• Nenhum resultado encontrado

A expressão da no português escrito do século XX no contexto dos gêneros textuais

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "A expressão da no português escrito do século XX no contexto dos gêneros textuais"

Copied!
224
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ CENTRO DE HUMANIDADES

DEPARTAMENTO DE LETRAS VERNÁCULAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LINGUÍSTICA

IZABEL LARISSA LUCENA SILVA

A EXPRESSÃO DA EVIDENCIALIDADE NO PORTUGUÊS ESCRITO DO SÉCULO XX NO CONTEXTO DE GÊNEROS TEXTUAIS

(2)

IZABEL LARISSA LUCENA SILVA

A EXPRESSÃO DA EVIDENCIALIDADE NO PORTUGUÊS ESCRITO DO SÉCULO XX NO CONTEXTO DE GÊNEROS TEXTUAIS

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Linguística, da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor em Linguística. Área de concentração: Linguística. Linha de pesquisa: Descrição e Análise Linguística.

Orientadora: Profa. Dra. Márcia Teixeira Nogueira.

(3)

IZABEL LARISSA LUCENA SILVA

A EXPRESSÃO DA EVIDENCIALIDADE NO PORTUGUÊS ESCRITO DO SÉCULO XX NO CONTEXTO DE GÊNEROS TEXTUAIS

Tese apresentada ao Programa de Pós-Gradução em Linguística, da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do grau de Doutor em Linguística, na Área de concentração Linguística. Linha de pesquisa: Descrição e Análise Linguística.

Aprovada em 08/04/2013.

BANCA EXAMINADORA

Profa. Dra. Márcia Teixeira Nogueira (Orientadora - UFC)

Dra. Profa. Vânia Cristina Casseb-Galvão (UFG)

Profa. Dra. Maria Auxiliadora Ferreira Lima (UFPI)

Profa. Dra. Márluce Coan (UFC)

(4)
(5)
(6)

AGRADECIMENTOS

A Deus, por me manter de pé nos momentos de dificuldade. Ao meu esposo, meu maior incentivador. Amor verdadeiro. À minha mãe, pelo exemplo de mulher forte e batalhadora.

Ao meu pai, que, nos últimos meses de redação desta Tese, mostrou-me que a felicidade está nas coisas mais simples da vida.

À minha irmã gêmea, também doutoranda, que compartilhou comigo as dúvidas e as alegrias nesses quatro anos de pesquisa.

Ao meus irmãos, pela força.

À minha companheira de curso, Klébia Enislaine, que, nesses quatros anos, tornou-se uma grande amiga e parceira.

Aos amigos queridos, por compreenderem meus momentos de ausência. À família de meu esposo, pela torcida.

À minha orientadora, Profa. Dra. Márcia Teixeira Nogueira, pela amizade e pelo incentivo durante a realização desta pesquisa.

Ao Prof. Dr. J. Lachlan Mackenzie, pela orientação no Estágio Sanduíche (PDSE) e pela simpatia com que sempre me recebeu no ILTEC.

A todos os meus professores do PPGL, que enriquecerem meu conhecimento em Linguística nesses quatro anos de doutorado.

À Profa. Dra. Márluce Coan, pelas valiosas sugestões e críticas feitas nas leituras deste trabalho.

À Profa. Dra. Vânia Casseb-Galvão, pelas sugestões e críticas dadas na leitura do Projeto desta pesquisa.

À Nadja, pela ajuda com o SPSS e pelas palavras de incentivo.

Ao Bosco e à Ediene, por terem atendido minhas solicitações em relação ao COMTELPO.

Ao Eduardo e à Antônia, pela prontidão com que atenderam minhas solicitações no PPGL.

(7)

“Tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração como para o Senhor e não para os homens.”

(COLOSSENSES 3:23).

“[...] o rigor no estabelecimento de tipologias de modalidade poderia ser flexibilizado em favor de uma interpretação das estratégias argumentativas dos indivíduos usuários de uma língua”.

(8)

RESUMO

(9)

exteriorizando-se como uma unidade Reportativa ou Genericidade. No Nível Representacional, os dados demonstram que, na maioria dos casos, o Falante, ao apresentar a fonte da informação, designa, também, o modo de obtenção dessa informação. No Nível Morfossintático, a Expressão Linguística (composta por duas Orações) e o Sintagma Preposicional constituem os meios mais frequentes de manifestação da evidencialidade. Por fim, os dados sugerem que entre as categorias cognitivo-pragmáticas e a codificação da evidencialidade há um alinhamento, refletido na preferência pela ordem direta do enunciado evidencial, representado, na maior parte das ocorrências, por meio de uma Expressão Linguística construída pela fonte da informação explicitada (lexical ou pronominal), por um verbo de elocução de valor axiológico não marcado (marca Reportativa) e pelo conteúdo asseverado na forma de discurso indireto.

Palavras-Chave: Gramática Discursivo-Funcional. Evidencialidade. Gêneros Textuais.

(10)

ABSTRACT

(11)

source, means also for obtaining this information. At a Morphosyntactic Level, the Linguistic Expression (composed of two clauses) and the prepositional phrase are the most frequent manifestation of evidentiality. Finally, the data suggest that there is an alignment between the cognitive-pragmatic categories and evidentiality codification, reflected in the preference for direct order from the evidential statement, represented at the occurrences through a constructed Linguistic Expression by an explicit source of information (lexical or pronominal), by an unmarked axiological value verb (Report mark) and the content asserted in the form of indirect speech.

(12)

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Modelo de interação verbal segundo a Gramática Funcional... 29

Figura 2 - A GDF como parte de uma teoria de interação verbal... 33

Figura 3 - Esquema geral da GDF... 35

Fgura 4 - Organização do Nível Interpessoal na GDF... 37

Figura 5 - Organização do Nível Representacional na GDF... 40

Figura 6 - Organização do Nível Morfossintático na GDF... 45

Figura 7 - Equacionamento entre modalidade epistêmica e evidencialidade... 59

(13)

LISTA DE QUADROS

(14)

LISTA DE GRÁFICOS

(15)

LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Tipo de evidencialidade em função dos agrupamentos de gêneros

textuais... 127

Tabela 2: Relação: evidencialidade, variação do português e período do século XX... 136

Tabela 3: Tipo de evidencialidade em função da sequência textual... 139

Tabela 4: Tipo de discurso nos agrupamentos textuais... 146

Tabela 5: Tipo de Ilocução... 149

Tabela 6: Função do tipo de evidencialidade nos agrupamentos de gêneros... 154

Tabela 7: Presença de marcas de adesão/afastamento à fonte da informação... 160

Tabela 8: Presença de modalizador epistêmico... 162

Tabela 9: Presença de modalizador epistêmico na sequência textual... 163

Tabela 10: Tipo de fonte e agrupamento de gêneros... 165

Tabela 11: Relação entre fonte e modo de obtenção da informação... 171

Tabela 12: Modo de obtenção: relato... 172

Tabela 13: Modo de obtenção: inferência... 173

Tabela 14: Modo de obtenção: evidência sensorial... 175

Tabela 15: Valor semântico dos verbos de elocução... 176

Tabela 16: Valor semântico de verbo de elocução nos agrupamentos de gêneros.... 178

Tabela 17: Contexto morfossintático de manifestação da evidencialidade... 179

Tabela 18: Relação entre classe de palavra e agrupamentos de gêneros textuais... 188

Tabela 19: A ordenação da marca evidencial no enunciado... 194

(16)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

A1: ato

A: adjetivo ABS: absolutivo Ap: sintagma adjetival Adp: sintagma adposicional Adjvp: sintagma adverbial Adv: advérbio

Aw: palavra adjetival C: conteúdo comunicado Cl: oração, cláusula

dep

Cl: oração dependente COMPL: completivo CNTRL: controle DECL: declarativa Det: determinante e: estado-de-coisas ep: episódio f: propriedade F1: ilocução F: feminino

GDF: Gramática Discursivo-Funcional GF: Gramática Funcional

Gw – palavra gramatical INF: infinitivo

INFERR: inferida l: lugar

Le: expressão linguística m: modo

M: movimento

(17)

p: conteúdo proposicional pI: posição inicial

pM: posição medial pF: posição final

P1: participante (falante) P2: participante (ouvinte) PASS: passado

PFV: perfectivo Pro: pronome q: quantidade r: razão

R: subato referencial

RECEPST: passado recente REP: reportativo

SG: singular t: tempo

T: subato atributivo TOP: tópico

TR: marca de transitividade V: verbo

Vp: sintagma verbal Vw: palavra verbal x: indivíduo Xp: sintagma Xw: palavra

(18)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 20

2 FUNCIONALISMO LINGUÍSTICO... 27

2.1 A Gramática Funcional... 28

2.2 A Gramática Discursivo-Funcional... 32

2.2.1 A arquitetura da Gramática Discursivo-Funcional... 34

2.2.2 Nível Interpessoal... 36

2.2.3 Nível Representacional... 39

2.2.4 Nível Morfossintático... 44

2.3 Síntese conclusiva... 47

3 A EVIDENCIALIDADE... 50

3.1 Estatuto linguístico da evidencialidade... 51

3.2 Estudos tipológicos da evidencialidade... 63

3.3 Evidencialidade na Gramática Discursivo-Funcional... 76

3.4 Tratamento da evidencialidade em língua portuguesa... 84

3.5 Síntese conclusiva... 98

4 METODOLOGIA... 100

4.1 Características do COMTELPO... 100

4.1.1 Agrupamentos de gêneros... 102

4.2Constituição e delimitação da amostra textual da pesquisa... 107

4.3 Procedimentos metodológicos gerais da pesquisa... 108

4.3.1 Categorias de análise... 109

4.3.1.1Tipo de evidencialidade... 110

4.3.1.2Categorias contextuais... 111

4.3.1.3Categorias do Nível Retórico-Textual... 112

4.3.1.4Categorias do Nível Interpessoal... 113

4.3.1.5Categorias do Nível Representacional... 115

4.3.1.6Categorias do Nível Morfossintático... 116

4.4 Síntese conclusiva... 119

5 A EVIDENCIALIDADE NO PORTUGUÊS ESCRITO DO SÉCULO XX NO CONTEXTO DE GÊNEROS TEXTUAIS... 121

(19)

5.1.1 A evidencialidade na totalidade da amostra textual... 122

5.1.2 A evidencialidade nos agrupamentos dos gêneros textuais... 127

5.1.3 A relação entre evidencialidade, variação do português e período do século XX... 135

5.2Categorias do Nível Retórico-Textual... 138

5.2.1 A relação entre evidencialidade e sequência textual... 138

5.2.2 Tipo de discurso enquadrando a fala reportada... 145

5.3 Categorias do Nível Interpessoal... 148

5.3.1 Tipo de ilocução... 149

5.3.2 Função dos tipos de evidencialidade... 152

5.3.3 Marcas de adesão/afastamento à fonte da informação... 159

5.3.4 A relação com a modalidade epistêmica... 161

5.4 Categorias do Nível Representacional... 164

5.4.1 Tipo de fonte da informação... 164

5.4.2 Modo de obtenção da informação... 170

5.4.3 Valor semântico do verbo de elocução... 176

5.5 Categorias do Nível Morfossintático... 178

5.5.1 Contexto morfossintático de manifestação da evidencialidade... 178

5.5.2 Classe morfológica da marca evidencial... 187

5.5.3 Ordenação da marca evidencial no enunciado... 194

5.6 Síntese conclusiva... 198

6. CONCLUSÃO... 201

7. REFERÊNCIAS... 211

(20)

1 INTRODUÇÃO

A evidencialidade é definida como uma categoria linguística indicadora da fonte da informação. Seus efeitos de sentido estão relacionados a duas funções. A primeira função (mais básica) diz respeito à noção de que, a partir da fonte da informação, o falante revela o modo de obtenção dessa informação. A segunda, secundária em relação à primeira, está ligada ao efeito de que, a depender do tipo de fonte da informação, o falante demostra também seu grau de comprometimento em relação ao conteúdo expresso na proposição.

No tocante à sua manifestação linguística, a evidencialidade pode ser expressa por elementos gramaticais (afixos, por exemplo) ou por elementos lexicais ou menos gramaticais (verbos encaixadores de conteúdo proposicional, por exemplo). Em sistemas evidenciais gramaticais, o uso da marca evidencial constitui um requisito obrigatório do enunciado, cabendo ao falante apenas escolher entre os tipos de fontes disponíveis no sistema. Por outro lado, em sistemas evidenciais lexicais (ou menos gramaticais), como é o caso do português, o uso da evidencialidade não é obrigatório. Como a expressão lexical é opcional, ou seja, cabe ao falante, de acordo com suas intenções comunicativas, revelar ou não a qualidade da fonte da informação, sua manifestação contém nuanças semânticas que os paradigmas gramaticais não apresentam, uma vez que têm sua expressão condicionada por fatores internos ao sistema. Na verdade, em sistemas evidenciais lexicais, a fonte da informação é utilizada apenas quando o falante julga haver uma boa razão para seu uso, ou seja, está relacionada a uma máxima conversacional de Grice (1975) segundo a qual uma informação é fornecida porque é relevante para a interação verbal (máxima da relevância).

No que diz respeito à classificação dos tipos evidenciais expressos nas línguas naturais, de modo geral, em sistemas evidenciais mais gramaticalizados, verificam-se, pelo menos, três tipos de evidências: a direta (visual ou não-visual – o falante é a fonte e afirma ter obtido a informação de modo direto por meio sensorial), a menos direta (o falante é a fonte e afirma ter derivado a informação por meio de uma inferência – de resultados ou de raciocínio lógico) e a indireta (o falante não é a fonte, mas outro, e afirma ter obtido a informação por meio de um relato de 2ª ou 3ª mão) (WILLET, 1988; CASSEB-GALVÃO, 2001).

(21)

fazer a distinção apenas entre evidência direta (“de primeira mão”) e evidência indireta (“não de primeira mão”). Ainda no caso de sistemas evidenciais essencialmente lexicais, ressaltamos que a evidencialidade direta parece constituir a forma não marcada de manifestação da fonte da informação, tal como propõe Anderson (1986), quando constata que os evidenciais são raramente usados quando o falante observa diretamente o evento; apenas em sentido enfático.

De fato, independentemente da discussão sobre as restrições de codificação gramatical ou lexical da evidencialidade, hoje, muitos estudiosos afirmam ser a natureza da evidencialidade um fenômeno cognitivo, comunicativo-funcional ou pragmático (BOYE; HADER, 2009). Tal concepção lança a hipótese de que todas as línguas naturais apresentam formas de manifestação ou referência à fonte da informação (“estratégias evidenciais”), colocando a evidencialidade como um domínio cognitivo -funcional sujeito à codificação gramatical e/ou lexical. Além disso, tal acepção sugere que a fonte da informação constitui um domínio cognitivo-funcional não apenas conceitualmente independente, mas também hierarquicamente superior à modalidade epistêmica, qualificação a partir da qual o falante expressa os julgamentos que faz sobre o conteúdo de seus anunciados.

No âmbito da língua portuguesa, os estudos sobre a evidencialidade se organizam, genericamente, em torno de dois grandes objetivos: (i) aqueles que visam a analisar a expressão lexical da evidencialidade em contextos reais de uso da língua (DALL’AGLIO-HATTNHER, 1999; CARIOCA, 2005, 2009; LUCENA, 2008; SANTOS, 2008; VENDRAME, 2005, 2010); (ii) aqueles que objetivam analisar o processo de gramaticalização envolvido no uso de certas unidades evidenciais, adotando, na investigação desse processo, um ponto de vista sincrônico (CASSEB-GALVÃO, 2001) ou sincrônico-diacrônico (GONÇALVES, 2003).

Os estudos do primeiro grupo, resguardadas suas especificidades, embora tenham enriquecido fortemente o quadro teórico de investigação das propriedades formais e funcionais da expressão lexical da evidencialidade em língua portuguesa, limitam-se ora à análise da fonte da informação em um contexto específico de uso da língua, ora à investigação de certas unidades lexicais que se prestam à manifestação da evidencialidade em língua portuguesa (por exemplo, itens verbais).

(22)

deve-se ao fato de terem lançado a hipótese de que, no português brasileiro (PB), pode estar em constituição um subsistema evidencial gramaticalizado, representado, principalmente, pelos usos evidenciais dos operadores funcionais dizque (CASSEB-GALVÃO, 2001, 2010) e parecer (GONÇALVES, 2003). Embora constituam propostas de investigação pioneiras sobre o processo de gramaticalização envolvendo marcadores evidenciais no PB, os dados desses trabalhos não esgotam a discussão em torno desse tema, ao contrário, incitam a realização de mais pesquisas que busquem comprovar empiricamente tal hipótese.

Tendo em vista, portanto, esse cenário atual da pesquisa sobre a evidencialidade no PB, propomos como objetivo geral desta Tese descrever e analisar, sob a perspectiva funcionalista, a manifestação da evidencialidade no português escrito do século XX no contexto de gêneros textuais (da ordem do narrar, do relatar, do argumentar, do expor e do prescrever ou instruir). Considerando o pressuposto de que as escolhas realizadas no plano linguístico são fortemente condicionadas (controladas, nos termos de Van Dijk, 2012) por fatores de natureza contextual (como o gênero textual), acreditamos que uma investigação da evidencialidade em cinco diferentes agrupamentos de gêneros textuais permite compor um quadro mais amplo dos usos das marcas evidenciais e de suas funções no português escrito do século XX, promovendo, assim, uma análise mais completa da manifestação da evidencialidade em correlação com as propriedades cognitivas e discursivas específicas de cada agrupamento de gêneros. Na verdade, esse tratamento da evidencialidade em diferentes contextos de gêneros textuais autoriza não apenas uma identificação mais precisa das formas, dos tipos e dos sentidos das construções evidenciais no português escrito do século XX, mas consente, principalmente, a elaboração de “gramáticas evidenciais” que demonstrem as preferências relativas a cada dimensão textual-discursiva.

(23)

propriedades que caracterizam esse domínio funcional.

Para a efetivação dessa proposta de investigação da evidencialidade, utilizamos amostras textuais pertencentes ao Corpus Mínimo de Textos Escritos da Língua

Portuguesa – COMTELPO, organizado por Figueiredo-Gomes e Pena-Ferreira (2006).

Esse banco de dados é constituído por textos agrupados em cinco categorias de gêneros textuais, segundo a classificação proposta por Dolz; Schneuwly (1996), a saber: gêneros da ordem do narrar (domínio social da cultural literária ficcional), do relatar (domínio social da memória e da documentação das experiências vividas), do argumentar (domínio social da discussão de temas controversos), do expor (domínio social da sistematização do conhecimento humano em diferentes áreas do saber) e do instruir ou prescrever (domínio social da instrução, da normatização, da prescrição ou regulamentação de ações). Ressaltamos, ainda, que essa coletânea é composta por gêneros do século XII ao século XX, produzidos em Portugal e no Brasil. Na presente pesquisa, utilizamos textos elaborados, especificamente, durante o século XX em Portugal e no Brasil. Tal recorte metodológico se justifica porque visamos a verificar as possíveis diferenças existentes entre os sistemas evidenciais do português europeu (PE) e brasileiro (PB), um vez que é no final do século XIX e no início do XX que o PB passa por transformações estruturais que não acontecem no PE1.

Para o estudo da evidencialidade no contexto de gêneros textuais, optamos por uma abordagem teórico-metodológica que considere as unidades linguísticas como configurações de aspectos cognitivos e pragmáticos, reafirmando, assim, uma relação não arbitrária, mas sistemática entre as funções das expressões linguísticas e seu contexto de uso. Esse requisito é preenchido pelo Paradigma Funcionalista, mais especificamente pelos modelos da Gramática Funcional (GF - DIK, 1997) e da Gramática Discursivo-Funcional (GDF – HENGEVELD; MACKENZIE, 2008).

A opção pela orientação funcionalista se justifica pelo fato de que o modelo de gramática proposto pela GDF permite dar conta de fenômenos lexicais e/ou gramaticais, correlacionando as propriedades semântico-pragmáticas, morfossintáticas e fonológicas das unidades linguísticas a níveis e camadas que explicitam o escopo de atuação da

1 Segundo Ilari; Basso (2009), o final do século XIX e o início do XX são particularmente importantes

para a história do português do Brasil. Esse período é marcado não só por uma série de eventos que

afetam a língua “de fora para dentro”, mas por importantes transformações estruturais, tais como: (i) omissão do objeto direto quando ele consiste em um pronome átono (“comprei um livro e li”), (ii) prevalência de uso do sujeito pronominal (“eu fiz”), (iii) prevalência de uso de orações relativas

cortadoras ou copiadoras (“a colega que eu saí ontem”, “a colega que saí ontem com ela”), (iv)

(24)

unidade evidencial em termos de suas funções interpessoais ou representacionais. Levando em conta, portanto, o objetivo de fornecer uma análise mais completa da expressão da evidencialidade e de suas funções interpessoais e representacionais em correlação com diferentes contextos comunicativos, a presente pesquisa formula o seguinte problema geral:

 Como se manifesta a evidencialidade no português escrito do século XX no contexto2 de gêneros textuais (da ordem do narrar, do relatar, do argumentar, do expor e do prescrever)?

Considerando que a evidencialidade constitui uma estratégia cognitivo-pragmática responsável pela manifestação da fonte da informação ou do modo de obtenção de uma informação, o que está, indiretamente, relacionado ao grau de comprometimento do falante com o conteúdo expresso na proposição; e que o domínio textual-discursivo reflete opções significativas realizadas no plano linguístico, sustentamos a hipótese de que a manifestação da evidencialidade no português escrito do século XX caracteriza-se por propriedades sintáticas, semânticas e pragmáticas condicionadas por fatores cognitivos, funcionais e composicionais inerentes aos cinco agrupamentos de gêneros textuais nos quais as marcas evidenciais são utilizadas.

Partindo, então, da definição desse objeto, a presente pesquisa estabelece como objetivos os que se seguem:

a) Descrever os meios linguísticos (lexicais, gramaticais ou em processo de gramaticalização), integradamente a aspectos semânticos e pragmático-discursivos, que se prestam à manifestação da evidencialidade no português escrito do século XX no contexto de gêneros textuais.

b) Analisar a correlação entre fonte da informação e modo de obtenção da informação na manifestação da evidencialidade no português escrito do século XX no contexto de gêneros textuais.

c) Analisar os tipos de expedientes linguísticos e/ou contextuais que marcam os

2 A menção ao termo contexto demonstra, na verdade, nossa consciência de que os gêneros textuais são

(25)

graus de comprometimento do falante na manifestação da evidencialidade no português escrito do século XX no contexto de gêneros textuais.

d) Analisar, comparativamente, os cinco agrupamentos de gêneros textuais de modo a identificar as formas mais frequentes, ou seja, preferíveis, relacionadas aos agrupamentos de gêneros textuais.

e) Analisar os agrupamentos de gêneros mais favoráveis à manifestação da evidencialidade.

f) Analisar os fatores contextuais que condicionam a manifestação dos subtipos evidenciais e seus efeitos de sentido nos agrupamentos de gêneros textuais.

No tocante à estruturação das informações nesta Tese, ela está organizada nos seguintes capítulos:

O capítulo 1, esta Introdução, tem como finalidade apresentar uma visão geral do tema investigado nesta pesquisa, ressaltando-se o objeto de estudo, a perspectiva teórica adotada, a justificativa que explica a relevância da pesquisa, seu problema geral e seus objetivos.

O capítulo 2 trata do suporte teórico funcionalista, mais especificamente dos modelos teóricos da Gramática Funcional, de Dik (1997), e da Gramática Discursivo-Funcional, de Hengeveld; Mackenzie (2008), destacando-se os principais pressupostos teórico-metodológicos para a descrição e análise linguística da evidencialidade neste trabalho.

O capítulo 3 versa sobre a evidencialidade, apresentando, inicialmente, uma discussão em torno de seu estatuto linguístico e sua relação com a modalidade epistêmica. Em seguida, apresentamos uma síntese dos principais estudos tipológicos realizados sobre a evidencialidade em várias línguas do mundo. Depois, expomos a classificação proposta pela Gramática Discursivo-Funcional para o estudo da evidencialidade. Por fim, resumimos os principais estudos funcionalistas sobre a evidencialidade em língua portuguesa.

(26)

possamos compreender melhor como o contexto de produção linguística condiciona o uso da evidencialidade.

O capítulo 5 versa sobre os resultados obtidos a partir da análise dos dados coletados em cada um dos agrupamentos de gêneros textuais. Nele, expomos e discutimos os resultados com base nos dados quantitativos sugeridos pelo programa computacional SPSS (Statistical Package for the Social Sciences), descrevendo e analisando a evidencialidade na construção dos agrupamentos de gêneros textuais.

(27)

CAPÍTULO 2

FUNCIONALISMO LINGUÍSTICO

“Numa concepção geral, desvinculada de propostas de escolas particulares, o funcionalismo é uma teoria que se liga, acima de tudo, aos fins a que servem as unidades linguísticas, o que é o mesmo que dizer que o funcionalismo se ocupa, exatamente, das funções dos meios linguísticos de expressão” (NEVES, 2006, p. 17).

O termo funcionalismo é utilizado para designar um paradigma de investigação linguística. Embora possamos destacar a existência de diferentes vertentes funcionalistas3, podemos dizer que os diferentes modelos compartilham um “denominador em comum”: o interesse por investigar a gramática das línguas dentro de um quadro geral de interação verbal (propósito comunicativo, seus participantes, contexto social), o que leva o funcionalismo a priorizar a análise das funções4 das unidades linguísticas sobre seus aspectos estritamente formais.

O presente estudo adota como suporte teórico para a descrição e análise da manifestação da evidencialidade no português escrito do século XX em contextos de gêneros textuais o chamado funcionalismo holandês, especificamente o modelo teórico

da Gramática Funcional (GF - DIK, 1997) e o da Gramática Discursivo-Funcional

3

A pesquisa de orientação funcionalista pode seguir diferentes modelos teóricos. Segundo Nichols (1984), há o funcionalismo conservador, que aponta a inadequação da análise formalista, sem, contudo, propor uma análise funcionalista da estrutura linguística; existe o moderado, que indica as inadequações das propostas estritamente formais e propõe uma análise funcionalista; e o chamado funcionalismo extremado, que nega a própria estrutura, considerando as regras das línguas naturais como funções decorrentes do uso ou da pressão do discurso.

4 De acordo com Nichols (1984), o termo “função” concerne a algum tipo de dependência de um

(28)

(GDF – HENGEVELD; MACKENZIE, 2008).

Apesar de constituírem modelos teóricos autônomos, a GF e a GDF compartilham muitos pressupostos. Um de seus principais objetivos é compreender como a estrutura morfossintática das línguas naturais reflete propriedades pragmáticas e semânticas originadas na cognição humana e na comunicação inter-humana (HENGEVELD; MACKENZIE, 2010). Em outras palavras, a GF e a GDF interessam-se, particularmente, por fenômenos linguísticos funcionalmente motivados, como correlatos cognitivos e/ou discursivos.

Podemos dizer, ainda, que o funcionalismo holandês constitui-se de propostas teórico-metodológicas que se encontram a meio caminho das abordagens formais radicais, que se limitam ao estudo das formas linguísticas independentes de seu contexto de uso e consideram a estrutura das unidades linguísticas como a idealização de um conjunto de regras subjacentes, e a meio caminho das abordagens funcionais radicais, que tendem a negar a existência da estrutura linguística e vê-la apenas como a manifestação efêmera da tentativa do falante em expressar suas intenções comunicativas (BUTLER, 2003).

Para subsidiar a descrição e a análise da manifestação da evidencialidade neste estudo, apresentamos, a seguir, uma síntese da teoria da GF e da GDF. Nas seções 2.1 e 2.2, resenhamos, respectivamente, os principais pressupostos teórico-metodológicos que definem a investigação linguística sob o enfoque da GF e da GDF, procurando apontar, na seção 2.2, os principais avanços alcançados pelo modelo da GDF em relação ao da GF. Na seção 2.3, apresentamos uma síntese conclusiva.

2.1 A Gramática Funcional

Na Gramática Funcional de Simon Dik, o usuário assume papel central, pois o objetivo da investigação linguística é explicitar como falantes e ouvintes se comunicam entre si, de modo eficiente, por meio da expressão linguística (DIK, 1989, 1997). Para Dik, a descrição funcionalista da linguagem deve considerar não apenas a capacidade linguística dos indivíduos, ou seja, a capacidade que as pessoas têm de codificar e decodificar expressões linguísticas em sua língua, mas também de usar e interpretar essas expressões de uma maneira interacionalmente satisfatória (competência

comunicativa).

(29)

usuários de língua, Dik aponta que a Gramática Funcional visa a investigar as relações entre as unidades linguísticas e as capacidades epistêmica, lógica, perceptual e social. Para Dik, em uma interação verbal, as pessoas são capazes de construir, manter e explorar uma base de conhecimento organizado (capacidade epistêmica); de empregar regras de raciocínio para extrair novos conhecimentos a partir de conhecimentos prévios

(capacidade lógica); de perceber o ambiente e dele derivar conhecimento (capacidade

perceptual); e de usar a linguagem de acordo com a situação de interação (capacidade

social).

Essas capacidades, segundo Dik, não funcionam de modo isolado, mas em conjunto, produzindo, assim, cada uma, um output fundamental para a produção e a interpretação da linguagem. Ressaltamos, ainda, que, ao enfatizar a competência comunicativa e não apenas a linguística, Dik demonstra o fato de que o entendimento (ou o desentendimento) entre os indivíduos nas interações sociais não depende apenas dos sentidos que são codificados pelas expressões linguísticas, mas, também, está relacionado aos conteúdos socialmente compartilhados entre falante e ouvinte (que não precisam ser explicitados), às informações que podem ser inferidas ou percebidas nos gestos, olhares, expressões faciais.

Para Dik, um paradigma funcionalista compreende a língua não como um conjunto de expressões linguísticas arbitrárias que podem ser estudadas fora do contexto de uso, mas como um instrumento de interação social entre os seres humanos, usado com a intenção de estabelecer, primeiramente, interações comunicativas. Esse processo de interação que se dá por meio da linguagem é ilustrado por Dik (1997, p. 8) da seguinte maneira:

Figura 1: Modelo de interação verbal segundo a Gramática Funcional

(30)

Segundo Dik, os seres humanos estabelecem interações visando a provocar algum tipo de modificação na informação pragmática do destinatário. A informação pragmática é compreendida como o conjunto de conhecimentos, crenças, suposições, opiniões e sentimentos que tanto o falante como o ouvinte dispõem (e ativam) no ato da interação verbal. Para alcançar a modificação pretendida na informação pragmática do ouvinte, o falante, então, constrói sua expressão linguística tendo em vista uma intenção comunicativa, uma espécie de “plano mental” concernente à modificação que ele deseja provocar na informação pragmática do ouvinte, e que, por sua vez, é elaborada com base na antecipação que o falante faz da interpretação que o ouvinte dará a sua expressão linguística. O ouvinte, por seu turno, interpreta o propósito comunicativo do falante com base na expressão linguística, na informação pragmática que possui e na hipótese que faz a respeito da intenção comunicativa do falante.

Já a expressão linguística é vista, na perspectiva do modelo de interação de Dik, como mediadora, no sentido de que ela relaciona, como uma “ponte”, a intenção comunicativa do falante e a interpretação dada pelo ouvinte a essa intenção. Em outras palavras, o que Dik deseja ressaltar é que, do ponto de vista do falante, a expressão linguística não corresponde à verbalização direta de sua intenção comunicativa, e, do ponto de vista do ouvinte, essa expressão não é a única “ferramenta” disponível ao ouvinte para interpretar a intenção comunicativa do falante.

Resumidamente, podemos dizer que, nesse modelo de interação, a expressão linguística é função: (i) da intenção comunicativa do falante; (ii) da informação pragmática do falante; (iii) da antecipação que ele faz da interpretação do ouvinte. E a interpretação do ouvinte é função: (i) da expressão linguística; (ii) da informação pragmática do ouvinte; (iii) da sua conjectura sobre a intenção comunicativa do falante (NEVES, 2001, p. 20).

Na formulação da GF, Dik define a interação verbal como uma atividade

cooperativa, porque envolve, no mínimo, dois participantes (falante e ouvinte); e

altamente estruturada por dois sistemas de regras: o que comanda os padrões de interação verbal (regras pragmáticas) e o que governa a constituição dos enunciados

(regras semânticas, sintáticas, morfológicas e fonológicas).

Outro aspecto importante da GF diz respeito à proposta de integração dos níveis

de análise, ou seja, da existência de uma sistematização entre os domínios da sintaxe, da

(31)

instrumental em relação à pragmática, e a sintaxe, instrumental em relação à semântica. Ao colocar o componente pragmático como o mais abrangente da teoria (a pragmática interna à gramática), dentro do qual a semântica e a sintaxe devem ser estudadas, Dik mostra a relevância do contexto comunicativo para a interpretação das unidades linguísticas, superando, assim, o problema metodológico que muitas teorias linguísticas encontram ao desconsiderar o papel do contexto social na interação verbal.

Em relação à descrição linguística, Dik propõe que a estrutura oracional seja analisada em camadas hierarquicamente ordenadas. Nos níveis mais subjacentes (baixos), a oração representa um estado-de-coisas que é entendido como algo que pode ocorrer em um dado mundo real ou ficcional (função representacional). No nível acima, a oração designa uma proposição que é definida como um “conteúdo proposicional”, um “fato possível”, que, revestida de uma força ilocucionária, corresponde, em um nível mais externo (alto), a uma cláusula, um ato de fala (função interpessoal). Essa representação em camadas pode ser visualizada no quadro 1 a seguir:

Quadro 1: Camadas da estrutura frasal segundo a Gramática Funcional Unidade

Estrutural

Tipo de Entidade Nível Função

Cláusula Ato de fala 4 Interpessoal

Proposição Fato Possível 3

Predicação Estado-de-Coisas 2

Termo Entidade 1 Representacional

Predicado Propriedade/relação Ø

Fonte: Adaptado de DIK (1989, p. 46).

Como podemos observar no quadro 1, a construção de uma expressão linguística pressupõe um predicado que se aplica a um certo número de termos, resultando em uma

predicação. Os predicados designam propriedades ou relações, os termos são

(32)

Uma predicação pode ser construída em uma estrutura de ordem superior denominada proposição. Segundo Dik, tal unidade pode ser motivo de dúvida, de surpresa, pode ser negada, lembrada ou, ainda, ser considerada falsa ou verdadeira.

Uma proposição, revestida por uma força ilocucionária, corresponde, como já dissemos, a uma cláusula (frase), que designa um ato de fala especificado pela proposição. A forma, a ordem e o padrão entonacional dos constituintes desse nível são determinados pelo sistema de regras de expressão da língua em questão.

Essa representação da estrutura oracional em camadas tem uma vantagem: possibilita distinguir o escopo de atuação dos operadores gramaticais e satélites lexicais, inclusive, em relação aos diferentes tipos de modalidade (categoria mais ampla dentro da qual a evidencialidade está inserida no modelo da GF).

Destacamos, no entanto, que essa representação bottom-up (ascendente) da estrutura oracional proposta pela GF não diz respeito à representação da produção do discurso, pois, como vimos, no modelo de interação de Dik, a expressão linguística, como mediadora, é função da intenção comunicativa do falante, que, por sua vez, interage visando a provocar uma modificação na informação pragmática do ouvinte.

2.2 A Gramática Discursivo-Funcional

A Gramática Discursivo-Funcional (GDF) se distingue de outras teorias funcionalistas por um conjunto de características essenciais. De modo geral, podemos dizer que a GDF: (i) tem uma organização top-down (descendente); (ii) toma o Ato

Discursivo como unidade básica de análise; (iii) inclui as representações morfológicas e

fonológicas como representações de propriedades pragmáticas e semânticas do Ato Discursivo; (iv) como é concebida como um Componente Gramatical de uma teoria de interação verbal, liga-se, sistematicamente, a um Componente Conceitual, a um

Componente Contextual e a um Componente de Saída (de Expressão). A seguir,

apresentamos cada um desses pressupostos.

(33)

“espelhar” evidências psicolinguísticas em relação à produção da linguagem pelos indivíduos, já que pesquisas mostram que a produção linguística é um processo top-down, ou seja, inicia-se com a intenção comunicativa do falante e termina com a articulação da expressão linguística (LEVELT, 1989). Ressaltamos, ainda, que os autores esclarecem que a GDF não é uma gramática do discurso; muito menos um modelo de descrição da organização do discurso, mas é, em sua essência, um modelo de gramática que procura compreender como as intenções comunicativas e as conceitualizações cognitivas interferem na codificação da expressão linguística.

Na figura 2, a seguir, podemos visualizar como o modelo top-down da GDF insere o componente gramatical em uma teoria mais ampla de interação verbal, relacionando esse componente gramatical aos componentes não gramaticais. Nessa perspectiva, duas operações têm de ser distinguidas na organização top-down dos enunciados: a operação de Formulação e a de Codificação. Tais operações interagem entre si e com os Componentes Conceitual, Contextual e de Saída:

Figura 2: A GDF como parte de uma teoria de interação verbal

Fonte: Traduzido de HENGEVELD; MACKENZIE (2008, p. 06).

(34)

relevantes nas línguas, e a operação de Codificação relaciona-se à forma morfossintática e fonológica que as configurações semânticas e pragmáticas realizam nas línguas (HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 12).

O Componente Conceitual representa o conhecimento prévio do falante, tal

como sua competência comunicativa, seu conhecimento de mundo e sua competência linguística. Segundo Hengeveld; Mackenzie (2008, p. 06), é responsável tanto pelo desenvolvimento da intenção comunicativa do falante como pelas conceitualizações associadas a eventos extralinguísticos relevantes. Para esses autores, o Componente Conceitual não inclui cada aspecto da cognição humana, mas apenas aqueles que afetam a intenção comunicativa imediata do falante. É, segundo os autores, a “força motriz” por trás do Componente Gramatical, que, como já dissemos, é motivado, condicionado pela intenção comunicativa do falante. A ligação entre o Componente Conceitual e o Gramatical é feita por meio da operação de Formulação, responsável por traduzir configurações conceituais em distinções semânticas e pragmáticas relevantes em uma língua. De acordo com os autores, tal distinção varia de uma língua para outra.

O Componente Contextual relaciona-se ao contexto comunicativo no qual o

falante desenvolve sua expressão linguística. Diz respeito não apenas às informações deriváveis do discurso precedente (informação de curto prazo), mas também às informações socioculturais relevantes do contexto de interação verbal (informação de longo prazo) que afetam a expressão linguística. Em outros termos, podemos dizer que tal componente armazena dois tipos de informações: informações linguísticas necessárias para o desenvolvimento dos enunciados e informações não linguísticas sobre a situação comunicativa que condicionam as escolhas de determinados mecanismos linguísticos.

No que diz respeito ao Componente de Saída, este é responsável por converter a informação fonológica em sinais acústicos, gráficos ou visuais.

2.2.1 A arquitetura da Gramática Discursivo-Funcional

(35)

Componente Contextual, à direita, e o Componente de Saída, na parte inferior. As setas representam a perspectiva descendente da GDF, as elipses contêm as operações, os quadros, à esquerda, contêm os primitivos usados nas operações, e os retângulos contêm os níveis de representação produzidos pelas operações.

Figura 3: Esquema geral da GDF

Fonte: Adaptado de HENGEVELD; MACKENZIE (2008, p. 13).

No Componente Gramatical, distinguem-se os níveis Interpessoal (Pragmático), Representacional (Semântico), Morfossintático e Fonológico, nesta ordem hierárquica. A estratificação descendente e a separação desses níveis são diferenças importantes com relação à proposta de Dik. Ao contrário do modelo da GF, que é um modelo ascendente

(bottom-up), em que a descrição da expressão linguística vai das unidades menores às

(36)

uma estratificação descendente (top-down). Em outros termos, nesse modelo, a geração de estruturas subjacentes e, particularmente, as interfaces entre os vários níveis, pode ser descrita em correlação com as decisões comunicativas que um falante toma quando constrói um enunciado.

Embora a GDF estabeleça uma separação entre os níveis, isso não significa dizer que eles sejam autônomos; ao contrário, regras de mapeamento ligam o Nível Interpessoal ao Representacional nos casos em que um conteúdo semântico é necessário para transmitir uma intenção comunicativa. Nos casos em que só um conteúdo pragmático tem de ser transmitido, regras de expressão ligam diretamente o Nível Interpessoal ao Morfossintático.

Segundo Hengeveld; Mackenzie (2008), a GDF capta as estruturas das unidades linguísticas em termos do mundo que elas descrevem (função representacional) e das intenções comunicativas com as quais elas são produzidas (função interpessoal). Ao organizar a gramática dessa forma, a GDF postula que a Pragmática governa a Semântica; a Pragmática e a Semântica governam a Morfossintaxe; e a Pragmática, a Semântica e a Morfossintaxe governam a Fonologia.

Vejamos, a seguir, cada um dos níveis de organização da gramática e suas unidades de análise.

2.2.2 Nível Interpessoal

O Nível Interpessoal representa uma expressão linguística em termos de sua função comunicativa. Diz respeito às distinções de Formulação que são relevantes na interação comunicativa entre o falante e o ouvinte e que são refletidas na forma linguística. A unidade de análise hierarquicamente mais alta no Nível Interpessoal é o Move (M), que pode conter um ou mais Atos Discursivos (A)5. Cada Ato Discursivo contém uma Ilocução (F), que especifica uma relação entre o ato de fala dos Participantes (P1 - falante; P2 – ouvinte) e o Conteúdo

Comunicado (C). O Conteúdo Comunicado, por sua vez, contém um número variável de

Subatos Atributivos (T) e Subatos Referenciais (R). Devemos notar que essas duas

últimas unidades atuam na mesma camada, não havendo uma relação hierárquica entre elas (relação de equipolência, representada por meio de colchetes).

5

(37)

Segundo Hengeveld; Mackenzie (2008, p. 49), o Nível Interpessoal pode ser representado da seguinte forma:

Figura 4: Organização do Nível Interpessoal na GDF

Fonte: Adaptado de HENGEVELD; MACKENZIE (2008, p. 49).

Para a GDF, o Move é a maior unidade de interação relevante para a análise gramatical. É definido como sendo uma contribuição autônoma para iniciar a interação e constitui a menor unidade livre de discurso capaz de entrar em uma estrutura de troca. Caracteriza-se como uma unidade que pode ser uma ação (ato ilocutório) ou uma reação a uma ação (ato perlocutório).

Hengeveld; Mackenzie (2008) explicam que um Move pode ser composto por um ou mais Atos Discursivos, os quais, por seu turno, são definidos como a menor unidade identificável de conduta comunicativa. Quando o Move é constituído por dois ou mais Atos Discursivos, os Atos podem estar em uma relação de equipolência, quando o Falante dá estatuto comunicativo igual aos dois Atos; ou de dependência, quando o falante dá estatuto comunicativo desigual aos dois Atos.

Vejamos, no exemplo (1), a seguir, a diferença entre Move e Ato Discursivo:

(1)A: O que aconteceu ontem no Scottish Premier League? (M1, A1)6 B: O Celtic ganhou. (A1) E o Rangers perdeu. (A2) (M2)

Em um único Move de Reação (B), há dois Atos que estão em uma relação de

6

A: What happened yesterday in the Scottish Premier League?

(38)

equipolência. Por outro lado, o exemplo (2), a seguir, ilustra uma relação de dependência entre dois Atos. Tal relação é indicada como uma função retórica no Ato Discursivo dependente, que constitui a motivação que levou o Falante a proferir o primeiro Ato:

(2)A: Tome cuidado (A1), pois vai haver pegadinhas na prova (A2). (M1) 7

Como dissemos anteriormente, diferentemente da GF, que estabelece como unidade básica de análise a frase, a GDF estabelece o Ato Discursivo como unidade básica para a descrição linguística, visando a uma expansão do modelo - de uma gramática da frase para uma gramática orientada para o discurso. Essa expansão, segundos os autores, justifica-se pelas seguintes razões: primeiramente, há muitos fenômenos linguísticos que só podem ser explicados em termos de unidades maiores que a frase em si mesma, tais como formas verbais narrativas, partículas discursivas, cadeias anafóricas etc. Além disso, o Ato Discursivo permite analisar, por outro lado, expressões linguísticas que são menores do que a frase, mas que funcionam como enunciados completos e independentes no discurso.

No que tange à sua estruturação, o Ato Discursivo pode ser constituído de: Ilocução, Participante(s) e Conteúdo Comunicado.

A Ilocução é uma das formas de representar as intenções comunicativas do

falante, indicando o uso interpessoal convencionalizado dos Atos Discursivos. A ilocução pode ser representada tanto por uma unidade lexical (por exemplo, um verbo performativo, do tipo I promise/Eu prometo ou I inform/Eu informo) como também por uma unidade abstrata (“performativos implícitos”), que envolve a escolha de uma Ilocução pronta, frequentemente chamada, segundo os autores, de “sentença-tipo”. Há uma variedade de forças ilocucionárias, tais como: Declarativa, Interrogativa, Imperativa, Proibitiva, Optativa, Imprecativa, Exortativa, Comissiva, Admoestativa, Suplicativa, Mirativa (HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 71-72).

No que diz respeito aos Participantes da interação ((P1) e (P2)), podemos dizer que eles se alternam como Falante e Ouvinte. Segundo os autores, suas referências podem ser feitas por meio de vocativos, pronomes de primeira ou de segunda pessoa.

O Conteúdo Comunicado contém a totalidade do que o Falante deseja evocar na

7

(39)

sua comunicação com o Ouvinte. Cada Conteúdo Comunicado pode apresentar um ou mais Subatos, os quais, por sua vez, podem ser de dois tipos: Subatos Atributivos (T) e

Subatos Referenciais (R). É por meio dos Subatos Atributivos que o Falante evoca

propriedades ou relações e por meio dos Subatos Referenciais que o Falante evoca referentes.

Vejamos, a seguir, o exemplo (3) que demonstra como essas unidades do Nível Interpessoal são analisadas em conjunto:

(3) Jonh estava na festa8.

Em (3), há um Move (M1) que contém um Ato Discursivo (A1) com uma força ilocucionária Declarativa (DECL). Os Participantes P1 e P2 não são especificados na situação por meio de pronomes de 1ª e 2ª pessoas, mas estão presentes na situação, pois uma Ilocução Declarativa é comunicativa (de conteúdo). O Conteúdo Comunicado (C) contém, por sua vez, dois Subatos: um Subato Atributivo9 (T1), expresso pelo verbo

estar, preenchido por meio da seleção de um item lexical no Nível Representacional; e

um Subato Referencial (R1 – Jonh), que é preenchido apenas no Nível Interpessoal (e não no Representacional), visto que constitui um nome próprio, sem conteúdo semântico. Nesse caso, o referente é marcado pelo operador “+id” como identificável pelo Ouvinte; ou seja, em (3), o Falante assume que o Ouvinte pode identificar tal referente. Por último, o termo na festa é indicado no Nível Representacional como uma entidade designada como Lugar.

2.2.3 Nível Representacional

De acordo com Hengeveld; Mackenzie (2008), o Nível Representacional está relacionado aos aspectos semânticos das unidades linguísticas. O termo “semântico” deve ser entendido de duas formas distintas, segundo os autores: (i) como o modo pelo qual as línguas se relacionam com o mundo que descrevem e (ii) como o significado de unidades semânticas lexicais e de unidade semânticas complexas sem levar em consideração a maneira pela qual essas unidades são utilizadas na comunicação

(40)

(HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 128-129).

As unidades de análise do Nível Representacional são descritas em relação ao tipo de entidade ou categoria semântica ontológica que elas designam, por isso, neste nível, as unidades referem-se à função de designação (e não de evocação, que ocorre no Nível Interpessoal). Aos três tipos de categorias estabelecidos por Lyons (1977), Hengeveld; Mackenzie (2008, p. 131) acrescentam uma categoria de ordem mais baixa, a Propriedade (p), propondo quatro categorias semânticas básicas, a saber: indivíduo (x) – entidade de primeira ordem, que pode ser localizada no espaço e pode ser avaliada em termos de sua existência; Estado-de-Coisas (e) – entidade de segunda ordem, que pode ser localizada no espaço e no tempo e pode ser avaliada em termos de sua realidade; Conteúdo Proposicional (p) – entidade de terceira ordem, que constitui um construto mental, não podendo ser localizada nem no espaço nem no tempo, mas em termos de seu valor verdade; Propriedade (f) – entidade que não tem existência independente e pode ser caracterizada em termos de sua aplicabilidade. Além dessas categorias semânticas básicas, Hengeveld; Mackenzie (2008, p. 135) afirmam que há línguas que dispõem de outros tipos de categorias semânticas, tais como: Episódio (ep), Lugar (l), Tempo (t), Modo (m), Quantidade (q) e Razão (r).

Vejamos, a seguir, como elas estão organizadas na estrutura hierárquica do Nível Representacional:

Figura 5: Organização do Nível Representacional na GDF

Fonte: Adaptado de HENGEVELD; MACKENZIE (2008, p. 140).

O Conteúdo Proposicional (p) é a unidade hierarquicamente mais alta do Nível

(41)

e desejos, podendo ser factuais, quando correspondem a conhecimentos ou crenças sobre o mundo real, ou não factuais, quando correspondem a desejos ou expectativas em relação a um mundo imaginário (HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 144). Ressaltamos, também, que o Conteúdo Proposicional pode ser caracterizado em termos de atitudes proposicionais (certeza, dúvida, descrença) e/ou em termos de sua fonte ou origem (conhecimento comum partilhado, evidências sensoriais, inferência). A principal diferença entre o Conteúdo Proposicional (p) e o Conteúdo Comunicado (C) é o fato de que este sempre está relacionado ao Falante, enquanto aquele pode ser atribuído a outras pessoas que não sejam o Falante. O exemplo (4), abaixo, atesta essa distinção:

(4) Jennyacredita que sua mãe iria visitá-la10.

Em (4), o complemento do verbo acreditar constitui um Conteúdo Proposicional, que se manifesta na forma de uma oração finita [(que) sua mãe iria

visitá-la]. Nesse caso, o Conteúdo Proposicional da oração encaixada é inferido com

base no conhecimento que Jenny tem sobre os hábitos de sua mãe (o fato de, por exemplo, sua mãe sempre visitá-la no final do ano). Por outro lado, o exemplo (5), a seguir, caracteriza-se como um Conteúdo Comunicado em termos de sua natureza reportativa: o falante reporta, em seu próprio Ato Discursivo, um Conteúdo Comunicado obtido de uma fonte externa a ele:

(5) De acordo com John, a mãe de Jenny irá visitá -la11.

O Conteúdo Proposicional podem conter Episódios (ep). Tais unidades consistem de um ou mais Estados-de-Coisas tematicamente coerentes, que possuem unidade ou continuidade de Tempo (t), Lugar (l) e Indivíduos (x). Os Estados-de-Coisas (e), por sua vez, são entidades que dizem respeito a eventos e estados que podem ser localizados em tempo relativo e podem ser avaliados em termos de sua realidade. A diferença entre Episódios e Estado-de-Coisas consiste no fato de que o Episódio caracteriza-se por modificadores de tempo absoluto (como yesterday/ontem, today/hoje,

tomorrow/amanhã etc.), e a categoria Estado-de-Coisas (estados, eventos) relaciona-se a

modificadores de tempo relativo (como after lunch/depois do almoço, in two hours/em

10

Jenny believed that her mother would visit her (HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 144).

(42)

duas horas, moday/segunda-feira etc.), tal como podemos verificar no exemplo (6) a seguir:

(6) Ontem Sheila saiu antes do jantar12.

O modificador de tempo absoluto ontem situa temporalmente tanto o Estado-de-Coisas Sheila saiu quanto o Estado-de-Coisas jantar, formando, assim, um único Episódio. Nesse contexto, o modificador antes, por outro lado, especifica a relação temporal relativa entre os dois Estados-de-Coisas: sair e jantar.

O Indivíduo (x) designa entidades concretas. Tais entidades, por sua vez,

ocupam um lugar no espaço, de tal modo que dois Indivíduos não podem ocupar o mesmo lugar. As Propriedades (f) são categorias semânticas que não têm existência independente, podendo ser avaliadas apenas em termos de sua aplicabilidade. Assumem um papel fundamental no Nível Representacional, pois podem ocorrer nas representações semânticas de todas as unidades desse nível. Ressaltamos que podem ser de dois tipos: Propriedades Lexicais e Propriedades Configuracionais. A seguir, apresentamos um exemplo dado por Hengeveld; Mackenzie (2008, p. 216) que ilustra o primeiro tipo de Propriedades, as Lexicais:

(7) Uma casa antiga (f1) e uma moderna (f2)13.

As Propriedades Configuracionais, por seu turno, correspondem ao inventário

de esquemas de predicação relevantes em uma língua e que são igualmente relevantes na construção de representações semânticas. A aplicação de uma Propriedade Configuracional pode ser observada na representação semântica do exemplo (8), a seguir, em que é possível verificar como uma entidade de primeira ordem e uma de zero ordem podem entrar na construção de uma predicação:

(8) Sheila (x) está doente (f)14.

O Estado-de-Coisas pode, ainda, ser caracterizado em termos de Propriedades

12 Sheila went out before dinner (HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 171). 13

Una casa antigua y una moderna (HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 171).

(43)

Configuracionais Aspectuais. Tais operadores podem codificar as fases envolvidas no desenvolvimento de um Estado-de-Coisas (aspecto progressivo, resultativo etc.) e a (in)completude do desenvolvimento de um Estado-de-Coisas (oposição Perfectivo e Imperfectivo). Os Lugares (l), tal como os Indivíduos (x), são entidades concretas, tangíveis. Tanto substantivos como advérbios e até orações podem indicar lugares, tais como: “I live in this home/Moro nesta casa”, It isvery cold here/Aqui é muito frio”, “I like where you hung that picture/Gosto do local onde você pendurou este quadro”.

A categoria semântica Tempo (t) diz respeito aos diversos tipos de expressões de tempo: às ligadas ao momento da fala (como today/hoje, next year/no próximo ano), às que estabelecem pontos relativos na linha do tempo (como before friday/antes de

sexta-feira), às que se relacionam a um calendário socialmente estabelecido (como

Wednesday Carnival/Quarta-feira de Carnaval, Christmas day/dia de Natal), às que

identificam um ponto na linha do tempo (como moment/momento, at 2 o’clock/às 14

horas) e às que indicam um período na linha do tempo (como period/período,

april/abril) (cf. HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 257). A categoria semântica

Modo (m) está relacionada a expressões linguísticas que designam a maneira como um Estado-de-Coisas acontece (como Mary dance beautifully/Maria dança lindamente).

A categoria semântica Quantidade (q) designa quantias de fenômenos incontáveis e números de fenômenos contáveis (HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 268) (como em Mary eats a large amount of cheese/Maria comeu uma grande

quantidade de queijo). Por último, a categoria semântica Razão (r) especifica, de acordo

com Hengeveld; Mackenzie (2008, p.272), um tipo especial de Conteúdo Proposicional que representa os pensamentos que orientam ou conduzem um agente humano a agir de uma determinada maneira. Segundo Hengeveld; Mackenzie (2008, p. 272), o item why do Inglês exemplifica a existência dessa categoria.

(44)

nível de análise não estão no escopo deste estudo da expressão da evidencialidade no Português.

2.2.4 Nível Morfossintático

O Nível Morfossintático está relacionado à operação de Codificação. Por meio dessa operação, o Nível Morfossintático, que apresenta suas próprias unidades de análise, é responsável por receber informações pragmáticas e semânticas relevantes, respectivamente, disponíveis nos níveis Interpessoal e Representacional, e organizá-las em uma única representação estrutural, que será, em seguida, convertida em uma estrutura fonológica no Nível Fonológico. Como podemos observar, o Nível Morfossintático é “alimentado” pelos níveis Interpessoal e Representacional, funcionando como input para o Nível Fonológico, que, por seu turno, fornece input ao Componente de Saída (output), onde acontece a articulação.

Face a essa relação entre os níveis Interpessoal e Representacional e o Nível Morfossintático, muito do que ocorre no Nível Morfossintático é motivado, sendo governado por três princípios básicos: (i) Iconicidade; (ii) Integridade do Domínio; (iii) Estabilidade Funcional.

A Iconicidade relaciona-se aos níveis mais altos, como a ordenação dos Estados-de-Coisas, que estão ligados à experiência física e mental dos indivíduos. A Integridade refere-se à preferência por unidades que, juntas nos dois primeiros níveis, podem ser justapostas umas às outras no Nível Morfossintático. Por último, a Estabilidade Funcional diz respeito ao fato de que os constituintes com a mesma especificação sejam colocados na mesma posição em relação às outras categorias (HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p 284 - 286).

(45)

Figura 6: Organização do Nível Morfossintático na GDF

Fonte: Adaptado de HENGEVELD; MACKENZIE (2008, p. 219).

No nível morfossintático, a unidade linguística é analisada em termos de sua composição sintática e morfológica, não havendo uma distinção rígida entre esses dois aspectos, uma vez que os princípios utilizados na formação de palavras são os mesmos para a formação de frases e orações. No Nível Morfossintático, a descrição linguística é feita com base nas seguintes unidades hierarquicamente ordenadas: Expressão Linguística (Le), Oração (Cl)15, Sintagma (Xp) e Palavra (Xw). Ainda, conforme Hengeveld; Mackenzie (2008, p. 291 - 292), podemos distinguir, dentro de cada Palavra, Morfemas (Xs) e Afixos (Aff).

Uma Expressão Linguística (Le) é definida como qualquer conjunto de, pelo

menos, uma unidade morfossintática, podendo ser composta por Orações, Sintagmas e Palavras. Ao introduzir a Expressão Linguística como a categoria hierarquicamente mais alta no Nível Morfossintático, a GDF cria a possibilidade de lidar com expressões linguísticas não apenas oracionais, mas também não oracionais, sem um núcleo verbal.

Esclarecemos, ainda, que as unidades que compõem a Expressão Linguística podem apresentar uma relação de dependência ou não, tais como: dependência mútua entre orações e sintagmas (relação de equiordenação), dependência de uma unidade apenas (relação de cossubordinação - entre orações - e relação de extraoracionalidade – entre sintagmas), não dependência (relação de coordenação – entre orações – e relação de enumeração – entre palavras).

A Oração (Cl) é considerada pelos autores como uma categoria universal no que

diz respeito à estrutura morfossintática. É definida como um agrupamento de um ou

(46)

mais Sintagmas, e possivelmente Palavras, caracterizado por um padrão para a ordenação dos Sintagmas (ordenação Sujeito-Verbo-Objeto, ou Sujeito-Objeto-Verbo, ou Verbo-Sujeito-Objeto, por exemplo) e por expressões morfológicas de conexão (como concordância e regência, por exemplo).

O Sintagma (Xp) se caracteriza por ter um núcleo (item lexical) que é

transmitido a partir do Nível Interpessoal ou do Nível Representacional ao Nível Morfossintático. Entre os tipos de Sintagmas, os autores destacam: o Sintagma Verbal (Vp), o Sintagma Nominal (Np), o Sintagma Adjetival (Ap), o Sintagma Adverbial (Advp) e o Sintagma Adposicional (Adp). Ainda de acordo com os autores, não há uma correspondência biunívoca necessária entre os tipos de Sintagmas e as classes de lexemas correspondentes em uma dada língua. É possível que uma língua tenha uma classe de lexemas altamente flexível, podendo ter uma variedade de tipos de Sintagmas.

A Palavra (Xw) pode ter uma estrutura morfossintática altamente complexa,

especialmente em línguas polissintéticas. Pode ser composta por Morfemas (Xm), como também pode, exatamente como qualquer outra camada de análise morfossintática, encaixar camadas superiores, como Sintagmas e Orações.

Ressaltamos, ainda, que o “mapeamento” entre as unidades do Nível Interpessoal e do Nível Representacional no Nível Morfossintático se dá com base em três tipos de Alinhamento: (i) alinhamento interpessoal: a organização morfossintática reflete a organização do Nível Interpessoal, em termos das funções pragmáticas (Tópico, Foco etc.) e das propriedades referenciais das unidades linguísticas (definitude, especificidade etc.); (ii) alinhamento representacional: a organização morfossintática reflete a organização do Nível Representacional, no que diz respeito às funções semânticas (Ator, Beneficiário etc.) e à designação delas (animacidade, pessoa etc.); (iii) alinhamento morfossintático: a organização morfossintática tem sua própria estruturação em termos das funções sintáticas (Sujeito, Objeto) e da complexidade dos constituintes (Palavras, Sintagmas, Orações), não sendo um “espelho fiel” da organização do Nível Interpessoal ou do Nível Representacional (HENGEVELD; MACKENZIE, 2008, p. 317).

(47)

razão de sua complexidade estrutural. O exemplo (9), a seguir, demonstra isso:

(9) É uma pena que ele tenha ido embora16.

Lembramos que, como o Nível Morfossintático pode refletir unidades dos níveis Interpessoal e Representacional, as orações subordinadas são classificadas, no Nível Morfossintático, em termos das camadas interpessoais ou representacionais. Assim, uma oração subordinada pode corresponder a Moves, Atos Discursivos, Conteúdos Comunicados (Nível Interpessoal) ou a Conteúdos Proposicionais, a Episódios, a Estado-de-Coisas (Nível Representacional).

No que diz respeito às relações internas da oração, a marcação de pessoa, por exemplo, pode ser feita, segundo os autores, por meio de referência cruzada (quando a marcação de pessoa no verbo é suficiente) e de concordância (quando a marcação de pessoa é expressa por uma unidade livre, lexical ou pronominal).

A seguir, apresentamos uma síntese conclusiva que resume os aspectos mais importantes abordados neste capítulo.

2.3 Síntese conclusiva

Neste capítulo, apresentamos os principais pressupostos teórico-metodológicos da Gramática Funcional de Simon Dik (GF - 1989, 1997) e da Gramática Discursivo-Funcional de Hengeveld; Mackenzie (GDF - 2008). De modo geral, sob tais perspectivas funcionalistas, a análise linguística é orientada para a correlação entre estrutura linguística e aspectos cognitivo-discursivos.

Mostramos que, embora tais propostas compartilhem alguns aspectos teóricos importantes, a GF e a GDF são modelos de gramática independentes. Podemos afirmar que a GDF representa um avanço significativo em relação à GF, uma vez que considera o discurso na gramática da língua, englobando, na análise, tanto as unidades menores quanto as unidades maiores que a oração.

Frisamos, também, que a GDF, por ser um modelo tipológico-funcional, procura desenvolver uma análise linguística baseada em um quadro mais amplo de interação verbal. Isso fica evidente na correlação que os autores fazem entre o Componente

Imagem

Figura 1: Modelo de interação verbal segundo a Gramática Funcional
Figura 2: A GDF como parte de uma teoria de interação verbal
Figura 3: Esquema geral da GDF
Figura 4: Organização do Nível Interpessoal na GDF
+7

Referências

Documentos relacionados

A avaliação da atual matriz produtiva do território Sul Sergipano com o uso de indicadores dará elementos para a construção de um estilo de produção familiar de base ecológica,

De acordo com estes resultados, e dada a reduzida explicitação, e exploração, das relações que se estabelecem entre a ciência, a tecnologia, a sociedade e o ambiente, conclui-se

Após extração do óleo da polpa, foram avaliados alguns dos principais parâmetros de qualidade utilizados para o azeite de oliva: índice de acidez e de peróxidos, além

Não houve um aumento significativo da resistência a compressão da mistura (MTA+Lignina) quando comparada com os resultados do MTA Angelus na mesma metodologia, isso se

Percebe que as ferramentas da qualidade e da metodologia Lean Seis Sigma, associadas corretamente à cada etapa do DMAIC podem trazer ganhos expressivos para as mais variadas áreas

Quanto às suas desvantagens, com este modelo, não é possível o aluno rever perguntas ou imagens sendo o tempo de visualização e de resposta fixo e limitado;

Estudos sobre privação de sono sugerem que neurônios da área pré-óptica lateral e do núcleo pré-óptico lateral se- jam também responsáveis pelos mecanismos que regulam o

Como parte de uma composição musi- cal integral, o recorte pode ser feito de modo a ser reconheci- do como parte da composição (por exemplo, quando a trilha apresenta um intérprete