AS ESTRATÉGIAS DE DIVERSIFICAÇÃO E ESPECIALIZAÇÃO DA RENDA RURAL FRENTE AS CATEGORIAS DE ALTA E BAIXA RENDA
Miguel Angelo Perondi
1; Jhuly Caroline Biava
2; Norma Kiyota
3; Ana Paula Schervinski Villwock
4;
1. Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR; 2. Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR; 3. Instituto Agronômico do Paraná – IAPAR;
4. Universidade Federal de Santa Maria – UFSM.
1. biava.jhuly@gmail.com; 2. perondi@utfpr.edu.br; 3. normak@iapar.br;
4. ana.agronomia@gmail.com;
Grupo de Pesquisa 07: Agricultura familiar e ruralidade
Resumo
A partir de um banco de dados sobre a renda rural dos agricultores familiares do município de Itapejara D’Oeste se fez um diagnóstico dos principais sistemas de produção frente as categorias de Alta e Baixa renda nos anos de 2005 e 2010. A principal contribuição desse trabalho é oferecer uma metodologia de tipificação dos sistemas de produção a partir do foco de 75% da renda numa determinada atividade e permitir correlacionar esses sistemas com uma categoria de renda delimitada pela técnica Bootstrap de estimativa do intervalo de um parâmetro da população. Este ensaio permitiu perceber que a estratégia de especialização cresceu em número no período considerado, bem como, que a tendência de concentração da renda coincidiu com um maior pertencimento à categoria de Baixa Renda.
Palavras-chave: Sistema de produção, categoria de renda, agricultura familiar
Abstract
From a database on rural incomes of family farmers in the municipality of Itapejara D'Oeste was made a diagnosis of the main production systems facing the categories of high and low income in 2005 and 2010. The main contribution of this research is to offer a classification methodology of production systems from the focus of 75 % of income in a given activity and allow these systems to correlate with an income category defined by the Bootstrap technique to estimate the range of a parameter of the population. This test allowed to realize that specialization strategy has grown in number over the period considered , as well as the trend of income concentration coincided with a greater belonging to the category of low income.
Key words: System of production, income category, family farm
1. Introdução
A agricultura familiar do Brasil enfrenta um acelerado processo de modernização e mercantilização, e em reação, demonstra formas de se manter na atividade, superando suas adversidades (clima, finanças, preço, mercado, etc.), através da capacidade de diversificação das estratégias de sobrevivência à modernização. Estas estratégias vem sendo objeto de estudo, sobretudo aos olhos dos pesquisadores que buscam entender a trajetória da agricultura familiar no mundo moderno.
De acordo com Long (1986), a modernização alavancou a mercantilização, que nada mais é que a crescente orientação da produção para o mercado, para uma forma social cada vez mais subordinada e dependente do modo de produção capitalista, entretanto, para Abramovay (1992) a agricultura familiar possui um papel próprio e útil para sociedade capitalista. Segundo Ploeg (1993) é importante salientar que a inserção social e econômica da agricultura familiar, frente ao processo de mercantilização, guardam particularidades quanto ao seu formato e intensidade, reagindo de diferentes formas mediante ao processo capitalista.
Segundo Schneider (1999) nos países com agricultura moderna se percebe que a reprodução social da agricultura familiar, frente ao processo de mercantilização, se deu por sua capacidade de diversificação das fontes de renda, seja agrícola ou não, bem como, sua capacidade de adaptação aos novos contextos sociais
Um dos fatores que definem a permanência do agricultor familiar no meio rural é a renda, seja vinculada às atividades do campo (agricultura, criação, transformação) ou relacionada _às atividades não agrícolas, desenvolvidas no meio rural ou urbano. Assim, como afirma Ellis (2000), a diversidade de alternativas de renda torna a unidade de produção menos vulnerável ao mercado em situações de crise ou instabilidade financeira.
A estratégia de combinar atividades agrícolas com não-agrícolas proporciona aumento de renda e melhoria na qualidade de vida frente as poucas oportunidades que seriam proporcionadas num contexto de produtor de commodities apenas. Assim, para Schneider (2003), pluriatividade é o fenômeno através do qual membros das famílias de agricultores que habitam o meio rural optam pelo exercício de outras atividades - inclusive não-agrícolas - mantendo uma ligação (inclusive produtiva) com a agricultura e a vida no espaço rural. Além da estratégia de combinação de oportunidades intersetoriais, existe também a possibilidade de melhorar a renda via a agregação de valor pelo processo de transformação e produtos agrícolas. Neste caso, as rendas de transformação ou agregação de valor dependem diretamente da maior disponibilidade de força-de-trabalho da família.
Fruto de todas essas ameaças e oportunidades proporcionadas pela modernização
existe uma crescente dicotomia de rendas no meio rural, ou seja, observa-se que existe uma
crescente distância entre grupos de agricultores de alta e baixa renda, bem como, é cada vez
mais raro a existência de uma classe média rural. Assim, esse estudo acompanhou a trajetória
da renda de um conjunto representativo de famílias de agricultores familiares do município de
Itapejara D’Oeste nos anos 2005 e 2010 e, partindo das primeiras constatações produzidas por
Souza et al (2014) e Villwock (2015), sabe-se que neste período houve famílias que
permaneceram e outras que migraram entre as categoria de alta e baixa renda, o que nos
instiga investigar qual a relação dessas trajetórias com a estratégia de diversificação da renda.
Portanto, o objetivo dessa pesquisa é analisar quais estratégias de diversificação ou simplificação da renda coincidem com a maior ou menor participação das famílias nas categorias de alta e baixa renda no município de Itapejara d’Oeste nos anos de 2005 e 2010.
Para tanto, procurar-se-á: (1) Calcular a renda agrícola e total no meio rural de Itapejara d’Oeste nos anos 2005 e 2010; (2) Tipificar as estratégias de renda e em conjuntos de renda diversificada e especializada; (3) Categorizar as famílias nos conjuntos de alta e baixa renda; e (4) Comparar as estratégias de diversificação com as categorias de renda.
Assim, o trabalho, a seguir, apresenta a localidade do estudo, a metodologia utilizada para definir as tipologias de renda e as categorias de renda, bem como, a análise do resultado.
2. O local representado pelo banco de dados
A pesquisa foi baseada num banco de dados que representa o meio rural de Itapejara d’Oeste, um município de 11.335 habitantes, sendo 46% rural, que se situa a 360 km da capital Curitiba e se localiza na região Sudoeste Paranaense. (IBGE, 2014).
Figura 1 - Localização geográfica do município de Itapejara d'Oeste, no estado do Paraná.
Fonte: IBGE (2014)
Essa região - Sudoeste Paranaense - foi colonizado por várias frentes de ocupação,
agregando características socioculturais, étnicas e econômicas distintas e por isso apresenta
uma predominância da agricultura familiar no seu meio rural, sendo que uma grande parte da
população urbana ainda conserva aspectos do modo de vida rural (SIMONETTI,
VILLWOCK e PERONDI, 2010). Tais diferenças foram impressas nas diferentes frentes de
ocupação que ocorreram na região Sudoeste do Paraná, mas também resultam das estratégias
de diversificação setorial e intersetorial da agricultura familiar em busca de uma renda maior
e mais segura, do uso mais eficiente dos fatores de produção e da busca por uma maior sustentabilidade dos seus meios de vida (PERONDI, KIYOTA E GNOATTO, 2007).
A escolha do município se deve ao fato de ser característico das particularidades socieoeconômicas e agrícolas da região Sudoeste do Paraná, como a distribuição fundiária, origem étnica dos agricultores, predominância da agricultura familiar, topografia, solo e a produção de soja, milho, leite, aves e suínos.
3. Uma metodologia em construção
Esse trabalho visa avaliar a composição da renda dos agricultores familiares como forma de compreender o papel da estratégia de renda na dinâmica da inclusão/exclusão social.
O trabalho partiu da investigação sobre o banco de dados de Perondi (2007) referente ao ano agrícola de 2004/2005 e Perondi (2013) referente ao ano agrícola de 2009/2010, que por sua vez resultou da aplicação de questionários numa parcela representativa dos agricultores familiares do município em foco.
Deve-se ressaltar que o banco de dados original desse estudo contabiliza 100 agricultores familiares entrevistados no ano de 2005, entretanto, cinco famílias não mais localizadas no meio rural em 2010 e, somado ao fato de uma das entrevistas ter apresentado inconsistências de dados, assim, somente 94 famílias compuseram essa análise.
Observa-se que o banco de dados de Perondi (2007 e 2013) contém os valores do Produto Bruto (PB), que por sua vez, foi obtido da soma das receitas e autoconsumo agrícola, numa forma de cálculo obtida de Lima et al (1995) e FAO/INCRA (1999), bem como, a forma como se obteve o valor da Renda Não Agrícola (RNA) que somou todas as rendas líquidas obtidas com a prestação de serviços (sejam agrícolas ou não agrícolas), bem como, das transferências sociais.
Para a definição dos sistemas de produção e análises, foi utilizada uma metodologia adaptada de Ellis (2000), Souza et al (2014) e Villwock (2015), que neste caso se diferencia por dar foco também à agregação de valor. Desta maneira as famílias foram tipificadas segundo o critério de deter 75% do Produto Bruto Total do estabelecimento decorrente de uma das 15 composições de renda listadas a seguir, atendo-se que todos os casos fossem explicados por pelo menos uma dessas estratégias de renda nos anos 2005 e 2010, sendo elas:
1. Produção Vegetal (V): Produto Bruto (PB) de hortaliças, frutas, grãos e legumes;
2. Produção Animal (A): PB de bois, touros, vacas, novilhas, bezerros, frangos, suínos, cavalos, peixes, cabras e ovelhas, venda de leite e ovos;
3. Produção de Transformações (T): PB de vinho, doces, melado, iogurte, banha, salame e queijo;
4. Renda Não-Agrícola (RNA): aposentadoria, pensões e transferências sociais, arrendamento de terras, aluguéis, rendas de poupança, dinheiro recebido de familiares, doações, aplicações, rendas obtidas fora da unidade de produção e procedente de uma atividade interna ao setor agropecuário e rendas de atividades não agrícola;
5. V+A: PB das atividades de produção vegetal e animal;
6. V+T: PB das atividades de produção vegetal e transformações;
7. V+RNA: PB das atividades de produção vegetal e RNA;
8. A+T: PB das atividades de produção animal e transformações;
9. A + RNA: PB das atividades de produção animal e RNA;
10. T + RNA: PB das atividades de transformações e RNA;
11. V+A+T: PB das atividades de produção vegetal, animal e transformações;
12. V+A+RNA: PB das atividades de produção vegetal, animal e RNA;
13. V+T+RNA: PB das atividades de produção vegetal, transformações e RNA;
14. A+T+RNA: PB das atividades de produção animal, transformações e RNA;
15. V+A+T+RNA: PB das atividades de produção vegetal, animal, transformações e RNA.
A seguir, o trabalho procurou caracterizar a dicotomia da renda rural com as categorias de alta e baixa renda numa distribuição anormal e capturada pela técnica Bootstrap de estimativa do intervalo de um parâmetro da população (CYMROT E RIZZO, 2006).
Segundo Souza et al (2014) e Villwock (2015) a técnica Bootstrap permite visualizar e entender quais são as principais classes de renda e, nesse caso, percebeu-se que praticamente não existe uma classe intermediária de renda dentro desse grupo de famílias como Ellis (2000) encontrou. Sendo assim, foram pautadas somente duas categorias distintas, utilizadas neste trabalho: (1) Baixa Renda, as famílias que apresentaram renda abaixo da mediana; (2) Alta Renda, as famílias que apresentaram renda acima da mediana.
A renda total das 94 famílias foi analisada em ambos os anos, segundo as categorias de alta e baixa renda. Em 2005, 45 destas famílias se enquadraram na categoria de Alta Renda e 49 famílias na categoria de Baixa Renda, enquanto que, em 2010, 29 famílias se enquadraram na categoria de Renda Alta e 65 famílias na categoria de Renda Baixa. O valor limítrofe dessas categorias foi de R$ 21.596,90 em 2005 e R$ 47.947,00 em 2010, conforme dados de Villwock (2015).
2005 2010
Figura 2. Distribuição da frequência da renda total em salários mínimos para os anos 2005 e 2010, do município de Itapejara d’Oeste – PR. Fonte: VILLWOCK (2015).
A Figura 1, apresentada por Villwock (2015) em pesquisa sobre as estratégias de renda com o mesmo banco de dados dessa pesquisa, utilizou a técnica Bootstrap para evidenciar a presença dos dois grandes grupos - alta e baixa renda - para os anos 2005 e 2010. Os gráficos estão distribuídos pelo número de salários mínimos
1que a família recebeu naquele ano.
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