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Recomendações ao médico que pratica a psicanálise (1912)

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Academic year: 2021

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Recomendações ao médico que pratica a psicanálise (1912)

1. Como manter na memória os incontáveis nomes, datas, detalhes, associações e sintomas da neurose que um paciente apresenta durante meses e anos?

A técnica é muito simples. Ela recusa todos os meios de apoio, mesmo a anotação [...], dispensando a mesma “atenção equiflutuante” ao que ouvimos. [...] Pois assim que afiamos a atenção intencionalmente até um determinado ponto, começamos a selecionar em meio ao material apresentado; [...] e, nessa seleção, fiamos as nossas expectativas ou as nossas inclinações. Mas é justamente isso que não podemos fazer; se na seleção seguimos as nossas expectativas, corremos o risco de nunca encontrarmos algo diferente daquilo que já sabemos.

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2. Sou insistente em recomendar aos colegas que no tratamento psicanalítico tomem como exemplo o cirurgião, que coloca de lado todos os seus afetos e até a sua compaixão humana e estabelece um único objetivo para as suas forças psíquicas: realizar a operação o mais perfeitamente possível. Nas atuais condições, para o psicanalista existe uma aspiração por afeto mais perigosa, que é a “ambição terapêutica” de realizar, através de seu meio novo e muito criticado, algo que possa ser convincente para outros.

(“Furor Curandis”)

Um velho cirurgião usou como seu lema as seguintes palavras: Eu lhe fiz os curativos, Deus o curou. O analista deveria se dar por satisfeito com algo parecido.

Dessa forma, ele não só coloca a si próprio em uma situação desfavorável para o seu trabalho, mas também se expõe, indefeso, a certas resistências do paciente [...].

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É fácil inferir em qual objetivo essas regras aqui apresentadas confluem. Elas todas querem criar no médico o contraponto da “regra psicanalítica fundamental” estabelecida para o analisando.

Assim como o analisando deve comunicar tudo que ele capta em sua auto-observação, evitando todos os apartes lógicos e afetivos que querem motivá-lo a proceder a uma seleção, também o médico deverá ser capaz de utilizar tudo que lhe foi dito para a finalidade da interpretação, do reconhecimento do inconsciente oculto, sem substituir a

“seleção” descartada pelo doente por uma censura própria [...].

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3. Ele não poderá tolerar quaisquer resistências dentro de si próprio [...].

Para tanto, não basta ele ser uma pessoa razoavelmente normal; pode-se, antes, exigir que ele tenha se submetido a uma purificação psicanalítica e que tenha tomado conhecimento daqueles complexos próprios, adequados para atrapalhá-lo na absorção daquilo que lhe é apresentado pelo analisando.

[...] do contrário, ele introduziria um novo tipo de “seleção” e deformação na análise, o que seria muito mais nocivo do que aquilo que foi produzido pela tensão de sua atenção consciente.

[...] cada recalque não resolvido do médico, corresponde, de acordo com uma expressão precisa de Wilhelm Stekel, a um “ponto cego” em sua percepção analítica.

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4. Devíamos crer ser totalmente aceitável e até útil [...] quando o médico lhe oferece uma visão de seus próprios defeitos psíquicos e conflitos, possibilitando a ele uma igualdade de posições quando lhe dá informações sigilosas de sua vida. Ora, a confiança de um equivale à do outro – dirão –, e quem exige intimidade do outro também deve dá-la em troca.

Assim, consegue-se que o paciente [...] informe com maior facilidade aquilo que ele conhece e o que ele teria mantido oculto [...].

[Essa técnica] fracassa regularmente diante da insaciedade despertada no paciente, que passa a querer inverter a relação, achando a análise do médico mais interessante que a sua própria.

(O médico precisa ser opaco para o analisando e, assim como uma superfície espelhada, não deve mostrar nada além daquilo que lhe é mostrado)

(“Neutralidade”)

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5. É incorreto dar tarefas ao analisando, tais como reunir as suas lembranças, refletir sobre um determinado período de sua vida e tarefas assemelhadas.

Essa regra deve ser seguida de forma especialmente rígida com aqueles pacientes que exercitam a arte de resvalar para a intelectualização durante o tratamento, [...] refletindo muito e frequentemente com muita erudição sobre o seu estado [...]. Por isso, com os meus pacientes não gosto de recorrer à leitura de escritos psicanalíticos; eu exijo que aprendam com sua própria pessoa e lhes asseguro que desse modo experienciarão mais, e coisas mais valiosas do que toda a literatura psicanalítica poderia lhes transmitir.

Mas entendo que sob as condições de uma internação em uma instituição pode ser vantajoso usar a leitura para preparar os analisandos e para estabelecer um clima de influência.

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Sobre o início do tratamento (1913)

6. O paciente deve ser responsável por um horário, mesmo que não venha

No caso de uma prática mais complacente, os cancelamentos “eventuais” acabam se acumulando tanto que o médico verá a sua existência material ameaçada. Se nos ativermos estritamente àquela determinação, no entanto, verificamos que acasos que impedem a presença são inexistentes, e as doenças intercorrentes, muito raras.

O paciente falta justamente quando o trabalho prometia ser muito importante...

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7. Não é possível dar garantias sobre a duração do tratamento

Informo, por exemplo, os seguintes dados da carta de uma senhora na Rússia, que recebi há poucos dias: ela tem 53 anos de idade, sofre há 23 e há 10 anos não é mais capaz de encontrar um trabalho fixo. “Tratamentos em diversas instituições para doenças dos nervos” não conseguiram possibilitar a ela uma “vida ativa”. Ela espera que com a Psicanálise, sobre a qual leu alguma coisa, possa ser completamente curada. Mas os tratamentos já custaram tanto à sua família que ela não poderá permanecer em Viena mais do que seis semanas ou dois meses. Some-se a isso a dificuldade de que desde o início ela só quer “tornar claras” as coisas por escrito, pois tocar em seus complexos provocaria uma explosão dentro dela ou fazer com que “emudecesse temporariamente”.

[...] na Psicanálise, trata-se sempre de longos períodos de tempo, semestres ou anos inteiros, sempre períodos mais longos do que aqueles esperados pelo paciente. Por isso, temos a obrigação de esclarecer a situação ao paciente, antes que ele decida definitivamente iniciar o tratamento.

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8. Deve-se utilizar o divã

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9. O analista não deve fazer concessões à Regra Fundamental

[...] não podemos impedi-los de lograr dizer algumas frases antes do início da ‘sessão’ ou após o anúncio do seu término, quando se levantam. Assim, eles dividem o tratamento em um segmento oficial, durante o qual geralmente se comportam de modo muito acanhado, e em um segmento ‘aconchegante’, em que podem realmente falar livremente e em que comunicam muitas coisas que eles próprios não consideram parte do tratamento.

O médico não tolera essa divisão por muito tempo, ele aponta o que foi dito antes ou após a sessão e, a partir da utilização desse material na próxima oportunidade, ele acaba por derrubar o muro de separação que o paciente pretendia erguer

Há pacientes que desde as primeiras sessões se preparam com esmero para a narrativa, aparentemente para garantir o melhor aproveitamento do tempo de tratamento. Aquilo que vem travestido de empenho na verdade é resistência.

Por exemplo, irá conversar diariamente com um amigo íntimo sobre o tratamento, inserindo nessa conversa todos os pensamentos que deveriam aflorar na presença do médico. O tratamento, então, terá sofrido um vazamento pelo qual escoa justamente o

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Questão

Em sala de aula estudamos dois importantes artigos sobre a técnica escritos por Freud:

Recomendações ao médico que pratica a psicanálise (1912), e Sobre o início do tratamento (1913). Neles fica evidente que as recomendações estabelecidas por Freud não são de modo algum arbitrárias, ou seja, elas estão intimamente relacionadas ao método da psicanálise (“associação livre” e “atenção flutuante”), e às “resistências”

colocadas pelo paciente contra a aplicação desse método. Selecionei abaixo algumas dessas recomendações estudadas, e gostaria que você tentasse justificar a aplicação de cada uma delas, pensando na sua relação com o “método” e a “resistência”.

a) Deve-se utilizar o divã

b) Não fazer concessões à regra da “associação livre”

c) O paciente deve pagar pela sua sessão, mesmo em caso de falta d) Todo analista deve ter passado também por uma análise

Referências

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