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DataGramaZero - Revista de Ciência da Informação - v.9 n.6 dez/08 ARTIGO 03

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DataGramaZero - Revista de Ciência da Informação - v.9 n.6 dez/08 ARTIGO 03

Análise de pesquisas sobre o comportamento informacional de decisores sob o ponto de vista da cognição situada

Analysis of the researches about the informational behavior of decision makers from the point of view of situated cognition

por Mônica Erichsen Nassif

Resumo: Este artigo apresenta os resultados iniciais de uma pesquisa que analisa os estudos sobre o comportamento informacional de decisores, usuários da informação em organizações, do ponto de vista da cognição situada. A pesquisa tem como objetivo analisar, as teses e dissertações defendidas da linha de pesquisa em gestão da informação e do conhecimento junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação – PPGCI da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Com base nos resultados e nos aspectos teóricos da cognição situada, aponta caminhos, até então pouco explorados, para os estudos sobre os usuários e decisores na área de gestão da informação e do conhecimento.

Palavras-chave: Gestão da informação e do conhecimento; Usuário da informação; Cognição situada; Decisor.

Abstract: This text presents the results of a research that analyse the studies about the informational behavior of decision makers, from the point of view of the situated cognition. The research analised the thesis and dissertations in information and knowledge management of the Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação – PPGCI da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. The results to point out questions for the researches about decision makers/users in information and knowledge

management.

Keywords: Information and knowledge management; Cognitive science; User information, Decision maker.

Introdução

As primeiras discussões que modelaram as ciências cognitivas enquanto campo de conhecimento pautaram-se pelo objetivo de descobrir mecanismos neurais subjacentes aos fenômenos mentais e expressá-los em linguagem matemática. Isso à época, significava criar uma ciência exata da mente e modelizar os mecanismos neurais, à semelhança do computador.

Nesse contexto, a informação – considerada como objeto que pode ser estocado, codificado e representado - existia no mundo real, bastando ser captada (no sentido de ser coletada) pelo nossos órgãos sensoriais, devidamente representada através de símbolos (a linguagem, considerada como um sistema de símbolos), que ficariam armazenados nas memórias primária ou secundária do cérebro, para posterior processamento (manipulação de símbolos). Essa informação processada poderia alterar o estado de conhecimento do sujeito (e.g., alterando suas estruturas mentais), aumentando-o, e o processo de conhecer se encerraria com a geração de uma saída na forma de uma ação no mundo.

O conhecimento é, então, considerado como toda alteração da estrutura mental do indivíduo, que gera uma mudança no seu comportamento, resultante do processamento da informação. Além disso, essa alteração do conhecimento tem como objetivo resolver problemas relacionados a uma ausência de conhecimento sobre algo. O processo de conhecer algo é visto, ou modelado, como um processo de "resolução de problemas” que, obviamente, é o que um computador faz. Assim sendo, da mesma forma como se pode estabelecer e programar técnicas para resolver problemas num computador (e.g., jogar xadrez), pode-se fazer o mesmo com o ser humano, tudo que é necessário é construir um modelo da situação problema e buscar um algoritmo que a solucione, tudo isto, analiticamente, racionalmente.

Essas são as idéias acerca da cognição humana que se entranharam na ciência da informação, e nela persistem ainda hoje, bastando, para reconhecê-las, observar a literatura da área. Essas questões já foram tratadas em Borges (2002), Borges (2004), Nassif, Venâncio e Henrique (2007) mas cabe, aqui, fazer algumas reflexões sobre essas influências, analisando-se o que alguns autores, tais como Le Coadic ( 1994),

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Brookes (1980), Allen (1991) e outros dizem acerca da informação e do conhecimento, no âmbito da ciência da informação, embasados, ainda que de forma “inconsciente” nas teorias cognitivas tradicionais.

A relação que Brookes ( 1980, p. 131)) estabelece entre informação e conhecimento é claramente definida com base na idéia de que o conhecimento é uma alteração da estrutura mental de um sujeito, resultante do processamento da informação. “What is the relation between information and knowledge? I regard knowledge as a structure of concepts linked by their relations and information as a small part of such a structure.” Em sua conhecida “equação fundamental”, o autor afirma que a estrutura de conhecimento é transformada em nova estrutura, pela informação.

Em seu artigo de revisão, Allen (1991) mostra que alguns autores como Saracevic, Wettler e Glockner-Rist tratam da relação entre usuário e intermediários tendo, subjacente, a idéia de informação como subsídio para a resolução de problemas de necessidade de informação. Dessa forma, o conhecimento é obtido pela informação, no sentido de se buscar uma solução para algo que se desconhece.No que se refere à

informação, à linguagem e à transmissão da informação, Le Coadic (1994, p. 5) afirma que:

“informação é um conhecimento inscrito (gravado) sob a forma escrita (impressa ou numérica), oral ou audiovisual. A informação comporta um elemento de sentido. É um significado transmitido a um ser consciente por meio de uma mensagem inscrita em um suporte espacial-temporal: impresso, sinal elétrico, onda sonora, etc. essa inscrição é feita graças a um sistema de signos (a linguagem), signo este que é um elemento da linguagem que associa um significante a um significado: signo alfabético, palavra, sinal de pontuação”

Nesse trecho, que pauta toda a discussão do autor sobre a ciência da informação, estão subjacentes as idéias de informação como um objeto passível de ser captado do mundo real, representada através da linguagem, esta considerada como um sistema de símbolos que pode ser transmitido de um indivíduo para outro. Não há como negar que essa concepção sobre o conhecer humano é dominante no meio científico e não somente na ciência da informação, por estar embasado em uma concepção de mundo cartesiana e nos princípios da física newtoniana. Entretanto, estudos contemporâneos sobre o tema têm tomado outros rumos. As mudanças de pontos de vista a respeito do conhecer humano tiveram origem nos anos 60 do século XX com os estudos sobre os sistemas auto-organizados, tendo como pano de fundo concepções filosóficas e científicas relacionadas a uma visão sistêmica.

Além disso, resultados de pesquisas sobre o funcionamento do cérebro conseguiram demonstrar que o conhecer humano é muito mais complexo do que se conhecia nos anos em que se consolidaram as ciências cognitivas, principalmente no que se refere aos aspectos relacionados à memória (Izquierdo, 2004), às emoções (Maturana, 1995, Damásio, 1996), à linguagem (Maturana, 1995, Clancey, 1997 ) e à consciência ( Edelman & Tonomi, 2000, Damásio, 2000).

Os usuários da informação sob a perspectiva cognitiva

A abordagem cognitiva contemporânea estabelece um novo paradigma denominado “cognição situada” e, também, “mente incorporada”, “ecologia da mente”, “enative view” , que vem sendo crescentemente utilizado na construção de sistemas inteligentes. Além disso, as concepções acerca dos conceitos de informação e de conhecimento mudam bastante nessa perspectiva.

Essa concepção cognitiva considera o processo do conhecer como uma dinâmica individual e social ao mesmo tempo. O indivíduo, definido como um ser que possui uma estrutura determinada pela sua história coletiva como espécie humana e pela sua história individual no experienciar cotidiano, só consolida o processo de conhecer no nível individual e na sua interação congruente no meio, ou seja, nos vários

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domínios, ou grupos sociais, nos quais transita (família, trabalho, grupos de amigos, etc). Há que se considerar as duas instâncias – a individual e a social – como uma dinâmica complementar, para se referir ao processo de conhecer.

Uma questão fundamental nessas discussões diz respeito ao fato de que cada sujeito cognoscente é um observador que, portanto, estabelece “seu mundo” ao longo da suas interações no meio, ou seja, nos vários domínios de ação pelos quais transita. Dessa forma, não existe o mundo objetivo da concepção tradicional sobre a cognição. Isso significa que o ser humano não cria representações “do mundo”, mas vive nele, numa dinâmica de interações sujeito e meio. Não há, então, símbolos que representam o mundo objetivo, mas, sim, o viver experiencialmente no meio. Nesse processo, o conhecer ocorre a todo instante e não somente para se resolver problemas, tal como também preconizado pelas teorias tradicionais sobre a cognição humana.

Portanto, o conhecimento não é obtido. Conhecimento significa conduta adequada em um meio relacional, no qual cada comportamento é um ato cognitivo. Quem pode dizer se alguém conhece algo é um

observador, o qual avalia se a conduta apresentada por alguém é adequada numa certa dinâmica situacional. Informação é um construto, ou seja, é a perturbação do meio ou do indivíduo – de qualquer natureza – determinada como “informação”, ou não, pela estrutura do sistema, do sujeito ou do meio. Assim, não existe o fenômeno da transmissão da informação, pois ela perde o seu caráter objetivo, de algo que pode ser estocado, codificado e representado. Desta forma, a determinação do que seja “informação” só pode se dar nos níveis individual e social ao mesmo tempo e não somente em uma das duas dimensões.

De um modo geral, os estudos sobre necessidades, demandas e uso de informação procuram investigar como indivíduos obtêm, processam e usam informação, como buscam informação sobre algo, que tipos de fontes lhes são importantes e como as utilizam, e para que usam determinada informação. Esses aspectos

levantados têm como objetivo saber que tipo de problemas os usuários procuram solucionar através do uso de determinada informação.

Nesses estudos, encontram-se subjacentes os princípios das abordagens tradicionais sobre a cognição humana, nas quais o sujeito (usuário) é um ser que recebe informação do meio externo que lhe modifica as estruturas próprias de conhecimento. A informação, tomada como algo objetivo, e recebida pelo usuário, permite a ele resolver gaps de conhecimento sobre algo. Além disso, esses estudos consideram a informação como algo que pode ser estocado, processado e transmitido e o conhecimento como algo que é obtido para se resolver um problema relacionado a uma ausência de conhecimento sobre algo. Essas questões são discutidas com maiores detalhes por Borges (2006).

Na perspectiva cognitiva contemporânea, que abrange aspectos de funcionamento do cérebro, de comportamento, de linguagem, de história, é possível considerarem-se os usuários e os sistemas de informação não como estruturas dissociadas, tal como quer Choo (1998). Ao contrário, os sistemas de informação passam a ser “um sistema social”, inserido na ação do usuário, contextualizado, ou melhor, situacionalizado.

Desse ponto de vista, os usuários da informação são seres humanos individuais e sociais, que vivem uma deriva de experiências pessoais e intransferíveis, ao mesmo tempo em que vivem em contínua interação com outros indivíduos. Nesse viver cotidiano, os usuários de informação vivem em domínios de ação (empresa, família, lazer, amigos, etc), fazendo parte de diferentes redes de relações e interações. Cada domínio de ação pelos quais transitam possibilita aos indivíduos estabelecerem redes de relações e interações que, embora distintas, influenciam as suas condutas no meio, a sua linguagem e as suas pré-disposições em determinarem ou não algo como informação.

Além disso, ainda que os usuários da informação experienciem relações e interações sociais, vivem ao mesmo tempo experiências individuais. Isto significa que, mesmo participando de domínios de ação que influenciem o seu comportamento, há condutas que são exclusivas de cada um que devem também ser

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consideradas, se observarmos os sujeitos como usuários da informação.

A perspectiva cognitiva contemporânea oferece a possibilidade de considerarmos não somente os aspectos que são levados em conta pelos estudos de usuários, que têm, subjacentes, os princípios cognitivos

tradicionais, mas outras questões também importantes e provavelmente mais difíceis de serem observadas. É importante considerar as condutas (rotina de trabalho, hábitos, etc) dos indivíduos no domínio de ação, ou contexto social, ou ainda, situação específica em que estão sendo observados (escola, trabalho, família); os contatos que estabelecem no cotidiano e como e porque eles ocorrem; as pré-disposições e interesses relacionados ao domínio de ação no qual estão sendo observados (assuntos relacionados, publicações específicas, etc) e a pré-disposição para utilizar os recursos de informação que podem ser pertinentes para um contexto ou situação específica.

As pesquisas sob o comportamento informacional de decisores:o olhar cognitivo

Na perspectiva de Choo (1998), os gerentes são usuários especiais da informação, pois utilizam-na para criar conhecimento, formar sentido sobre o ambiente e para a tomada de decisão. Além dessa perspectiva, o autor ainda especifica algumas características desses gerentes no que se refere ao seu fazer no ambiente

organizacional e a relação dessas tarefas com o uso que fazem da informação.Tais características serão apresentadas a seguir.

Nas organizações, os gerentes são sujeitos que, a todo momento, tomam decisões e, para que isso seja viável, desenvolvem um conhecimento especializado sobre o negócio no qual atuam. Ao longo do tempo, combinam seus conhecimentos sobre as competências da organização e as exigências do mercado, tendo em vista atingir as metas e os objetivos organizacionais.

Monitoram e disseminam informação dentro e entre unidades da organização, na medida em que negociam com subordinados, superiores, outros gerentes, outras unidades de trabalho e pessoas externas à

organização. Todo esse fazer tem como base principal administrar conflitos e encontrar soluções para a resolução de problemas, procurando encontrar respostas que otimizem a execução das atividades da organização.

No que se refere especificamente ao uso da informação, a ação dos gerentes sempre prevalece quando a informação disponível é incompleta ou ambígua. Quando utilizam informação, os gerentes optam por aquela que lhe apresente alternativas, ou a melhor alternativa, para a resolução de problemas. Sendo assim,

requerem informação objetiva e detalhada, oriundas de um número restrito de fontes de informação, dando preferência ao contato face-a-face.

Além dessa abordagem de Choo (1998), historicamente, a literatura sobre gestão da informação tem registrado resultados de pesquisas a respeito do comportamento de gestores com relação à busca e uso da informação para subsidiar atividades organizacionais. Isso se verifica na literatura internacional e em pesquisas nacionais ligadas às áreas da administração e ciência da informação, no que se refere à gestão da informação e gestão do conhecimento. Com o objetivo de se analisar como se tem observado

comportamento informacional de decisores, propõe-se a análise de estudos já realizados, relacionados, inicialmente à gestão da informação e do conhecimento.

Como base para o início de uma pesquisa mais ampla, foram analisadas, inicialmente, teses e dissertações defendidas no Programa de Pós-Graduação da Escola de Ciência da Informação – PPGCI da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, especificamente da linha de pesquisa em Gestão da Informação e do Conhecimento. As pesquisas selecionadas foram aquelas cujo tema central fosse analisar como gerentes buscam e usam informação, seja sobre a própria organização, seja sobre o seu respectivo ambiente externo. Foram analisadas 33 dissertações e 05 teses, defendidas entre 1994 e 2007, que tratavam do tema e

apresentavam, como resultado, o que se pode chamar de estudo de usuário, desenvolvido em ambientes organizacionais, sobre seus respectivos gestores. Os objetivos de cada pesquisa não serão relatados aqui, no sentido de resguardar os pesquisadores, uma vez que não temos a intenção de fazer uma crítica à pesquisa, mas, sim, analisá-la do ponto de vista cognitivo.

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Em cada trabalho, foram analisadas todas as partes constituintes da pesquisa, com exceção da revisão da literatura. Sendo assim, foram analisados o problema da pesquisa, os objetivos, aspectos metodológicos e resultados finais. Cada dissertação e tese foi analisada da perspectiva da cognição situada, cujos princípios já foram expostos anteriormente nesse artigo, sendo importante se destacar que elementos dessa abordagem cognitiva são considerados preponderantes para esta pesquisa, tais como: o ambiente organizacional, as atividades desenvolvidas pelo decisor, as relações estabelecidas por ele no ambiente organizacional, possíveis demonstrações de envolvimento emocional, aspectos motivacionais relacionados às decisões ou ambiente organizacional do decisor e a relação dessas questões com a busca ou uso da informação. O que se observa nas pesquisas é que elas têm uma tendência a apresentar uma descrição do ambiente no qual os gestores atuam, seja ele uma organização ou uma área específica de atuação. Porém, as atividades desenvolvidas pelos gestores estudados são pouco descritas, havendo uma tendência a se apresentar apenas os respectivos cargos, a idade, o tempo de atuação na organização ou na área. Esses aspectos estão

presentes nos estudos de usuários tradicionais.

No que se refere à questão sobre a informação, as pesquisas procuram compreender o comportamento dos gerentes numa perspectiva processual, ou, como apresentamos na exposição teórica, numa perspectiva mecanicista. São observados os modos como os gerentes buscam e usam informação no ambiente organizacional sem, contudo, haver uma análise das atividades desses gestores de uma forma mais aprofundada. A Informação é tratada do ponto de vista da perspectiva cognitiva tradicional, objeto dissociado da conduta e do meio dos gestores, tal como definida por Le Coadic (1994).

Segundo Concha; Dreckmann; Mpodozis (1997), cada indivíduo, como membro de uma organização, preenche o papel característico de sua posição e se relaciona com outros indivíduos em um meio de interação particular. A definição de uma posição para um indivíduo, na organização, delimita o seu escopo de ação, os tipos de relações, tanto hierárquicas quanto horizontais, com outras posições na organização. Isso é pouco considerado nas pesquisas analisadas.

Outro aspecto observado nas pesquisas diz respeito à dualidade das mesmas. Na perspectiva dos

pesquisadores, eles distinguem os indivíduos num ambiente específico – organização ou setor da economia – fazem uma exposição e uma análise sobre os mesmos, mas, ao final, apresentam conclusões que nos levam a uma perspectiva do próprio ambiente, e não mais dos sujeitos no ambiente. Essa questão é importante, pois, na construção de serviços e produtos de informação que tenham como fim subsidiar o uso da informação em contextos de decisão, sujeito e ambiente não podem ser vistos como lados estanques, ou complementares, mas devem ser observados numa perspectiva ecológica.

Essa ausência da perspectiva holística impossibilita a observação das relações e interações que os sujeitos estabelecem e mantêm no ambiente estudado. Nem mesmo a história de relações que os indivíduos

estabeleceram ao longo do tempo em que se encontram no ambiente em questão é possível analisar. Além disso, as motivações dos gestores para certas atividades, ou, mesmo, uma análise do sentido que as

atividades e as relações com o ambiente de atuação podem fazer para os atores das pesquisas, não são, muitas vezes, nem sequer mencionados.

Os autores Concha, Dreckmann, Mpodozis (1997) afirmam, ainda, que as características do comportamento dos membros de uma organização são o resultado da dinâmica de interações estabelecidas por esses

membros e dependem de como eles participam da rede de relações e de interações dessa organização. As práticas conversacionais dos membros de uma organização determinam o alcance de possíveis ações, com respeito a atividades concretas e à coordenação dessas, mas, também, delimitam o espaço emocional que caracteriza o desempenho dos integrantes e o escopo de argumentos que serão usados para explicar e justificar problemas diários e mudanças na organização.

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Enfim, toda a perspectiva e análise das pesquisas traz, subjacente, uma transposição das teorias sobre a cognição humana para as organizações: se as pessoas conhecem por receberem e processarem informação em suas mentes, tal como as máquinas, então as organizações também são assim, pois são constituídas por pessoas! Essa associação indivíduo/organização dá às organizações propriedades antropomórficas, cujas bases teóricas me matéria de cognição originam-se de abordagens tradicionais da cognição.

Apesar de, no âmbito da gestão da informação e do conhecimento, haver a necessidade de se estudar os decisores, nas pesquisas, diz-se observar os sujeitos das organizações na tentativa de se apresentar um comportamento informacional das próprias organizações. Esquecemo-nos, muitas vezes, de que as

estruturas de informação que definimos e sugerimos como resultados de nossos estudos são utilizados pelos membros das organizações.

De uma certa forma, criamos uma dualidade, pois ora falamos do nível do sujeito, ora falamos do nível da organização. É possível que parte das dificuldades, ao discutirmos sobre informação e sobre conhecimento no âmbito da gestão da informação e do conhecimento, decorre dessas questões.

Sob o ponto de vista de Von Krogh e Roos (1995), no nível organizacional, o conhecimento dos membros de uma organização se faz como um conjunto particular de normas e distinções dependentes das interações individuais com várias partes do que o sujeito distingue como a organização, em tempo e local variados. O que um sujeito sabe sobre uma organização jamais é sabido por outro da mesma forma, mas existem percepções similares acerca de aspectos específicos da organização.

A linguagem e o conhecimento que constituem uma organização caracterizam-se por contínua mudança. É preciso ressaltar que, apesar dessa “plasticidade”, linguagem e conhecimento são mantenedores da

estabilidade da organização quando permanecem coerentes e harmoniosas as redes de relações e interações que definem a organização como tal.

Analisando-se o comportamento informacional de decisores nessa perspectiva, o caráter antropomórfico das organizações desaparece. A análise sobre o conhecer se dá tendo como foco os membros das organizações. Além disso, o conhecer, no meio organizacional, ocorre nas interações sujeito-sujeito e sujeito-meio, tal como postulado originalmente por Maturana (1997). O conhecer não é determinado por captação de informação, o que difere sobremaneira dos estudos cognitivos tradicionais. Por último, a organização é um domínio cujos contornos se definem por uma linguagem resultante das relações e interações de seus membros e a permanência de uma organização depende da manutenção dessa linguagem.

Do ponto de vista da cognição situada, a linguagem como conduta é o que constitui um domínio de ações. No caso de uma abordagem em organizações, a linguagem constitui um domínio organizacional. Este é um aspecto fundamental a ser observado no âmbito da gestão da informação e do conhecimento.

Dessa forma, pode ser possível considerar cada organização como um sistema social, caracterizado por uma dinâmica de relações e de linguagem próprias. Assim, é interessante o foco de atenção que Von Krogh e Roos (1995) e Von Krogh; Ichijo; Nonaka (2000), Concha, Dreckmann, Mpodozis (1997) e Calderón-Moncloa (1997), dão às relações e interações existentes nas organizações e à linguagem que as configura. É uma forma diferente de se considerar o ambiente organizacional, fugindo da visão antropomórfica e

funcionalista da literatura utilizada nos estudos sobre gestão da informação e do conhecimento, que se perpetuam nas pesquisas da área e que fazem com que os estudos sobre comportamento informacional fiquem bastante limitados a essas concepções.

Considerações para as pesquisas em gestão da informação e do conhecimento

Ao propor esta visão sobre os estudos sobre o comportamento informacional de decisores no domínio da gestão da informação e do conhecimento, alguns aspectos importantes devem ser não só considerados, como

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vem ocorrendo em algumas nas pesquisas da área, mas analisados em profundidade. Faz-se necessário salientar que estudos sobre o comportamento gerencial em ambientes organizacionais são tratados, no âmbito dos estudos em administração por autores consagrados, como apresentam Massimo e Rizzello (2003). Esses estudos são importantes e trazem discussões que devem ser considerados pela gestão da informação e do conhecimento.

Neste artigo, entretanto, o foco situa-se em comportamentos de busca e uso de informação por decisores, analisados do ponto de vista da cognição situada. Em pesquisas sobre comportamento informacional de decisores, desenvolvidas na área de gestão da informação e do conhecimento, é comum apresentar-se o ambiente, ou contexto e as atividades desses sujeitos. Quando presentes nas pesquisas, esses ambientes são apresentados como “pano de fundo” , numa tentativa de se mostrar onde os decisores atuam.

Essas descrições muitas vezes perdem-se ao longo das pesquisas, visto que são superficiais e raramente são consideradas nas etapas de análise de dados como influenciadoras do comportamento informacional. Uma questão importante apontada por Henrique (2006) em sua tese de doutorado é a análise das tarefas como aspecto que deve ser considerado em estudos sobre busca de informação, sendo a decisão, uma tarefa que apresenta características que podem ser analisadas. Sendo assim, é fundamental se analisar as diversas tarefas que esses decisores executam em suas organizações, pois, de acordo com Nassif, Venâncio e Henrique (2007) “é através da identificação e observação das tarefas que se observam as experiências e evidencia-se a característica cognitiva “situada””.

A história de vida é um aspecto importante na cognição situada. No caso em questão, a história de vida dos decisores, sua história no domínio das suas organizações e as suas relações e interações no cotidiano do seu trabalho, nessas organizações – como acontecem e por que acontecem. Nesta linha de raciocínio, Calderón-Moncloa (1997) afirma que os decisores têm como premissa básica gerar e manter uma rede de

conversações para a ação, para o sucesso do trabalho. Quando consideram que algo seja um “problema”, definem também o espaço de possibilidades para a solução da situação problemática. Assim, um

“problema” não é um fato, mas uma pessoa e/ou uma construção coletiva que se inicia com alguns fatos e que apresenta possíveis soluções. A definição de um “problema” e de suas possíveis soluções ocorre na linguagem, através de atos lingüísticos existentes na rede de conversações formada pelo decisor e, sendo assim, o sucesso organizacional não pode ser atribuído a um único tomador de decisão, mas também ao desempenho coletivo.

Como argumenta Venâncio (2007, p. 102) em sua pesquisa, “a conduta na busca de informação é

dinâmica, recursiva a situacional” , sendo fundamental a análise das relações que os decisores estabelecem com outros sujeitos, tanto da organização, quanto externos a ela, que influenciam seus comportamentos informacionais. Essa questão é abordada pela autora como sendo comum, por parte dos decisores, recorrerem a fontes pessoais para se ter acesso a informação.

Outro fator que merece destaque nessa perspectiva de pesquisas sobre os decisores, diz respeito à

necessidade de se observar as disposições emocionais que também influenciam e, muitas vezes determinam, as condutas informacionais em situações de decisão. A discussão a respeito das emoções como disposições corporais que especificam um domínio de ação do sujeito a todo instante é aspecto central da cognição situada: não há ação humana que se estabeleça sem uma emoção. (Maturana, 1997) As pré-disposições emocionais de decisores foram também consideradas pela pesquisa de Venâncio (1997) e traz aspectos importantes para estudos nessa perspectiva, principalmente no que se refere às diferentes emoções que influenciam os decisores ao se vivenciar uma situação a ser analisada e modificada em uma organização.

Sendo assim, acredita-se que essas questões são importantes para as pesquisas sobre o comportamento informacional de decisores. Muito ainda é necessário ser compreendido sobre o assunto, mas é certo que há

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contribuições importantes para a gestão da informação e do conhecimento que ainda são pouco explorados, mas que podem enriquecer os estudos na área.

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Sobre a autora / About the Author:

Mônica Erichsen Nassif mnassif@eci.ufmg.br

Doutora em Ciência da Informação; Docente na Escola de Ciência da Informação da Universidade Federal de Minas Gerais; Coordenadora do Grupo de Estudos Cognitivos em Ciência da Informação.

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