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AS DIMENSÕES DO USO DA EXPRESSÃO “REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO” NO CONTEXTO DA GUERRA-FISCAL DO ICMS

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

TAÍSA SILVA REQUE

AS DIMENSÕES DO USO DA EXPRESSÃO “REDUÇÃO DA BASE DE

CÁLCULO” NO CONTEXTO DA GUERRA

-FISCAL DO ICMS

MESTRADO EM DIREITO

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

TAÍSA SILVA REQUE

AS DIMENSÕES DO USO DA EXPRESSÃO “REDUÇÃO DA BASE DE

CÁLCULO” NO CONTEXTO DA GUERRA

-FISCAL DO ICMS

MESTRADO EM DIREITO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito Tributário, sob a orientação do Prof. Dr. ROQUE ANTONIO CARRAZZA.

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Banca Examinadora

________________________________

________________________________

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AGRADECIMENTOS

A conclusão desta dissertação de mestrado não seria possível sem a compreensão daqueles que fazem parte do meu dia a dia. A todos vocês, os meus agradecimentos:

A minha amada família, a quem devo tudo o que sou e conquistei. Ao meu tio Paulinho pela colaboração na revisão deste trabalho.

Ao meu amor Eurico de Santi pelo incentivo e ajuda fundamental para a conclusão desta pesquisa.

Ao meu querido chefe Robson Maia, pela compreensão e disponibilidade para discussão sobre os temas deste trabalho.

As amigas e colegas de sala Marcela Maia e Marília Bezzan e ao Marcelo Rocha, contemporâneo no mestrado e companheiro no desespero desta reta final.

Aos colegas da Barros Carvalho Advogados Associados e do Instituto Brasileiro de Direito Tributário - IBET pelo convívio diário.

As minhas amigas de longa data, companheiras do ballet e da PUC, que agradeço na pessoa da Lícia Porfírio, pela ajuda com o inglês jurídico.

(7)

RESUMO

A concessão de incentivos fiscais pelos Estados no âmbito do ICMS com o objetivo de atrair investimentos é prática recorrente e antiga: durante a vigência do extinto Imposto sobre Vendas e Consignações (IVC) já se praticava o que denominamos de "guerra fiscal".

Nosso intuito com este trabalho é ressaltar o abuso dessa prática com foco no conceito "redução da base de cálculo", demonstrando que conceitualmente ela não pode ser equiparada a isenção (parcial), mas que ainda assim o seu uso é feito de forma abusiva com intuito de fomentar ainda mais o conflito entre os Estados.

Com uma legislação tributária excessivamente complexa e onerosa, que acaba por estimular esse tipo de prática, o problema da guerra fiscal se torna cada vez difícil de resolver, prejudicando contribuintes que ficam submetidos ao poder dos Estados, que por sua vez manipulam os conceitos jurídicos procurando contornar legislações, princípios e jurisprudências.

(8)

ABSTRACT

The granting of ICMS tax incentives by States in order to attract investments is a recurrent and old practice: it was already practiced during the term of the former Tax on Sales and Consignment (IVC), collaborating to what we call "tax competition".

Our goal with this study is to demonstrate the abuse of this practice, focusing on "reduction of the tax basis", demonstrating that, conceptually, it cannot be equated with exemption (partial), but still its use is done improperly encouraging yet plus the dispute between federal entities.

With an overly complex and burdensome tax law, which ultimately stimulates this type of practice, the problem of the tax competition becomes increasingly more difficult to solve, affecting taxpayers who are subject to the power of States, who handle the legal concepts violating the law, the principles and the jurisprudence.

(9)

LISTA DE ABREVIATURAS

ADCT Atos das Disposições Constitucionais Transitórias ADPF Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade

CONFAZ Conselho Nacional de Política Fazendária

CF Constituição Federal

CTN Código Tributário Nacional

EC Emenda Constitucional

IVA Imposto sobre o valor Agregado

IVC Imposto sobre Vendas e Consignações IVM Imposto sobre Vendas Mercantis

ICM Imposto sobre Circulação de Mercadorias

ICMS Imposto Sobre Operações de Circulação de Mercadorias e de Prestação de Serviços de Comunicação e de Transporte interestadual e intermunicipal

LC Lei Complementar

Min. Ministro

RE Recurso Extraordinário

STF Supremo Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 14

CAPÍTULO 1 CONCEITOS FUNDAMENTAIS ... 19

1.1. Competência Legislativa Tributária ... 23

1.1.1. Atributos da Competência Tributária ... 26

1.1.1.1 O ICMS como exceção ao atributo da facultatividade das competências tributárias ... 27

1.1.2. Conflitos de Competência no ICMS e a Delegação para o CONFAZ editar Convênios ... 28

1.2. Concretização da Competência Legislativa Tributária e a Estrutura da Regra Matriz de Incidência ... 29

1.2.1. Critérios que compõem a regra matriz de incidência tributária ... 30

1.2.2. Base de Cálculo ... 33

1.2.3. Regra Matriz de Incidência do ICMS ... 37

1.3. Competência Administrativa Tributária e Incidência ... 40

1.3.1. Teorias sobre a Incidência ... 41

1.3.2. As formas de constituição da obrigação tributária ... 45

1.4. Isenção Tributária ... 51

1.4.1. Isenção Tributária como espécie do gênero Benefício Fiscal ... 51

1.4.2. Teorias sobre a isenção ... 52

1.4.3. Da interpretação da expressão “parcial” no conceito de isenção de Paulo de Barros Carvalho ... 56

1.5. Redução da Base de Cálculo ... 59

1.6. Considerações sobre os conceitos Redução da Base de Cálculo e sua Equiparação a Isenção (parcial) ... 62

CAPÍTULO 2 CONVÊNIOS CONFAZ E A DELEGAÇÃO DE COMPETÊNCIA PREVISTA NO ART. 155, §2º, XII, "g" DA CF ... 64

2.1. Instituição dos Convênios CONFAZ ... 65

2.2. A exigência de unanimidade dos Estados ... 69

(11)

2.3.1. A dissociação entre a natureza autorizativa dos convênios e a necessidade de sua implementação pelos Estados ... 75

CAPÍTULO 3 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO USO DA EXPRESSÃO “REDUÇÃO

DA BASE DE CÁLCULO” NA CONSTITUIÇÃO E NA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA

... 82

3.1. Origens da Guerra Fiscal do ICMS na Transição do IVC para o ICM com a Emenda Constitucional nº 18 de 1965 e a Instituição do Princípio da Não Cumulatividade ... 82 3.2. Constituição Federal de 1967: confirmação do princípio da não cumulatividade e manutenção do regramento geral do ICM ... 86 3.3. Emenda Constitucional nº 1 de 1969: a reação institucional para barrar a concessão unilateral de isenções pelos Estados ... 86 3.4. A Regulamentação dos Convênios pela Lei Complementar nº. 24 de 1975 .. 87 3.5. Reação do STF para impedir a ação dos Estados de exigir o cancelamento dos créditos de operações beneficiadas com isenção, em defesa do princípio da não cumulatividade ... 88 3.6. Pressão dos Estados para diminuir os prejuízos decorrentes das concessões unilaterais de isenção que culminou com a Emenda Constitucional nº 23 de 1983 ... 88 3.7. Nova vitória dos Estados com a Constituição Federal de 1988 que estendeu a restrição ao crédito também às operações anteriores à isenção ou não incidência e a Inserção da Necessidade de Lei Específica para Concessão de Benefícios Fiscais pela EC nº 3 de 1993 ... 89 3.8. A origem dos conflitos dos casos Camargo Soares, Monsanto, Santa Catarina e Santa Lúcia ... 91

CAPÍTULO 4 REDUÇÃO DE BASE DE CÁLCULO E O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ... 92

(12)

4.2.2. O uso da redução da base de cálculo como afronta à necessidade de lei estadual para fixação de alíquotas ... 99 4.2.3. O uso da redução da base de cálculo como afronta à obrigatoriedade de lei para concessão de isenção ... 101 4.2.4. A redução de base de cálculo manteve-se ativa na função de afrontar a legalidade, apesar da obrigatoriedade de celebração de convênios (LC 24/75) ... 102 4.2.5. Restrição ao aproveitamento de crédito introduzida pela EC nº 23/83 aumentou a importância da redução da base de cálculo para os Estados ... 103 4.2.6. O uso da redução da base de cálculo manteve-se vantajoso, apesar da exigência de lei específica introduzida pela EC nº 3 de 1993 ... 105 4.2.6.1. O termo “lei específica” na interpretação do STF ... 106

CAPÍTULO 5 - REDUÇÃO DE BASE DE CÁLCULO E O PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE ... 112

5.1. Princípio da não cumulatividade ... 112 5.2. A impossibilidade de restrição dos créditos decorrentes de redução da base de cálculo ... 117 5.3. O uso da expressão “redução da base de cálculo” como violação ao princípio da não cumulatividade ... 119 5.3.1. Reação dos Estados frente às decisões do Supremo Tribunal Federal 121 5.3.2. Nova confirmação do princípio da não cumulatividade com o RE nº 161.031/MG (caso Camargo Soares) ... 122 5.3.3. Reação dos Estados culminando com o RE nº 174.478/RS (caso Monsanto) ... 123

CAPÍTULO 6 - REDUÇÃO DE BASE DE CÁLCULO E O PRINCÍPIO FEDERATIVO ... 125

(13)

6.2.3. ADI nº 3.389/RJ: concessão de redução de base de cálculo pelo Estado do Rio de Janeiro para mercadorias produzidas exclusivamente em seu território ... 131 6.2.4. ADI nº 3410/MG: concessão de redução de base de cálculo aliada à exigência de antecipação do recolhimento do tributo como afronta ao art. 152 da CF ... 133 6.2.5. RE nº 635.688/RS (caso Santa Lúcia): concessão de redução de base de cálculo aliada à exigência de cancelamento dos créditos como afronta ao art. 152 da CF ... 135

CAPÍTULO 7 USO DA EXPRESSÃO REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO NA JURISPRUDÊNCIA DO STF ... 138

7.1. O uso da expressão redução da base de cálculo culminando em conflitos a serem decididos pelos STF ... 139 7.2. Caso Camargo Soares (RE nº 161.031/MG): Decisão paradigmática do Ministro Marco Aurélio que diferenciava os conceitos de isenção e redução de base de cálculo em defesa do princípio constitucional da não cumulatividade ... 141 7.3. Caso Monsanto (RE nº 174.478/SP): Decisão que superou a jurisprudência anterior do Min. Marco Aurélio equiparando redução de base de cálculo ao conceito de isenção parcial ... 142 7.4. Caso Santa Catarina (ADI nº 2.320/SC): Decisão que manteve a equiparação dos conceitos (“isenção” e “redução de base de cálculo”), mas não analisou a abrangência do termo “legislação” empregado pelo art. 155, § 2º, II da CF ... 145 7.5. Caso Santa Lúcia (RE nº 635.688/RS): consolidação em sede de repercussão geral da equiparação dos conceitos de isenção e redução da base de cálculo, porém restando abertas as indefinições sobre o tema ... 148 7.6. Desafios do STF no tema da “Redução da Base de Cálculo” ... 152 7.7. A Proposta de Súmula Vinculante nº 69 do STF não sinaliza solução para o problema da guerra fiscal ... 153

CONCLUSÕES ... 157

(14)

14 INTRODUÇÃO

A guerra fiscal do ICMS, desde sua origem, caracteriza-se pela existência de conflitos que envolvem distorções de conceitos jurídicos pelos entes estatais que mediante subterfúgios, buscam contornar os limites legais do ordenamento jurídico.

O foco deste trabalho é a análise das dimensões do uso da expressão “redução da base de cálculo” como forma jurídica para os Estados oportunamente exercitarem a guerra fiscal do ICMS, sem se submeter aos limites e efeitos decorrentes das restrições legais impostas aos conceitos jurídicos de alíquota e isenção. No processo de pesquisa, foram identificados quatros acórdãos do Supremo Tribunal Federal que representam a evolução da jurisprudência sobre o tema.

No RE nº 161.031/MG (caso Camargo Soares), o STF entendeu que os conceitos de redução de base de cálculo e isenção (parcial) não se equiparam. Em decorrência disso, a exceção ao princípio da não cumulatividade que proíbe o aproveitamento de créditos nos casos de isenção (art. 155, §2º, II da CF), não poderia ser aplicada aos casos de redução de base de cálculo, restando garantido, então, o direito ao crédito do contribuinte.

O RE nº 174.478/SP (caso Monsanto) marcou a mudança de entendimento do STF que passou a equiparar os conceitos de redução da base de cálculo e isenção parcial. Assim, a aplicação do art. 155, §2º, II da CF passou a ser possível, permitindo o cancelamento/estorno dos créditos nos casos de base de cálculo reduzida.

(15)

15 Finalmente, no RE nº 635.688/RS (caso Santa Lúcia), o STF, em sede de repercussão geral, pacificou-se a equiparação dos conceitos de redução de base de cálculo e isenção parcial. Entendeu que os convênios são meramente autorizativos e concluiu que a falta de lei prevendo a manutenção dos créditos permite o seu cancelamento.

Assim, verifica-se que os quatro casos revelam a intensão dos Estados em contornar a restrição ao direito ao crédito prevista para os casos de isenção (art. 155, §2º, II da CF), por meio da utilização da redução da base de cálculo. E posteriormente pretendem a equiparação desses conceitos judicialmente para garantir o cancelamento dos créditos aumentando a arrecadação.

O uso da expressão “redução da base de cálculo” envolve problema de competência tributária na medida em que se procura definir se os Estados possuem autorização restringir o direito ao crédito nas hipóteses de base de cálculo reduzida.

No primeiro capítulo serão tratados, então, os conceitos fundamentais ligados à competência: (i) a visão estática da competência legislativa tributária, permitirá a compreensão sobre as limitações dos Estados no que diz respeito a instituição e regulamentação do ICMS; (ii) a concretização da competência legislativa, mediante a estrutura da regra-matriz de incidência, tratará da relação entre a base de cálculo e alíquota e (iii) a realização da competência administrativa pela via da incidência, possibilitará a demonstração da distinção entre os conceitos de isenção e redução de base de cálculo.

No segundo capítulo serão tratados os problemas decorrentes da delegação de competência aos convênios/CONFAZ que induziu o surgimento da dualidade: (i) convênios autorizativos, que devolvem aos Estados a liberdade para concederem ou não os benefícios por meio de suas legislações estaduais e (ii) convênios impositivos, que mantém a competência do CONFAZ, determinando a obrigatoriedade de todos os Estados instituírem benefícios fiscais.

(16)

16 capítulo irá evidenciar o jogo de ação dos Estados para despistar as limitações legais que lhe são impostas e reação institucional para conter estas ações.

Nos capítulos quatro, cinco e seis, será destacada a manipulação do conceito de redução de base de cálculo pelos Estados como forma de evitar a incidência dos limites impostos pelos princípios da legalidade, da não cumulatividade e federativo.

Dessa forma, no quarto capítulo será demonstrado como o conceito “redução da base de cálculo” surgiu para evitar a exigência de: (i) estipulação de alíquotas do ICMS pelo Senado Federal; (ii) lei estadual para fixação de alíquotas; e (iii) lei para concessão de isenção; em nítida afronta ao princípio da legalidade.

No quinto capítulo será demonstrada a violação ao princípio da não cumulatividade, na medida em que a pretensão de equiparar o conceito de redução de base de cálculo com o conceito de isenção (parcial) torna cumulativo o ICMS sem autorização constitucional.

E no sexto capítulo se demonstrará a violação ao princípio federativo na medida em que a utilização da redução de base de cálculo pelos Estados busca contornar a proibição de distinção tributária em razão da origem do bem.

Já no último capítulo serão relatados os quatro acórdãos do STF (caso Camargo Soares, Monsanto, Santa Catarina e Santa Lúcia) envolvendo a concessão de redução de base de cálculo, com o objetivo de destacar que a forma como a redução da base de cálculo passou a ser utilizada pelos Estados fomenta a guerra fiscal e transmite ao poder judiciário o dever de solucioná-la. No entanto, o que esta pesquisa sinaliza é que os conflitos estão longe de terminar, pois a capacidade institucional do STF resolver os problemas da guerra fiscal do ICMS é menor que o interesse e a criatividade jurídica dos Estados.

Método

(17)

17 Partiremos da premissa de que o conhecimento é redutor de complexidades1 na medida em que visa tornar o objeto cognoscente menos complexo. De acordo com a filosofia da linguagem, inaugurada por Ludwig Wittgenstein, a linguagem é condição para que haja conhecimento, porquanto somente ela revela o significado do objeto a ser conhecido que, por sua vez, verifica-se no mundo da experiência2.

Ou seja, a mera apreensão das coisas pela experiência concreta não é suficiente para que o conhecimento se solidifique, sendo imprescindível que os dados, empiricamente recolhidos pelos sentidos do ser cognoscente, sejam revestidos em linguagem.

O conhecimento científico pressupõe linguagem rigorosa, o que torna necessário que o cientista opte por um método3 e delimite o objeto que pretende conhecer (corte metodológico4). A depender do método adotado, diferentes serão as regras aplicáveis às proposições resultantes da aproximação com o objeto.5

Dessa forma, o método aqui empregado será a análise linguística6 do direito positivo. E sendo este (o direito positivo7) o objeto do presente estudo,

1 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, Linguagem e Método, São Paulo: Noeses, 2013, p. 7.

2 Não há, portanto, compreensão fora da linguagem. “Mediante a superação da dualidade sujeito -objeto, intermediado pela linguagem, esta deixa de ser terceiro elemento que serviria de instrumento ao conhecimento do mundo. Ao contrário. A linguagem, sob esta concepção, passa a ser responsável pela própria construção (conhecimento) do objeto que se pretende conhecer. O sujeito cognoscente do objeto é representado na linguagem e, a partir desta perspectiva, compreende o objeto a ser conhecido. Abandona-se a máxima metafísica da existência do objeto em si, ‘entificado’. Não há

compreensão desvinculada da linguagem. Há, portanto, mudança de concepção em relação à

possibilidade de se conhecer o ‘objeto em si’,enquanto ente.” PISCITELLI, Thatiane dos Santos. Os limites à interpretação das normas tributárias. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 23.

3“(…) empregaremos o signo ‘método’ no sentido de caminho a ser percorrido pelo cientista para a justificação de suas asserções, ou seja, são os instrumentos utilizados pelo cientista para se

aproximar (approach) do objeto (entendido o ‘objeto’ sempre em um sentido lingüístico).”

MOUSSALLÉM, Tárek Moysés. Fontes do direito tribuário. São Paulo: Noeses, 2005, p. 9.

4“Corte metodológico é o ato lingüístico delineador da linguagem do objeto de estudo. Vale ressaltar que a aludida incisão ocorre mediante o processo de abstração, operação lingüística consistente em prescindir partes de um todo. Ademais, esta separação é medida arbitrária do sujeito cognoscente.

Não se encontra sujeita a contestações. É pressuposto epistemológico.” MOUSSALLÉM, Tárek

Moysés, Fontes do direito tribuário, p. 11.

5 Enunciados produzidos de acordo com um método não se relacionam com enunciados resultantes

de outro. “Por ejemplo: ‘la concepción del mundo del señor Copérnico atenta contra las convicciones religiosas de nuestra comunidad’. Este enunciado no discute la veracidad o la falsidad de la teoría

copernicana sino su valor moral de acuerdo com los presupuestos religiosos de una sociedad.”

SCAVINO, Dardo. La filosofia actual: pensar sin certezas. Buenos Aires: Paidós, 2007, p. 67.

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18 se-á com especial atenção as normas jurídicas constitucionais e infraconstitucionais que disciplinam a forma de concessão de benefícios fiscais. O objetivo é demonstrar os problemas decorrentes do uso da expressão “redução da base de cálculo” (corte metodológico) pelos Estados e os prejuízos causados a Federação com o aumento dos casos de guerra fiscal.

Espera-se, então, que ao final da pesquisa, consiga-se demonstrar que a utilização da expressão redução da base de cálculo não é proibida pelo ordenamento jurídico pátrio, porém o seu emprego para conceder benefícios fiscais no âmbito do ICMS, visa contornar as disposições constitucionais, legais e a jurisprudência, trazendo insegurança jurídica aos contribuintes e aos Estados.

esta é o momento necessário constitutivo de todo e qualquer saber humano, de tal modo que a formulação de conhecimentos intersubjetivamente válidos exige reflexão sobre sua infra-estrutura

lingüística.” OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Reviravolta lingüístico-pragmática na filosofia contemporânea. São Paulo: Loyola, 2006, p. 13. Neste contexto, Fabiana Del Padre Tomé assevera

que: “(…) o fenômeno do conhecimento não se opera entre um sujeito cognoscente e um objeto da experiência, pois qualquer coisa do mundo lá fora só passa a ser suscetível de se conhecer quando apreendida pelo ser humano, que a constitui lingüisticamente. Conhecer não significa a apreensão mental de um objeto da existência concreta. Ao contrário, é o intelecto que produz os objetos que

conhecemos.” A prova no direito tributário. São Paulo: Noeses, 2005, p. 2.

7 O direito positivo, para nós, é o conjunto de normas voltadas para a regulação das condutas humanas. Na lição de KELSEN: “o Direito (…) é uma ordem normativa da conduta humana, ou seja, um sistema de normas que regulam o comportamento humano. (…) Dizemos que se dirigem

intencionalmente à conduta de outrem não só quando, em conformidade com seu sentido, prescrevem (comandam) essa conduta, mas também quando a permitem e, especialmente, quando conferem o poder de realizar, isto é, quando a outrem é atribuído um determinado poder,

(19)

19

CAPÍTULO 1 CONCEITOS FUNDAMENTAIS

Ser competente é estar habilitado a fazer algo. É poder jurídico de exercer deliberação sobre dado campo material: atributo de agente prescrever conduta, mediante exercício da atividade de produção normativa8. O uso da expressão

“redução da base de cálculo” aparece em vários planos do processo de concretização da competência tributária: demarcação constitucional, definições de lei complementar, edição de convênios, elaboração de lei estadual, respectiva regulamentação, aplicação administrativa e solução dos conflitos decorrentes desse processo através do Poder Judiciário.

O problema do abuso da expressão “redução de base de cálculo” teve seu ápice com o recente julgamento do caso Santa Lúcia, em sede de repercussão geral. Este e outros três casos (Camargo Soares, Monsanto e Santa Catarina) apresentam problema comum ligado ao exercício da competência tributária: todos discutem a possibilidade de equiparação dos conceitos de isenção e redução da base de cálculo para fins de determinar se os Estados tem competência para restringir o direito ao crédito nos casos de concessão de redução de base de cálculo, com base na regra prevista no art. 155, §2º, II da Constituição Federal que apenas permite a restrição nos casos de isenção ou não incidência.

O ordenamento jurídico brasileiro é composto por normas jurídicas9 que organizadas sistematicamente orientam todo o seu funcionamento. Adota-se neste trabalho o conceito de ordenamento como sinônimo ao de sistema10, consistindo,

8 PEIXOTO, Daniel Monteiro. Competência Administrativa na Aplicação do Direito Tributário. São

Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 76-112.

9Paulo de Barros Carvalho distingue as normas jurídicas da seguinte forma: “(...) ‘normas jurídicas

em sentido amplo’ para aludir aos conteúdos significativos das frases do direito posto, vale dizer, aos enunciados prescritivos, não enquanto manifestações empíricas do ordenamento, mas como significações que seriam construídas pelo intérprete. Ao mesmo tempo, a composição articulada dessas significações, de tal sorte que produza mensagens com sentido deôntico-jurídico completo, receberia o nome de ‘normas jurídicas em sentido estrito’” (CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. São Paulo: Noeses, 2013, p. 135- grifamos)

10 Há quem diferencie ordenamento e sistema, sendo este a forma elaborada, interpretada e

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20 pois, em um conjunto de regras e princípios organizados de acordo com um fundamento comum11.

As normas jurídicas que compõem esse sistema, segundo a nomenclatura adotada por Paulo de Barros Carvalho12, dividem-se em normas de conduta, que são aquelas que regulam as relações intersubjetivas, e normas de estrutura, que regulam o modo de produção de outras normas13.

Interessa-nos, neste momento, a análise das normas de estrutura, nas quais se destacam as normas de competência. São estas normas que garantem a autonomia dos entes políticos, uma vez que cada um deles possui competências delimitadas cuidadosa e exaustivamente pela Constituição Federal. Esta distribuição minuciosa de competências configura reclamo impostergável do princípio federativo14.

Geraldo Ataliba15 adverte que a república e a federação são os princípios mais importantes do ordenamento, capazes de orientar a interpretação dos demais. Sobre a relação existente entre eles, destaca:

também alcança o status de sistema, uma vez que, conforme ensina Paulo de Barros Carvalho, “onde

houver um conjunto de elementos relacionados entre si e aglutinados perante uma referência determinada, teremos a noção fundamental de sistema”. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Noeses, 2010, p. 171.

11 Geraldo Ataliba define sistema normativo da seguinte forma: “conjunto unitário e ordenado de

normas, em função de uns tantos princípios fundamentais, reciprocamente harmônicos, coordenados

em torno de um fundamento comum”. (Sistema Constitucional Tributário Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1968, p. 19)

12 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Noeses, 2010.

13 Esta classificação das normas jurídicas em normas de conduta e de estrutura não é precisa. Paulo

de Barros Carvalho explica: “(...) a adoção desse sistema classificatório atende a certo padrão de

operacionalidade com a experiência do sistema de normas, mas, como toda classificação, vai cedendo seu rigor, à proporção em que a investigação se aprofunda. O próprio Norberto Bobbio, que

a utiliza fartamente, ao formalizar as chamadas ‘regras de estrutura’ não pôde evitar o reconhecimento ostensivo da tônica ‘conduta’, como destino finalístico de toda regulação normativa”.

(CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Fundamentos da Incidência. 7ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 43) Dessa forma, pode-se dizer que as regras de estrutura também acabam por regular comportamentos: tanto do sujeito que produzirá as novas normas, quanto daqueles que devem obediência às normas produzidas. A mesma relativização ocorre com as regras de conduta, que, assim como as de estrutura, também regulam a produção normativa, uma vez que a aplicação dessas normas de conduta (gerais e abstratas) ocorre por meio da produção de normas individuais e concretas, sendo apenas estas últimas, verdadeiras normas de conduta. (PEIXOTO, Daniel Monteiro. Competência Administrativa na Aplicação do Direito Tributário. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p.77-78).

14 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 29ª ed. São Paulo:

Malheiro, 2013, p. 571/572.

15“No Brasil os princípios mais importantes são os da Federação e da república”. (ATALIBA, Geraldo.

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21 Tal como fixado o regime republicano, entre nós, a federação é uma forma necessária de sua realização: a autonomia dos Estados surge, já em 1891, como forma de expressão das exigências republicanas, entre nós. Como postulado pela mais lúcida doutrina, tudo o que puder ser feito pelos escalões intermediários haverá de ser de sua competência; tudo o que o povo puder fazer por si mesmo, a ele próprio incumbe. Aí está a demonstração da íntima relação entre república e federação16.

É importante observar que a guerra fiscal afeta diretamente o conceito de Federação, por abalar a relação de cooperação entre os Estados, conforme demonstra Ricardo Varsano17:

A guerra fiscal é, como o próprio nome indica, uma situação de conflito na Federação. O ente federado que ganha quando, de fato, existe algum ganho – impõe, na maioria dos casos, uma perda a algum ou a alguns dos demais, posto que a guerra raramente é um jogo de soma positiva. O federalismo, que é uma relação de cooperação entre as unidades de governo, é abalado. Também a Federação cara aos brasileiros a ponto de a Constituição conter cláusula pétrea que impede sua abolição - perde.

Dentre as principais características que distinguem o ordenamento jurídico dos demais tipos de ordenamentos normativos encontram-se as normas de competência (por exemplo, não parecem existir normas de competência nos ordenamentos morais)18. Entende-se por competência a habilidade para praticar

atos cujo resultado seja a criação de normas válidas, ou seja, aptidão para provocar alterações no ordenamento jurídico19.

Daniel Monteiro Peixoto, ao mencionar as três funções do Estado brasileiro, a legislativa, a administrativa e a judiciária, ensina que a produção de

16 ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. 3ª edição. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 45.

17 VARSANO, Ricardo. Guerra fiscal do ICMS: quem ganha e quem perde. IPEA. Planejamento e

Políticas Públicas, n. 15, junho de 1967, p.6 apud PEIXOTO, Daniel Monteiro. Federação, competência tributária e guerra fiscal entre Estados via ICMS. In SANTI, Eurico Marcos Diniz de (coord.). Curso de Direito Tributário e Finanças Públicas – do fato à norma, da realidade ao conceito jurídico. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 1082-1083.

18 GUASTINI, Riccardo. Prólogo à obra de Beltran, Jordi Ferrer. Las normas de competência: um

aspecto de la diámica jurídica. Madrid: Boletín Oficial del Estado, 2000 apud PEIXOTO, Daniel Monteiro. Competência Administrativa na Aplicação do Direito Tributário. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 76.

19 PEIXOTO, Daniel Monteiro. Federação, competência tributária e guerra fiscal entre Estados via

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22 normas nestas esferas é regulada por normas de competência com características peculiares:

As ‘normas de competência legislativa’ regulam a função legislativa na produção de normas, notadamente, abstratas e gerais; as

‘normas de competência administrativa’, a função administrativa na produção de normas, em sua maior parte, concretas e individuais;

e as ‘normas de competência judiciária’, a função jurisdicional em que o Estado juiz produz normas com o propósito de resolver determinada situação litigiosa (podem ser concretas e individuais, no caso das sentenças condenatórias; ou mesmo abstratas e gerais, como no caso do controle concentrado de constitucionalidade pelo STF)20.

Assim, verifica-se que as normas produzidas legislativamente são majoritariamente normas gerais e abstratas, as produzidas administrativamente, individuais e concretas e as produzidas pela função jurisdicional, individuais e concretas ou gerais e abstratas21.

Sobre a classificação das normas pela generalidade e abstração Paulo de Barros Carvalho22 escreve:

Costuma-se referir a generalidade e a individualidade da norma ao quadro de seus destinatários: geral, aquela que se dirige a um conjunto de sujeitos indeterminados quanto ao número; individual, a que se volta a certo indivíduo ou a grupo identificado de pessoas. Já a abstração e a concretude dizem respeito ao modo como se toma o fato descrito no antecedente. A tipificação de um conjunto de fatos realiza uma previsão abstrata, ao passo que a conduta especificada no espaço e no tempo dá caráter concreto ao comando normativo.

Com base nos problemas de competência apresentados nos casos Camargo Soares, Monsanto, Santa Catarina e Santa Lúcia, interessa-nos estudar: (i) a visão estática da competência legislativa tributária, que permitirá entender as limitações dos Estados no que diz respeito a instituição e regulamentação do ICMS; (ii) a concretização da competência legislativa, mediante a estrutura da regra-matriz de incidência, em especial, o produto base de cálculo e alíquota do critério

20 PEIXOTO, Daniel Monteiro. Competência Administrativa na Aplicação do Direito Tributário. São

Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 76.

21 Trataremos com maiores detalhes sobre as normas produzidas pela função jurisdicional no capítulo

7 deste trabalho.

22 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. São Paulo:

(23)

23 quantitativo e (iii) a realização da competência administrativa pela via da incidência, possibilitando a distinção dos conceitos de isenção e redução de base de cálculo.

1.1. Competência Legislativa Tributária

Dentre as competências atribuídas aos entes políticos, destaca-se a competência legislativa tributária, que permitirá a arrecadação de recursos para o desempenho das funções constitucionalmente outorgadas. Isto porque, sem autonomia financeira, a independência e a isonomia entre os entes políticos desaparecem.

Pode-se conceituar competência tributária como a aptidão das pessoas políticas de direito público interno (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) para criar tributos, descrevendo, legislativamente, as suas regras matrizes de incidência.

Destaca Roque Antonio Carrazza23 que a Constituição Federal ao

discriminar as competências tributárias descreveu todos os critérios da regra matriz de incidência dos tributos, cabendo ao legislador, ao exercer a sua competência, ser fiel aos limites da norma traçada constitucionalmente.

Consequentemente, o ente competente para criar o tributo, também tem poderes para aumentar ou diminuir a carga tributária, isentar24 e até simplesmente não tributar.

Ocorre que esta competência legislativa outorgada aos entes políticos não é ilimitada. Por afrontar diretamente o direito à propriedade e à liberdade dos contribuintes, deve ser exercido com cautela, observando as limitações impostas pela própria Constituição Federal.

Leciona Roque Antonio Carrazza que:

23 “Noutros termos, ela [Constituição Federal] apontou a hipótese de incidência possível, o sujeito

ativo possível, o sujeito passivo possível, a base de cálculo possível e a alíquota possível, das várias espécies e subespécies de tributos. Em síntese, o legislador, ao exercitar a competência tributária, deverá ser fiel à norma-padrão de incidência do tributo, pré-traçada na Constituição”. (CARRAZZA,

Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 29ª ed. São Paulo: Malheiro, 2013, p. 587).

24“Em rigor, a competência para tributar e a competência para isentar são como o verso e o anverso

de uma mesma moeda. Ou, dito de outro modo (menos metafórico), se só a lei pode validamente tributar, só a lei pode validamente isentar (esta, pelo menos, é a regra geral)”. (CARRAZZA, Roque

(24)

24 (...) o tributo, de algum modo, esgarça o direito de propriedade. Ora, na medida em que o direito de propriedade é constitucionalmente protegido, o tributo só será válido se, também ele, deitar raízes na Constituição25

Os limites impostos pela Constituição ao exercício da competência tributária estão presentes nas normas e princípios constitucionais, que implicam o respeito aos amplos direitos e garantias fundamentais dos contribuintes, com destaque à norma que impede o uso do tributo com efeito de confisco (art. 150, IV), bem como a que impede o estabelecimento de diferença tributária em razão da procedência ou destino dos bens e serviços (art. 152). Assim, verifica-se a submissão do Estado ao direito (Estado de Direito).

A nossa Carta Magna é exaustiva ao tratar de matéria tributária, despendendo ao tema inúmeros artigos, na contramão do que ocorre com Constituições estrangeiras que se limitam a descrever princípios gerais, em um ou dois artigos, dando ao legislador ordinário ampla liberdade.

No Brasil, então, a Constituição deixou pouco espaço para o legislador infraconstitucional no que diz respeito à matéria tributária, podendo ser classificada, sob a perspectiva de sua intensidade e amplitude, como rígida. Sobre o assunto, ensina Geraldo Ataliba:

O que ao nosso estudo interessa, das considerações formuladas, é estabelecer a validade científica da classificação dos diversos sistemas constitucionais tributários, em função da liberdade por eles concedidas ao legislador ordinário; é anotar que sua feição geral será

– sob a perspectiva de sua intensidade e amplitude – rígida ou flexível, conforme se restrinja ao ditame de princípios genéricos, admitindo à lei participar da tarefa de moldar o sistema tributário, ou se estenda, direta e imediatamente, à modelagem do sistema, conferindo à lei simples função regulamentar.26

Dessa forma, ao criar, in concreto, os tributos os entes políticos devem

total obediência aos ditames constitucionais, sob pena de flagrante inconstitucionalidade.

25 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 29ª ed. São Paulo:

Malheiro, 2013, p. 433.

26 ATALIBA, Geraldo. Sistema Constitucional Tributário Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais,

(25)

25 No que diz respeito à distribuição de competência legislativa tributária às pessoas políticas de direito público interno, é relevante para este trabalho a opção da Constituição Federal em deixar a incumbência para a instituição do ICMS aos Estados-membros.

Acredita-se que o principal motivo para a existência de conflito entre os entes estatais, no que diz respeito ao ICMS, seja justamente a atribuição deste tributo a competência dos Estados. Por trata-se de tributo sobre o consumo, a sua abrangência extrapola os limites territoriais dos Estados, o que o fornece um caráter nacional:

Desde o início, todavia, ficou claro que a regionalização do modelo brasileiro do imposto sobre o valor agregado, cuja vocação, na esmagadora maioria dos países, é nacional, continuaria a ser o grande obstáculo para um sistema tributário que objetivasse a justiça fiscal e o desenvolvimento nacional, em função das distorções que provoca 27.

Ao redor do mundo, o imposto que faz às vezes do nosso ICMS é o IVA (Imposto sobre o Valor Agregado), atualmente adotado em mais de 150 países28. Dentre as suas principais características está a homogeneidade, amparada pela existência de alíquotas uniformes e com poucas isenções29.

Dessa forma, o Brasil, ao contrariar a experiência mundial, e não instituir um único tributo sobre o consumo, mas quatro (ICMS, ISS, IPI e PIS-COFINS) e em diferentes esferas, possibilitou a ocorrência de conflitos de competência entre os entes federados e também disputas horizontais (v.g. entre os Estados) pelo aumento de arrecadação tributária que se denominou “guerra fiscal”.

27 CARVALHO, Paulo de Barros; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Guerra Fiscal: reflexões sobre a

concessão de benefícios no âmbito do ICMS. 2ª Ed. São Paulo: Noeses, 2014, p. XIV.

28 COELHO, Isaías. Reforma do PIS-COFINS, sem chororô. JOTA, São Paulo, jun/2015. Disponível

em http://jota.info/reforma-do-pis-cofins-sem-chororo. Acesso em 27 de setembro de 2015.

29 “Há duas gerações do IVA no mundo. Os IVAs antigos (VERSÃO 1.0 entre 1967 e 1980s), que

eram repletos de isenção e muitas alíquotas; e os IVAs modernos (VERSÃO 2.0 após 1990) apresentam alíquotas uniformes e poucas isenções” SANTI, Eurico M. D. de. Em defesa de um IVA

(26)

26 1.1.1. Atributos da Competência Tributária

Roque Antonio Carrazza30 destaca seis características próprias da

competência, quais sejam: privatividade; indelegabilidade; incaducabilidade; inalterabilidade; irrenunciabilidade e facultatividade de exercício.

A privatividade consiste na exclusão da competência das demais pessoas políticas no que se refere a competência outorgada especificamente a um ente federado. Paulo de Barros Carvalho31 entende que apenas a União possui

competência privativa, pois em situações excepcionais pode legislar sobre materialidades originalmente previstas no campo de competência de outros entes federados.

A indelegabilidade impede a transferência da competência outorgada a determinado ente político a quem quer que seja, ainda que por meio de lei.

A incaducabilidade garante ao titular da competência tributária o direito de instituir os tributos a qualquer tempo, impedindo a sua caducidade.

A inalterabilidade impede que a própria pessoa política titular da competência amplie as suas dimensões. Apesar disto, Paulo de Barros Carvalho32

entende que é possível alterar a competência tributária por meio do poder constituinte derivado.

A irrenunciabilidade proíbe que o ente político abdique unilateral e definitivamente da competência que lhe foi atribuída.

E por fim, a facultatividade permite liberdade às pessoas políticas para exercitar a competência tributária quando e da forma como pretenderem. No entanto, no que diz respeito ao ICMS, a facultatividade não se aplica. Isto porque, por força do art. 155, §2º, XII, “g” da CF o tributo deve ser obrigatoriamente instituído.

30 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 29ª ed. São Paulo:

Malheiro, 2013, p. 590 e seguintes.

31 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010, p.

272.

32 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010, p.

(27)

27 1.1.1.1 O ICMS como exceção ao atributo da facultatividade das competências tributárias

Sabe-se que o ente competente para criar o tributo, também tem poderes para conceder isenção, são duas faces da mesma moeda. Assim, a competência constitucional para tributar, de que são dotados os entes federativos, os permite certa liberdade de decisão política sobre a instituição ou não dos tributos a eles discriminados (facultatividade), e uma vez instituídos é possível ainda que os Estados concedam benefícios fiscais. Esta é a regra.

Com o ICMS, no entanto, a Constituição Federal/88 (desde a Emenda Constitucional nº 1 de 1969) retirou-lhes tanto a liberdade de instituição, quanto a de concessão de benefícios, tendo em vista o já mencionado caráter nacional do imposto.

Sobre o assunto, ensina Roque Antonio Carrazza:

Pensamos que a única exceção a esta facultatividade e ainda assim, em termos- é a que toca ao imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e serviços (ICMS), que os Estados e o Distrito Federal estão obrigados a instituir e arrecadar, em

decorrência do que dispõe o art. 155, § 2º, XII, “g”, da CF: “Cabe

à lei complementar: (...) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios

fiscais serão concedidos ou revogados”33.34

Assim, ao delegar à lei complementar (e indiretamente aos convênios) a competência para concessão de benefícios fiscais a Constituição Federal de 1988, ao mesmo tempo em que limitou a possibilidade de concessão de isenção unilateral pelos Estados, também os obrigou a instituí-lo e cobrá-lo.

33 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 29ª ed. São Paulo:

Malheiro, 2013, p. 771.

34 O autor ainda acrescenta: “Ainda assim, não vemos como compelir o Poder Legislativo de um

Estado (ou do Distrito Federal) a criar o ICMS. O máximo que podemos aceitar é que as demais pessoas políticas competentes para criar este imposto podem bater às portas do Poder Judiciário

(28)

28 1.1.2. Conflitos de Competência no ICMS e a Delegação para o CONFAZ editar Convênios

Não obstante a rígida repartição constitucional de competências há situações em que a ocorrência do fato jurídico tributário permite uma margem de dúvida sobre qual tributo deverá incidir no caso concreto, acarretando conflitos de competência que envolvem todos os entes federativos. E muitas são as possibilidades: temos conflitos entre IPTU (Municípios) e ITR (União); entre ICMS (Estados e Distrito Federal) e ISS (Municípios) e também IPI (União); entre outros.

Assim, existem conflitos de competência entre Municípios, Estados, Distrito Federal e União (conflitos verticais), mas não só, existem também conflitos horizontais, como por exemplo, o conflito entre os próprios entes estaduais, que brigam entre si na tentativa de aumentar a sua arrecadação, seja por concessão unilateral de benefícios fiscais, seja pela glosa de créditos oriundos de operações beneficiadas em outros Estados, entre outras situações. Passou-se a denominar tais conflitos de “guerra fiscal”.

Daniel Monteiro Peixoto35 a define da seguinte forma:

‘Guerra fiscal’, na acepção construída pelos tribunais, imprensa e

literatura especializada, é expressão que representa metaforicamente o esforço competitivo entre pessoas políticas para que a alocação de investimentos privados seja direcionada aos seus respectivos territórios.

Com o objetivo de evitar estes conflitos, a competência para a concessão de isenções e não incidência em matéria de ICMS foi transferida dos Estados para os convênios/CONFAZ, pela EC nº 1 de 1969, de modo que a concessão ficou adstrita a deliberação conjunta de todos os entes estaduais, limitando a autonomia destes entes.

No entanto, após esta delegação de competência aos convênios/CONFAZ revelou-se uma pretensão dos Estados em reaver a autonomia perdida, por meio da estratégia de tornar os convênios mecanismos meramente

35 PEIXOTO, Daniel Monteiro. Federação, competência tributária e guerra fiscal entre Estados via

(29)

29 autorizativos, retirando a sua obrigatoriedade, de modo que apenas por meio da edição de lei específica (estadual) seja possível a concessão de benefícios fiscais36.

Tal atitude fere frontalmente o atributo da indelegabilidade das competências, uma vez que pretende indiretamente devolver a competência que foi delegada ao CONFAZ de volta aos Estados.

Observe-se que essas situações apenas acontecem quando a concessão de benefícios fiscais foi feita por convênio, demonstrando assim, que o problema da guerra fiscal do ICMS não se limita às situações de concessão unilateral de benefícios.

Assim, optou-se por estudar neste trabalho as situações de guerra fiscal em que há celebração de convênios, objetivando demonstrar que o uso da expressão redução da base de cálculo pelos Estados tem sido feito com o objetivo de desrespeitar as legislações e jurisprudência, colocando os contribuintes em situação de insegurança jurídica.

Estes casos possuem uma complexidade extra, uma vez que não se tratam de casos típicos de guerra fiscal, nas quais há concessão de benefícios unilateralmente pelos Estados, mas de benefícios concedidos com base em convênios, demonstrando que mesmo se observando o disposto na LC 24/75 e na CF/88 (art. 155, §2º, XII, “g”) ainda assim a situação conflituosa existente entre os Estados e a insegurança jurídica do contribuinte não se resolvem.

1.2. Concretização da Competência Legislativa Tributária e a Estrutura da Regra Matriz de Incidência

As decisões do STF nos casos Camargo Soares, Monsanto, Santa Catarina e Santa Lúcia apresentam, em comum, também, problemas históricos conectados com a regra-matriz de incidência tributária. O cerne do problema encontra-se no critério quantitativo da norma tributária, uma vez que a relação direta entre a alíquota e a base de cálculo permite que a alteração de uma equivalha à

(30)

30 alteração da outra, isto é, ambas compõem o valor do tributo, logo, a alteração de qualquer delas alterará o valor final a ser pago.

Esta relação entre os elementos do critério quantitativo possibilitou inicialmente aos Estados manipular o conceito de redução da base de cálculo para fugir das restrições impostas à alteração das alíquotas37, maneira mais usual de

alteração do valor do tributo. Posteriormente a redução da base de cálculo passou a ser utilizada para fugir das restrições impostas à isenção (no art. 155, §2º, II da CF), problema central nos casos julgados pelo STF.

1.2.1. Critérios que compõem a regra matriz de incidência tributária

As normas jurídicas38 possuem estrutura lógica de juízo hipotético, dessa forma tem-se que a regra matriz de incidência de um tributo, assim como as demais normas jurídicas, estrutura-se da seguinte forma: dada uma hipótese, deve ser uma consequência.

A peculiaridade da norma jurídica tributária é que o fato abstratamente previsto na sua hipótese dará ensejo a uma relação jurídica entre o Fisco e o contribuinte, em que o primeiro tem o direito subjetivo de cobrar do segundo determinada quantia (crédito), cuja contrapartida é o dever jurídico deste último de cumpri-la (débito).39

A regra matriz de incidência consubstancia uma regra de comportamento na medida em que regula a conduta que deverá assumir o sujeito passivo - devedor da prestação fiscal - perante o sujeito ativo - titular do crédito tributário. Ela define a incidência dos tributos. O seu estudo permite o melhor conhecimento do fenômeno jurídico tributário, ao passo que possibilita uma análise minuciosa de seus critérios, aprofundando a investigação sobre a legislação tributária.

37 Este assunto que será tratado no capítulo 4, item 4.2.

38 “’Norma Jurídica’ é a expressão mínima e irredutível (com o perdão do pleonasmo) de

manifestação do deôntico, com o sentido completo”. CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. São Paulo: Noeses, 2013, p. 627.

39Como assevera Lourival Vilanova: “a norma jurídica, geral e abstrata (generalidade e abstrateza,

(31)

31 Sua estrutura é dividida em antecedente e consequente, também chamados de descritor e prescritor, respectivamente. O antecedente descreve todos os critérios necessários para que se repute ocorrido o fato jurídico tributário40. Trata-se de uma escolha do legislador, que dentre os inúmeros fatos do mundo social elege aqueles que ostentem signos presuntivos de riqueza, passíveis de serem tributados.

Para designar este antecedente, muitas denominações surgiram, dentre elas a expressão fato gerador. Ocorre que esta expressão pode ser ambígua, significando não só a descrição constante da norma geral e abstrata, como também o fato verificado no mundo empírico que satisfaz os requisitos da norma abstrata.

Com efeito, Paulo de Barros Carvalho prefere denominar de forma distinta estas situações, diferenciando o fato verificado no mundo empírico e a descrição deste constante da norma geral e abstrata, evitando assim a ambiguidade do termo fato gerador.

Para nominar-lhes, Geraldo Ataliba sugeriu “hipótese de incidência” e

“fato imponível”, mas preferimos operar com “hipótese tributária” e “fato jurídico tributário”, assinalando que o importante é discernir as duas situações, evitando, com isso, a possível ambiguidade da expressão fato gerador.41

Assim, temos a hipótese tributária como a descrição normativa do evento (situações ocorridas no mundo social que podem ser captadas pelos órgãos sensoriais, mas que ainda não foram relatadas em linguagem) e fato jurídico tributário como o relato linguístico da ocorrência deste evento, ou seja, o fato concretamente realizado.

Já o consequente prescreve um vínculo abstrato entre sujeitos de direito, resultando na formação da relação jurídica tributária, que já explicitamos tratar-se do direito subjetivo do sujeito ativo de cobrar a quantia devida pelo sujeito passivo, que, por sua vez, possui o dever jurídico de cumpri-la.

40“Pontes de Miranda utilizou suporte fáctico para designar o fato bruto e o fato jurídico para referir-se

àquela porção demarcada pelas notas da descrição hipotética. Acrescentemos que o fato bruto, o suporte físico, é plurilateral; o fato jurídico é que é, todo ele e exclusivamente, jurídico.” CARVALHO,

Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. São Paulo: Noeses, 2013, p. 155.

41 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: Linguagem e Método. São Paulo: Noeses, 2013, p.

(32)

32 Compõem o antecedente da regra matriz os critérios material, temporal e espacial. E o consequente, os critérios pessoal e quantitativo.

Paulo de Barros Carvalho define os três primeiros critérios da seguinte forma:

O critério material é o núcleo do conceito mencionado na hipótese normativa. Nele há referência a um comportamento de pessoas físicas ou jurídicas, condicionado por circunstâncias de espaço e de tempo, de tal sorte que o isolamento desse critério, para fins cognoscitivos, é claro, antessupõe a abstração das condições de lugar e de momento estipuladas para a realização do evento. Já o critério espacial é o plexo de indicações, mesmo tácitas e latentes, que cumprem o objetivo de assinalar o lugar preciso em que a ação há de acontecer. O critério temporal, por fim, oferece elementos para saber, com exatidão, em que preciso instante ocorre o fato descrito. (grifo nosso)42

No que se refere ao critério pessoal temos os sujeitos ativos e passivos, sendo os primeiros, pessoas jurídicas de direito público ou privado que titularizem a capacidade tributária ativa43. Já os sujeitos passivos são pessoas físicas ou jurídicas, privadas ou públicas, sujeitas ao cumprimento da obrigação tributária.

Os sujeitos ativos estão definidos na Constituição Federal por meio da repartição de competências tributárias, mas permite-se alteração através da transferência da capacidade tributária ativa. Quanto ao sujeito passivo, cabe ao legislador ordinário escolher aquele que arcará com o ônus fiscal, mas sempre observando os limites constitucionais, uma vez que a Constituição determina os sujeitos passivos possíveis, quais sejam os realizadores do fato jurídico tributário.

No critério quantitativo temos a base de cálculo como o seu aspecto dimensível, mensurando a intensidade do comportamento descrito pelo legislador. E a alíquota, complementando-a, na medida em que realiza com ela a determinação

42 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: Linguagem e Método. São Paulo: Noeses, 2013, p.

156.

43“No mais das vezes, a competência tributária e a capacidade tributária ativa acumulam-se numa

mesma pessoa política. Logo, habitualmente, ocupa o pólo ativo da obrigação tributária a mesma pessoa política que, por haver exercitado a competência tributária, criou in abstracto o tributo. De fato, se dermos revista em nosso direito positivo, veremos que essa é a regra geral. (...).”

(33)

33 do valor do débito, possibilitando o controle do confisco, bem como da extrafiscalidade.

Interessa para o presente trabalho estudar com maiores detalhes um dos elementos do critério quantitativo da regra matriz de incidência, qual seja, a base de cálculo.

1.2.2. Base de Cálculo

Ao discorrer sobre a base de cálculo, cumpre ressaltar a posição de destaque que ela ocupa na teoria da glorificação do fato gerador que a considera

como o núcleo da hipótese de incidência, cabendo aos demais critérios a função de complementa-la, conforme destaca Alfredo Augusto Becker44:

Resumindo, o aspecto atômico da hipótese de incidência da regra de tributação revela que em sua composição existe um núcleo e um, ou mais, elementos adjetivos. O núcleo é a base de cálculo e confere o gênero jurídico ao tributo.

Os elementos adjetivos são todos os demais elementos que integram a composição da hipótese de incidência. Os elementos adjetivos conferem a espécie àquele gênero jurídico de tributo. (grifo nosso)

Reconhece-se nesse trabalho que a base de cálculo possui papel fundamental na norma jurídica tributária, porém colocá-la como elemento central é subestimar a importância dos critérios constantes do descritor da regra matriz.

Assim, Paulo de Barros Carvalho reconhece sua importância, mas em conjunto com os demais critérios, apontando a relevante ligação existente entre o binômio hipótese normativa e a base de cálculo, que é o responsável por permitir a identificação da natureza jurídica de cada tributo45.

A base de cálculo do tributo deve guardar correlação lógica com a hipótese, dimensionando-a adequadamente. Assim, a natureza jurídica do tributo

44 Teoria Geral do Direito Tributário. 4ª ed. São Paulo: Noeses, 2007, p. 347.

45“(...) no direito tributário, o tipo tributário se acha integrado pela associação lógica e harmônica da

hipótese de incidência e da base de cálculo. O binômio, adequadamente identificado, com revalar a natureza própria do tributo que investigamos, tem a excelsa virtude de nos proteger da linguagem

(34)

34 independerá do nome a ele atribuído, pois o que o distinguirá dos demais será a relação hipótese de incidência/base de cálculo.

Com efeito, a base de cálculo apresenta uma enorme versatilidade, sendo a análise do binômio supracitado apenas uma das suas três funções, a comparativa. Somada a função comparativa, temos ainda a (i) mensuradora e (ii) a objetiva. Passemos a sua análise.

A função mensuradora decorre da escolha do legislador ordinário, que ao cumprir com a competência outorgada pela Constituição, deve dimensionar a conduta prevista no verbo núcleo do tipo, delimitando a “fórmula numérica de estipulação do conceito econômico do dever jurídico”46 que será cumprido pelo sujeito passivo.

É neste momento que se determina qual será o atributo valorativo do fato tributário (dentre os muitos existentes: valor da operação; valor venal; altura, volume, ect) sobre o qual recairá a alíquota. Em outras palavras, é a base de cálculo que possui a capacidade de medir a intensidade do fato.

A sua segunda função é a objetiva, ou seja, a função de demarcar o conteúdo do objeto da obrigação tributária. Nesta função, observa-se que a base de cálculo se equipara a alíquota, que juntas não representam “mais que números justapostos que se preparam para um processo de cálculo matemático”47. Assim, ela também compõe a específica determinação do valor do tributo.

A terceira função, comparativa, não mais se relaciona com o aspecto unicamente numérico, mas sim com o caráter material do tributo. Ao permitir a identificação da natureza jurídica de cada tributo tem-se na base de cálculo a segurança procurada pelos intérpretes das normas, que podem com ela confirmar, infirmar ou afirmar o critério material da hipótese tributária48.

46 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010, p.

401.

47 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010, p.

402.

48 A função comparativa da base de cálculo ajuda a eliminar a imprecisão existente nas redações

legais, que por atecnia do legislador pode transformar um tributo em entidade difusa (v.g. um imposto revestido de taxa), o que é inadmissível. Tal situação é explicada por Paulo de Barros Carvalho da

(35)

35 Assim, a base de cálculo (i) confirma o critério material da regra matriz de

incidência tributária quando a grandeza eleita e a hipótese prevista pelo legislador estiverem em sintonia; (ii) infirma, quando forem incompatíveis e (iii) afirma, quando

a formulação do dispositivo legal suscitar dúvidas.

Cumpre ainda destacar que diante de incompatibilidade entre a base de cálculo e o critério material eleito pelo legislador deve prevalecer a base de cálculo, para fins de se detectar a natureza da exação tributária, conforme demonstra a sua característica “infirmadora”. No entanto, constatado que o desencontro entre a hipótese e a base de cálculo desconfigura a natureza jurídica do tributo criado, e a nova configuração acarreta inconstitucionalidades, ele não poderá subsistir, uma vez que estará burlando a rígida repartição de competência tributária prevista constitucionalmente49.

Ainda sobre as funções da base de cálculo Aires Barreto50 confirma o acima descrito e acrescenta uma quarta função, a de determinar a capacidade contributiva:

Presta-se a base de cálculo a:

a) servir como elemento de mensuração do critério material do suposto normativo;

b) permitir a determinação da base calculada, pela conjugação do critério dimensional (base de cálculo) com a alíquota;

c) afirmar, confirmar ou infirmar como destaca proficientemente Paulo de Barros Carvalho – o critério material. Em outras palavras, a possibilitar a precisa investigação da natureza jurídica do tributo criado;

d) determinar a presença de capacidade contributiva.

Com efeito, a mesma relação existente entre a base de cálculo e a hipótese tributária, que nos permite identificar a natureza jurídica do tributo, deve ser observada para efeito de obediência ao princípio da capacidade contributiva. Assim, discriminação das competências impositivas” (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 60).

49Vem ao encontro desta ideia de unicidade, o art. 154, I, da Constituição Federal, que ao autorizar

a União a criar novos impostos, proibiu tivessem ‘fato gerador e base de cálculo próprios’ dos discriminados nos arts. 153, 155 e 156, deste mesmo Diploma. Com isso, sinalizou nitidamente que a hipótese de incidência e a base de cálculo são realidades jurídicas distintas, que sob pena de

inconstitucionalidade, devem estar em perfeita sintonia”. (CARRAZZA, Roque Antonio. Reflexões sobre a obrigação tributária. São Paulo: Noeses, 2010, p.170)

50Base de cálculo, alíquota e princípios constitucionais. 2ª ed. revisada. São Paulo: Max Limonad,

(36)

36 caso a base de cálculo não reflita a grandeza prevista na hipótese, a capacidade contributiva do sujeito passivo restará violada.

A versatilidade da base de cálculo fica ainda mais latente quando a observámos sobre duas perspectivas diversas, distinguindo-a em (i) base de cálculo normativa e (ii) base de cálculo fática. Esta consiste na versão concreta daquela51. Ou seja, a sua previsão em abstrato pela lei configura a base de cálculo normativa, já o seu resultado, apurado por ocasião do lançamento, expresso em moeda, corresponde à base de cálculo fática.

A esta mesma dualidade, Aires Barreto denomina de base de cálculo e base calculada, explicando o fenômeno da seguinte forma:

A subsunção dos fatos tributários à norma é objeto de formalização através do ato do lançamento, e com observância ao tipo fechado, que já elegeu a base de cálculo. A administração, a partir daí, procede à investigação e avaliação dos fatos, transformando a base de cálculo (conceito ou critério legal) em base calculada. Sobre ela aplica a alíquota devida, na forma da lei, obtendo o tributo a ser carreado aos cofres públicos52.

Este autor defende ainda que apenas há necessidade de lei para a alteração da base de cálculo (normativa), estando dispensada deste requisito a alteração da base calculada (base de cálculo fática) 53. Explica: “o critério de

51 A base de cálculo nunca vem determinada no plano normativo. Lá teremos só uma referência

abstrata – o valor da operação, o valor venal do imóvel ect. É com a norma individual do ato administrativo do lançamento que o agente público, aplicando a lei ao caso concreto, individualiza o valor, chegando a uma quantia líquida e certa – a base de cálculo fáctica. (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 406)

52 BARRETO, Aires. Base de cálculo, alíquota e princípios constitucionais. 2ª ed. revisada. São Paulo:

Max Limonad, 1998, p.126.

53 A discussão a respeito da possibilidade de alteração da planta de valores do IPTU por meio de

Referências

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