• Nenhum resultado encontrado

TEATRO-ESPORTE: Análise de procedimentos com ênfase na construção da relação com o público

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "TEATRO-ESPORTE: Análise de procedimentos com ênfase na construção da relação com o público"

Copied!
7
0
0

Texto

(1)

TEATRO-ESPORTE: Análise de procedimentos com ênfase na

construção da relação com o público

Brenno Jadvas Soares Ferreira (UFU)

jadvas@mestrado.ufu.br

Resumo: O Teatro-Esporte e seu treinamento baseado em jogos e técnicas de improvisação, tem esta como elemento fundamental no processo de construção artística, especificamente na criação cênica, como forma de experimento de ações e temas que serão desenvolvidos na cena. Revelando-se assim como a dramaturgia do momento que pode vir a ser desenvolvida e fixada em um determinado processo de criação ou apenas como forma de treinamento e preparação do ator, alimentando-o de ferramentas e estímulos que podem se incorporar de forma orgânica ao seu ‘repertório criativo’1

. E que poderão também ser ‘revisitados’ em outros processos de criação. A proposta deste artigo é observar a influência do público nas partidas de Teatro-Esporte e como ele interfere diretamente no jogo em si e nas reações dos jogadores com sua participação totalmente ativa durante a partida.

Palavras chave: Teatro-Esporte, Improvisação, Relação com o público

INTRODUÇÃO

Criado no final dos anos cinqüenta e estruturado na década seguinte, o método de improvisação do inglês Keith Johnstone e suas publicações deram origem ao que é nomeado hoje como IMPRO, inclusive no Brasil. Com essa proposta como fundamentação prática do improviso ele elabora uma estrutura de trabalho junto ao Grupo de Autores do Royal Court Theatre, que resulta no surgimento do Theatre Machine, que se transformará no TEATRO-ESPORTE.

No Canadá, Keith encontra uma sociedade mais liberal e se sente livre das formalidades e censuras inglesas daquele período. Do Theatre-Machine, totalmente reformulado, surgirá o TEATRO-ESPORTE. Com base no sucesso do trabalho de Keith, surge também no Canadá o “Match de Improvisação”, uma modalidade

1

Trato como ‘repertório criativo’ as potencialidades de criação desenvolvidas pelo ator durante sua constante formação e que se tornam parte de sua natureza orgânica em seus processos criativos.

(2)

específica de TEATRO-ESPORTE. Criado em 1977 por Robert Gravel e Yvon Leduc, na cidade de Montreal, Canadá, o “Match de Improvisação” tem sua estrutura de jogo baseada no hóquei sobre o gelo.

No Brasil é crescente o trabalho da improvisação com “Teatro-Esporte” no ‘treinamento cênico’, preparação do ator, assim como a pesquisa de seus elementos componentes e a dinâmica de execução e desenvolvimento, que vem se consolidando no Canadá, Argentina e países da Europa2, como prática artística e de competição.

A PESQUISA NO BRASIL

“Nas relações entre arte e ciência podemos perceber o jogo do cientista com as regras, já para o artista é o jogo com as possibilidades perceptivas (...)” (PLAZA, 1997. p. 24)

Possuímos grupos que trabalham com essa prática, mas ainda são poucas as pesquisas acadêmicas sobre o Teatro-Esporte, inclusive a ausência de traduções em português das obras de Keith Johnstone.

Felizmente, observo que no Brasil as escritas acadêmicas sobre o Teatro-Esporte em sua maioria passam pelas experiências práticas do autor, aqui mesmo em nosso país ou tendo participado de práticas em outros países, que aglomeraram maior bagagem à sua escrita. Como no caso de Mariana Muniz que é Doutora em Improvisação pela Universidade de Alcala de Henares, Espanha, pesquisadora do Match de Improvisação e atualmente professora do Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal de Minas Gerais.

No primeiro semestre de 2013 ministrei as disciplinas Improvisação I e Improvisação II no curso de Licenciatura em Artes Cênicas do IFTO (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Tocantins), onde tive a oportunidade como Membro do Núcleo Docente Estruturante do curso elaborar a ementa dessas disciplinas, trazendo para Improvisação II o estudo sobre o Teatro-Esporte. A inexistência no Tocantins de grupos de IMPRO aliada às poucas referências acadêmicas sobre esse assunto foi um fator agravante para o desenvolvimento deste trabalho. Recorri,

2

No Canadá o surgimento do Match de Improvisação, criado por Robert Gravel e Yvon Leduc; na Argentina a L.P.I. (Liga Professional de Improvisación) dirigida por Ricardo Behrens e na Europa, além dos campeonatos, o próprio surgimento do Teatro-Esporte de Keith Johnstone.

(3)

juntamente com meus alunos, além de algumas bibliografias produzidas no Brasil, a vídeos e publicações via internet.

De certa forma a carência dessas traduções também serviu como recurso para que grupos de IMPRO e Teatro-Esporte no Brasil adequassem suas práticas à outras similares às estruturas de partidas propostas por Johnstone.

Em meu processo de escrita do projeto para seleção no Mestrado em Artes/Teatro na UFU, estive em Brasília, onde tive acesso e gravei entrevistas com atores que trabalham com IMPRO. Dentre eles, integrantes da Cia de Comédia Sete Belos, que me relataram sua primeira experiência como competidores em um Campeonato de Match de Improvisação, sediada na Cia de Teatro Contemporâneo, no Rio de Janeiro (onde, em 2007 tive a oportunidade de fazer a primeira oficina de Match de Improvisação dada por Ricardo Behrens para integrantes de grupos de IMPRO e Teatro-Esporte cariocas). Na entrevista os atores da Sete Belos contaram do estranhamento vivido quando se depararam com as regras específicas e rígidas do Match de Improvisação adotadas no campeonato, visto que em seus espetáculos em Brasília eles ‘jogavam’ com um ‘sistema mais livre de improvisação’, sem tantas penalidades e restrições durante as cenas. Em sua tese de doutorado Vera Achatkin cita as penalidades em uma das versões do Teatro-Esporte:

Teatro-Esporte Regular. A partida consiste em cenas livres, jogos

específicos e desafios, estes últimos em número de três. O juiz alerta para o risco de falência da cena (cartão amarelo) e, se o time não conseguir reverter a situação rapidamente, é aplicado o cartão vermelho, que resulta em expulsão. Há também penalidades que valem para atores e para o público. Segurar o jogo, obscenidades, desobediência às regras ou ao juiz podem levar público ou atores a ficarem dois minutos fora do seu espaço habitual: O ator vai para a plateia e não participa da próxima rodada de seu time, e se a infração tiver sido cometida por alguém do público, esta pessoa virá para o palco. Algumas companhias, incluindo o Loose Mosse Theatre, colocam saco de papel na cabeça do infrator. Todas as cenas são julgadas por um ou mais juízes convidados. (ACHATIKIN, 2010. p. 210)

O PÚBLICO

Segundo o diretor da “Liga Professional de Improvisación” da Argentina, Ricardo Behrens:

(4)

“Como num jogo, o público aplaude e vaia a atuação dos jogadores e do juiz. São apresentações bem populares, no sentido de causarem muita emoção e participação na plateia durante o espetáculo e no momento em que escolhem a equipe vencedora”3

Assim como numa apresentação teatral, nos moldes do teatro tradicional, a presença do espectador é indispensável, uma vez que para a realização do ato teatral se faça necessária a relação palco/plateia, citada por diversos autores como Boal, Grotowski, Spolin, Koudela dentre outros. Nos espetáculos de IMPRO, sejam competitivos - como nas modalidades de TEATRO-ESPORTE -, ou não, essa relação transcende a simples necessidade da ‘presença’ do público. O público neste caso é obrigatoriamente componente ativo do espetáculo, sendo solicitada sua interferência em diversos momentos da apresentação ou partida de IMPRO ou TEATRO-ESPORTE, respectivamente. Nos próprios “jogos teatrais” de Viola Spolin temos a importância do público como agente observador e avaliador do jogo. No “Match de Improvisação” o público também assume a função de avaliador, pois ele vota na equipe que realizou a melhor improvisação da partida em sua opinião. Na Espanha são oferecidos para o público, em sua entrada, frutas de pelúcia, que podem ser lançadas nos atores, juiz ou músicos ou quaisquer integrantes da partida durante sua realização, nos momentos onde a público não agrada do que está assistindo. Em minha primeira oficina de Match de Improvisação com Mariana Muniz, realizamos ao final uma partida aberta ao público onde eram oferecidas bolas de papel para esse fim. Ou seja, temos a participação efetiva de todos os presentes na realização destas atividades cênicas.

O público no Teatro-Esporte proporciona um “incentivo” ou “crítica” aos jogadores no momento da partida, às vezes podendo interferir diretamente na mesma. Como nos exemplos de Vera Achatkin:

(...) os jogos “Palavras suplementares” (em que alguém do público acrescenta ao sinal do ator uma palavra, que será imediatamente incorporada ao texto da cena) ou “Cena do voluntário” (em que alguém da plateia sobe ao palco para criar a cena diretamente junto com o time). (ACHATKIN, 2010. p. 209)

3

Depoimento em oficina de Match de Improvisação ministrada por ele na Cia de Teatro Contemporâneo (Rio de Janeiro – 2007)

(5)

E complementa em relação ao cuidado para que o público se sinta a vontade e nunca imposto ou obrigado a participar, preservando a espontaneidade durante toda a partida.

Considero importante ressaltar que no Teatro-Esporte a participação do público é sempre espontânea. Em nenhum momento alguém pode ou deve se sentir constrangido ou ameaçado ante a perspectiva de ser escolhido para subir ao palco. Sua participação é sempre voluntária e se o Mestre de Cerimônias perceber que tem diante de si uma plateia não disposta, os jogos que necessitam da participação direta do público devem, para o bem do espetáculo, ser substituídos por outros. (ACHATKIN, 2010. p. 209)

A interação do público e os aspectos de competitividade presentes no Teatro-Esporte, tanto nos treinamentos quanto nas apresentações, juntos estimulam o ator-jogador a elaborar estratégias e parcerias que estimulam o desenvolvimento mais apurado do raciocínio rápido e sua disposição corporal para a execução do fazer cênico nesta modalidade esportivo-teatral.

O TEATRO-ESPORTE de Keith Johnstone foi, em determinados aspectos, a concretização de idéias propostas por Bertold Brecht acerca da “forma” do espetáculo cênico e da relação do público com os atores.

“Brecht sonhava com uma plateia constituída por iniciados, espectadores aptos a avaliar as propostas trazidas à cena, prontos a elaborar um juízo acerca dos significados presentes nos elementos cênicos. O encenador alemão queria que os espectadores de teatro fossem especializados como uma plateia de um evento esportivo, que conhece as regras do jogo, sua história, meandros e fundamentos técnicos. O conhecimento tático do jogo permite que o espectador esportivo, mesmo emocionalmente envolvido com a partida, identificado com os “heróis” em campo, questione a atuação dos jogadores.” (DESGRANDES, 2003:35)

Brecht busca em seu público a inquietação não só crítica, mas também física, com uma plateia participativa à atividade cênica, semelhante ao público das competições esportivas. O ator, assim como um esportista deve buscar leveza e precisão e objetividade em suas ações.

(6)

Ricardo Behrens diz sobre a diferença entre o “Match de Improvisação” e o teatro tradicional com texto, que “são prazeres diferentes, mas ambas formas de atuar

emocionantes para o ator”.

Se tratando do Match de Improvisação podemos expor essa emoção como advinda de sua característica imediatista, onde ninguém, inclusive o próprio ator / ator-jogador, sabe o tema que terá de interpretar no jogo de cena proposto durante a partida. Tendo assim que construir em minutos uma história com princípio, meio e se possível um desfecho, antes que o juiz, que marca o tempo da improvisação em seu cronômetro, a dê por encerrada.

São estas algumas das características que nos chamam a atenção para o estudo dessa prática, que vem se mostrando um instrumento importantíssimo para o trabalho do ator, independente de sua formação teatral. Com os exercícios de treinamento do TEATRO-ESPORTE são trabalhados elementos de precisão, velocidade de movimento e pensamento, além de trabalhar a criatividade e o estado de prontidão do ator-improvisador para a cena.

Segundo Lina Ladrón de Guevara, A los eventos de “Theatre Sport” acude

todo tipo de público, lo que há producido uma muy necessária revitalización del teatro. Es que outra consequência de las ideas de Keith es la democratización del arte.

(JOHNSTONE, 1990: X)

(7)

REFERÊNCIAS

ACHATKIN, Vera C. O Teatro-Esporte de Keith Johnstone: o ator, a criação e o público. Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.

BOAL, Augusto: 200 exercícios e jogos para o ator e o não ator com vontade de dizer algo através do teatro. Civilização Brasileira. 1997.

DESGRANDES, Flávio. A pedagogia do espectador. São Paulo: Hucitec, 2003. JOHNSTONE, Keith. IMPRO: Improvisacion y el teatro. Traducción: Elena Olivos y Francisco Huneeus. Saniago de Chile: Cuatro Vientos Editoral, 1990.

KOUDELA, Ingrid: Jogos teatrais. São Paulo: Perspectiva, 2001.

MUNIZ, Mariana Lima. El Match de improvisación: Su estructura dinâmica y técnicas de entrenamiento.

____________________ La Improvisación como Espetáculo. Tese de Doutorado, Universidade de Alcala de Henares, Espanha, 2004.

PLAZA, Julio. Arte, Ciência, Pesquisa: Relações. Campinas: Trilhas, 1997. SPOLIN, Viola: Improvisação para o Teatro. São Paulo: Perspectiva. 2003. _____________: O Fichário de Viola Spolin. São Paulo: Perspectiva. 2001.

Referências

Documentos relacionados