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Vista do O emprego do enunciado Padrão FIFA na mídia após os escândalos no cenário do futebol

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O emprego do enunciado "padrão FIFA" na mídia após os

escândalos no cenário do futebol

Luiz Afonso Fernandes de Meirelles

Mestrando em Linguística Aplicada pela Universidade de Taubaté. Atualmente é Master de programação na TV Canção Nova. luizafonso_2@hotmail.com

Pedro Henrique Monteiro Whately Martins

Especilaista em Educação e Mídia pelas Faculdades Integradas Teresa D’Ávila, mestrando em Linguística Aplicada pela Universidade de Taubaté. Atualmente é Assistente de Comunicação e Marketing no Instituto Nossa Senhora Auxiliadora. whatelymartins@gmail.com

Resumo

Este artigo tem por objetivo discutir as construções de sentido atribuídos pela mídia para o enunciado "padrão FIFA" após os escândalos de corrupção envolvendo a maior entidade administrativa do Futebol. De acordo com os estudos de Bakhtin e o Círculo, o enunciado concreto estabelece conexões com o contexto extraverbal da vida e todo signo ideológico representa a realidade a partir de um lugar valorativo. A metodologia deste trabalho consiste na análise de como tal expressão foi apresentada no jornal Meia Hora de Notícias publicado dia vinte e oito de maio de 2015; na edição 2428 da revista Veja de três de junho de 2015 e edição 2374 da revista IstoÉ de mesma data. A fundamentação teórica se complementa à luz da perspectiva Bakhtiniana dos conceitos de enunciado, enunciado concreto e signo ideológico; Citelli (2005), responsável por apresentar algumas estratégias para a realização do efeito persuasivo e Farina (2007), com a abordagem sobre a psicodinâmica das cores. Após a análise, verificou-se que tal expressão recebeu um novo sentido a partir dos contextos em que foi inserida.

Palavras- chave

Enunciado Concreto; Signo ideológico; Mídia; Padrão FIFA.

Abstract

This article aims to discuss the sense of constructions attributed by the media to the statement "FIFA standard" after the scandals of corruption involving the highest administrative body of soccer. According to the studies of Bakhtin and the Circle, the statement sets out concrete connections to the extraverbal context of life and every ideological sign is the reality from an evaluative place. The methodology of this work is the analysis of how such an expression was presented in the journal Half Hour News published on May 28, 2015; in the 2428 edition of Veja magazine of June 3rd, 2015 and 2374 edition of the same date Isto É magazine. The theoretical framework is complemented in the light of the statement Bakhtinian perspective concepts as set out concrete and ideological sign; Citelli (2005), responsible for presenting some strategies for the realization of the persuasive effect and Farina (2007), with the approach of the psychodynamics of colors. After analysis, it was found that such expression has received a new order from the context in which it was inserted.

Key words

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Introdução

A Federação Internacional de Futebol (FIFA) é uma associação de direito suíço criada em 1904 e com sede em Zurique. Hoje conta 209 membros associados em todo o mundo, número superior que ao de filiados à Organização das Nações Unidas (ONU). Segundo o site oficial da FIFA o objetivo da instituição é desenvolver o futebol em todos os lugares e para todos, de modo a tocar o mundo através de seus torneios e para construir um futuro melhor através do poder do jogo.

Nos últimos anos, a organização tem sido associada a práticas antiéticas e escândalos de corrupção, o que levou a entidade a instaurar uma Comissão Independente de Ética. Entretanto, foi em maio de 2015 que a imagem da FIFA sofreu seu maior ataque. Após investigações realizadas pelo FBI (Federal Bureau of Investigation) um grande número de pessoas ligadas a federação máxima do futebol foram indiciadas, acusadas de fraude, extorsão e lavagem de dinheiro. Estima-se que foram recebidos US$ 150 milhões em suborno.

A mídia de todo o mundo repercutiu a notícia dos escândalos envolvendo a FIFA, no Brasil porventura não foi diferente. As revistas IstoÉ e Veja, por exemplo, dedicaram capas inteiras a expor o tema, bem como o jornal Meia hora de Notícias do Rio de Janeiro, conhecido pelas manchetes polêmicas e os famigerados títulos de duplo sentido em suas edições. Estes são um fragmento, ou um retrato, dos outros muitos meios - sites de notícias, redes sociais, programas de tevê - que reproduziram este fato. No trabalho a seguir pretende-se analisar como o enunciado "Padrão FIFA" que está prepretende-sente em todos os três objetos de estudo foi apresentado e qual o papel das editorias em empregar-lhe sentido na construção verbo-visual de suas capas.

Anteriormente tal expressão era reconhecida como um sinônimo de boa qualidade, vide as próprias notícias que permeavam a esfera jornalística e que por vezes reproduziram esta ideia. Esse chavão teria surgido a partir das primeiras visitas de inspeção realizadas pela FIFA aos estádios durante a preparação para a Copa do Mundo 2014 a ser realizada no Brasil, na ocasião uma extensa lista de exigências foi apresentada pela Federação Internacional de Futebol, dando origem a epígrafes como: "Estádio não tem padrão da FIFA para segurança", exibida pela Folha Uol em 29 de agosto de 2007.

A partir disto, a expressão se espalhou rapidamente designando uma espécie de selo de qualidade. Em junho de 2013, prestes a realizar-se a Copa das Confederações, evento FIFA que precede a Copa do Mundo, notícias sobre os gastos excessivos para a construção dos estádios e para a organização da Copa em geral circulavam com mais frequência, e deram início a manifestações populares de cunho político. Dentre uma série de reivindicações, muitos cartazes levados às ruas pediam por hospitais, escolas e qualidade de vida ao dito "padrão FIFA" caracterizado, então, como modelo de excelência a ser atingido.

A seguir, será apresentada a fundamentação teórica deste artigo, onde a análise se baseia. Na sequência, o leitor encontrará a apreciação dos objetos de pesquisa e as considerações após a conclusão do objetivo da análise.

Fundamentação teórica

Primeiramente é necessário compreender que a língua não pode ser entendida como pertença do homem enquanto indivíduo solitário, mas como fenômeno necessariamente social da interação verbal. A palavra, como produto da interação entre dois indivíduos, comporta

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“duas faces”: procede de alguém e se dirige a alguém (sempre busca a reação do outro). Por isso que, para a teoria bakhtiniana, não existe discurso neutro e nem “fala individual”: ela é sempre composta de discursos já-ditos e dirigida a alguém.

Nessa perspectiva, a linguagem medeia as diversas situações de interação verbal, que implica dois indivíduos (enunciador e enunciatário) de mesma comunidade lingüística e de uma sociedade organizada. Eles precisam estar integrados na “unicidade da situação social imediata”, ter relações entre si; isto é, “a unicidade do meio social e a do contexto social imediato” são as condições básicas para haver um “ato de linguagem” (BAKHTIN, 2004, p. 70-71).

O diálogo, entendido como o momento da enunciação, é irrepetível: o discurso, como um “evento” (ações sociais mediadas pelo discurso) no mundo, é proferido uma única vez em determinada situação de interação. Não pode ser repetido, apenas citado. O mesmo acontece com a unidade real de comunicação discursiva: o enunciado, conceito-chave para a teoria bakhtiniana.

Enunciado, Enunciação e Enunciado Concreto

Ao longo dos anos, alguns modelos teóricos têm pretendido explicar como se dá o processo de comunicação nas relações humanas, dentre eles destacam-se os conceitos bakhtinianos voltadas para o estudo da linguagem e que tem influenciado muitos pesquisadores contemporâneos. Segundo essa linha de pensamento que tem sua origem nos estudos do filósofo russo Bakhtin, esse processo comunicacional se desenvolve sob a forma de enunciados.

Esse termo "enunciado", é chamado viskázivanie na língua russa, e deriva do infinitivo

viskázivat que significa ato de enunciar, de exprimir, transmitir pensamentos, sentimentos,

etc. em palavras. Brait (2005, p.63) explica que nessa perspectiva o enunciado é concebido como:

[...] unidade de comunicação, como unidade de significação,

necessariamente contextualizado. Uma mesma frase realiza-se em um número infinito de enunciados, uma vez que esses são únicos, dentro de situações e contextos específicos, o que significa que a ‘frase’ ganhará sentido diferente nessas diferentes realizações enunciativas.

A sequência processual pela qual esses enunciados são produzidos determinamos enunciação. De acordo com Ducrot (apud BRAIT, 2005, p. 64):

[enunciação] é o acontecimento constituído pelo aparecimento de um enunciado. A realização de um enunciado é de fato um acontecimento histórico: é dado existência a alguma coisa que não existia antes de se falar e que não existirá depois. É esta aparição momentânea que chamo de enunciação.

Brait (2005, p.64) acrescenta: “a enunciação [...] deixa marcas da subjetividade, da intersubjetividade, da alteridade que caracterizam a linguagem em uso”. Neste aspecto, a linguagem precisa ser concebida a partir de um ponto de vista amplo que abrange o contexto histórico, cultural e social para que seja compreendida, é preciso

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considerar a comunicação como um todo. "O enunciado e as particularidades de sua enunciação configuram, necessariamente, o processo interativo, ou seja, o verbal e o não verbal que integram a situação". (BRAIT, 2005, p.67)

Neste panorama apresenta-se o enunciado concreto. Este tem correlação mui próxima com o enunciado. Volochinov descreve que estes “estabelecem uma miríade de conexões com o contexto extraverbal da vida, e, uma vez separados deste contexto, perdem quase toda a sua significação” (VOLOCHINOV, 1926, p.8)

Parafraseando Bakhtin, um enunciado é individual e pode ser encontrado em diversas possibilidades de utilização da língua. Sua organização através do conteúdo temático, estilo e construção composicional recebe o nome de gênero discursivo.

Gêneros Discursivos

Entender o que um meio de comunicação quer transmitir ao seu leitor exige muito mais do que uma simples observação. Esta, aliás, é apenas uma das etapas que o indivíduo que quer interpretar este produto midiático, caracterizado como um gênero discursivo deve fazer. Sobre os gêneros do discurso, Bakhtin (2003, p.279) afirma que estes são os tipos relativamente estáveis de enunciados elaborados por cada esfera de utilização da língua.

As capas de revista e de jornal, quando analisadas com profundidade, revelam uma sequência de enunciados organizados com uma finalidade. Durante o processo de elaboração de uma capa, deixa-se evidente o tema, a forma composicional e o estilo. Este conjunto permite que uma capa seja encarada como um gênero discursivo. Conforme encontra-se em Bakhtin (1990, p. 262):

Esses enunciados refletem as condições específicas e as finalidades de cada referido campo não só por seu conteúdo (temático) e pelo estilo da linguagem, ou seja, pela seleção dos recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua mas, acima de tudo, por sua construção composicional. Todos esses três elementos – o conteúdo temático, o estilo, a construção composicional – estão indissoluvelmente ligados no todo do enunciado e são igualmente determinados pela especificidade de um determinado campo da comunicação.

Neste cenário, pode-se perceber que a extensão e a diversidade dos gêneros discursivos é imensa, pois os processos de comunicação da humanidade são múltiplos, e de tempos em tempos ganham novas formas, principalmente à medida que a tecnológica da comunicação evolui, apresentando novas possibilidades.

Dentre os muitos gêneros que perpassam os veículos de comunicação, o jornalístico causa grande impacto no seu destinatário. Este tem como premissa informar de forma imparcial. O jornalismo se propõe processar informação em escala industrial e para consumo imediato. As variáveis formais devem ser reduzidas, portanto, mais radicalmente do que na literatura. Para Lage (2004, p.35), enquanto na literatura a forma é compreendida como portadora, em si, de formação estética, no jornalismo a ênfase desloca-se para os conteúdos, para o que é informado.

Faz-se necessário dizer ainda que uma característica do discurso jornalístico, ao qual pertence o gênero discursivo capa de revista e jornal é lidar com o inusitado, como bem lembra Citelli (2005, p.82):

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Trabalho com o inusitado. Esse é um dos mais importantes aspectos a serem trabalhados por veículos sensacionalistas. O comum e corriqueiro não interessam, é preciso que haja algo diferente, algum ângulo não explorado, alguma situação que provoque impacto e estranhamento. (CITELLI, 2005, p. 82)

Dialogismo e Responsividade

Todo enunciado carrega em si outros, é a interação de um encontro de vozes sociais, de forma dialógica e ligada a uma cadeia responsiva.

Conforme Bakhtin (2003): “O falante não é um Adão bíblico, só relacionado com objetos virgens ainda não nomeados, aos quais dá nome pela primeira vez”. (BAKHTIN, 2003[1979], p. 300). Ou seja, nenhum discurso é original mas reflexo de outros que o precedem. Nesta perspectiva, a fala do indivíduo não pode ser entendida como algo que emana exclusivamente dele enquanto ser único, mas como um produto do coletivo de sua relação com outrem, pois refere-se direta ou indiretamente a uma pluralidades de outros discursos pertinente ao contexto em que este encontra-se inserido.

Dialogismo, portanto, é entendido como essa propriedade da linguagem que propicia o diálogo entre os enunciados, correlacionando o discurso individual com os outros discursos. Desta maneira, a língua em seu contexto real de uso é essencialmente dialógica. Assim explica Bakhtin (2003, p. 300):

O enunciado é um elo na cadeia da comunicação discursiva e não pode ser separado dos elos precedentes que o determinam tanto de fora quanto de dentro, gerando nele atitudes responsivas diretas e ressonâncias dialógicas. Entretanto, o enunciado não está ligado apenas aos elos precedentes, mas também aos subsequentes da comunicação discursiva. Quando o enunciado é criado por um falante, tais elos ainda não existem. Desde o início, porém, o enunciado se constrói levando em conta as atitudes responsivas, em prol das quais ele, em essência, é criado. O papel dos outros para quem se constrói o enunciado, é excepcionalmente grande.

Quanto ao conceito de responsividade, este está intimamente ligado ao dialogismo, e parte da noção que todo enunciado gera por parte do interlocutor uma atitude responsiva, mesmo que ela não se apresente de imediato através de um ato ou fala. Para Bakhtin/Volochinov (2004, p. 271), todo enunciado é dirigido a alguém (auditório social), logo seu sentido pleno só possível se provocar no outro alguma reação para com o discurso do locutor. Marcando assim seu papel na "relação de anterioridade e posterioridade com outros enunciados, de modo que podemos dizer que todo enunciado é fruto de enunciados anteriores, e semente para enunciados futuros" (SANTOS e FILHO 2012, p. 147).

O Signo ideológico

A palavra signo, proveniente do termo latim signum, é por definição um objeto, fenômeno ou ação material que, por natureza ou por convenção, representa ou substitui outro. Isto é, algo que está no lugar de outro, diferente dele mesmo de forma a simbolizá-lo. O signo, segundo Brait (2013, p. 170) “representa a realidade a partir de um lugar valorativo, revelando-a como verdadeira ou falsa, boa ou má, positiva ou negativa, o que faz o signo

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coincidir com o domínio do ideológico.

A consciência humana é constituída a partir de signos ideológicos. Assim como dito anteriormente, do mesmo modo que a língua é compreendida como de natureza social, precisamos admitir que nossa própria consciência também é, visto que resgatamos no meio social os signos necessários para formular o pensamento. Logo, mesmo na intimidade de nosso raciocínio encontram-se valores e ideologias externas. Bakhtin (2006, p.16) afirma:

a ideologia é um reflexo das estruturas sociais; assim, toda modificação da ideologia encadeia uma modificação da língua [...] A variação é inerente à língua e reflete variações sociais; se, efetivamente, a evolução, por um lado, obedece a leis internas (reconstrução analógica, economia), ela é, sobretudo, regida por leis externas, de natureza social.

Bakhtin torna evidente que se fosse possível qualquer atividade mental que não comportasse ideologia, esta não seria pensamento, apenas uma manifestação biológica e fisiológica do indivíduo, o que foge ao estudo da língua.

Sob esta ótica, o signo ao ser incorporado pelo sujeito, traz em si uma ideologia, porém o seu valor ideológico pode altera-se de acordo com signos relativos ao discurso interior. O signo é, portanto, renovado a cada vez que é utilizado. Stella (2005) explica que a palavra também é um produto ideológico vivo, isto é em constante mudança, capaz de funcionar em qualquer situação social, e se torna “signo ideológico” justamente por concentrar entoações decorrentes dos diálogos vivos entre interlocutores e dos valores sociais. "A palavra é o fenômeno ideológico por excelência" (BAKHTIN, 2006, p.34).

Em suma, o signo receberá a cada enunciação um novo sentido dotado de carga individual e social, dado que lidamos com uma língua dinâmica, capaz de crescer e evoluir a cada nova situação de comunicação.

A partir destas considerações teóricas, a sequência deste artigo dedica-se a análise dos objetos de estudos sugeridos.

Análise do Corpus

Antes de iniciar-se a apreciação dos objetos de análise propostos na introdução deste artigo, algumas considerações são necessárias. As capas de revista e jornal são constituídas de diversos itens, como imagens, cores e textos que permitem ao leitor entender a temática que a editoria conduzirá nas páginas seguintes. Estes elementos serão analisados de forma a compreender-se o propósito comunicativo da editora, contudo o foco será destinado às representações do enunciado “padrão FIFA” nos veículos selecionados para este trabalho.

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Imagem 1. Edição 2428 da revista Veja. Fonte: Acervo digital da Revista Veja.

A primeira capa analisada, edição 2428 da revista Veja, publicada no dia três de junho de 2015, apresenta um homem trajando roupa social com uma cartola na mão esquerda e uma bola de metal atada a perna. Em destaque, encontra-se o seguinte enunciado: “PADRÃO FIFA – A prisão dos cartolas na Suíça é o começo de uma era de transparência que pode fazer o futebol ser de novo a alegria do povo”.

Localizada na parte superior da capa, encontram-se também menções a outros temas que estarão presentes no interior da revista. A título de explanação, o background da capa é

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composto majoritariamente pela cor azul com parte em degrade para o branco.

Sobre o homem representado na capa, este traja um terno de aparência impecável com sapatos engraxados nos quais há um efeito nítido cujo objetivo parece ser transparecer o brilho dos mesmos, sinal que este representa um arquétipo de alguém bem sucedido.

Ao deslocar o olhar para a direita, o leitor depara-se com uma bola de futebol feita de metal atada à perna esquerda do sujeito. Este recurso faz alusão às arcaicas bolas metálicas que eram presas na perna de um detento para que ele não fugisse o que sugere que o indivíduo em questão também já foi julgado e condenado.

Na cartola encontra-se estampada a marca da entidade máxima do futebol. É possível inferir representações para esta imagem: numa primeira observação, é possível presumir que trata-se de um mandatário da entidade (na linguagem popular que circula o universo esportivo, “cartola” é o nome atribuído a um presidente de um clube ou ainda aos grandes líderes de associações ligadas ao futebol, como a CBF a FIFA, por exemplo) que foi julgado. Em outra interpretação, a marca de forma invertida simboliza que a instituição está “de cabeça para baixo”, em meio aos escândalos revelados após as investigações.

A presença do enunciado que acompanha a imagem na capa é determinante para a compreensão do assunto a ser abordado nas páginas interiores. Escrito em amarelo e em letras maiúsculas, contornado ainda por uma sombra preta, destaca-se: “PADRÃO FIFA”. O enunciado é complementado por outro, posicionado logo abaixo em letras brancas também sombreadas como no anterior: “A prisão dos cartolas na Suíça é o começo de uma era de transparência que pode fazer o futebol ser de novo a alegria do povo”. O efeito de proximidade exige uma leitura contínua. Para Williams (1995, p.15) “Itens relacionados entre si devem ser agrupados e aproximados uns dos outros, para que sejam vistos como um conjunto coeso”.

A escolha do amarelo, segundo Farina (2007, p.07) causará no leitor a sensação de alerta. Essa sensação é reforçada pelo uso de letras em caixa alta para escrever este enunciado. A cor branca, empregada no enunciado seguinte, na concepção de Farina (2006), reforça a mensagem deixada: o branco, numa perspectiva afetiva, indica ordem ou limpeza. Percebe-se, portanto, que nesta enunciação, a expressão “padrão FIFA” refere-se à grandiosa e bem-sucedida investigação, com punições já aplicadas e problemas supostamente superados. Neste sentido, o enunciado “padrão FIFA” resguarda certo sentido de qualidade e organização, punindo aqueles tidos como contraventores.

Na capa a seguir, será analisada outra abordagem da mídia para o enunciado em estudo.

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Imagem 2. Edição 2374 da revista IstoÉ. Fonte: Acervo digital da Revista InstoÉ.

Publicada no dia três de junho de 2015, a edição 2374 da revista Isto É também traz em sua capa a mesma temática, entretanto apresenta um outro posicionamento frente os escândalos envolvendo a FIFA.

No alto, bem como na revista Veja, encontram-se os demais assuntos que também serão abordados na edição. Ocupando o espaço privilegiado da edição, a revista apresenta ao seu leitor a marca da empresa, que assina o conteúdo e logo a frente do logo uma bola de futebol com uma aparência de desgastada e murcha com a presença da fotografia de alguns

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dirigentes nos gomoso que compõem o objeto.

Logo abaixo da imagem, encontra-se o enunciado: “CORRUPÇÃO PADRÃO FIFA”, acompanhado de um segundo que diz: “A vida excêntrica dos cartolas que desviaram milhões de dólares. Como eles operavam e por que as investigações do FBI podem mudar o futebol”. Completam a capa outros dizeres: “EXCLUSIVO” e “J. HAWILLA: ‘Houve uma investigação. Mas delação não houve’.

A respeito da bola, além de representar a modalidade esportiva que a entidade figura, chama a atenção as fotografias dos mandatários dentro dela. Sobre as fotografias, Kossoy (2001, p.50) afirma:

Toda fotografia é um testemunho segundo um filtro cultural, ao mesmo tempo que é uma criação a partir de um visível fotográfico. Toda fotografia representa o testemunho de uma criação. Por outro lado, ela representará sempre a criação de um testemunho.

Desta forma, as fotografias são interpretações sob determinados juízos de valor, e nunca a realidade em si. Elas se apresentam, portanto como forma da editoria da revista Isto É de representar os dirigentes em meio aos escândalos. A bola murcha também se refere à uma expressão popular originada no futebol que quer dizer que o “individuo não foi bem sucedido em algo”. Para facilitar o reconhecimento dos indivíduos localizados na bola, a revista colocou a seguinte legenda: “OS ENVOLVIDOS: Em sentido horário, Ricardo Teixeira (ao lado), Joseph Blatter, joão Havelange e J. Hawilla. No centro, José Maria Marin.

Na sequência e em letras garrafais, o enunciado “CORRUPÇÃO PADRÃO” na cor preta. Para Farina (2007, p.06) a cor preta simboliza sujeira. Por sua vez, os enunciados “FIFA”, “ISTO É” e “EXCLUSIVO” estão representados na cor azul claro, que segundo a autora (2007, p. 07) pode significar verdade. Infere-se a intenção da Isto É em expor a aquilo dito como verdade a respeito da FIFA.

Percebe-se o emprego da ironia na construção deste enunciado. Cherubim (1989, p.41) afirma que a ironia se configura como uma figura de linguagem “pela qual se diz o contrário do que se pensa, com intenção sarcástica”. Sobre a ironia, ela pode se apresentar de diversas formas. Neste enunciado, por exemplo, encontra-se presente a ironia na forma de sarcasmo, que ainda de acordo com este autor (1989, p. 45) “se constrói de modo mais explícito, é sempre um deboche altamente crítico”. Por consequente, entende-se que, ao alinhar “Corrupção”, “Padrão FIFA”, a editoria pretende quantificar o substantivo corrupção, desempenhando função similar ao adjetivo de intensidade.

Neste enunciado concreto específico, o “padrão FIFA” que antes era associado a coisas positivas e grandiosas, adquiriu um novo sentido, havendo uma inversão de valores: agora a entidade passa a ser entendida como aquela que desenvolve esquemas ilícitos. A edição da revista IstoÉ constrói uma crítica veemente a instituição mandatária do futebol internacional, destacando os “mentores” dos esquemas fraudulentos.

A próxima análise será realizada a partir da capa de uma edição de jornal, que apresenta novas possibilidades de representação para o enunciado “padrão FIFA”.

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Imagem 3. Jornal Meia Hora de Notícias, Ano 10, Nº 3420. Fonte: Fanpage oficial do Jornal Meia Hora de Notícias.

Tradicionalmente conhecido por empregar uma linguagem mais popular na construção de suas capas, o jornal carioca Meia Hora de Notícias (que recentemente conquistou o Prêmio Esso de Primeira página de 2014) também dedicou um espaço generoso de página principal para tratar da polêmica envolvendo os líderes do futebol mundial.

A edição 3420, do dia vinte e oito de maio de 2015 teve o cuidado de privilegiar os temas ligados ao futebol com a parte predominante da página e dedica uma coluna à direita para os temas variados. Sobressaem nesta edição os escândalos envolvendo a entidade máxima do futebol.

Nesta publicação, encontra-se o enunciado “PADRÃO FIFA VIRA LADRÃO FIFA” acompanhado da legenda “Polícia prende sete dirigentes da entidade, entre eles o ex-presidente da CBF José Maria Marin. Assunto virou piada na rede”. Estes enunciados são

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acompanhados de duas fotografias: a primeira, onde o mascote da Copa do Mundo de 2014 é carregado por dois homens e a segunda trata-se da foto do ex-presidente da CBF José Maria Marin.

Este conteúdo está posicionado dentro de um entorno amarelo, que gera um contraste com o restante das informações dispostas na capa. Segundo uma das regras de noções básicas de planejamento visual, Williams (1995, p.53) afirma:

O contraste é uma das maneiras mais eficazes de acrescentar algum atrativo visual a uma página (algo que realmente faça com que uma pessoa queira olhar para ela), criando uma hierarquia organizacional entre diferentes elementos. [...] Cria-se o contraste quando dois elementos são diferentes [...] uma letra grande pode ser contratada com uma letra pequena, [...] uma cor fria com uma mais quente.

Chamam a atenção no jornal o uso de fotografias para reforçar o propósito comunicativo. A fotografia explorada é do personagem FULECO (Mascote da copa do Mundo FIFA 2014) com o dizer “sobrou até para o fuleco”. De forma bem humorada, a editoria faz uma sátira com os resultados da investigação, sugerindo que tantas pessoas foram indiciadas que até o mascote “estaria envolvido”. Outa fotografia em destaque é a de José Maria Marin, que também foi indiciado nas investigações. Sobre as fotografias de personalidades, Puzzo (2012, p.96) destaca:

Um dos componentes de maior impacto são as fotos de personagens públicas do cenário político e cultural, cujas imagens, estampadas nessas capas, exercem força persuasiva, já que uma das potencialidades dos retratos é constituir-se como representação da realidade.

Quanto ao enunciado discutido neste artigo, o Jornal Meia Hora de Notícias utiliza-se do verbo "virar", no sentido de tornar-se algo novo, para afirmar categoricamente que este tem agora outro significado. No proposto pelo Jornal por meio de um jogo de palavras, “Padrão FIFA”, antes entendido como sinônimo de qualidade, tornou-se “Ladrão FIFA”; ou seja algo pejorativo, de má índole.

Considerações Finais

A presente análise buscou investigar a presença do enunciado "Padrão FIFA" nas revista Isto É, Veja e no Jornal Meia Hora de Notícias como objetivo de expor como nestes gêneros discursivos pertencentes a esfera jornalística e publicitária é possível perceber o tom valorativo dos enunciados através dos itens composicionais, propiciando novas perspectivas de leituras acerca da linguagem verbovisual.

Esse contexto também ofereceu a possibilidade de enriquecer compreensão a respeito das diferenças conceituais de enunciado e enunciado concreto, este último enquanto aquele que comporta um sentido mais pleno.

Após este estudo, percebeu-se que os três objetos pesquisados manifestaram formas distintas de empregarem a expressão "Padrão FIFA". Ficou evidente também que os fatos sociais (os escândalos) propiciaram novas significâncias enquanto signos representativos de uma ideologia social, isto porque as editoras só optaram por esse enunciado uma vez que ele tinha

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novo tom valorativo. Se ainda representasse pura e simplesmente um sinônimo de qualidade, provavelmente não teria sido escolhido em um universo de signos possíveis, dadas as intencionalidades destes veículos midiáticos.

Numa ótica discursiva, revela-se a necessidade de promoção do pensamento crítico-reflexivo não apenas daquele que, de alguma maneira, tem contato com este produto midiático, mas também de educadores que devem desenvolver projetos que possibilitem a identificação do posicionamento ideológico na construção dos enunciados verbovisuais. Esta análise apresenta-se como uma fuga a interpretação normalmente realizada de forma superficial dos diversos gêneros discursivos midiáticos, como as capas de revista e jornal. Desvendar o que as linguagens verbal e visual transmitem possibilita ao leitor um ato mais consciente frente aos enunciados.

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