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Pega na Chaleira. Resenhas. Editorial

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Academic year: 2021

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“Pega na Chaleira”

Resenhas

Editorial

Pouco antes de morrer, em meados dos anos sessenta, meu bisavô me fez presente da coleção de acetatos que guardava no andar superior, já desabitado, do belo prédio da Farmácia Palombini, em Antonio Prado. Ali, entre operismos itálicos (onde brilhava a sobrinha, Vittoria Palombini) e os binarismos metálicos da teuta esposa, encontrei o “Pega na chaleira” ou “Gargalhada”, de Eduardo das Neves, em disco de 1909 da Casa Edison, do Rio de Janeiro. Conta Almirante que...

Um certo Presidente da República, nas suas viagens durante a campanha para a sua eleição, costumava levar consigo uma pequena chaleira de prata, porque ele mesmo gostava de preparar, não sei se o seu café ou o seu chá. Cercado como andava por indivíduos interessados em cair nas suas boas graças, era freqüente ver-se quando um ou outro, em requintes de amabilidade, se esforçava para poupar ao futuro presidente o trabalho de preparar ou de servir a sua bebida preferida. Os mais afoitos, mal o ilustre homem manifestava o desejo de saborear a sua bebida, avançavam para a pequena chaleira e, na ânsia de serem os primeiros, a seguravam por onde calhasse, ou pelo cabo, ou pelo bojo e até pelo bico. Com isso, naturalmente, queimavam os dedos. Nasceu daí o dito popular “chaleira”, para designar adulador, e a expressão “pegar no bico da chaleira”, para indicar aquela ação de adular.

A História confuta a estória em seus detalhes. Affonso Penna falecera em junho de 1909 e, de acordo com dispositivo institucional, Nilo Peçanha, o vice-presidente, completaria o mandato. O fim desta gestão foi marcado por uma das mais conturbadas eleições da República Velha, confrontando Rui Barbosa e o Marechal Hermes da Fonseca, que assumiu a Presidência num clima de grande hostilidade: “era um joguete mais ou menos cretino nas mãos do caudilho sulista Pinheiro Machado” (afirma Oswald de Andrade em suas memórias). Senador pelo Rio Grande do Sul desde 1890, Pinheiro Machado havia-se aos poucos convertido no homem forte do Legislativo e na eminência parda de muitos governos. No alto do Morro da Graça, sua residência fazia sombra ao Catete, diariamente freqüentada por dezenas de pessoas — senadores, deputados, juízes, empresários ou, simplesmente, candidatos a cargos públicos ou mandatos eletivos — que disputavam acirradamente o privilégio de segurar a chaleira que supria de água quente o chimarrão do “chefe”.

Em 1909, às vésperas da eleição presidencial que marcaria a derrota do jurista baiano, João José da Costa Júnior, o Maestro Costa Júnior (oculto pelo pseudônimo de Juca Storoni), compõe a polca "No bico da chaleira" ou "Pega na chaleira", gravada em disco pela Casa Edison, do Rio de Janeiro. No mesmo ano, a gravadora registra “No bico da chaleira”, polca de Eustórgio Wanderley, na interpretação do dançarino e cançonetista Geraldo Magalhães e da cantora Nina Teixeira (a dupla gaúcha Os Geraldos). Embora a melodia da segunda versão seja a de Costa Júnior, a letra, em forma de diálogo e quilométrica, é completamente diversa, o bico em questão servindo de pretexto às mais variadas alusões sexuais. Ainda em 1909 estréiam a revista Pega na chaleira, de Raul Pederneiras e Ataliba Reis, e o filme Pega na

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Photo-Cinematographia. Nem as belas-letras escaparam ao dito da moda: em 1909 Alphonsus de Guimaraens Filho compõe um “Soneto muito em segredo”:

Eu para o Rio partirei em breve,

Deixando a santa paz destas montanhas. A viagem deve ser formosa, deve

Ser toda cheia de emoções estranhas.

Que a salvamento Deus, que é bom, me leve. Preciso de alentar as minhas banhas

E smartizar meu passo de almocreve Nessas ruas amplíssimas, tamanhas... Que vai fazer ao Rio de Janeiro

Este velho, velhíssimo mineiro, Com todo o acato e toda a devoção? Vai segurar, Senhores meus, bem cedo, (Fica dito isto aqui muito em segredo) No bico da chaleira do Barão...

Foi o temor de ver o Senador Pinheiro Machado suceder a Hermes da Fonseca na Presidência que aliou, nos bastidores, mineiros e paulistas, garantindo a indicação e a eleição de Venceslau Brás em 1914. Pinheiro Machado foi assassinado por um desequilibrado mental em 1915. Após sua morte, deram seu nome à Rua Guanabara, onde começava a subida da Ladeira da Graça. Em sua casa passou a funcionar o Colégio Sacre Coeur e, tempos depois, uma empresa construtora. O “pega na chaleira”, contudo, ficou, indelevelmente gravado no imaginário nacional.

A canção de Storoni foi regravada pela Banda da Casa Faulhaber e Cia (sem data), pela Banda Pryor (sem data), pela Banda do 52o de Caçadores (sem data), por Almirante (no rádio, em 1946), por Monsueto e as Gatas (1972) e pela Banda do Canecão (1973). Com o tempo, a expressão “chaleira” foi substituída por “puxa-saco”, uma gíria militar usada para designar os soldados que carregavam a bagagem de seus superiores. Em 1945 os Anjos do Inferno prestaram tributo a Storoni, citando os versos iniciais de sua polca na marcha “O cordão dos puxa-sacos”, de Roberto Martins e Erathostenes Frazão. Embora o Estado Novo estestorasse, “O cordão” teve problemas com a censura. Mas caiu nas graças de Getúlio, que enviou um de seus famosos bilhetinhos ao DIP. Tomara-se de ojeriza por chaleiristas.

Presente de meu bisavô getulista, a polca de Eduardo das Neves não é o mais conhecido dos frutos musicais dum caudilhismo quiçá hereditário. Ela comparece aqui à guisa de admoestação humorada, tributo à reação popular e convite a uma carnavalização discreta da arte da resenha musical.

Carlos Palombini (UFMG), editor de resenhas de PER MUSI

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Primeiro Encontro Nacional da

Associação Brasileira de Etnomusicologia,

Recife, novembro de 2002

Samuel Araújo (UFRJ)

e-mail: samuca@openlink.com.br Ao final de um ano de muitas expectativas quanto a possíveis novos rumos para a política cultural no país, teve lugar em Recife, entre 19 e 22 de novembro de 2002, o Primeiro Encontro Nacional da Associação Brasileira de Etnomusicologia (ABET). Criada em assembléia realizada no Rio de Janeiro durante o trigésimo sexto congresso mundial do International Council for

Traditional Music (ICTM), em julho de 2001, a ABET procura integrar os interessados na

pesquisa sistemática e multidisciplinar da música em geral, tendo a música no Brasil como um dos seus eixos prioritários. O primeiro encontro nacional foi organizado conjuntamente pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Cultural da UFPE e pelo Departamento de Música da mesma universidade, através de seu Núcleo de Etnomusicologia, com apoio institucional da CAPES e da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (Facepe).

A comissão organizadora teve como presidente Carlos Sandroni (UFPE), como tesoureira Alice Lumi Satomi (UFPB) e como demais membros Maria do Carmo Tinôco Brandão (UFPE), Paulo Cristóvão de Lima (UFPE), Renato Athias (UFPE) e Cristiane Maria Galdino de Almeida (UFPE). Seu comitê científico foi constituído por Samuel Araújo (UFRJ), Elizabeth Travassos (Uni-Rio) e Martha Ulhôa (Uni-Rio). A parte operacional do evento ficou sob a responsabilidade de eficiente e simpática equipe de alunos da UFPE e estagiárias do Núcleo de Etnomusicologia da instituição.

“Cem anos do disco no Brasil: músicos, públicos, pesquisadores e registros fonográficos” foi o tema geral do evento, a propósito da passagem, em 2002, do centenário de implantação da indústria fonográfica no Brasil. Cerca de duzentas pessoas compareceram, em sua grande maioria apresentando comunicações nas diversas sessões de trabalho. Os participantes representavam diferentes áreas de conhecimento, afiliações institucionais e regiões brasileiras, notando-se também a presença de um bom número de participantes estrangeiros.

Abriu-se a programação no dia 19 de novembro à noite, com a presença à mesa de representantes da UFPE e de entidades congêneres como a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música (Anppom), a Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e a Comissão Brasileira de Folclore. Logo após a abertura oficial, Bruno Nettl (Universidade de Illinois) proferiu a conferência inaugural, tendo como tema o estudo da mudança musical. Abordando comparativamente quatro culturas musicais distintas (sul-indiana, iraniana, nativa norte-americana e acadêmica dos Estados Unidos) estudadas por ele ao longo de sua trajetória de pesquisa, o Dr Nettl procurou apontar semelhanças e contrastes no modo respectivo de cada uma se relacionar à idéia de mudança. Os uso de exemplos sonoros ilustrativos enriqueceu sobremaneira a palestra, ao fim da qual foi oferecida uma recepção aos participantes pela organização local.

A primeira mesa-redonda, no dia 20 pela manhã, foi dedicada ao tema geral do encontro, tendo como mediador o Dr Araújo. A exposição inicial, realizada por José Ramos Tinhorão (Instituto Moreira Salles), enfatizou o percurso dos registros da música popular, desde a anotação e eventual publicação de textos de canções na Europa medieval até a emergência da impressão musical, ápice da fase que antecede a invenção do fonógrafo. Em seguida, o pesquisador de música popular brasileira e discófilo Humberto M. Franceschi discorreu sobre as características e evolução do registro fonográfico de música popular dos primórdios do século XX, destacando, por meio de exemplificação em áudio, as possibilidades de refinamento do processo de restauração abertas recentemente pela revolução digital. Concluindo a sessão, Hermano Vianna refletiu sobre a emergência de fusões estilísticas no Brasil, tornada possível pela difusão massiva de informações musicais geradas em pontos distantes do globo através, em grande medida, da circulação da produção fonográfica. Fazendo uso de exemplificação em

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áudio, o Dr Vianna destacou o potencial dos estilos assim surgidos para abrir amplos e nem sempre amistosos debates sobre temas como a autenticidade e a identidade social.

Após intervalo musical e almoço, a tarde do mesmo dia — como, de resto, as tardes dos outros dois dias de encontro — foi dedicada a sessões temáticas: “regional, nacional, global e as novas cenas musicais urbanas”, coordenado pela Professora Lumi; “tradições afro-brasileiras”, por Ângela Luening (UFBA); “música indígena nas terras baixas da América do Sul”, por Deise Montardo (UFSC) e Maria Ignês Mello (UFSC); “continuidade e mudança da música do Norte/Nordeste, 1938–2002”, pelo Dr Sandroni; “músicas tradicionais e patrimônio imaterial”, por Letícia Viana (Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular da Funarte) e a Dra Travassos; “escolas de música, ideologias da arte e etnomusicologia”, por Rosângela Tugny (UFMG) e José Alberto Salgado e Silva (Uni-Rio); “gêneros musicais”, por Rose Marie Reis (UFRGS); “o tradicional no mundo dos hits, a world music no mundo dos clássicos: esquizofonias do terceiro milênio”, por Heloísa Valente (Uni-Santos); “história da música popular brasileira”, pela Dra Ulhôa; “etnografia das músicas do Norte/Nordeste”, por Romério Zeferino (Museu Luiz Gonzaga, Campina Grande); e “o samba como ícone nacional”, pelo Dr Araújo.

Conduzida pela diretoria provisória da entidade, a Assembléia Geral da ABET foi realizada no dia 20, à noite, tendo sido rediscutido e votado seu estatuto para registro definitivo em cartório. Redefiniu-se, na ocasião, a estrutura de diretoria, criando-se os novos cargos de vice-presidente e segundo secretário. Foi proposta e aprovada, assim, a formação de chapa única para a eleição da primeira diretoria da ABET, sufragada pela unanimidade dos presentes para um mandato de dois anos, tendo o Dr Sandroni como Presidente, o Dr Araújo como Vice, a Dra Travassos como Primeira Secretária, Edilberto Fonseca (Uni-Rio) como Segundo Secretário, Eurides de Souza Santos (UFPB) como Primeira Tesoureira, a Professora Lumi como Segunda Tesoureira, a Dra Tugny como Editora e Mariana Carneiro da Cunha como Vice-Editora.

A mesa-redonda do dia 21 de novembro, “arquivos sonoros: objeto de pesquisa e patrimônio cultural”, teve as participações de Anthony Seeger (UCLA), Flávia Camargo Toni (IEB-USP) e Kilza Setti, tendo como mediadora a Dra Travassos. Ex-curador da série fonográfica da Smithsonian Institution e atual secretário-geral do ICTM, o Dr Seeger descortinou uma série de questões pertinentes à grande variedade de objetivos, formatos e problemas, tanto técnicos quanto ético-legais, relativos aos acervos no mundo contemporâneo. A Dra Toni, por sua vez, levantou questões sobre a gestão de acervos no Brasil e a política de patrimônio recém-estabelecida no país, com base em sua experiência como curadora do Acervo Mário de Andrade no Instituto de Estudos Brasileiros da USP, detendo-se em particular sobre a importância das referências fonográficas para o trabalho do eminente musicólogo paulista e para a reapreciação contemporânea do mesmo. Encerrando as exposições, a Dra Setti discorreu sobre seu trabalho com a memória musical de sociedades indígenas no país como forma de refletir sobre a fragilidade e instabilidade das políticas públicas que poderiam contemplar iniciativas desse tipo.

No último dia do encontro, 22 de novembro, a mesa-redonda matinal teve como tema “o campo de estudos da ABET: objeto, métodos, institucionalização e relações com outros campos”, tendo como mediador o Dr Sandroni. Manuel Veiga (UFBA), grande impulsionador da etnomusicologia no país e da própria ABET, abriu a sessão destacando alguns marcos teórico-conceituais da disciplina e sua importância para os rumos daquele campo de estudos em nossas instituições de ensino e pesquisa. Kazadi wa Mukuna (Universidade de Kent, EUA) ressaltou as diversas possibilidades de definição do campo de estudos, e sua conseqüente interdisciplinaridade, como seu grande trunfo enquanto caminho de produção de conhecimento. Por fim, Gerard Béhague (Universidade do Texas em Austin) empreendeu um balanço da produção brasileira recente na área em questão, constatando um incremento considerável de publicações relevantes, simultâneo ao que percebe como um predomínio preocupante de citações de literatura estrangeira, nem sempre compatível com os dados empíricos dos trabalhos em que se encontram inseridas.

À noite do dia 22, em assembléia de encerramento, realizou-se uma avaliação geral do encontro, destacando-se a eficiente organização, a alta qualidade de um número relevante dos trabalhos apresentados e dos debates travados nas diferentes sessões, e o potencial de

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afirmação da entidade como veículo de abertura da área de música ao diálogo com outras áreas de conhecimento e como interlocutor na definição de políticas públicas pertinentes. Ressaltou-se ainda, entre os pontos altos do evento, a variedade e excelência da programação musical, apresentando, nos intervalos de sessões acadêmicas e nos horários livres noturnos, uma amostra significativa da cultura musical local, unindo ao aguardado repertório de frevo, cavalo-marinho, afoxé, maracatu, cabocolinhos e coco, inesperadas sonoridades de origem japonesa recriadas no Brasil pela Professora Lumi e seu grupo. Antes do encerramento oficial, a delegação da Bahia propôs Salvador como sede do II Encontro Nacional, a realizar-se no primeiro semestre de 2003, sugestão acatada com irrefreável entusiasmo pelos presentes. Nada mais havendo a deliberar, os participantes exibiram fôlego suficiente para a confraternização final, dançando animadamente até as primeiras horas do sábado, dia 23, no grande forró de despedida.

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Os verbetes “Sonata” e “Forma sonata” no Grove:

1956, 1980 e 2001

Cristina C. Gerling (UFRGS)

e-mail: cgerling@vortex.ufrgs.br

Joana C. de Holanda (UFRGS)

e-mail: joanaholanda@hotmail.com A importância da sonata na história da música ocidental é inquestionável: além de constituir ferramenta pedagógica útil, tanto para o instrumentista quanto para o compositor, desde o século XVIII estabeleceu-se como um dos veículos preferenciais na expressão de obras primas da música européia. Desta forma os “grandes mestres” da prática tonal e o cultivo da forma tornaram-se conceitos indissociáveis. Enquanto o gênero tem tido presença assegurada em programas de concerto, mais recentemente, o número de estudos teóricos dedicados à forma tornou-se tão numeroso quanto diversificado na sua abordagem. Um exame dos verbetes das edições de 1956, 1980 e 2001 do Grove Dictionary of Music and Musicians reflete a valorização da análise musical como disciplina acadêmica e seu desenvolvimento exponencial nas últimas décadas.

Grove 1956

O verbete “Sonata” da edição de 19561 define o termo segundo a sua utilização no final do século XVI, contrapondo sonare (soar, música instrumental) a cantare (cantar, música vocal) e apresentando um apanhado histórico da produção de sonatas no período Barroco, divididas em

sonata da camara e sonata da chiesa. Quanto ao denominando período Clássico (final do

século XVIII e início do XIX), a forma sonata é definida como uma estrutura tripartite, organizada em exposição, desenvolvimento e recapitulação e, eventualmente, apresentando uma quarta sessão, a coda (vide PARRY, 1956b, p.888).

Ao contrário das edições subseqüentes, a de 1956 não dedica um verbete exclusivo à “Forma sonata”, mas o verbete “Forma” (PARRY, 1956a, p.430) discute diversos tipos de estruturas, entre as quais a sonata. A forma sonata aparece definida com referência ao grupo temático: “se a relação entre importantes figuras da melodia e as circunstâncias especiais em que elas se encontram são observadas, torna-se perceptível a definição de forma a partir dos temas” (id., ibid.).

“Tema” é a palavra chave para o estudo da forma e, neste contexto, concorre para conotar uma perspectiva progressista. Juízos de valor diminuem compositores como Bach e Handel, por não se conformarem à linha “evolutiva”, que culminará nas sonatas para piano de Beethoven, com seus temas bem diferenciados. Hugh Parry escreve:

Outros contemporâneos de Bach e Handel contribuíram mais do que eles para o desenvolvimento da forma sonata; mas é Scarlatti que, apesar de figura menor e criador mais limitado, alcançou mais longe aqui e fez a ligação direta [grifo nosso] com Haydn e Mozart. Pois comparadas com seus esercizi, as formas instrumentais de Bach e Handel estavam fora de moda e formavam nada mais do que um fraco elo com a forma sonata clássica (PARRY, 1956a, p.434).

Sobre as sonatas de Corelli, o autor emite curiosa opinião: “ambos os exemplos são inferiores à giga supracitada no tocante à conclusão da primeira parte ser na tonalidade principal” (PARRY, 1956a, p.433).

O revisor do artigo “Forma”, chama a atenção para o fato de que a abordagem “evolucionista” não é universalmente aceita. Salienta, no entanto, a importância e seriedade da pesquisa de

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A autoria do verbete não é claramente especificada nesta edição. C. H. Parry é o provável autor, H. C. Colles e R. Donington os revisores.

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Parry, a justificar sua publicação. Um aspecto positivo é que o verbete “Forma” leva em consideração a figura do ouvinte, contribuinte direto no desenvolvimento da forma (vide PARRY, 1956a, p.439). Por outro lado, pouco espaço é dedicado à produção dos teóricos do século XVIII, período definitivo para o estabelecimento da forma sonata como veículo de expressão instrumental.

No verbete “Sonata”, a edição de 1956 aborda claramente o período Barroco. Um trecho é dedicado ao estilo de Corelli (PARRY, 1956b, p.892), outro às escolas de violino barroco (PARRY, 1956b, p.893), outro a uma análise minuciosa de diferentes tipos de esquema binário (PARRY, 1956b, p.894). De acordo com Parry, é na obra de Corelli que surgem os primeiros tipos de forma sonata, nos últimos movimentos das obras. O conceito é, no entanto, empregado a posteriori, num olhar retrospectivo, que pode não se conformar à noção de forma sonata como esquema cristalizado no período clássico.

Ainda segundo Parry, “com Mozart e Haydn o ápice da regularidade na construção dos temas é alcançado” (PARRY, 1956b, p.899). A comparação dos dois compositores diz respeito mais aos distintos tratamentos da forma rondó do que à forma sonata propriamente dita, Parry considerando os rondós de Mozart os mais interessantes. O artigo destaca a inovação de Mozart na manipulação de elementos estruturais também na forma binária em algumas de suas obras e a importância das sinfonias e quartetos de Haydn para a história da forma sonata. Parry ressalta a maestria, humor e simplicidade com que Haydn manipula seus temas. As condições históricas são descritas, como um fio condutor, em vista das considerações de estilo. Por exemplo, o trecho dedicado à contribuição das construções melódicas de Haydn chama a atenção para o fato de que quase todos os compositores deste período estavam, de algum modo, relacionados à produção de óperas.

É relevante observar que, em 1949, no artigo “Harmonic Aspects of Form”, Leonard Ratner já se preocupara em analisar como os teóricos do século XVIII e início do XIX compreendiam a forma sonata (RATNER, 1949). Ratner mostra que eles a concebem em termos harmônicos, como um movimento da tônica em direção à dominante, com o retorno subseqüente à tônica. O uso de descrições do movimento harmônico de longo alcance, que alicerça a sonata na sua estrutura bipartite, não coincide porém com a concepção temática tripartite da forma, que o verbete em questão apresenta. O autor postula o entendimento harmônico como mais consoante com o entendimento dos teóricos contemporâneos aos compositores.

Grove 1980 e 2001

Os verbetes das edições de 1980 e 2001 apresentam formato semelhante entre si. Há, em ambos, uma introdução onde se discute o termo “sonata”, seguida de uma abordagem dos diferentes períodos: Barroco, Clássico, Romântico e Século XX. Mas se a organização segundo estas categorias traz vantagens, ela leva também a simplificações.

A sistematização da prática artística, seja nas artes plásticas, música ou literatura, resultou na periodização das produções por autores e escolas. Em seu artigo “Historiografia”, Hans Heinrich EGGEBRECHT (1980, p.595) indica que, já no século XVIII, Charles Burney organizava a história “de acordo com períodos, escolas e problemas musicais específicos, sempre procurando entender a música como parte de um todo cultural”. No século XIX, ocorre uma proliferação de estudos dedicados à música, com ênfase no estabelecimento de escolas nacionais e na elaboração de monografias sobre a vida e a obra de compositores. Os estudos de Kiesewetter e Fétis sobre músicos da Holanda estão entre os primeiros a seguir esta sistemática, destacando-se ainda o trabalho de Winterfeld, Johannes Gabrieli und sein Zeitalter (1834). Com a preocupação de conferir uma organização ordenada e previsível ao passado, Fétis, Ambros e Riemann esmeram-se na produção de estudos historiográficos. Entre 1918 e 1919, Gurlitt, um aluno de Riemann, sugeriu que

considerar o fenômeno musical em conjunto com as características especiais individuais, nacionais e de atmosfera cultural promoverá um entendimento mais profundo da natureza intrínseca de qualquer documento pertinente ao pensar musical, invenção e percepção, e uma consciência mais aguda do seu lugar na história (EGGEBRECHT 1980, p.598).

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Para Gurlitt, a compreensão da história da música estava centrada na observância da individualidade estilística dos compositores.

Ao comentar a multiplicidade de significados que “estilo” pode assumir no contexto musical, Rubert Pascall ressalta que “o termo pode ser usado para definir as características de um compositor individual, de um período, de uma área ou centro geográfico, ou ainda de uma sociedade ou função social” (PASCALL 2001, p.638). Pascall discorre brevemente sobre como historiadores utilizaram o conceito de “estilo de uma época” para determinar a divisão da História da Música em períodos e suas interpretações diferenciadas (vide Pascall 2001, p.640). Preocupado em dividir a história da música ocidental a partir do ano 1000, Guido Adler apresentou argumentos a favor da adoção de normas estílísticas em Der Stil in der Musik (1911) e Methode der Musikgeschichte (1919). A palavra “estilo”, contudo, surgiu no vocabulário musical já no período Barroco, junto com as primeiras discussões sobre o assunto em produções teóricas (vide PASCALL 2001, p.641).

Comentando as produções mais recentes, Pascall escreve: “outros escritores — G. Reese (Music in the Middle Ages, 1940, e Music in the Renaissance, 1954), M. Bukofzer (Music in the

Baroque Era, 1947) e F. Blume (Die Formung der Musikgeschichte, 1940) — continuaram a

periodizar a história da música desde o século XI. Os termos Arte Antiga, Arte Nova, Renascença, Barroco, Classicismo e Romantismo tornaram-se conceitos familiares. F. Blume argumentou convincentemente sobre a coerência em assumir-se que o Classicismo e o Romantismo formam um só período estilístico” (PASCALL 2001, p.640). Contra-argumentamos que categorizações estanques da produção musical podem gerar equívocos, uma vez que muitos compositores e obras não se conformam a seus limites estreitos. As escolas, os períodos e os estilos devem ser entendidos como uma ferramenta, e não uma norma.

Esta tendência já se detecta no verbete “Sonata”, de 1980. Apoiando-se em estudos numerosos e significativos das décadas de sessenta e setenta, ele refuta a tentativa de compreender o termo sob uma perspectiva histórica linear, afirmando que “a questão surge se o termo ‘sonata’ tem sido usado numa constância que justifique uma discussão em um contínuo histórico” (NEWMAN, TILMOUTH e GRIFFITHS, 1980, p.497). O artigo discute o termo “sonata” em diversos períodos, sem linearidade ou teleologia. Citando reflexões de compositores sobre o termo, os autores argumentam que a abordagem “semântica” tem a vantagem de refletir as idéias dos próprios compositores sobre a “sonata” em diferentes épocas.

Está presente a discussão teórica da sonata e sua forma ao longo da história, com exemplos de estudos e tratados dos diferentes períodos, a refletir uma nova preocupação: o estudo sistemático dos escritos sobre forma sonata do próprio século XVIII e início do XIX. Esta posição recente da musicologia pode ser examinada na produção dos próprios Ratner, Newman, Feil, Webster e Churgin,2 entre outros surgidos após a segunda guerra mundial. O artigo apresenta uma discussão da função social da sonata em cada período, de sua instrumentação e de seus estilos distintos. É visível a preocupação com as bases sociais e históricas da prática musical.

O artigo de 2001 soma-se às discussões anteriores na preocupação com o intercâmbio de compositores nas diversas regiões da Europa, as condições de publicação e de circulação de manuscritos e as práticas de performance. Ele contém uma seção dedicada à diversidade estilística do período Clássico (1735–1820). O estilo chamado “galante”, com o seu ápice entre 1750 e 1760, é descrito em detalhe, e o apogeu do estilo clássico fartamente exemplificado nas obras de Haydn, Mozart e Beethoven.

No verbete “Forma sonata” (WEBSTER, 1980 e 2001), comum às edições de 1980 e 2001, há uma seção dedicada à teoria, isto é, a tratados sobre a composição de sonatas, sublinhando assim a preocupação em discutir como o conceito teórico foi apresentado e entendido nos diferentes períodos. Webster salienta a importância de Heinrich Christoph Koch como o autor da descrição mais completa de forma sonata no século XVIII, ao lado de nomes como os de

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Mattheson, Niedts, Scheibe, Quantz, Riepel, Galeazzi, Kollmann e Gervasoni. Para Webster, estes teóricos compreendiam a forma sonata como uma estrutura binária, em termos da estrutura tonal da exposição, do ritmo das frases e do plano de cadências. Este debate reflete a importância dos trabalhos precursores de Ratner e Newman, acima mencionados.

No que diz respeito ao século XIX, Webster mostra a emergência do livro-texto “prescritivo”, onde a “doutrina” descreve a forma nos termos do material temático e seu desenvolvimento. O modelo “surgiu em parte como uma tentativa de explicar as dificuldades das obras de Beethoven, em parte como uma receita para uso em aulas de composição e de análise” (WEBSTER, 2001, p.697). Os principais estudiosos do período foram Hoffman, Birnbach, Momigny, Reich, Czerny e Marx, ressaltando-se o objetivo didático explícito dos dois últimos. Mais recentemente, dois autores, pelo menos, defendem a concepção que Marx desenvolveu na primeira metade do século XIX e cujos pressupostos formais apontam para uma divisão tripartite da forma sonata. No artigo “The Role of Sonata Form in A. B. Marx’s Theory of Form”, Scott Burnham escreve:“a idéia formal que Marx tem em mente é uma onde o maior peso estrutural conferido a uma forma tripartite, estrutura essa que vem se desenvolvendo através de estágios da família dos rondós, seria equivalente à obtenção de um tipo de unidade mais satisfatório, explicitada na primeira e quarta seção dos rondós de quarta e quinta espécies” (BURNHAM, 1989, p.256).

Burnham apresenta uma descrição dos tipos de rondós segundo a classificação de Marx. Também Newman, em The Sonata since Beethoven, afirma que “Marx dedicou muita atenção aos detalhes de frase e período, ele preferia uma concepção tripartite a uma concepção bipartite da forma sonata” (NEWMAN, 1969, p.31). A controvérsia justifica-se: o artigo de Burnham realça como Marx desenvolve a noção de forma sonata a partir da noção de período harmonicamente concebido. Sua concepção harmônica da forma está incorporada na elaboração temática, e as duas noções não são excludentes mas complementares. Explicações mais detalhadas sobre as publicações desses teóricos encontram-se na seção “Romantismo: definições e atitudes contemporâneas” do verbete “Sonata” da edição de 1980 (NEWMAN, TILMOUTH e GRIFFITHS, 1980, p.491) e na seção “Teoria”, subseção “séculos XIX e XX”, da edição de 2001 (WEBSTER, 2001, p.697).

Em 1840 Carl Czerny atribui-se a primazia na sistematização da forma e de seus múltiplos movimentos, no estabelecimento de relações de proximidade da sonata com a sinfonia, quarteto e outros ciclos instrumentais, bem como no fornecimento de detalhes da forma propriamente dita (NEWMAN, TILMOUTH e GRIFFITHS, 1980, p.492). É oportuno ressaltar que, em 1837, Marx já havia concebido a forma como tripartite e tocado em pontos que Czerny iria desenvolver posteriormente. O fato é que ambos exerceram profunda influência durante todo o século XIX, tendo contribuído para a visão segundo a qual, com Beethoven, a sonata atinge seu apogeu absoluto e — o que é mais grave, pois perdura até os nossos dias — os compositores anteriores a Beethoven são como organismos menos desenvolvidos a procura de uma forma mais satisfatória.

O estudo da sonata enquanto forma sonata exerceu o seu fascínio também no século XX. As publicações de Dahlhaus, Newmann e Rosen são alguns exemplos dos vários estudos dedicados ao tema. Em sintonia com este interesse, métodos de análise musical da sonata também foram propostos no século XX. No verbete “Forma”, de 1980 e 2001, James Webster divide os métodos analíticos em seis linhas principais.

Nesta classificação, Donald Francis Tovey foi o primeiro a desmistificar o modelo acadêmico proposto no século XIX, reinterpretando-o como “estilo sonata”. Tendo priorizado sobretudo a música alemã, de Bach a Brahms, o eminente músico inglês escreveu com refinada sensibilidade e raro discernimento alguns dos ensaios mais relevantes da primeira metade do século. Tovey elevou a escrita do texto sobre música a um novo patamar, só retomado no final do século XX pelo norte-americano Charles Rosen.

Para Heinrich Schenker, a forma sonata é uma estrutura binária de larga escala, na qual a prolongação da dominante no desenvolvimento da composição desempenha papel determinante. Seus argumentos ressoam ainda, sobretudo porque este estudioso resgatou os

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escritos do século XVIII sobre a forma, cujo entendimento restaurou, tendo por base o entrelaçamento do contraponto com a harmonia. Ao fazê-lo, submeteu todo o processo de análise a uma revisão radical, principalmente ao relegar as transformações temáticas e motívicas, e mesmo as questões formais, a um plano mais discreto, oferecendo uma teoria estrutural unificada da tonalidade. A partir da década de cinqüenta, um interesse renovado por essa alternativa analítica passou a dominar a América do Norte, num crescendo sem precedentes. Entre seus principais defensores, Burkhart reintegra estudos motívicos ao cânone schenkeriano, Rothgeb investe no aspecto contrapontístico e Rothstein e Schachter integram o parâmetro rítmico ao movimento tonal.

No que diz respeito ao estudo do ritmo, abordado na forma de reação a esta corrente dominante do pensamento analítico, já na década de cinqüenta surgem propostas marcantes de Leonard Meyer e, pouco depois, sua formalização, com Grosvenor Cooper. Outros trabalhos que seguem a tendência de valorização do parâmetro ritmo, em maior ou menor grau, são os de Cogan, Cone, Epstein e Kramer, entre outros.

Se o estudo da retórica e das dimensões referenciais produziu os trabalhos semióticos de Ratner e Agawu, o interesse pela sonata em termos de análise narratológica ocupa boa parte da produção mais recente, como se pode verificar em periódicos especializados. Kramer desenvolveu uma proposta narrativa, relacionando a sonata a seu entorno social e cultural. A abordagem final relaciona-se à posição denominada pós-modernista, segundo a qual o valor da sonata como forma e como gênero tem sido exagerado e necessita reavaliação. Esta abordagem minimizante contrasta com o número crescente de investigações sobre a sua história nos séculos XVIII e XIX. Webster constata que, desde o pós-guerra, a sonata — gênero e forma — tem sido objeto sistemático de estudo e, mesmo que uma fundamentação teórica histórica e analítica consistente se tenha estabelecido, o campo ainda carece de estudos mais abrangentes e de maior sistematização.

Griffiths (MANGSEN, IRVING, RINK e GRIFFITHS, 2001, p.683) comenta, com referência ao gênero composicional, que a dissociação entre procedimento e conteúdo tipifica o século XX, uma situação que caracteriza a produção musical do período e cuja solução os compositores se esforçaram por encontrar. Esta dissociação teve conseqüências radicais, exemplificadas na Segunda Sonata para piano de Boulez, que aquele autor considera o último compositor da forma. Webster acredita que as diferentes abordagens mencionadas iluminaram a compreensão da sonata no século XX, estabelecendo, “pela primeira vez, os alicerces para uma história analítica e diferenciada da forma sonata, a qual, admitamos, ainda permanece por ser escrita” (WEBSTER, 2001, p.698).

Observações finais

Os artigos distinguem-se tanto pela abordagem que fazem do tema (por exemplo, ao ressaltar o aspecto da utilização social da sonata e de sua instrumentação, em 1980, ou as tentativas de retorno às práticas de performance anteriores ao século XX, no ano 2001) quanto pelo maior destaque dado a um determinado período ou compositor. Os estudos e as preocupações musicológicas das últimas décadas refletem-se nas edições sucessivas dos verbetes. As referências bibliográficas, ainda que contendo vários títulos em comum, são distintas e constituem fontes de informação confiáveis.

Digna de nota é a ausência de referências a toda e qualquer sonata escrita na América Latina. Apesar da importância e do número significativo de sonatas compostas no continente durante o século precedente, essa produção não recebe menção. Carlos Palombini tece considerações sobre as prováveis causas desta omissão: “o desenvolvimento da sonata e da forma sonata são construções historiográficas, de autoria, na maior parte das vezes, de musicólogos europeus ou anglo-saxões. Por outro lado, a música brasileira aparece no Grove (1980 e 2001) como do domínio etnomusicológico, o que se comprova pelo fato de praticamente todas as

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contribuições sobre o Brasil serem de autoria de um etnomusicólogo estrangeiro, um tanto desatualizado.”3 Os responsáveis pelos verbetes continuam entrincheirados no etnocentrismo musical e são omissos no que se refere à produção musical de sonatas e congêneres na América do Sul ou em outras partes do planeta.

Feitas essas ressalvas e considerações, recomendamos a leitura. Além das discussões sobre repertório, estilo e escolas, os artigos procuram situar as obras em seu contexto social, abordando, em seu espaço restrito, um bom número de aspectos estruturais, analíticos e formais, e cumprindo assim a função do verbete de dicionário: informar e guiar o leitor em pesquisas futuras.

Resta, portanto, empreender um estudo sistemático do repertório de sonatas (quartetos, concertos, sinfonias e congêneres) latino-americanas. Um levantamento incipiente revela uma produção rica e extensa. Seu conhecimento pode trazer reflexos positivos nos meios acadêmicos e artísticos: o pensar-se a si mesmo é condição essencial para o crescimento e contribui, em música, para o estabelecimento de uma identidade própria. É necessário admitir que, em seu estágio atual, a pesquisa sobre nosso repertório é bastante incompleta ainda. Como poderíamos integrar este corpus a um patrimônio maior sem uma noção mais clara de sua real extensão e valor?

Referências bibliográficas:

AGAWU, K. Playing with Signs: A Semiotic Interpretetation of Classic Music. Princeton: Princeton University Press, 1991.

BURNHAM, S. “The Role of Sonata Form in A. B. Marx’s Theory of Form”. Journal of Music

Theory 33 (2): 27–271, 1989.

COOPER, G. e MEYER, L. The Rhythmic Structure of Music. Chicago:University of Chicago Press, 1956.

EGGEBRECHT, H. H. “Historiography”. New Grove Dictionary of Music and Musicians. Org. Stanley Sadie. Londres: Macmillan, 1980, v. 8, pp 592–600.

MANGSEN, S., IRVING, J., RINK, J. e GRIFFITHS: “Sonata”. New Grove Dictionary of Music

and Musicians. Org. Stanley Sadie. Londres: Macmillan, v. 23, pp 671–87, 2001.

NEWMAN, W. S. The Sonata since Beethoven. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 1969, rev. 2/1972.

NEWMAN, W. S., TILMOUTH, M. e GRIFFITHS: “Sonata”. New Grove Dictionary of Music and

Musicians. Org. Stanley Sadie. Londres: Macmillan, 1980, v.17, pp 479–97.

PARRY, C. H. H. “Form”. New Grove Dictionary of Music and Musicians. Org. Eric Blom. Nova Iorque: St. Martin Press,, v. 3, pp 429–45, 1956a.

———. “Sonata”. New Grove Dictionary of Music and Musicians. Org. Eric Blom. Nova Iorque: St. Martin Press, v. 7 , pp 887–908, 1956b.

PASCALL, R. “Style”. New Grove Dictionary of Music and Musicians. Org. Stanley Sadie. Londres: Macmillan, v. 24, pp 638–42, 2001.

RATNER, L. Classic Music: Expression, Form and Style. Nova Iorque: Schirmer Books, 1980.

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Este comentário foi expresso em comunicação de correio eletrônico para a primeira autora desta resenha; nosso agradecimento ao autor pela permissão de citação.

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———. “Harmonic Aspects of Classic Form”. Journal of the American Musicological Society, v. 2, pp 159–68, 1949.

———. Classic Music: Expression, Form and Style. Nova Iorque: Schirmer, 1980. ROSEN, C. Sonata Forms. Nova Iorque: Norton, 1988.

———. The Classical Style: Haydn, Mozart and Beethoven. Nova Iorque: Norton, 1972.

TOVEY, D. F. A Companion to Beethoven’s Pianoforte Sonatas. Nova Iorque: AMS Press, 1935.

WEBSTER, J. “Sonata Form”. New Grove Dictionary of Music and Musicians. Org. Stanley Sadie. Londres: Macmillan, v. 23, pp 687–701, 2001.

———. “Sonata Form”. New Grove Dictionary of Music and Musicians. Org. Stanley Sadie. Londres: Macmillan, 1980, v.17, pp 498–508.

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Uma soirée eletroacústica no

Quarto Encontro de Compositores e Intérpretes

Latino-Americanos, Belo Horizonte, maio/junho de 2002

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Carlos Palombini (UFMG)

e-mail: palombini@musica.ufmg.br O Quarto Encontro de Compositores e Intérpretes Latino-Americanos (vide <http://www.encontrocompositores.org.br/>) aconteceu de domingo, 25 de maio, a sábado, primeiro de junho de 2002, na Fundação de Educação Artística de Belo Horizonte (vide <http://caleidoscopio.art.br/fundacao/>), que já havia realizado encontros semelhantes em 1986, 1988 e 1992. Na manhã de sábado, discursos de representantes de autoridades municipais, estaduais e federais abriram o evento, evocando imagens dos anos quarenta e cinqüenta — quando o “grande compositor” era uma peça importante do aparato estatal — para uma audiência de mestres cabeludos, ainda que calvos. À noite, a peça para doze violões giratórios e um igual número de executantes estáticos de Teodomiro Goulart deu início à série de dezoito concertos, mostrando que o experimentalismo não-eletroacústico está vivo e passa bem no Cone Sul. Intitulada MinaSonora, mas apelidada Os violocópteros por seus bem humorados intérpretes, ela atraiu um público numerosíssimo e peculiar. Os programas subseqüentes apresentaram obras eletroacústicas de Dante Grella, Flo Menezes, Daniel Quaranta, Rodolfo Coelho de Souza e Rogério Vasconcelos entre trabalhos não-eletroacústicos. Além disso, o primeiro concerto noturno de sexta-feira, 31 de maio, foi inteiramente dedicado à arte da composição eletroacústica.

A Sala Sérgio Magnani da Fundação de Educação Artística é uma jóia acústica. Equipada com um conjunto de quatro alto-falantes, porém, ela não constitui o cenário ideal para uma apresentação eletroacústica. É difícil dizer alguma coisa do recente Quatro sketches em

movimento, de Sérgio Freire, para percussão, parte pré-gravada e processamento em tempo

real, além de que a peça teria tido muito a ganhar de um ensaio geral. O excelente percussionista que é Fernando Rocha fez o que pôde, mas foi finalmente nocauteado pelo som errado na hora certa.

Tirando partido do antagonismo entre uma parte pianística altamente eclética — onde se acotovelam tríades maiores e uma escritura bouleziana — e as morfologias sonoras do material processado, Ana Cláudia de Assis interpretou Grain Streams (2000), de Eduardo Reck Miranda, para piano, sons pré-gravados e processamento em tempo real. Se esse antagonismo constitui a força ou a fraqueza da peça, foi tema de debate entre os conhecedores locais. Maurício Loureiro apresentou Tangerina, de Fernando Iazzetta, para clarinete e processamento em tempo real. Usando o programa MAX de forma sutil, quase decorativa, Fernando Iazzetta conseguiu atingir uma ampla parcela do público, entre aficionados e neófitos.

Rodolfo Caesar providenciou o necessário clímax com Ranap-Gaô (2001), para mídia gravada e vídeo de Simone Michelin. O nome, em falso Tupi (na realidade um anagrama de “araponga”), evoca o pássaro cujos apelos ruidosos, semelhantes às batidas do martelo na bigorna, Rodolfo Caesar sintetiza (uma araponga de verdade tendo vindo bater à janela do compositor assim que a peça foi finalizada). Como as imagens surreais do vídeo de Simone Michelin, os sons de Rodolfo Caesar retêm toda a sua ambigüidade em relação aos corpos sonoros que os produzem, sua natureza — elektronisch ou concret? — sempre um mistério. A platéia respondeu com ouvidos atentos e só uma dúvida: “será que ele vai conseguir manter este elã?” A peça percorreu sua trajetória em grande estilo, a natureza compacta da ambiência e a falta de relevo da difusão potencializando-lhe o impacto.

O concerto encerrou-se com Concreto armado (2000–1), de Neder José Nassaro, para soprano, interpretado por Doriana Mendes, e sons eletrônicos pré-gravados. Sujeitando um

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Originalmente publicada em inglês no Computer Music Journal 27 (1), 2003, <http://mitpress.mit.edu/CMJ>.

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caso daquilo que se tornou conhecido como poesia concreta (“o martelo martela” etc) a uma superabundância de manipulações, o compositor conseguiu engendrar um senso daquele mal-estar modernista diante do qual o silêncio e o aplauso são as únicas manifestações possíveis: não houve vaia.

Jovial, bem-informada e calorosa, a platéia foi um destaque e superlotou a sala diariamente. Transmitir o conhecimento e o gosto pela música contemporânea às novas gerações do estado de Minas Gerais tem sido o trabalho de Berenice Menegale, a pianista que dirige a Fundação de Educação Artística desde seu início. O concerto final recompensou-a com emocionada ovação.

Referências

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