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Competitividade e desenvolvimento territorial rural : ações e contradições do planejamento federal para territórios rurais no Brasil

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Academic year: 2021

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Instituto de Geociências

ALCIDES MANZONI NETO

COMPETITIVIDADE E DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL RURAL: AÇÕES E CONTRADIÇÕES DO PLANEJAMENTO FEDERAL PARA TERRITÓRIOS RURAIS NO BRASIL

CAMPINAS 2017

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COMPETITIVIDADE E DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL RURAL: AÇÕES E CONTRADIÇÕES DO PLANEJAMENTO FEDERAL PARA TERRITÓRIOS RURAIS NO BRASIL

TESE APRESENTADA AO INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS PARA OBTENÇÃO DO TÍTULO DE DOUTOR EM GEOGRAFIA NA ÁREA DE ANÁLISE AMBIENTAL E DINÂMICA TERRITORIAL

ORIENTADOR: PROF. DR. RICARDO A. CASTILLO

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELO ALUNO ALCIDES MANZONI NETO E ORIENTADA PELO PROF. DR. RICARDO ABID. CASTILLO

CAMPINAS 2017

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Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas Biblioteca do Instituto de Geociências Cássia Raquel da Silva - CRB 8/5752

Manzoni Neto, Alcides,

M319c ManCompetitividade e desenvolvimento territorial rural : ações e contradições do planejamento federal para territórios rurais no Brasil / Alcides Manzoni Neto. – Campinas, SP : [s.n.], 2017.

ManOrientador: Ricardo Abid Castillo.

ManTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Geociências.

Man1. Geografia agrária. 2. Distribuição geográfica. 3. Desenvolvimento rural. 4. Planejamento territorial. 5. Território nacional. I. Castillo, Ricardo,1963-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Geociências. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Competitiveness and territorial rural development : actions and contradictions of federal planning for rural territories in Brazil

Palavras-chave em inglês: Agricultural geography Geographical distribution Rural development Territorial planning National territory

Área de concentração: Análise Ambiental e Dinâmica Territorial Titulação: Doutor em Geografia

Banca examinadora:

Ricardo Abid Castillo [Orientador] Maria Mónica Arroyo

Ricardo Mendes Antas Júnior Adriana Maria Bernardes da Silva Vanderlei Braga

Data de defesa: 31-05-2017

Programa de Pós-Graduação: Geografia

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AUTOR: Alcides Manzoni Neto

COMPETITIVIDADE E DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL RURAL: AÇÕES E CONTRADIÇÕES DO PLANEJAMENTO FEDERAL PARA TERRITÓRIOS

RURAIS NO BRASIL

ORIENTADOR: Prof. Dr. RICARDO ABID. CASTILLO

Aprovado em: 31 / 05 / 2017

EXAMINADORES:

Prof. Dr. Ricardo Abid Castillo

Profa. Dra. Adriana Maria Bernardes da Silva

Profa. Dra. Maria Mónica Arroyo

Prof. Dr. Ricardo Mendes Antas Junior

Prof. Dr. Vanderlei Braga

A Ata de Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.

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Aos meus pais Antonio Cesar Manzoni e

Maria Assunta Staino Manzoni

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Esta pesquisa demandou anos de comprometimento e, sem dúvida, pessoas muito importantes participaram direta ou indiretamente desse processo. Primeiramente, agradeço a Deus, porque sua presença – das mais diversas formas – foi decisiva para meu amadurecimento e crescimento. E agradeço pelo enorme carinho, pelo apoio incondicional e pelas palavras de incentivo de meus pais Antonio Cesar Manzoni e Maria Assunta Staino Manzoni. Não teria chegado até o fim dessa jornada sem o apoio deles e de toda a minha família.

Impossível não reconhecer a importância do meu professor e orientador Ricardo Castillo, pois sua paciência, seu rigor e seu comprometimento com uma produção científica responsável e operacional foram fundamentais para minha formação enquanto pesquisador e como profissional na área do ensino. Agradeço ainda à professora Adriana Bernardes da Silva pelos ensinamentos e pela leitura atenta do trabalho na qualificação, assim como sou muito agradecido à professora Mónica Arroyo, sempre criteriosa e profunda em suas análises (inclusive na qualificação da presente pesquisa), e uma profissional que sempre deixa transparecer seu carinho pela Geografia. Sou grato também ao professor Márcio Cataia pelas excelentes aulas na graduação e na pós-graduação e ao professor Ricardo Mendes Antas Jr., porque suas discussões e análises muito me ajudaram na construção de novas visões de mundo. Agradeço ainda ao professor Peter Demant, porque seu rigor, suas ótimas aulas e seu profundo conhecimento da História da Ásia me inspiram todos os dias.

Agradeço pela ajuda e disposição dos entrevistados em Brasília, Campinas e Chapecó, os quais foram sempre muito solícitos. Meus agradecimentos a Andréa Lorena Butto Zarzar (secretária de Desenvolvimento Territorial da Secretaria de Desenvolvimento Territorial – SDT), Carlos Luiz de Miranda (coordenador de Territórios e Bem Estar Rural do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA), James Luiz Berto (professor da Universidade Federal da Fronteira Sul), Maria de Fátima Gomes Brandalise (coordenadora executiva do Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural – NEAD), Matteus Guimarães Martins (coordenador de Apoio a Comércio e Negócio Territorial, da Secretaria de Desenvolvimento Territorial – SDT), Roberto Nascimento (diretor Nacional do Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural – NEAD), Ronaldo Gonçalves Martins

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Não teria conseguido me manter firme nessa caminhada sem a ajuda de meus amigos: Victor Begeres, Marianne Garroux, Alexandre Rubega, Mait Bertollo, André Pasti, Luciano Duarte, Ana Mello (e família!), Mohammed Elkatter, Patricia Merlin, Carlos Eduardo, Virgínia de Oliveira, Maria Susie, Rogério Gaiotti, Gustavo Pansani, Denílson Corsi, Daniella Rubbo, Maria Carolina Rodrigues e José Roberto Cabrera. Registro aqui, também, meus agradecimentos aos muitos alunos com os quais tive o prazer de conviver nesses anos de docência em colégios e na Esamc.

Agradeço ainda à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), cujo financiamento foi essencial para a realização desta pesquisa.

Deixo um agradecimento especial à minha querida Ana Paula Ogassawara, que esteve tão presente nessa caminhada, com paciência nas horas que me comprometi com meus estudos, com tolerância para ouvir meus lamentos, com carinho e incentivo nas horas certas, com alegria nos momentos que compartilhamos, com um abraço nos momentos tensos... E com ajuda nos procedimentos técnicos dessa tese! Obrigado minha Linda!

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“Se tudo no mundo fosse sensato, nada aconteceria. Sem ti não haveria quaisquer acontecimentos, e é preciso que haja acontecimentos. E então trabalho a contragosto para que haja acontecimentos e crio o insensato cumprindo ordem. Os homens, a despeito de toda a sua indiscutível inteligência, tomam toda essa comédia por alguma coisa séria. Nisto reside sua tragédia. E então sofrem, é claro, mas... em compensação, vivem apesar de tudo, vivem na realidade, não na fantasia; porque o sofrimento é que é vida. Sem sofrimento, que prazer poderia haver em viver? Tudo se transformaria num infinito Te Deum: é uma coisa sagrada, porém meio chata. Bem, e eu? Sofro, e no entanto não vivo. Sou o x de uma equação indefinida. Sou uma espécie de espectro da vida, que perdeu todos os fins e princípios e acabou esquecendo até como se chama”.

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Desde a promulgação da Constituição de 1988, é possível observarmos uma valorização da dimensão territorial do planejamento no Brasil, em oposição à sua clássica orientação setorial. De tal modo, no âmbito de uma nova geração de políticas públicas no Brasil, o Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (PRONAT), lançado em 2004, representa um avanço da política agrária e nos instrumentos de promoção do desenvolvimento rural. Sua operacionalização e aperfeiçoamento ao longo de mais de dez anos têm trazido à tona importantes temas de debate para os rumos do planejamento territorial e também para o desenvolvimento rural, ao mesmo tempo em que revela o esforço de recentes governos federais em criar uma estrutura institucional que desse suporte para uma nova maneira de se combater a pobreza e a desigualdade no campo. Assim, propomos analisar o PRONAT mediante a investigação dos pressupostos envolvidos na concepção, delimitação, implantação e regulação dos Territórios Rurais, considerando que um território rural deve ser compreendido como um compartimento complexo do espaço geográfico. Avaliamos em que medida tais compartimentos subsidiaram e ainda subsidiam propostas de desenvolvimento local fundamentadas nos pressupostos da competitividade geográfica, bem como pesquisamos as implicações desses compartimentos para o planejamento territorial no Brasil e para a elaboração de políticas públicas direcionadas para porções do território nacional identificadas como “rurais”. Analisamos diferentes concepções de competitividade e de competitividade territorial presentes em uma bibliografia internacional sobre o tema, procurando precisar tal conceito e investigar sua importância para o desenvolvimento rural. Em paralelo, avaliamos como as propostas ligadas à teoria do Desenvolvimento Local têm influenciado análises e propostas de dinamização econômica dos territórios rurais, com destaque para uma pretensa necessidade de implantação de Arranjos Produtivos Locais. Visando compreender em que medida a competitividade pautou os pressupostos do PRONAT, investigamos Planos Territoriais de Desenvolvimento Rural Sustentável (PTDRS), para então sistematizar nossas conclusões.

Palavras-chave: território rural; competitividade geográfica; desenvolvimento rural;

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Since the 1988 Constitution has been enacted, it is possible to observe a valorization of territorial dimension in Brazil, in opposition to its classic sectorial guidance. Therefore, within the scope of a new public politics generation in Brazil, the National Program for Sustainable Rural Territories (PRONAT), launched in 2004, represents an advance in agrarian policy and in the instruments for promotion of rural development. Its operationalization and enhancement through more than ten years has brought important issues for the trends of territorial planning and also for rural development, at the same time it reveals the efforts of recent federal governments to create an institutional structure that gives support to a new way of combating poverty and inequality in the country side. Thus, we proposed to analyze PRONAT against the investigation of the assumptions involved in the development, demarcation, establishment and regulation of Rural Territories, considering that a rural area must be comprehended as a complex enclosure of geographic space. We evaluated to which extent those enclosures subsidized and still subsidize proposals of local development based on assumptions of geographic competitiveness, as well as we researched the implications of those enclosures for territorial planning in Brazil and for public policies elaboration targeted to national territory portions known as “rural”. We analyzed different conceptions of competitiveness and territorial and regional competitiveness present in an international literature regarding the subject, aiming to precise this concept and investigate its importance for rural development. In parallel, we evaluated how the proposals connected to Local Development theory has influenced analysis and proposals of rural territories economic dynamics, focusing in an alleged need to implement local productive arrangements. In order to understand in which actions the competitiveness has ruled PRONAT assumptions, we investigated Territorial Planning for Sustainable Rural Development (PTDRS), to systematize our conclusions.

Keywords: rural territory; geographic competitiveness; rural development; territorial

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Depuis la promulgation de la Constituition de 1988, il est possible d’observer une valorization de la dimension territoriale de l’aménagement au Brésil, par opposition à sa traditionelle orientation sectoriel. Dorénavant, dans le cadred’une nouvelle génération de politiques publiques au Brésil, le Programme National pour le Développement Durable de Territoires Rurales (PRONAT), paru en 2004, répresente un progrès de la politique agraire et pour les instruments de promotion du développement rural. Son opéracionalization et perfectionnement au long de plus de dix ans ont mis en relief des thèmes importantes du débat pour l’avenir de l’aménagement du territoire et aussi pour le développement rural, au même temps que révèl el’éffort des gouvernements fédérales récents pour créer une structure institutionnel qui apporte son soutien pour une nouvelle manière de combattre la pauvrété et l’inégalitédans la campagne. Par consequént, nous proposons l’analyse du PRONAT à l’aide de la recherche des préssuposés impliqués à la conception, délimitation, déploiement et la réglementation des Territoires Rurales, en considerant qu’un territoire doit être compris comme un compartiment complèxe de l’espace géographique. Nous avons évalué dans quelle mesure tels compatiments ont été subventionné et encore subventionnent des propositions de développement local basées dans les préssuposés de la compétitivité géographique, ainsi que nous avons recherché les repercussions de ces compartiments pour l’aménagement du territoire brésilien et pourl’élaboration de politiques publiques ciblées à certaines parties du territoire national identifiés comme “rurales”. Nous avons analysé des différents conceptions de la competitivité et de competitivité territoriale et régional qui sont présentes dans une bibliographie internationale à propôs du sujet, encherchant à preciser tel concept et à étudier son importance pour le développement rural. Parallèlement, nous avons évalué comment les hipothèses liées à la théorie du Développement Local peuvent influencer les analyses et les propositions de dynamization économique des territoires rurales, en soulignant une prétendue nécessité d’implantation des Arrangements Productives Locaux. Afin de comprendre dans quelle mesure la competitivité a guidé les préssuposés du PRONAT, nous avons examiné les Plans Territoriales du Développement Rural Durable (PTDRS), avecl’objectif de systématizer nos conclusions.

Mots-Clefs: territoire rural; compétitivité géographique; développement rural;

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Esquema 1: Sistematização das instituções envolvidas no PRONAT ... 97 Esquema 2: Processos de formulação e gestão de projetos dos territórios rurais ... 128

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Figura 1: Parte da “Árvore de estruturação de critérios para a análise de priorização de agrupamentos de projetos no PPA 2004-2007” ... 60 Figura 2: As quatro Instâncias que compõem o Colegiado Territorial ... 109

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Quadro 1: Análise de alguns dados do Censo Agropecuário 2006 por Fernandes et al. (2012)... 71

Quadro 2: Principais dados levantados pela Fundação Getúlio Vargas & Instituto Brasileiro de Economia quanto à produção agropecuária (2010) ... 72

Quadro 3: Tipologia dos municípios brasileiros segundo Veiga (2002) ... 79

Quadro 4: Caracterização dos municípios brasileiros segundo a tipologia proposta por Veiga (2002) 80 Quadro 5: Descrição do Programa Nacional de Territórios Rurais ... 87

Quadro 6: Fases que compõem cada ciclo de implementação dos Territórios Rurais ... 90

Quadro 7: Principais atribuições do Colegiado Territorial para a gestão do desenvolvimento territorial rural sustentável e as recomendações quanto à sua composição ... 107

Quadro 8: Atribuições das instâncias que compõem o Colegiado Territorial... 109

Quadro 9: Parâmetros para definição de Territórios Rurais ... 116

Quadro 10: Entidades envolvidas na produção de PTDRS ... 220

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Mapa 1: Os 165 Territórios Rurais reconhecidos pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário até 2013 ... 119 Mapa 2: Os 241 Territórios Rurais Agrário em 2016 ... 120 Mapa 3: Territórios Rurais segundo a data de criação em dois principais momentos ... 121

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APL Arranjo Produtivo Local

ATER Assistência Técnica e Extensão Rural

BM Banco Mundial

BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

CAI Complexo Agroindustrial

CAIs Células de Acompanhamento e Informação

CIAT Comissão de Instalação de Ações Territoriais

CODETER Colegiado de Desenvolvimento Territorial

CONDRAF Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural, Reforma Agrária e Agricultura Familiar

CEADES Instituto de Estudos e Assessoria ao Desenvolvimento CEDRS Conselhos Estaduais de Desenvolvimento Rural Sustentável

CMDR Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural

DR Desenvolvimento Rural

FAO Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IICA Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura

INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

LDO Lei de Diretrizes Orçamentárias

LEADER Ligações entre Ações de Desenvolvimento da Economia Rural

MDA Ministério do Desenvolvimento Agrário

MDSCF Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome

MI Ministério da Integração

MMA Ministério do Meio Ambiente

MME Ministério de Minas e Energia

TEM Ministério do Trabalho e Emprego

NEAD Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural

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PRONAF Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

PRONAT Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais

PTC Programa Territórios da Cidadania

PTDRS Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável

PTDRSS Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário

SEBRAE Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

SGE Sistema de Gestão Estratégica

SAF Secretaria de Agricultura Familiar

SDT Secretaria de Desenvolvimento Territorial

SRA Secretaria de Reordenamento Agrário

TR Territórios Rurais

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RESUMO ... iix

ABSTRACT ... x

RÉSUMÉ ... xii

Introdução ... 20

Capítulo 1: A emergência da abordagem territorial nas políticas públicas nos anos 1990: novas concepções para o desenvolvimento rural ... 24

1.1 O debate sobre desenvolvimento territorial: aspectos conceituais da experiência internacional ... 27

1.1.1 Requalificando espaços pelo movimento de neoliberalização: desafios para um novo padrão de desenvolvimento nos países periféricos ... 33

1.2 O novo contexto histórico para a promoção do desenvolvimento rural no Brasil ... 46

1.3 Aspectos da retomada do planejamento territorial durante os anos 1990 e a emergência de novas institucionalidades para a política agrária brasileira ... 52

1.4 Rupturas e novas concepções para o planejamento territorial e o desenvolvimento rural a partir dos anos 2000 ... 66

1.5 O debate sobre o “novo rural”: avaliando os conceitos de rural e urbano à luz da requalificação dos espaços... 55

Capítulo 2: Implantação, funcionamento e gestão do Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (PRONAT) ... 85

2.1. Marcos legais e objetivos do Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (PRONAT) ... 86

2.2. Um olhar sobre as instituições que dão suporte ao Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais ... 95

2.3. Estratégias de delimitação e priorização dos territórios rurais ... 97

2.4. Aspectos organizacionais do PRONAT e dos Planos Territoriais de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário (PTDRSS) ... 123

Capítulo 3: O Território Rural como compartimento complexo do espaço geográfico ... 134

3.1 Investigando a natureza de um Território Rural ... 135

3.2 A importância dos Arranjos Produtivos Locais para a competitividade dos Territórios Rurais ... 151

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Capítulo 4: O imperativo da competitividade geográfica nos Planos Territoriais ... 175

4.1. A competitividade como uma norma no século: um novo paradigma se impõe? ... 180

4.2 Competitividade territorial e regional: uma análise do contexto internacional ... 181

4.3 Natureza e os objetivos da competitividade: em busca de uma conceituação ... 192

4.4 O imperativo da competitividade territorial na experiência do Programa LEADER ... 203

4.5 Dinamização econômica dos territórios rurais frente à expansão de Regiões Competitivas ... 212

4.6 A competitividade geográfica nos Planos Territoriais de Desenvolvimento Rural Sustentável ... 216 Conclusões ... 230 Referências Bibliográficas ... 239 ANEXO 1 ... 253 ANEXO 2 ... 254 ANEXO 3 ... 255

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Introdução

o âmbito de uma nova geração de políticas públicas no Brasil, o Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (PRONAT), lançado em 2004, representa um avanço da política agrária e nos instrumentos de promoção do desenvolvimento rural. Sua operacionalização e aperfeiçoamento ao longo de mais de dez anos têm trazido à tona importantes temas de debate para os rumos do planejamento territorial e também para o desenvolvimento rural, ao mesmo tempo em que revela o esforço de recentes governos federais em criar uma estrutura institucional que desse suporte para uma nova maneira de se combater a pobreza e a desigualdade no campo.

Para a geografia e outras ciências sociais, a criação do PRONAT colocou também o desafio de entender a natureza e a importância de uma nova escala de planejamento: o território rural. O que veio se somar ao extenso debate sobre os conceitos de rural e urbano, campo e cidade, já presente há algum tempo nas pesquisas, na produção científica1 e nas instituições governamentais. Na complexa estrutura institucional montada pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, uma série de avanços se deram no suporte e consolidação do desenvolvimento rural, sendo que a noção de competitividade foi alçada a um papel de destaque nas propostas de dinamização econômica dos Territórios Rurais. Ao mesmo tempo, contribuições da Teoria do Desenvolvimento Endógeno, como os Arranjos Produtivos Locais (APLs), também estão presentes nas propostas de desenvolvimento rural que subsidiam o Programa e despertam a atenção para as consequências da promoção de APLs em

1 É o caso, por exemplo, de Abramovay (2003); Buainain et. al. (2013); Carlos (2003); Castillo (2013; 2015);

Castillo et. al. (2016); Elias (2007; 2011; 2013); Endlich (2006); Favareto (2006); Graziano da Silva (2001; 2010); Graziano & Navarro (2015); Hespanhol (2001); Kageyama (2008); Kay (2009); Medeiros & Dias (2011); Oliveira (2004); Pérez & Caballero (2003); Veiga (2002; 2004); Wanderley & Favareto (2013).

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Territórios Rurais. Mediante esse contexto de complexas questões e debates em curso, acreditamos que uma análise pormenorizada do PRONAT se faz necessária.

Consideramos que isso se deve ao fato do Programa ter priorizado, em sua concepção: 1) o reconhecimento político e institucional da agricultura familiar e dos povos e comunidades tradicionais; 2) a superação de uma visão setorial historicamente presente na alocação de recursos públicos; 3) a busca de uma nova visão do rural para o planejamento público; 4) pressupostos norteadores condizentes com novas demandas democráticas, como a autogestão (mediante os Colegiados Territoriais); e, sobretudo, 5) o desenvolvimento rural a partir de uma perspectiva territorial, que reconhece as limitações da escala municipal diante do desafio de se combater a pobreza.

Partimos da tese de que a aplicação e a gestão do Programa se depararam com algumas limitações: 1) inconsistências na delimitação dos Territórios Rurais; 2) pouca atenção à complexidade dos novos compartimentos espaciais criados; 3) contradições envolvendo os pressupostos da competitividade territorial, considerada pelos proponentes do Programa como uma das dimensões fundamentais do desenvolvimento sustentável; 4) problemas com a representatividade de agentes nos Colegiados Territoriais, bem como na relação destes com prefeituras de municípios constituintes de um mesmo Território Rural; 5) ausência de um conjunto normativo próprio dos territórios, o que os deixa suscetíveis às limitações políticas de prefeituras no acesso a recursos financeiros; 6) Planos Territoriais de Desenvolvimento Rural Sustentável (PTDRS) com baixa capacidade de nortear o planejamento territorial dos Territórios e; 7) incongruência da estratégia de desenvolvimento endógeno visando a dinamização econômica dos Territórios Rurais diante de compartimentos complexos tais como os espaços em questão.

Para tanto, o objetivo geral deste trabalho é analisar o Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (PRONAT), mediante a investigação dos pressupostos envolvidos na concepção, delimitação, implantação e regulação dos Territórios Rurais. Intentamos analisar em que medida tais compartimentos subsidiam propostas de desenvolvimento local fundamentadas nos pressupostos da competitividade territorial, bem como pesquisar as implicações dessas formas geográficas para o planejamento territorial no Brasil e para a elaboração de políticas públicas direcionadas para porções do território nacional identificadas como “rurais”.

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Para a análise de tais aspectos propomos uma estrutura de trabalho em quatro capítulos. No capítulo 1, discorremos sobre o contexto de profundas mudanças ocorridas no planejamento público federal nos anos 1990, associadas às mudanças que ocorreram na concepção do desenvolvimento rural, tanto no Brasil como na América Latina. Para uma da dada compreensão de tais mudanças, recorremos em um primeiro momento à análise de aspectos do processo de neoliberalização e de sua dimensão geográfica, tendo como pano de fundo a ampliação da globalização e da consequente requalificação dos espaços, segundo um movimento que é global. Essas variáveis são ressaltadas visando um entendimento inicial da competitividade (tendo em vista que se trata de uma noção com diferentes definições), onde destacamos aqueles significados que melhor auxiliem a compreender sua importância atual para as políticas públicas e para ações de desenvolvimento rural, subsidiando uma discussão que será pormenorizada no capítulo 4. Em seguida, procuramos avaliar aspectos e processos relacionados à ruptura na forma e na natureza de políticas públicas ocorrida com a consolidação de um novo governo federal nos anos 2000, que terá profundas implicações na criação de leis, normas e instituições voltadas para o desenvolvimento rural. Os conceitos de rural e urbano também serão objeto de discussão para melhor compreender a renovação de políticas públicas direcionadas para o desenvolvimento rural.

Em seguida, no capítulo 2, buscaremos compreender como tais mudanças implicaram em um novo arcabouço normativo e operacional do planejamento territorial federal, visando dar suporte ao PRONAT. Discorreremos de que modo um conjunto de mudanças culminou em uma proposta inovadora para o desenvolvimento territorial rural no Brasil: o Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (PRONAT), em 2004, que pode ser entendido como um marco para as políticas públicas com viés territorial e para a regionalização do território brasileiro. Buscaremos descrever os pressupostos do Programa, seus objetivos e seus critérios de regionalização e o funcionamento do complexo sistema institucional montado e orientado pela Secretaria de Desenvolvimento Territorial, do então Ministério do Desenvolvimento Agrário. Chamaremos a atenção para a importância dos Colegiados Territoriais, uma instância fundamental para a construção de um planejamento

bottom-up e que se propõe a ser mais comprometido com as realidades e demandas dos

lugares. As formas de financiamento do Programa também merecerão destaque dadas as limitações do território rural enquanto compartimento jurídico-institucional.

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Ocorre que o território rural, na qualidade de compartimento do espaço geográfico, também precisa ser investigado. Trataremos, no capítulo 3, da natureza de um território rural e procuraremos defender a ideia de que se trata de um compartimento complexo do espaço geográfico. Posteriormente, pretendemos avaliar como as propostas ligadas à teoria do Desenvolvimento Local têm influenciado análises e propostas de dinamização econômica dos Territórios, com destaque para uma pretensa necessidade de implantação de Arranjos Produtivos Locais.

Dado o fato de que em sua concepção o PRONAT também promoveu a noção de competitividade a um papel de destaque na orientação de propostas de políticas públicas, investigaremos mais detalhadamente a noção de competitividade no capítulo 4, a partir da análise de uma bibliografia internacional sobre o tema. Seu uso recorrente por agentes públicos e pesquisadores diretamente ligados ao processo de desenvolvimento territorial nos desperta a atenção para a necessidade de melhor entendermos qual a natureza da competitividade que tem sido defendida por planejadores públicos no Brasil e mesmo no contexto internacional. Em seguida, problematizaremos a existência e operacionalização de territórios rurais mediante a existência de Regiões Competitivas Agroindustriais, questionando em que medida existiria a proposta de transformar os territórios rurais em “Regiões Ganhadoras”, de acordo com o entendimento de Benko & Lipietz (1994). Para tanto, trataremos dos Planos Territoriais de Desenvolvimento Rural e Sustentável (PTDRS), quanto à sua metodologia e uso de preceitos oriundos da noção de competitividade.

Finalizaremos com uma conclusão, em que ressaltamos os principais aspectos levantados e as problematizações decorrentes das propostas aqui apresentadas.

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Capítulo 1: A emergência da abordagem

territorial nas políticas públicas nos anos

1990: novas concepções para o

desenvolvimento rural

m contínuo processo de modernização dos espaços vem deixando marcas permanentes no território brasileiro, assim como vem alavancando uma profusão de novas relações sociais, novos padrões de consumo, novas formas de produzir, novos condicionantes para a relação entre o campo e a cidade, novas problemáticas regionais, bem como metamorfoses na divisão do trabalho e um escalonamento da crise urbana. Além disso, dada a natureza dessa modernização, novos conteúdos vêm sendo requisitados aos lugares e algumas variáveis do período atual alcançaram um status privilegiado dentro das agendas públicas. É o caso, por exemplo, da logística, forma de circulação majoritariamente apropriada pelas grandes empresas (CASTILLO, 2008a; 2008b).

Em decorrência disso, a própria natureza do desenvolvimento passou a ser discutida dentro da Academia e de órgãos e instituições governamentais. Uma inquietação com os rumos das intervenções públicas se fez presente não apenas no Brasil, mas em muitos outros países do mundo, debate esse capitaneado sobremaneira por instituições internacionais. Neste sentido, no Brasil, profissionais ligados ao planejamento e gestão identificaram a necessidade de propor novos instrumentos para subsidiar políticas públicas para o campo brasileiro, com especial destaque para a criação do Programa Nacional de

U

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Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), na segunda metade da década de 1990, do Ministério do Desenvolvimento Agrário (instituído em 2000) e algumas outras normas que evidenciaram o quanto a agricultura e o campo precisavam de uma nova compreensão por parte do Governo Federal e dos entes federativos no país. A partir dos anos 2000, foi cogitada uma nova maneira de se propor planejamento, não mais “de cima para baixo”, mas que promovesse o “empoderamento” (ECHEVERRI, 2010; DELGADO & LEITE, 2011) de agentes com fortes vínculos com os lugares alvos de intervenções públicas. Além disso, surgiu a necessidade de uma nova organização produtiva em lugares destituídos de dinamismo econômico e de reconhecimento das limitações do atual arranjo federativo para o planejamento – dado pela disposição dos limites municipais, considerados sérios empecilhos para um novo planejamento que se almejava.

Como ponto de partida em nossa análise, apresentamos uma discussão sobre como o conceito de desenvolvimento rural adquiriu importância crescente ao longo dos anos 1990, fato esse que formatou os objetivos do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e inspirou, dentro de sua estrutura organizacional, a criação da Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), em 2003.

Sobre esse processo relativamente recente de proposição de uma nova agenda de desenvolvimento, Schneider (2007, p. 02) alerta que “o quadro analítico e interpretativo que vem sendo utilizado é relativamente difuso e polissêmico, não obstante tenha sido capaz de influenciar e desempenhar um papel importante na própria elaboração da agenda temática”.

Não pretendemos resgatar a extensa discussão sobre o conceito de desenvolvimento propriamente dito. Ao invés disso, adotamos a proposição de Cano (2012, p. 01-02), para quem

Desenvolvimento é o resultado de um longo processo de crescimento econômico, com elevado aumento da produtividade média, sem o qual o excedente não cresce o bastante para acelerar a taxa de investimento e diversificar a estrutura produtiva e do emprego. Esse processo intensifica a industrialização e urbanização para transformar de maneira progressista as estruturas sociais e políticas do país. Ademais, também se alterarão e modernizarão hábitos e costumes da sociedade.

Isto posto, nos interessa discutir como propostas de desenvolvimento rural foram sendo conduzidas a partir dos anos 1990, bem como a criação de um arcabouço teórico e

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institucional que lhe deu suporte. Consideraremos ainda o fato de que a reorientação das políticas agrárias e de desenvolvimento rural no Brasil e no mundo tem se pautado pela valorização da dimensão espacial, tornando obrigatório destacar que o conceito de espaço geográfico adotado em nossa pesquisa transcende a sua mera concepção como suporte físico das ações sociais. Pois concordamos com a definição de Santos (1996, p. 51), de que o espaço

É formado por um conjunto indissociável, solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como o quadro único no qual a história se dá.

Tal definição constitui o ponto de partida para a compreensão e delimitação do território, da região, do lugar e da paisagem, entendidos como os principais compartimentos do espaço geográfico. Ressaltamos que ele se soma a outras instâncias sociais como condição imprescindível para a produção e reprodução social, devendo ser pensado como “um conjunto de formas materiais (naturais e artificiais, articuladas ou não) que impõe resistências, oferece abrigo, expõe ao perigo, separa, unifica etc., somado a um conjunto de permissões e proibições que regula a maneira como cada porção pode ser apropriada, transformada e usada” (CASTILLO, 2008a, p. 04). Logo, como princípio de método, trataremos das variáveis determinantes do período atual a partir do espaço geográfico, identificando características da denominada globalização neoliberal nos anos 1990 e algumas de suas implicações para o planejamento territorial no Brasil.

Nos próximos itens, procuraremos evidenciar o processo de construção de uma visão de desenvolvimento voltada para a parcela da população e porções do território brasileiro considerados rurais, consubstanciada em políticas específicas de sucessivos governos federais na década em questão. Para tanto, propomos iniciar nossa discussão avaliando novas variáveis presentes no debate internacional sobre o tema, com o fim de compreender a importância da retomada do planejamento territorial no Brasil e alguns conceitos associados a um novo conjunto de políticas públicas como o de abordagem territorial, competitividade, Novo Rural e territórios rurais. De tal maneira, esperamos problematizar o contexto e a importância da aplicação do Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (PRONAT), institucionalizado em 2004.

(27)

1.1

O debate sobre desenvolvimento territorial: aspectos conceituais da

experiência internacional

O processo de globalização que se aprofundou nos anos 1990 contribui para a requalificação dos lugares e para a implantação de novos objetos e ações, bem como para um rearranjo normativo em diversas partes do mundo. Novas determinações foram importantes para que outros usos do território se fizessem e se façam presentes, mesmo que muitos destes não representem os reais anseios das populações nacionais. E, sem dúvida, o período em questão marcou uma crescente mercantilização de numerosas esferas das relações econômicas e sociais mais amplas, assim como a consolidação do poder sem precedentes das finanças em praticamente todos os espaços (HARVEY, 2008). Alguns desses novos atributos dos lugares tornaram-se condição para um novo ritmo de crescimento (e mesmo desenvolvimento) econômico não apenas no Brasil, mas de forma muito semelhante em diversas porções do campo em praticamente toda a América Latina.

Uma vez que tal movimento foi ganhando contornos crescentemente desiguais, novas propostas de desenvolvimento com uma abordagem territorial foram ganhando evidência. Para tanto, muitos pesquisadores constataram, inicialmente, a intensificação de uma série de processos que ampliaram desigualdades e tensões no campo nessa região. Teubal (2001) apresenta alguns deles: a difusão crescente do trabalho assalariado; a precarização do emprego rural; a considerável quantidade de médios e pequenos produtores expulsos do campo e da atividade agropecuária; a crescente orientação da produção agropecuária para os mercados; a articulação dos produtores a complexos agroindustriais em que predominam as decisões de núcleos de poder vinculados a grandes empresas transnacionais etc.

Como aponta ainda o autor supracitado (2001), um outro conjunto de mudanças, correlacionadas, mas com implicações ainda mais amplas nos territórios e regiões dos países latino-americanos, ganha destaque: a importância crescente que assumem os complexos agroindustriais (CAIs)2 comandados por grandes corporações transnacionais que se vinculam

2 Como salienta Graziano da Silva (1996), no período pós 1960, a dinâmica da agricultura passou a estar

determinada pelo padrão de acumulação industrial, o que exigiu “uma reorganização da agricultura a partir da intervenção do Estado e dos novos grupos chamados a orientar a produção agrícola e a renovação das estruturas de dominação” (p. 23). A ação do Estado brasileiro direcionou-se para a modernização da agricultura, buscando integrá-la ao novo circuito produtivo liderado pela indústria de insumos e processamento

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ao comércio mundial de produtos agropecuários, atuando na provisão de insumos e tecnologia agropecuária, o processamento industrial, a distribuição final de alimentos e, ainda, a diversos mecanismos financeiros que incidem sobre as atividades agropecuárias; a maior concentração de terras; a consolidação de um novo “latifundismo” no campo relacionado com o capital financeiro e agroindustrial; a maior concentração de capital nos diversos setores que integram os sistemas agroalimentares dos países latino-americanos; a transnacionalização de partes importantes do sistema agroindustrial e; a crescente integração vertical no interior de importantes CAIs.

De fato, o aprofundamento do processo de globalização trouxe significativas mudanças qualitativas nos territórios e nas regiões dos países latino-americanos. No caso brasileiro, promoveu-se, por exemplo, esforços para reorganizar o regime fiscal, a privatização de inúmeras empresas nacionais (como a Companhia Siderúrgica Nacional, a Vale do Rio Doce, empresas do Sistema Telebrás, bancos estaduais, entre outras) e a adoção do discurso da necessidade de maior competitividade das empresas no país devido ao seu papel na nova divisão territorial do trabalho. Ressalta-se, aqui, a importância da difusão de um novo modelo de produção agropecuária, que impulsionou especializações produtivas no campo e a reestruturação produtiva da agropecuária (ELIAS, 2007).

Segundo Kay (2009), era necessário, portanto, uma nova concepção de Desenvolvimento Rural (DR) alicerçada em novos conceitos, de modo a tornar mais claras as mudanças pelas quais a América Latina estava vivenciando nos anos 1990. Assim, para este autor, foi a mudança de estratégia de desenvolvimento dos Estados, antes baseada na industrialização via substituição de importações e agora dirigida pelas determinações da doutrina neoliberal, que impulsionou a adoção do enfoque da “nova ruralidade” do desenvolvimento rural.

Outrossim, desde o início do presente século, vem ganhando força no Brasil e na América Latina uma nova concepção do rural e de desenvolvimento rural, fruto de esforços

de matéria-prima, com o objetivo de aumento da produtividade. A produção agrícola tradicional permaneceu presente, mas passou a predominar um novo padrão agrícola, baseado nos Complexos Agroindustriais (CAIs). Esse novo padrão decorreu da industrialização da agricultura, de modo que a produção agrícola “passou a constituir um elo de uma cadeia, negando por completo as antigas condições do complexo rural fechado em si mesmo” (idem, p. 24). De tal modo, concordamos com MAZZALI (2000, p. 16), para quem o Complexo Agroindustrial corresponde a “articulação da agricultura, por um lado, com a indústria produtora de insumos e bens de capital agrícolas e, por outro lado, com a indústria processadora de produtos agrícolas, a agroindústria. A partir dessa mudança na base técnica, a reprodução ampliada da agricultura passa a depender cada vez menos dos recursos naturais e mais dos meios de produção gerados por um setor especializado da indústria”.

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de pesquisadores latino-americanos e também influenciada em grande medida por experiências europeias e estudos de instituições multilaterais como Banco Mundial (BM), Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), entre outros (MONTENEGRO GÓMEZ, 2006).

Partindo do princípio de que os espaços rurais vêm se submetendo a novas variáveis de mudança, diversos autores defendem a ideia de que se consubstanciou um Novo Rural. Aqueles que passam a defender essa compreensão para as metamorfoses do rural ressaltam a crescente diversificação das atividades rurais e a importância dos empregos e ingressos não agrícolas nas estratégias de sustento dos camponeses e trabalhadores agrícolas (KAY, 2009; GRAZIANO, 1999; VEIGA et al. 2001; PÉREZ & CABALLERO, 2003).

Mas é preciso que fique claro que novas abordagens do desenvolvimento rural não decorrem exclusivamente de esforços de pesquisadores latino-americanos. Convém ressaltar que autores europeus também apresentam discussões e elementos importantes para o debate, como o inglês Frank Ellis, com uma definição de Desenvolvimento Rural (DR) para os países periféricos; enquanto o holandês Jan Douwe Van Der Ploeg discorre sobre elementos que fundamentam uma perspectiva mais voltada para os problemas e contexto dos países centrais (SHNEIDER, 2004).

Em nossa discussão, privilegiamos uma determinada abordagem do DR: a territorial. Segundo esta proposta, uma vez que o rural precisa ser compreendido sob novas realidades e, portanto, novas concepções teóricas, o desenvolvimento rural precisa ser redefinido, tomando como principais pressupostos: 1) rejeitar a identificação do rural com o agrícola; 2) compreender que ações voltadas para o rural devem superar a visão setorial tradicional através da abordagem territorial, que corresponderia a uma visão integrada das diferentes temporalidades dos agentes que vivem e agem em um determinado espaço; 3) conferir maior importância: a) aos vínculos entre as pequenas cidades e o campo circundante, e a relação entre desenvolvimento urbano e rural; b) à complementaridade entre a agricultura e outras ocupações; c) à função residencial das áreas rurais; d) ao potencial econômico que oferecem os ativos ligados ao território, de tipo "geográfico" (compreendido como "natural"), histórico, cultural etc; e) à participação nas políticas e programas de desenvolvimento rural dos diversos agentes envolvidos e um pacto entre eles (PÉREZ & CABALLERO, 2003). Destas importantes variáveis que devem adquirir maior significado na

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compreensão do rural, os autores citados ainda apresentam mais uma, que destacamos por ser relevante para o presente estudo: “a integração das áreas rurais aos mercados e aos processos de globalização, o que destaca a importância da competitividade territorial frente àquela puramente empresarial ou setorial” (idem, p. 02).

Kay (2009) contribui para tal esforço, no sentido de buscar uma concepção de desenvolvimento rural mais coerente com os novos tempos no campo. Para tanto, segundo o autor, seria necessário considerar o desenvolvimento rural

em termos de uma variedade de metas normativas tais como buscar reduzir a pobreza; a sustentabilidade ambiental; a equidade de gênero; a reavaliação do campo, sua cultura e sua gente; facilitar a descentralização e a participação social; superar a divisão rural-urbana e; garantir a viabilidade da agricultura campesina (idem, p. 613, tradução nossa)3.

Isto posto, foram Schejtman & Berdegué (2004) quem apresentaram uma das primeiras propostas de Desenvolvimento Territorial Rural (DTR) sistematizada e baseada na abordagem territorial, com grande impacto na literatura sobre o tema. Para os autores (2004, p. 30), o DTR deve ser entendido como “um processo de transformação produtiva e institucional de um espaço rural determinado, cuja finalidade é reduzir a pobreza rural”. Em sua proposta, os autores apontam o objetivo de transformação produtiva, ou seja, “(...) articular competitiva e sustentavelmente a economia do território com mercados dinâmicos, o que supõe mudanças nos padrões de emprego e produção de um espaço rural determinado” (idem), e, também, desenvolvimento institucional: “(...) estimular a parceria entre os atores locais e entre eles e os agentes externos relevantes, assim como modificar as regras formais e informais que reproduzem a exclusão dos pobres nos processos e nas vantagens da transformação produtiva” (ibidem, tradução nossa)4.

3 “(...) reconsiderar el desarrollo rural en términos de una variedad de metas normativas tales como lograr

reducir la pobreza; la sustentabilidad ambiental; la equidad de género; la revaluación del campo, su cultura y su gente; facilitar la descentralización y la participación social; superar la división rural-urbana, y garantizar la viabilidad de la agricultura campesina”.

4

“Definimos el DTR como un proceso de transformación productiva e institucional de un espacio rural determinado, cuyo fin es reducir la pobreza rural (...) La transformación productiva tiene el propósito de articular competitiva y sustentablemente a la economia del territorio con mercados dinámicos, lo que supone cambios en los patrones de empleo y producción de um espacio rural determinado. El desarrollo institucional tiene como objetivo estimular la concertación de los actores locales entre sí y entre ellos y los agentes externos relevantes, así como modificar las reglas formales e informales que reproducen La exclusión de los pobres en los procesos y los beneficios de la transformación productiva”.

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Claro está, a nosso ver, que essa proposta apresenta sérias limitações. Como exemplo, podemos afirmar que: processos de modernização que culminem com a transferência da pobreza rural para as cidades também promovem a diminuição da pobreza rural, mas tal processo não representa necessariamente uma melhoria das condições de vida no campo; processos que impliquem em uma maior participação dos pobres nos processos produtivos não configuram em todos os casos melhorias nas condições salariais ou de trabalho; parcerias entre atores locais e agentes externos podem levar a uma maior vulnerabilidade dos primeiros decorrente de assimetrias nos processos produtivos.

Antes, porém, de nos debruçarmos sobre as considerações dos autores supracitados, que trouxeram uma considerável repercussão nos estudos sobre o rural, propomos destacar e analisar com mais detalhes esse aspecto que se tornou o ponto de partida dessa proposta: a abordagem territorial do desenvolvimento rural e suas conexões externas. Schneider (2004), ao discorrer sobre o uso do conceito de território como referência para as políticas públicas e das ações com fins operacionais, adota uma perspectiva que a nosso ver se aproxima da visão metodológica adotada pelo Estado brasileiro na conformação dos chamados “territórios rurais”. Para este autor (idem, p. 110), na perspectiva do desenvolvimento rural

a abordagem territorial assume a função de uma ferramenta para se pensar o planejamento e a intervenção no tecido social a partir de alguma escala, quer seja local, regional, microrregional, etc. Neste caso, o território passaria a ser uma unidade de referência, um nível de operação e agregação adequado para operar o planejamento de ações governamentais e políticas públicas que promovam mudanças e transformações múltiplas no espaço social.

Tal forma de se compreender a abordagem territorial e, consequentemente, o território para as políticas públicas, guarda estreita relação com a conformação do Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (PRONAT), cuja análise será detalhada no capítulo dois. Além disso, esta abordagem possui seus fundamentos em um conjunto de ações e programas mais antigo.

Foi a União Europeia, em 1988, que promoveu o primeiro esforço sistematizado para superar a orientação setorial em sua Política Agrícola Comum (PAC), visto que a abordagem setorial foi considerada insuficiente. Naquele ano, a UE introduziu medidas e programas entendidos como territoriais, multissetoriais e integrados, dirigidos ao conjunto da

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população rural das regiões e zonas consideradas atrasadas. Pérez & Caballero (2003) afirmam que dirigentes da União Europeia pensaram nas referidas medidas visando favorecer a população rural em seu conjunto e não somente os agricultores, com destaque para o reconhecimento da diferenciação existente nos espaços entendidos como rurais. De tal maneira, tratou-se como necessário o desenho de políticas e programas “específicos para

cada espaço [rural], com a participação de seus agentes econômicos e sociais, aproveitando

ainda as sinergias geradas pela interação entre atividades de diferentes naturezas” (PÉREZ & CABALLERO, 2003, p. 10-11, tradução nossa. Sem destaque no original)5.

Ainda de acordo com os autores supracitados (2003), após uma fase de viés estritamente setorial, com um predomínio das intervenções nos mercados agrícolas (que ficou conhecido como primeiro pilar), a PAC passou por uma transformação, uma vez que com a nova orientação no final dos anos 1980 se conformou uma nova política de desenvolvimento rural europeia, conhecida como segundo pilar da PAC. O objetivo era promover programas capazes de gerar processos endógenos de desenvolvimento6 (ou seja, projetos condizentes com os pressupostos da Teoria do Desenvolvimento Local e Endógeno, que será avaliada no capítulo 3).

Foram justamente as mudanças operacionais e normativas trazidas com o segundo pilar que, junto a outros fatores, delinearam propostas de desenvolvimento rural na América Latina. Como destacam Pérez & Caballero (2003, p. 03, tradução nossa),

A característica mais interessante [do segundo pilar] é a importância atribuída à competitividade econômica de cada território, com o propósito de melhorar a qualidade da vida rural. Isto requer estimular a participação organizada dos atores locais em programas especialmente desenhados para aproveitar os recursos materiais e imateriais da área [região], promover a diversificação multissetorial e vincular o meio rural com as populações e as pequenas cidades7.

5

“Así mismo, se reconoce La diferenciación existente en el espacio rural y por lo tanto la necesidad de diseñar políticas y programas específicos para cada zona, con la participación de sus agentes económicos y sociales, y aprovechando las sinergias generadas por la interacción de actividades de variada naturaleza”.

6 “Tratava-se de promover sistemas locais que puseram em marcha programas capazes de gerar processos

endógenos de desenvolvimento. Estas medidas inovadoras, unidas aos mencionados apoios a transformação agrícola [diversas medidas e fundos estruturais para apoiar a transformação e modernização das explorações agrícolas] passaram a constituir a nova política de desenvolvimento rural europeia, conhecida como segundo

pilar da PAC” (PÉREZ& CABALLERO, 2003, p. 02, tradução nossa). “Se trataba de promover sistemas locales que

pusieran en marcha programas capaces de generar procesos endógenos de desarrollo. Estas medidas innovadoras, unidas a los mencionados apoyos a la transformación agrícola, pasaron a constituir la nueva política de desarrollo rural europea, conocida como segundo pilar de la PAC”.

7

“La característica más interesante es la importancia atribuida a la competitividad económica de cada territorio, com el propósito de mejorar la calidad de la vida rural. Esto requiere estimular la participación organizada de los actores locales en programas especialmente diseñados para aprovechar los recursos

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Nota-se como, no caso da PAC europeia, uma maior competitividade aparece relacionada a uma melhoria da qualidade de vida no campo, chamando nossa atenção para um melhor entendimento de como os propositores de tal Política entendem a noção de competitividade. Outro fator que nos parece ter estimulado a incorporação da base metodológica da PAC nas propostas de DTR na América Latina e, mais especificamente no Brasil, foi o conjunto operacional e normativo que rege os fundos estruturais da UE. Esses fundos constituem um instrumento que almeja a coesão econômica e social dos territórios, intimamente relacionada com a redução das disparidades de desenvolvimento.

Retornaremos a esse importante aspecto, a busca por maior coesão territorial, no capítulo 4, pois se trata de um tema muito caro para o planejamento público brasileiro. Buscaremos entender a provável relação entre a competitividade territorial, a coesão dos espaços e a busca por um maior dinamismo econômico no campo que se moderniza a passos largos em porções significativas do território brasileiro. Antes, porém, faz-se necessário compreender alguns aspectos que impõem condições para a efetiva aplicação do desenvolvimento rural.

1.1.1 Requalificando espaços pelo movimento de neoliberalização: desafios

para um novo padrão de desenvolvimento nos países periféricos

A rediscussão do desenvolvimento rural e de seus pressupostos, apresentada anteriormente, se deve em grande medida às transformações experimentadas por esses espaços decorrentes da ampliação do processo de globalização, mediante a aplicação generalizada de medidas neoliberais. Diante disso, defendemos a necessidade de sermos bastante criteriosos quanto ao entendimento do neoliberalismo e sua relação com a globalização. Esta última é por nós compreendida como um período da história, marcado pelo estágio supremo da internacionalização (SANTOS, 1996; 2000) que se inicia no pós segunda guerra mundial e cuja dimensão geográfica é a emergência, no último quarto do século XX, do meio técnico, científico e informacional. Consideramos ainda que tal processo

materiales e inmateriales de la zona, promover la diversificación multisectorial y vincular al medio rural con los pueblos y las pequeñas ciudades”.

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teve seu aprofundamento reconhecido nos anos 1970 pela difusão das Novas Tecnologias da Informação e Comunicação, pelo alargamento de um novo modo paradigma de produção (HARVEY, 2006) e pela intensificação da mundialização do capital (CHESNAIS, 1996)8. Por conseguinte, entendemos que

o processo de intercâmbio entre países, que marcou o desenvolvimento do capitalismo desde o período mercantil dos séculos 17 e 18, expande-se com a industrialização, ganha novas bases com a grande indústria, nos fins do século 19, e, agora, adquire mais intensidade, mais amplitude e novas feições. O mundo inteiro torna-se envolvido em todo tipo de troca: técnica, comercial, financeira, cultural (...) Todo o planeta é praticamente coberto por um único sistema técnico, tornado indispensável à produção e ao intercâmbio e fundamento do consumo, em suas novas formas (...) Num mundo assim transformado, todos os lugares tendem a tornar-se globais, e o que acontece em qualquer ponto do ecúmeno (parte habitada da Terra) tem relação com o acontece em todos os demais (SANTOS, 2002, p. 79).

Ao mesmo tempo que tais mudanças se processavam nos anos 1970, ganhava força e amplitude uma doutrina econômica que data dos anos 19309: o neoliberalismo. Foram as condições de crise nos anos 1970 que permitiram um uso sistemático de preceitos liberais dada a consequente situação de erosão da capacidade financeira de muitos Estados Nacionais, destacadamente os periféricos. Se nos países europeus houve um desmonte do Estado do Bem-Estar Social, nos países capitalistas da periferia ocorreu uma explosão da dívida pública e uma paralisia dos investimentos do Estado. Por consequência, nos anos 1990, passou a haver a supremacia de um receituário neoliberal decorrente do chamado

8

“A mundialização é o resultado de dois movimentos conjuntos, estreitamente interligados, mas distintos. O primeiro pode ser caracterizado como a mais longa fase de acumulação ininterrupta do capital que o capitalismo conheceu desde 1914. O segundo diz respeito às políticas de liberalização, de privatização, de desregulamentação, que foram aplicadas desde o início da década de 1980, sob o impulso dos governos Thatcher e Reagan” (CHESNAIS, 1996, p. 34).

9

O neoliberalismo começou a ser sistematizado ainda nos anos 1930 como uma tentativa de síntese entre importantes pressupostos da doutrina liberal (como o laissez faire do século XIX) e da social-democracia. Para os proponentes dessa concepção teórica, a prática do laissez faire deveria ser predominante, mas precisaria estar associada a algumas demandas identificadas e defendidas por social-democratas, tais como o conceito de renda mínima (composto pelo salário-mínimo e distribuições de dinheiro por parte dos governos), medidas favoráveis à competição, como a legislação anti-trust e acessórias, o monopólio da moeda pelo governo e flexibilização do padrão-ouro, bem como regulamentações para cuidar de "ineficiências" ou "falhas" de mercado, entre outras. O uso do termo neoliberalismo se deve ao fato de se diferenciar do liberalismo clássico por propor uma intervenção do Estado relativa – o que ficou popularmente conhecido como “Estado Mínimo” – em oposição ao laissez faire do liberalismo clássico.

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Consenso de Washington, o qual estabeleceu um conjunto de medidas para a recuperação econômica, fiscal e financeira de Estados latino-americanos10.

Mas explorar todas as nuances do neoliberalismo, suas aplicações, consequências, bem como suas especificidades, estão além das pretensões desse trabalho. Porém, elaborar uma explicação sobre feições desse processo e sua relação com o que trataremos como um

imperativo da competitividade (SANTOS, 1996), a partir de uma leitura geográfica, constitui

um esforço necessário para um efetivo entendimento do contexto e dos pressupostos que nortearam a constituição de uma nova proposta de desenvolvimento territorial rural no final da década de 1990 e início dos anos 2000. Tendo isso em vista, para conceituarmos o neoliberalismo nos deparamos com conceitos, noções e ideologias que se somam a um elaborado discurso que procura legitimar esse conjunto de práticas, o que dificulta a sua completa compreensão. Como afirma Peck (2010, p. 08, tradução nossa):

Por sua natureza – uma forma paradoxal de ‘governo do mercado’ – o neoliberalismo é contraditório e polimórfico. Ele não é determinado. Talvez, o mais perto que podemos chegar na compreensão da natureza do neoliberalismo seja seguindo seus movimentos, e por meio de uma triangulação entre suas manifestações ideológicas, ideais e institucionais; entre filosofia, política e prática. Além disso, há necessariamente um exercício de geografia histórica, de modo que tal esforço deve estar atento para os espaços nos quais os projetos neoliberais foram (re)construídos11.

Ou seja, a dimensão geográfica do processo de neoliberalismo é uma variável decisiva para buscarmos seu melhor entendimento. É Peck (2010) quem chama a atenção para o fato de que apesar de sua ampla utilização nos meios acadêmicos após a metade da década de 1990, a maneira como tem sido utilizado permanece de certa forma confusa e mesmo inconsistente.

10O receituário proposto reuniu dez regras de ajuste econômico, formalizadas em um encontro na cidade de

Washington em 1989, ao cabo de dez anos de reformas econômicas conduzidas em diversos países da América Latina. De acordo com Almeida (2008), “o encontro tentava, justamente, fazer o balanço do que, exatamente, tinha sido aprendido na região (e fora dela) como experiência prática da penosa fase de crises recorrentes dos anos (e décadas) anteriores, ademais dos problemas estruturais e características sistêmicas desde sempre: inflação renitente, emissionismo irresponsável, choques do petróleo, crise da dívida, moratória, desequilíbrios cambiais e de balanço de pagamentos, pobreza generalizada, desigualdades extremas etc”.

11 “By its nature, as an oxymoronic form of ‘market rule’, neoliberalism is contradictory and polymorphic. It will

not be fixed. Perhaps, instead, the closest one can get to understanding the nature of neoliberalism is to follow its movements, and to triangulate between its ideological, ideational, and institutional currents, between philosophy, politics, and practice. This is necessarily an exercise, moreover, in historical geography, as any such effort must be attentive to the spaces in and through which the neoliberal project has been (re)constructed”.

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Em linhas gerais, podemos compreender o neoliberalismo como um projeto de regulação social e de enquadramentos de usos do território que mobiliza uma variedade de políticas, as quais teriam como objetivo estender a disciplina do mercado, a competição e a mercantilização plena de todos os setores da sociedade (BRENNER & THEODORE, 2002). De tal modo, os referidos autores Brenner & Thodore (2002), apontam características bastante relevantes do projeto em questão. Além de destacarem os programas liberais de redução e/ou privatização dos serviços públicos, desmantelamento de programas de Bem-Estar Social, a melhoria da mobilidade do capital internacional, eles acrescentam um ponto importante: a intensificação da competição entre localidades. Somado a tal explicação, destacamos ainda a considerações de Harvey (2008, p. 10), para quem

O neoliberalismo é em primeiro lugar uma teoria das práticas político-econômicas que propõe que o bem-estar humano pode ser melhor promovido liberando-se as liberdades e capacidades empreendedoras individuais no âmbito de uma estrutura institucional caracterizada por sólidos direitos a propriedade privada, livres mercados e livre comércio. O papel do Estado é criar e preservar uma estrutura institucional apropriada a essas práticas (...) As intervenções do Estado nos mercados (uma vez criados) devem ser mantidas num nível mínimo.

Tal como Peck (2010) e Peck & Tickell (2002), entendemos que o neoliberalismo passa por constantes mutações através do tempo e do espaço, em um permanente processo de construção e reconstrução de normas e materialidades:

(...) parece ter havido [na zona do Atlântico Norte] uma mudança de padrão da desregulação e do desmantelamento [do Estado] então dominante durante a década de 1980 – o qual poderia ser caracterizada como neoliberalismo ‘roll-back’ – para uma fase emergente de ativa construção do Estado e de reforma regulatória – um momento ascendente do neoliberalismo ‘roll-out’. No curso desta mudança, a agenda moveu-se gradualmente de uma preocupação com a ativa destruição e

descrédito das instituições coletivas, Keynesianas e de bem estar, para uma

preocupação com um enfoque deliberado na construção e consolidação de formas estatais neoliberalizadas, de modos de governança e de relações regulatórias (PECK & TICKELL, 2002, p. 37, tradução nossa)12.

12

“In short, in this North Atlantic zone at least, there seems to have been a shift from the pattern of deregulation and dismantlement so dominant during the 1980s, which might be characterized as "roll-back neoliberalism," to an emergent phase of active state-building and regulatory reform-an ascendant moment of "roll-out neoliberalism." In the course of this shift, the agenda has gradually moved from one preoccupied with the active destruction and discreditation of Keynesian-welfarist and social-collectivist institutions (broadly defined) to one focused on the purposeful construction and consolidation of neoliberalizade state forms, modes of governance, and regulatory relations”.

Referências

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