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UNIDADES DE CONSERVAÇÃO NA AMAZÔNIA COMO FERRAMENTA
PARA PRESERVAÇÃO DE SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS – Estudo de caso:
Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã
Carlos Gabriel Koury1,. Eduardo Rizzo Guimarães2, André Luiz Menezes Vianna3;
1 – Especialista em Silvicultura Tropical, Idesam – Instituto de Conservação e Desenvolvimento
Sustentável do Amazonas, Manaus, AM. carlosgabriel@idesam.org.br.
2 – Engenheiro florestal, Idesam – Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável do
Amazonas, Manaus, AM. eduardo.rizzo@idesam.org.br.
3 – Engenheiro florestal, Idesam – Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável do
Amazonas, Manaus, AM. andre.vianna@idesam.org.br.
INTRODUÇÃO
A Amazônia possui um dos patrimônios arqueológicos mais ricos e diversificados do
território brasileiro, mas ainda são escassos os estudos do passado pré-civilizatório na
região, por fatores como dificuldades logísticas, quadro de pesquisadores e mesmo
pela vastidão da floresta amazônica.
A legislação brasileira prevê a proteção de Sítios Arqueológicos, sendo a Lei 3924/61
a principal delas. A proteção também é contemplada pela Constituição Federal e pelas
leis ambientais, particularmente a Lei 9605/98 (Crimes Ambientais). Já a Portaria
IPHAN 230/02 compatibilizou a preservação do patrimônio arqueológico com os
licenciamentos ambientais, obrigando levantamento arqueológico prévio e resgate de
eventuais sítios em áreas onde serão realizadas obras que requeiram licenciamento
ambiental.
Como estes sítios estão espalhados por toda a Amazônia, é bastante comum
encontrá-los nos limites das Unidades de Conservação dessa região. As Unidades de
Conservação estaduais são geridas conforme um documento denominado Plano de
Gestão. O Plano de Gestão é um “documento técnico e gerencial, fundamentado nos
objetivos da Unidade de Conservação, que estabelece o seu zoneamento, as normas
que devem regular o uso da área e o manejo dos recursos naturais, inclusive a
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implantação da estrutura física necessária à gestão da Unidade” (SEUC, 2007).Com
forma normatizar a elaboração dos Planos de Gestão das UC´s do Amazonas, o
Governo Estadual utiliza como guia o ‘Roteiro pra Elaboração de Planos de Gestão
das Unidades de Conservação do Estado do Amazonas’ (AMAZONAS, 2007). Este
guia prevê que sejam implementados programas de gestão relacionados à arqueologia
sempre que a Unidade apresentar esta característica.
SITUAÇÃO ATUAL – RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
DO UATUMÃ – AMAZONAS – BRASIL
A região do Rio Uatumã foi alvo, no passado, de concentração de populações
humanas, que por longos períodos habitaram o local. Devido a essa realidade, existem
inúmeros vestígios arqueológicos na região (IDESAM, 2008).
As populações indígenas mais recentes, fora os últimos habitantes ‘brancos’ da área
após a construção de Balbina, são as populações indígenas waimiri-atroari que
dominavam a região dos rios Urubu y Uatumã desde a cachoeira de Balbina. Seu
território consistia em aproximados 8 milhões de hectares. (SOUZA 1993). Mas não se
tem ao certo desde quando essas populações estão presentes na região e quem
foram seus ancestrais.
Nos limites da RDS do Uatumã constata-se grande quantidade de cerâmicas,
inscrições rupestres e ferramentas rudimentares que surpreendem pela qualidade de
conservação
Durante mapeamento participativo realizado na Unidade de Conservação pela
Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas,
em 2005 foram catalogadas 25 regiões onde se encontram fragmentos arqueológicos.
Essas regiões são uniformizadas pela característica da terra-preta antropológica,
locais procurados pelos atuais moradores para produção agrícola pela elevada
quantidade de matéria-orgânica acumulada pelos anos de ocupação pré-colonial,
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caracterizada pela fixação dos grupos familiares a partir da domesticação local de
certas plantas que levou ao cultivo da mandioca-brava e de outras plantas na região
(sítios-moradia), que, associado à exploração dos recursos naturais, comporia a base
de subsistência necessária para o desenvolvimento das culturas amazônicas
(LATHRAP, 1970).
Segundo Levantamento Sócio-Ambiental realizado pelo IDESAM em janeiro de 2007,
24% dos terrenos na área de uso das comunidades possuem terra preta
antropológica, e 23,3% dos moradores entrevistados afirmaram que encontram
fragmentos cerâmicos e de outros materiais, evidenciando ainda mais a existência de
sítios arqueológicos na região. Relatos descrevem também a inscrição em pedras
(petroglifos) em afloramentos rochosos nos pontos localizados no leito do rio Uatumã.
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FIGURA 1. Mapa de distribuição dos locais onde são encontrados fragmentos arqueológicos na RDS do
Uatumã. Fonte: SDS/IPAAM, 2005.
Entre 1987 e 1988 um trabalho de salvamento arqueológico foi realizado na área da
UHE Balbina em virtude da construção da represa. Os trabalhos de campo foram
realizados percorrendo-se o rio Uatumã e afluentes ao longo de 345 km a montante e
30 km a jusante da barragem (ELETRONORTE, 2007).
No salvamento foram registrados in loco 150 sítios. Foram analisados mais
detalhadamente 118 desses sítios, sendo 19 sítios-acampamento, 57 sítios-habitação
com terra preta antropogênica, 17 sítios-oficina, 22 sítios com petróglifos em
afloramentos rochosos na calha do rio Uatumã, 1 sítio com pictoglifos em
caverna/abrigo-sob-rocha e 2 sítios não indígenas. As coleções cerâmicas somam
acima de 500.000 fragmentos e várias peças completas, e os líticos somam vários
milhares.
Estes sítios representam várias fases cerâmicas pertencentes a não menos de três
tradições indígenas e a Tradição Neobrasileira. A única fase suficientemente analisada
para permitir descrições é a Fase Caparu pertencente à Tradição Polícroma,
Subtradição Saracá (ELETRONORTE, 2007).
Cerâmicas da Tradição Polícroma são encontradas em uma ampla área que vai, com
interrupções, desde a ilha de Marajó até o sopé dos Andes, na Colômbia, Peru e
Equador.
Segundo Lathrap (1970), a Tradição Polícroma teria surgido como um
desenvolvimento local da cerâmica Barrancóide na Amazônia central. Nesse modelo,
a cerâmica Polícroma seria originária da Amazônia central, tendo sido posteriormente
difundida ao longo das áreas aluviais do Rio Amazonas até atingir a Ilha de Marajó.
A existência da Fase Caparu ao longo de um rio de água preta, como no caso do Rio
Uatumã, é de particular interesse, visto que a Tradição Polícroma é tipicamente restrita
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aos habitats das várzeas dos rios de água branca. A densidade incomum de recursos
protéicos, proporcionada pela abundância da tartaruga (Podocnemis expansa) dá a
plausível impressão de haver um aumento na capacidade de manutenção alimentar a
nível comparável com o da várzea (LATHRAP, 1970).
Conforme exposto, existem muitas lacunas de conhecimento nessa área que
necessitam de maiores estudos e detalhamento mais aprofundado. Nesse sentido, o
Programa de Gestão elaborado com a finalidade de sanar estas lacunas históricas dos
povos pré-históricos que habitaram essa região estão descritas no QUADRO 1, dentro
do sub-programa de pesquisa na UC:
QUADRO 1. Sub-programa de pesquisa relacionado à arqueologia no Plano de Gestão da
RDS do Uatumã. Fonte: IDESAM, 2008
16.Sub-programa de pesquisa
Ação
Atividades
Meios de
Verificação
Pré-requisitos
Implementação de estudos e pesquisas arqueológicas na RDS do Uatumã 1) Contratar consultor especialista em arqueologia na Amazônia Central; 2) Estudar in loco as áreas mapeadas em trabalhos preliminares; 3) Elaborar Programa Arqueológico na RDS. 1) Uso do solo ordenado; 2) Áreas de proteção integral devido à existência de sítios mapeadas e definidas; 3) Potencial para visitação pública levantado; 4) Programa Arqueológico da RDS do Uatumã elaborado. 1) Formalizar parceria com instituições de pesquisa; 2) Articulação institucional; 3) Fomento às pesquisas; 4) Diagnóstico de dados secundários da arqueologia local.BIBLIOGRAFIA
AMAZONAS. Governo do Estado. (2007). Roteiro para Elaboração de Planos de
Gestão para as Unidades de Conservação Estaduais do Amazonas:
Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. Série Técnica
Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, n° 12. Manaus/AM.
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