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ARTE/EDUCAÇÃO NO PROJETO INTERDISCIPLINAR DE REORIENTAÇÃO CURRICULAR PROPOSTO POR PAULO FREIRE PARA A SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE SÃO PAULO

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Academic year: 2021

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BRUNA BARLACH

ARTE/EDUCAÇÃO NO PROJETO INTERDISCIPLINAR DE

REORIENTAÇÃO CURRICULAR PROPOSTO POR PAULO FREIRE PARA

A SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE SÃO PAULO

São Paulo

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BRUNA BARLACH

ARTE/EDUCAÇÃO NO PROJETO INTERDISCIPLINAR DE

REORIENTAÇÃO CURRICULAR PROPOSTO POR PAULO FREIRE PARA

A SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE SÃO PAULO

Relatório final de iniciação científica apresentado à Universidade de São Paulo como requisito de finalização do PIBIC.

Orientadora: Dra. Maria Christina de Souza Lima Rizzi

São Paulo

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INTRODUÇÃO

Pensar a Educação de forma a promover o desenvolvimento e a cidadania dos alunos é um desafio que ainda está colocado na atualidade. Para dar base à elaboração de novas ideias é preciso, também, olhar para o passado e para as diferentes experiências praticadas, seus êxitos, equívocos e seu legado.

O anseio de analisar o projeto desenvolvido na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, proposto por Paulo Freire, considerado um marco fundamental para o pensar e o fazer Educação de forma a transformar a relação polarizada estabelecida entre professores e alunos para uma relação entre educadores e educandos, desenvolvendo um processo de aproximação com a comunidade do entorno da escola, surge como um norte para a busca do desenvolvimento de uma educação que construa significado e se relacione de fato com os estudantes.

A construção de um diálogo com o mundo ao redor remonta ao processo de desenvolvimento epistemológico e busca por um conteúdo que carregado de sentido para o estudante, para a comunidade e para escola, compreendendo que todos estes atores são parte fundamental deste processo e sua relação é rica para o processo educacional.

No Projeto de Reorientação Curricular o processo de elaboração dos conteúdos buscava o desenvolvimento de uma experiência interdisciplinar, com o empenho de professores de todas as áreas do conhecimento, dos alunos, dos pais e de docentes universitários, da comunidade como um todo, envolvendo diferentes instâncias e pensamentos com o objetivo de multiplicar os olhares para uma mesma questão, construindo assim um currículo que correspondia à realidade que emanava da comunidade na qual a escola estava inserida e era parte.

Nestes marcos esta pesquisa buscou responder aos seguintes questionamentos: É possível a construção de conhecimento em Arte via tema gerador? Qual a participação da arte/educação na construção do Projeto de Reorientação Curricular da SME São Paulo? Qual a contribuição do Projeto de Reorientação Curricular para o desenvolvimento da arte/educação?

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Nessa caminhada de um ano as questões foram dialogando entre si e com cada novo elemento que surgia, se desdobrando e se revirando, demonstrando que este foi um período muito rico para a Educação e que dá espaço para o desenvolvimento de um grande número de pesquisas. Talvez olhando para o passado possamos reconhecer nesta experiência real e distante de nós em apenas duas décadas o início das respostas que tanto se busca para os problemas que encontramos na Educação nos dias de hoje.

OBJETIVOS

Os objetivos estabelecidos para esta pesquisa foram:

1. O estudo do Projeto de Reorientação Curricular: Interdisciplinaridade via Tema Gerador desenvolvido na gestão do Prof. Paulo Freire na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo no período compreendido entre 1989 e 1992.

2. A colaboração com as pesquisas desenvolvidas sobre História do Ensino da Arte no Brasil no âmbito do Departamento de Artes Plásticas da ECA/USP e do PROAAESP (movimento pro Arte/Educação no estado de São Paulo).

3. A difusão do conhecimento oriundo deste Projeto no movimento Arte/Educação no estado de São Paulo, por meio do Movimento pró-Associação de Arte Educadores de São Paulo (PROAAESP) e no Brasil, por meio do CONFAEB (Congresso Nacional da Federação dos Arte/Educadores do Brasil).

METODOLOGIA

No momento da apresentação do projeto, as etapas metodológicas propostas para a pesquisa foram as seguintes:

1. Fazer um levantamento das fontes, documentos, registros existentes sobre a participação da arte/educação no projeto interdisciplinar da SME (1989/ 1992).

2. Identificar, localizar e entrevistar professores de arte e gestores participantes deste projeto, segundo a metodologia proposta pela História Oral (MEIHY, 2007).

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3. Gravar, transcrever, textualizar e transcriar as entrevistas concedidas. 4. Solicitar e arquivar as autorizações fornecidas.

5. Organizar um banco de dados com a documentação e informações encontradas.

6. Analisar a documentação, as informações e as entrevistas localizadas ou realizadas.

7. Interpretar as informações obtidas.

8. Participar de evento acadêmico com participantes do Projeto de Reorientação Curricular da SME no âmbito estadual e nacional.

9. Produzir artigo acadêmico contendo as reflexões, interpretações e propostas decorrentes do processo de pesquisa.

Das etapas elencadas quando o projeto tornou-se prática de pesquisa algumas foram mais utilizadas, outras menos utilizadas e outras acabaram por serem descartadas.

Os seguintes procedimentos de pesquisa elencados foram desenvolvidas:

− Levantamento das fontes, documentos, registros existentes sobre a participação da arte/educação no projeto interdisciplinar da SME (1989/ 1992).

− Analise da documentação, das informações e das entrevistas localizadas ou realizadas.

− Interpretação das informações obtidas.

− Participação de evento acadêmico com participantes do Projeto de Reorientação Curricular da SME no âmbito estadual e nacional.

Além disso, foi realizada a organização de banco de dados dos documentos levantados junto ao Centro de Memória da Secretaria Municipal da Educação, a organização da mesa “Querer é poder: Paulo Freire, 20 anos do Projeto de Reorientação Curricular da gestão Paulo Freire/Cortella na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo”, com a temática da pesquisa no XXII Congresso da Federação de Arte Educadores do Brasil, quando foram recolhidas importantes falas para o desenvolvimento desta pesquisa.

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Municipal da Educação, os mesmo foram retirados no local e organizados. Depois de uma leitura inicial, foi estabelecido um critério de relevância dos textos, selecionando aqueles que tratavam da época estudada e também da temática ou serviam de apoio para a compreensão do quadro geral da Educação durante o período. Os documentos selecionados como base para o desenvolvimento deste trabalho e posteriormente organizados em um banco de dados estão em tabela anexa (anexo I).

Dentre estes podemos destacar dois documentos que foram fundamentais para este trabalho, “Relatos de práticas pedagógicas 2/8- Educação Artística” e “Programa de primeiro grau ensino regular – Implementação da Educação Artística 1ª a 8ª série”.

Ainda, sobre a realização da mesa “Querer é poder: Paulo Freire, 20 anos do Projeto de Reorientação Curricular da gestão Paulo Freire/Cortella na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo”, coordenada pela autora da pesquisa e mediada pela orientadora Maria Christina de Souza Lima Rizzi e pela profª Drª Ana Mae Barbosa, buscou-se reunir importantes atores à época da decorrência do projeto, tendo sido escolhidos profissionais das diferentes linguagens das artes e com diferentes participações no projeto. A mesa foi configurada com a participação da Profª Drª Yara Borges Caznok, da área de música, Profª Drª Isabel A. Marques da área de dança, prof. Acácio Arouche das artes visuais e profª Drª Lisete Regina Gomes Arelaro, pedagoga que fez parte da formulação do projeto de reorientação curricular como um todo. Além disso também fora convidada a profª Joana Lopes, da área de artes cênicas que não pode comparecer à mesa mas enviou importante contribuição escrita.

RESULTADOS

Tomando por base as três questões problematizadoras que serviram de base para o desenvolvimento desta pesquisa chegamos a alguns resultados a serem analisados.

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documental extensa desenvolvida tendo por base os documentos produzidos à época demonstra que há sim a possibilidade de criação de conhecimento em Arte via tema gerador. Essa conclusão, longe de ser advinda somente desta pesquisa, foi a conclusão dos próprio arte/educadores envolvidos com o projeto de reorientação curricular proposto por Paulo Freire para as escolas municipais de São Paulo.

Não somente estes documentos demonstram como foi possível a criação do conhecimento em Arte via tema gerador como também através da experiência destes professores, seus educandos e de toda a comunidade envolvida com o projeto gerou-se o currículo de artes para as escolas que advinha da experiência concreta, ou seja, comprovada pela prática, de volta para a teoria e para uma nova aplicação, para dar seguimento ao projeto.

Em relação ao questionamento sobre a importância da arte/educação para construir o projeto de reorientação curricular da SME de São Paulo a pesquisa mostrou que sim, a arte/educação realmente foi importante para a construção deste processo. Em parte em função da importância da arte em si na leitura de mundo de Paulo Freire e da sua relação legítima e histórica com a Arte (como será desenvolvido nos próximos itens do presente relatório), o que pode ser observado tanto ao estudarmos a sua trajetória e o desenvolvimento de sua concepção de pedagogia até a entrevista realizada por uma das professoras participantes do projeto, Joana Lopes1, que serviu como base para esta pesquisa.

A parte significativa destes resultados adveio da vivência na construção e execução da mesa sobre o tema no XXII CONFAEB, um momento único onde diferentes profissionais da educação e da arte/educação em suas diferentes linguagens puderam falar sobre sua experiência e relacioná-la com o seu trabalho na arte/educação. Aliás, a realização da mesa em si é um importante resultado do trabalho desenvolvido nessa pesquisa em função de sua importância simbólica na comemoração dos vinte anos da implementação do projeto e por reinaugurar este debate num momento onde há uma busca por respostas para os problemas do ensino como um todo. Olhar para o passado e ver que um ensino de qualidade é 1FREIRE, Paulo. Paulo Freire ou a Palavra Viva. [29 de outubro de 2012]. ANAIS XXII CONFAEB: Paulo Freire ou a Palavra Viva. Entrevista concedida a Joana Lopes. Disponível em: <http://faeb.com.br/livro03/Arquivos/mesas/joana_lopes.pdf>

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possível assim como outras formas de se pensar a escola não são somente factíveis como foram realizadas em baixo de nossos olhos.

ANÁLISES

Podemos organizar as análises desta pesquisa a partir das mesmas questões problematizadoras levantadas anteriormente. Uma das principais fontes de dados para análise desta questão é o documento Relatos de Prática em Educação Artística, produzido pela Prefeitura em parceria com as escolas e as demais instâncias organizativas do Projeto de Reorientação Curricular. Este documento é um relato vivo e organizado dessa experiência escrito pelos próprios professores de sala de aula, que estavam efetivamente construindo conhecimento em arte através do tema gerador.

Para compreender a ligação íntima que há entre o projeto de reorganização curricular e a base de sustentação da arte/educação contemporânea, vejamos o relato de uma das professoras da época:

“A metodologia usada para o desenvolvimento das linguagens (artes plásticas, desenho, música, teatro, dança) é a Metodologia Triangular (o fazer, o apreciar, o conhecer) juntamente com a Metodologia Dialógica” (BERNARDI, 1992 in: Educação Artística: Relatos de prática)

Ao longo dos relatos podemos perceber as diferentes formas, dentro da metodologia dialógica interdisciplinar, que os professores conseguiram trabalhar e fomentar o desenvolvimento do conhecimento em arte. Dentre elas, se destaca o uso de questões problematizadoras com objetivo de levar o grupos (educadores e educandos) ao debate sobre o tema e suas possíveis interconexões com diferentes artistas, movimentos artísticos, linguagens artísticas e etc. Esta forma de trabalho está intimamente ligada com a metodologia dialógica e com a pedagogia de Paulo Freire.

Segundo ele,

“(...) Entendemos que, para o homem, o mundo é uma realidade objetiva, independente dele, possível de ser conhecida. É fundamental, contudo, partirmos de que o homem, ser de relações e não só de contatos, não apenas está no mundo, mas no mundo. Estar com o mundo resulta de sua abertura à realidade, que o faz ser o ente de relações que é. (...) “ (FREIRE, 2003, p. 47)

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Outro aspecto relevante acerca deste item, ainda relacionando as possibilidades de produção e desenvolvimento do conhecimento em Arte, vem expressa na fala de Acácio Arouche, em relato escrito para o XXII CONFAEB, em outubro de 2012:

“As lições que aprendi naquela época as uso em sala de aula até hoje. Estou trabalhando numa escola particular há 10 anos por ter aprendido fazer interdisciplinaridade em artes com o Prof. Paulo Freire e com o coletivo. Os resultados que tenho obtido são, em grade parte, consequência daquele momento.” (AQUINO, 2012)

Da fala do professor Acácio também podemos extrair um importante relato sobre a metodologia adotada para a construção do conhecimento em arte via tema gerador:

“Comecei então a pensar e pesquisar que arte era mais adequada para esse trabalho. Eu não tinha muita escolha em termos de linguagem pois minha competência e formação é em Artes Plásticas. Trabalhei algumas vezes com teatro, teatro de bonecos e vídeo, música nem pensar.

Foquei meus estudos na História da Arte e nos conceitos da área. Primeiro foquei nos conceitos, pensei na época que uma vez definido o Tema Gerador, tirava dele os conceitos fundamentais e os relacionava com conceitos em arte que de alguma forma ajudava a entender os conceitos envolvidos no estudo do meio. Por exemplo, o primeiro trabalho no Alípio o recorte de estudo da realidade era transporte, então trabalhei com conceitos de movimento, equilíbrio e saturação.” (AQUINO, 2012)

Em relação à participação dos arte/educação (e dos arte/educadores) na construção do Projeto de Reorientação Curricular é importante salientar que a pesquisa demonstra que havia grande entrosamento dos professores das diferentes áreas. Assim como estavam engajados os professores de artes (e podemos verificar a importância e o nível deste engajamento tanto nos documentos escritos à época como nos depoimentos colhidos durante a pesquisa) havia um engajamento coletivo das escolas com reuniões frequentes e formação continuada.

Nas palavras de Acácio, “O professor na Inter é o professor que aprende. Aprende com os colegas, aprende com os alunos.” Sobre o caderno de reorientação curricular e sobre sua atuação no processo de construção e implementação (uma sempre alimentando a outra, como requer o processo dialético), Acácio também conta que “Dois processos foram muito interessantes. Um foi a escrita do Caderno de Reorientação Curricular em Arte cujo processo envolveu toda a rede. O outro foi a discussão, também envolvendo os professores que estavam na sala de aula,

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sobre o que era o motor que movia o professor para suas escolhas.”

Ainda sobre a participação e a importância da arte/educação no desenvolvimento deste projeto é importante ressaltarmos uma importante informação: a ligação íntima que Paulo Freire tinha com a arte. Em entrevista realizada por Joana Lopes, uma das especialistas na área de Artes que através da parceria realizada com Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Universidade de São Paulo (USP) e Universidade Estadual de São Paulo (UNESP) participou da formulação e aplicação do projeto, o professor Paulo Freire coloca em suas próprias palavras a visão que tinha sobre a importância desta área no processo de construção dos saberes.

“JL- No projeto Mudar a Cara da Escola eu estou desenvolvendo um laboratório de artes cênicas e educação, que poderá ser um paradigma de atuação em outras escolas. Eu penso que o convênio firmado entre as universidades de Campinas, USP e UNESP, idealizado por você e sua equipe, é o que desejamos como extensão universitária, as vezes algo irrelevante ou inexistente. Qual é o papel que a arte tem, a seu ver, no conjunto das propostas de renovação?

Paulo Freire- Tentarei responder seu questionamento deste modo: a beleza faz parte da prática educativa. O modo de ser da educação tem a ver com o conhecimento, com a política, com a ética e com a estética.

O ato gnosiológico da educação é um ato no qual dois sujeitos, o educador e o aluno, estão envolvidos numa pesquisa, numa busca e, nesta pesquisa, o conteúdo é o mediador.

O que é o ensinamento, finalmente: ensinar é propor ao aluno um avizinhamento criativo ao objeto do conhecimento. Você, Joana, pode objetar: mas Paulo, não existe prática educativa se não há avizinhamento ao conteúdo... é justo.

Não há reflexão pedagógica em torno da prática educativa se não há um conteúdo definido. O conteúdo é indispensável na prática educativa na busca do conhecimento. Mas atenção: enquanto não assuma tal relevo que obscureça todas as outras dimensões da prática educativa. Por exemplo, na dimensão da arte: a beleza, a estética, a beleza do ato educativo, isto não pode ser resumido nem traduzido por este ou aquele conteúdo. O ato formativo não divide beleza e moralidade. E isto não se pode traduzir numa lista de conteúdos éticos e estéticos. A questão aqui não é ensinar aquele ou este conteúdo.

JL- Logo, pergunto, se a arte se ensina.

Paulo Freire: Eu creio que Não. Que coisa significa ensinar arte, indago. Ensinar literatura? Pode um professor me fazer poeta ou me ensinar a criar um quadro pintado, afinal o que na arte se ensina? Podemos ensinar um sem número de técnicas e processos que apoiam o artista a familiarizar-se com a linguagem, mas penso que não é possível transformar a expressão estética em objeto de conhecimento, menos ainda é possível ensinar expressão estética.” (FREIRE, 2012)

Ainda que possamos considerar um tanto quanto controversa, polêmica ou até contrária à arte/educação, é possível também fazermos uma leitura que aponta

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para a compreensão da arte como elemento fundamental e constitutivo do ensino. Não é à toa que os arte/educadores tiveram um papel tão importante na articulação deste projeto.

Também da mesa realizada no XXII CONFAEB, na fala da Profª Yara Caznók podemos verificar que esta leitura, de que a relação da arte com a educação é fundamental do ponto de vista freireano. Destaca-se em sua fala o trecho a seguir:

“Quando se propõe um trabalho artístico que garanta o desenvolvimento integral de um ser, respeitando e acompanhando seu desvelamento existencial pleno, é preciso pautar-se, no mínimo, por alguns dos muitos princípios e reflexões de Freire. Para citar apenas um de seus títulos, seleciono a Pedagogia da Autonomia – Saberes necessários à prática educativa (Paz e Terra, 2010), por ser uma publicação muito difundida em cursos de formação de professores. Lá, encontramos alguns saberes que têm implicação direta e visceral com a experiência artística: a consciência do inacabamento, o saber escutar, e a disponibilidade para o diálogo e para a pesquisa, entre outros. Estes saberes estão de tal maneira entranhados na experiência artística, que se tornam conteúdos ético-estético-pedagógicos inevitáveis a serem desenvolvidos em conjunto com aqueles específicos da linguagem musical.” (CAZNÓK, 2012)

A seguir relaciona como estes saberes estão relacionados com a música e com a Arte:

“1) A arte é o exercício do questionamento: é o enfrentamento com o já estabelecido, com o que já se tornou cômodo, com o que já temos na memória, em nossa história de vida e em nossa civilização, é a busca constante de ressignificação do que nos foi apresentado e cunhado como certo e, por isso, longe de ser apaziguadora, uma vivência artística pode ser intensamente desestabilizadora;

2) A experiência estética é a prática e a aceitação do provisório – valores, verdades, poderes, conceitos. Escutar, estudar e interpretar uma obra percebendo-a, realmente, é uma atitude que nada tem de passividade ou de domesticação do mundo interno. É, ao contrário, um estímulo a uma postura de procura intensa de sentidos, de direções múltiplas, de significados provisórios. É uma tarefa corajosa e angustiante que nos desloca espacial e temporalmente, que nos reposiciona na tradição e nos confronta com a contemporaneidade;

3) A arte lida simultaneamente com construção e desconstrução, com os limites entre escassez e excesso, com forças de coesão e desagregação, com impulsos de criação e de destruição. Apolo e Dionísio são experimentados concretamente e são convidados a fazer parte de nossa vida cotidiana;

4) Uma obra, quando incorporada em nossa interioridade nos transforma, sim, mas não necessariamente aplaca nossas angústias. Incita-nos a procurar outros modos de estar no mundo, a tentar compreender maneiras diferentes de ser e de conceber a vida. Favorece, por isso, o exercício da tolerância, da flexibilidade, da aceitação do outro, do que é diferente de nós e que, mesmo assim, se nos oferece como diálogo e como encontro.” (CAZNÓK, 2012)

Podemos depreender, relacionando a fala de Yara Caznók e o trecho da entrevista supracitado que a inquietação e a construção do processo educacional

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que se buscava a importância fundamental da arte/educação para o projeto e do projeto para o pensamento contemporâneo da arte/educação em suas diferentes linguagens.

CONCLUSÕES

"Ser consciente de sua própria inconclusão; estar no mundo significa, necessariamente, estar com o mundo e com os outros". Nas palavras de Paulo Freire inicio as conclusões deste trabalho que termina, como toda pesquisa, inconcluso e de portas abertas para novos desdobramentos, novas inconclusões.

Diante do material levantado mostra-se claro que novas pesquisas sobre a importância do movimento de reorientação curricular, que teve seu fim prematuro e dramático decretado por uma mudança de gestão governamental, devem ser realizadas.

Se nossas conclusões são um tanto inconclusas devemos a grande riqueza deste curto período histórico cujos desdobramentos simbólicos e efetivos das sementes que brotaram pelo país a fora e pela grande paixão que há na fala de cada um daqueles que estiveram presentes na construção deste projeto e que afirmam que este foi um momento que jamais será esquecido.

Um eco da fala de Acácio Arouche, professor de Artes que lecionava à época e participou ativamente da elaboração do projeto, continua em minha mente:

“Quero discordar radicalmente da ideia de que faz vinte anos que acabou, quero dizer, a administração pública tem seu tempo mas as experiencias não terminam necessariamente. Não acabou o que se plantou e a evidência disto é que estamos aqui falando do assunto.” (AQUINO, 2012)

Ele dizia que o movimento de reorientação curricular nunca terminou. Que o projeto do professor Paulo Freire não morreu. Que este sonho não teve seu fim com o final da gestão da prefeita Luiza Erundina. Este projeto, para o professor Acácio, permaneceu para sempre vivo na sua prática como educador, mesmo que institucionalmente ele tenha terminado.

Assim como essa afirmação do Acácio diz que o projeto não terminou ali, é possível dizer que a repercussão do projeto na arte/educação também não teria seu fim findo os quatro anos da gestão de Paulo Freire e Mario Sérgio Cortella. Uma das páginas que este projeto ainda deixa aberta é o quanto este momento influenciou o

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desenvolvimento das teorias contemporâneas de arte/educação que trabalham intrinsecamente e buscam trabalhar extrinsecamente com a relação, com a vivência e com a construção coletiva e experimentadora do conhecimento em arte.

Esse potencial questionador, experimentador, curioso e ousado da arte foi o que fez com estes profissionais arte/educadores, professores de arte de sala, professores universitários da área contagiassem a todos e fossem importantes protagonistas deste Projeto.

A conformação do pensamento em Arte, a construção do pensamento pela arte/educação é holisticamente interdisciplinar. Se alguns ajustes foram sendo feitos para conseguir fazer com que a arte/educação conseguisse se relacionar e ser parte da arte contemporânea esses ajustes não fugiram à baila do que já estava traçado: um caminho de experiência estética, onde os sentidos unidos ao pensamento racional constroem juntos uma forma de compreensão significativa do mundo, mediada pelo ser humano que somos cada um de nós, educadores e educandos.

REFERÊNCIAS

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BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo: Editora Hucitec, 1988, 4ª edição.

AQUINO, Acácio Arouche de. <sem título>. [29 de outubro de 2012]. ANAIS XXII CONFAEB. São Paulo: 2012. Disponível em

<http://faeb.com.br/livro03/Arquivos/mesas/acacio_arouche_de_aquino.pdf>

BARBOSA, Ana Mae, CUNHA, Fernanda Pereira da (org.). Abordagem Triangular no Ensino das Artes e Cultura Visuais. São Paulo: Cortez Editora, 2010

BARBOSA, Ana Mae. A Imagem no Ensino da Arte: Anos Oitenta e Novos Tempos. São Paulo: Perspectiva, 2010.

__________________. Arte/Educação contemporânea. São Paulo: Cortez, 2012

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CAZNÓK, Yara. A música na escola pública: uma crítica ao discurso do “troque sua arma por um violino”. [29 de outubro de 2012]. ANAIS XXII CONFAEB. São Paulo: 2012. Disponível em

<http://faeb.com.br/livro03/Arquivos/mesas/yara_caznok.pdf>

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 2012. ____________. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005, 43ª edição.

____________. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003.

____________. A educação na cidade. São Paulo: Cortez, 1991.

___________. À sombra desta mangueira. São Paulo: Editora Olho Dágua, 2001, 6ª edição.

__________. Pedagogia da Esperança: Um Encontro com a Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2006, 13a edição.

__________. Paulo Freire ou a Palavra Viva. [29 de outubro de 2012]. ANAIS XXII CONFAEB: Paulo Freire ou a Palavra Viva. Entrevista concedida a Joana Lopes. Disponível em:

<http://faeb.com.br/livro03/Arquivos/mesas/joana_lopes.pdf>

MEIHY, José Carlos Sebe B., HOLANDA, Fabíola. História Oral: como fazer, como pensar. Editora Contexto, São Paulo: 2007

SECRETARIA MUNICIPAL DA EDUCAÇÃO DE SÃO PAULO. Educação Artística: Relatos de prática. Prefeitura Municipal de São Paulo, São Paulo: 1992.

_________________________________________________. Programa de Primeiro Grau - Ensino Regular: Implementação de Educação Artística - 1ª à 8ª séries. Prefeitura Municipal de São Paulo, São Paulo: 1988 .

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