tratam, como a maioria da época, mais frequentemente de temas amorosos, diferentemente do século XIX. Neles, encontramos uma grande correspondência de substantivos e adjetivos

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galegos com os do português arcaico, como é o caso da palavra “cor”, no poema de Arcediago de Toro, que em ambos, no século XIV, se utilizava para designar coração.

O poema “Adiós Rios...”, da poetiza do século XIX Rosalía de Castro publicado no livro “Cantares Galegos”, é um canto de desterro. A autora, para demonstrar o carinho e a saudade que sente pela sua terra, recorre diversas vezes à utilização do diminutivo. Essa recorrência também está presente no poema de Antônio Noriega Varela, outro escritor do ressurgimento. Em seu poema “Como Chove Miudinho...” nos deparamos, já no título, com a utilização de uma palavra bastante portuguesa: miúdo.

“Miúdo” é um exemplo de palavra que, ao final de um processo de formação da língua, resultou igual tanto na língua portuguesa, quanto na língua galega. Para intensificar essa “miudez” com que chovia, essa delicadeza, o autor, assim como Rosalía, utiliza um artifício que será recorrente durante todo o poema e que não se imagina uma utilização que pudesse ser mais semelhante, e por que não dizer idêntica, a da língua portuguesa: o diminutivo – iño. Apesar da diferença ortográfica, o sufixo representa a mesma função da partícula – inho, típica da língua portuguesa. Há ocorrência também em palavras do gênero feminino como em “Adiós Ríos...” de Rosalía de Castro em que aparecem palavras como figueiriñas, hortiñas e amoriñas.

Também autor do século XIX, Eduardo Pondal, em seu poema saudosista “Muitas Veces”, canta a antiga liberdade que se tinha em sua terra e que já não há. O poema de Pondal não recorre, como os outros, ao artifício do diminutivo, mas se volta muito para a utilização de adjetivos e substantivos, tentando descrever o seu sentimento e formar a imagem na cabeça do leitor. Em seu poema encontramos grande quantidade de vocábulos equivalentes entre o galego e o português.

É perceptível também nos poemas estudados do século XIX uma influência do castelhano mais além da ortografia, no âmbito lexical. Essa influência se faz presente na utilização palavras como “desdichado”, também no poema de Rosalía de Castro. E é perceptível também a mescla entre os dois idiomas como em “arboriños” que mistura a noção de “árbol” e o sufixo diminutivo do gênero masculino -inho. Observamos ainda, na poesia “Soia!”, de Rosalía, a convivência de duas expressões sinônimas em idiomas diferentes: naide e ninguén. A primeira é uma clara influencia do castelhano e a segunda uma herança do português. Outro fato interessante é que os trovadores do século XIV utilizam a palavra “Deus”, enquanto que os do século XIX utilizam Dios para referir-se à mesma idéia, demonstrando, como disse Mateus (2005), que a região lexical foi realmente a mais afetada pela convivência entre as duas línguas.

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Entre os substantivos e os adjetivos percebemos também uma grande quantidade de equivalências idênticas tanto no século XIV quanto no século XIX. Dentre todas as palavras presentes na análise dos poemas da primeira época temos que aproximadamente 83% dos adjetivos e substantivos presentes estão presentes na língua portuguesa, em contraste com aproximadamente 77% no XIX. Essa diferença permite que consideremos pequenas as diferenças lexicais entre um período e outro: em ambos a presença da língua portuguesa é marcante.

4.2 Verbos

De acordo com Câmara Júnior (1979, p.125), “o verbo era em latim um vocábulo eminentemente flexional, e em português manteve esse caráter tipológico”. A partir da leitura dos poemas, observa-se que com a língua galega aconteceu o mesmo – talvez sendo esse um dos aspectos determinantes para que as duas línguas fossem consideradas a mesma língua no passado.

Consideramos as desinências de pessoa nos diversos tempos e modos verbais do português para estabelecer a comparação, não atentando para diferenças lexicais.

Como desinência de 1ª pessoa do singular temos, no presente do indicativo da língua portuguesa, -o. Exemplos dessa forma em galego são encontrados tanto nos poemas do século XIV, como, por exemplo, no poema de Arcediago de Toro: “ú non poso haber parte”. Nos poemas do século XIX, temos, no poema “Adiós Rios”, o verso: “hortiña que quero tanto”. Podem ser encontradas, também, formas irregulares da 1ª pessoa do singular no presente do indicativo, como com os verbos saber e ir, no século XIV: “Eu sei bem sem falimento [...]”, no poema de Alfonso Alvarez Villasandino; e no século XIX, no poema “Adiós Rios”: “Adiós, adiós que me vou [...]”.

Para a 2ª pessoa do singular, no pretérito perfeito, temos a desinência –ste, que pode ser encontrada nos versos do poema de Alfonso Alvarez de Villasandino, do século XIV: “!coitado!, que tu feciste/ uma gran dona ser triste”. Nos poemas do século XIX não foram encontrados exemplos de 2ª pessoa do singular nesse tempo.

A desinência de 3ª pessoa do singular, no pretérito perfeito do indicativo é, na língua portuguesa, -u. Exemplos dessa forma são encontrados nos dois momentos da poesia estudada: “viu que estaba seía”, no poema de Villasandino; e “Quizá!, pois xá notóu a ialma miña”, no poema “Como chove miudiño”. São encontradas também exemplos de conjugações irregulares, que também são irregulares em português, mas

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com diferente forma: “Que Deus non quixo que fose outorgada”, no poema de Pedro Vélez de Guevara; e “e cando/ viu que estaba seía/ dixo: ‘Amigo, !en gran folia”.

Para a 1ª pessoa do plural, em todos os tempos verbais a desinência é –mos. No poema de Rosalía de Castro, Adiós Ríos, temos um exemplo de que a estrutura se mantém no galego: “non sei cando nos veremos”. Nos poemas do século XIV não se encontram exemplos de 1ª pessoa do plural.

Com relação à 2ª pessoa do plural, encontram-se exemplos em galego apenas no poema de Pedro Vélez de Guevara. Tem-se em português, no pretérito perfeito, a desinência –stes. Encontra-se um exemplo de como a desinência se mantém no poema referido: “e nunca mais fostes demandada”. No futuro do subjuntivo da língua portuguesa, a desinência é –des, que se mantém no galego: “e si vós desto queredes dultar”, percebendo-se que, enquanto no português haveria uma irregularidade no radical do verbo querer, no galego mantém-se a regularidade do verbo. Encontra-se também um exemplo de segunda pessoa do plural no futuro do presente: “nunca alaroza seredes chamada”. Nesse caso, há uma mudança na desinência: enquanto em português a desinência é –is, em galego a desinência é –des.

A desinência da 3ª pessoa do plural em português é, em todos os tempos verbais, /u(n)/, quando posterior a –a ; e /(n)/ após –e átono. Em galego, há formas terminadas em –o, mas a desinência de 3ª pessoa do plural permanece /(n)/, como no exemplo de Pedro Vélez Guevara: “é, dés í, aqueles que Del descenderon”. O mesmo pode ser visto, por exemplo, no poema de Rosalía de Castro, “Adiós Ríos”: “que hastra lle dán de prestado”; e no “Toda Humilde Belleza”, de Antonio Noriega Varella: “que nas rosas dos vales, que sorríen”, ambos do século XIX.

Conforme observado, percebe-se uma quase total coincidência entre as formas verbais nos poemas em galego e as da língua portuguesa. À exceção da 2ª pessoa do plural, as formas verbais se mantêm equivalentes nos dois momentos analisados.

4.3 Artigos e pronomes

Nos dois momentos estudados, a utilização de pronomes e de artigos nas poesias é bastante semelhante à língua portuguesa. Além disso, não há ocorrências contraditórias entre os dois momentos históricos, dado que aponta para a presença de pouca ou nenhuma mudança nesse aspecto durante o período que separa a produção das poesias. Os comentários que seguem são, portanto, uma síntese das características encontradas em todas as poesias analisadas.

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Nas ocorrências de pronome oblíquo da forma tônica (ex.:“pedídelle a Dios por mín,”) a colocação dos termos é similar, sendo diversa apenas a maneira de escrever, sem separação entre o verbo e o pronome; a forma é similar nas duas línguas, mesmo em contrações, como no verso “foi fillar comigo guerra” do poema de Villasandino.

Na forma átona há algumas diferenças de colocação, como exemplificada no verso “terra donde me eu criéi”, de Rosalía de Castro, no qual o pronome oblíquo está colocado antes do pronome reto. Ao mesmo tempo, há um exemplo de similaridade com a colocação da língua portuguesa, especialmente com a variedade brasileira, também se tratando da primeira pessoa do singular: “Non me olvides, queridiña,”.

Nas poesias escolhidas como representativas, notamos que todos os pronomes possessivos possuem a mesma forma do português no masculino e no feminino. A análise revelou também equivalências entre os pronomes demonstrativos ese, esa, aquele. Também a contração da preposição de + pronome demonstrativo é similar.

Os artigos definidos e os indefinidos apresentam em galego a mesma forma e a mesma utilização da língua portuguesa, excetuando-se somente o feminino unha e unhas. Além disso, a contração de preposições e artigos também foi é similar.

CONCLUSÕES

Apesar de ser território político da Espanha, a Galícia preserva uma língua que, em vários aspectos, se aproxima mais do português do que do espanhol. Os resultados da análise demonstram que nos dois momentos há aproximações claras entre o galego e o português no que diz respeito ao léxico e às estruturas gramaticais.

O próprio ressurgimento galego, momento em que a língua voltou a ser escrita e valorizada, ocorreu em uma situação de dominação externa e de busca da resistência e da permanência cultural, processo semelhante ao que se vê hoje com a globalização e os efeitos que ela tem no local. Em se tratando de identidade, afirmar-se parte de um grupo é, ao mesmo tempo, negar-se parte dos outros. No caso da Galícia, afirmar-se galego é negar-se português, como seria negar-se alemão ou francês, mas, por causa da condição de dominação, é muito mais urgentemente negar-se espanhol. Essa necessidade de identificar-se, pondo em relevo diferenças, reflete na língua e mesmo na escolha lexical da poesia galega, como apontam os dados contabilizados.

O objetivo desse trabalho não foi apontar respostas definitivas sobre a questão de o galego ser ou não variante do português. Acreditamos, inclusive, que os dados encontrados que aproximam as duas línguas em períodos tão distantes da literatura

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galega chamam mais atenção por irem de encontro com a hipótese inicial, que previa forte presença castelhana nos poemas do século XIX, e por demonstrarem, desse modo, o forte caráter identitário exercido por língua e literatura em qualquer sociedade.

REFERÊNCIAS

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