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Pedro Henrique Barreto de Lima Crítica a Conhecimento por presença: em torno da filosofia de Olavo de Carvalho 1ª edição

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Pedro Henrique Barreto de Lima

Crítica a “Conhecimento por presença: em torno da filosofia

de Olavo de Carvalho” 1ª edição

Belo Horizonte

Edição do autor

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D353 de Lima, Pedro Henrique Barreto, 1987

Crítica a “Conhecimento por presença: em torno da filosofia de Olavo de Carvalho” - 1. ed. - Belo Horizonte, Edição Independente, 2020.

369 p.; 27 cm.

ISBN : 978-65-00-15294-4

1. Capítulo I - o que é a "pseudo-iniciação"? I. Título

CDD 200 CDU: 11

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Sumário

Capítulo I - o que é a "pseudo-iniciação"? ...5 Capítulo II - Olavo de Carvalho e o tema do expletivo 76 Capítulo III - Um estudo teológico da teoria dos quatro discursos ... 99 Capítulo IV - O ocultismo e o tema da "dúvida radical" ... 169 Capítulo V – Ação histórica e o “trabalho do negativo”. ... 236 Capítulo VI – O simbolismo do figo e o sonho de Olavo de Carvalho ... 270 Capítulo VII – Simbolismo do filme “O náufrago” (2000) ... 329

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Capítulo I - o que é a "pseudo-iniciação"?

Um homem e sua jovem filha estão em um bar-restaurante, conversando de modo

distraído e tranquilo. De repente, chega um garçom à mesa com duas taças de

martini, "Um 'cosmopolitan' para o senhor", diz o garçom pondo sobre a mesa um pedido que pai e filha não haviam

requisitado, "e um 'sex on the beach' para a moça. Cortesia do homem à direita, no bar." Gesto atrevido, mas ainda é possível bufar sem estrondo e seguir em frente; não fosse o

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bilhete deixado pelo abonador desconhecido, vindo junto com as taças: "Parabéns pelos genes, velhote, a tua filha tem saúde!"

Esse é o sentimento usual, de algo impertinente, que sentem os olavistas ante críticas

dirigidas à filosofia de Olavo de Carvalho ou à linguagem convencional do seu meio; isto é, quando o crítico tem a sorte de não se deparar com simples indiferença ou desinteresse. Dizem que Pierre Viret, um colaborador de Calvino, foi bem sucedido como

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missionário protestante pela capacidade de infundir na sua audiência sentimentos de

doçura. Eu desejaria que essa fosse a minha posição

alcançável, no me dirigir criticamente à filosofia

olavista. Lamentavelmente, o crítico da filosofia olavista se coloca na mesma posição de certo personagem de filme, vítima da conspiração de

gângsteres, homem que levou para passear de carro uma espiã se passando por

namorada, chamada

"Heroína"; ele um personagem cujo porta-malas fora enchido com a droga "heroína". O

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pobre homem se viu obrigado a alegar, a policiais que o

pararam, que não estava

fazendo nada mais que levar a Heroína para passear,

enquanto a sua "namorada" dava no pé. Eu deixo ao leitor julgar se é possível, em tais circunstâncias, arrazoar com sentimentos de doçura e

generosidade.

A tese central da minha crítica à publicação de Ronald

Robson ("Conhecimento por presença: em torno da filosofia de Olavo de Carvalho") é a de que o olavismo é uma pseudo-iniciação, exatamente no

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sentido que o orientalista e metafísico francês René Guénon atribuiu a um

fenômeno como o teosofismo.

Importa, portanto, explicar o que é a "pseudo-iniciação". O principal discutidor

do assunto parece ter sido René Guénon, mas o estudo desse fenômeno foi de modo similarmente formidável empreendido pelo escritor britânico J. R. R. Tolkien, autor dO Senhor dos Anéis. Guénon retrata a pseudo-iniciação como um

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fenômenos terrestres a

"engrenagens" feitas por mãos humanas; isso contrastando com como no Livro de Daniel a estátua do sonho do

Imperador Nabucodonosor (esta um objeto "feito por mãos" e potencial símbolo da idolatria) é destruída por uma rocha "não cortada por mão". A "mão" significa tanto um ato ou uma atividade, quanto um ato especificamente criador. A redução das coisas a

"engrenagens", ou à

"indústria", simboliza um ato criador que se separa

usurpadoramente de uma ordem ou processo "natural".

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Essa separação significa que aquilo que é acidental se separa do que é essencial (embora essência e acidente tenham um vínculo

subjacente), e ganha uma espécie de ilusória aparência auto-suficiente. Nessa analogia o que é de criação humana

("feito por mãos") corresponde ao acidente cujo vínculo com a essência é obscurecido; o que é de criação divina

correspondendo, de outro lado, à essência que contém em si todo acidente latente. Uma expressão dessa separação é o chamado "pensamento

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pelo todo, o aspecto isolado pelo fenômeno em si),

conforme bem descreve a filosofia de Olavo de

Carvalho. Uma outra

expressão da separação entre essência e acidente é o tema bíblico da "árvore do fruto do conhecimento do bem

[essência] e do mal [acidente]".

O "Anel de Sauron", em O Senhor dos Anéis, também

chamado "the one ring" ("o um anel"); simboliza esse

fenômeno da pseudo-iniciação. Simboliza a sombra de um

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tradição), sombra que

condensa em si os ecos desde um vínculo subjacente com o que é essencial e não sombrio; mas esse vínculo foi de tal modo afastado por um curso degenerativo que restou

apenas um cadavérico

mausoléu onde outrora existira um palácio real. O anel é um objeto "feito por mãos",

forjado pelo ato criador de um artífice, e adorna a "mão". Assim, o fato de que a

narrativa do Sr. Tolkien fala a respeito de o anel "ter uma vontade própria", como um ente vivo, de algum modo reflete o tema apocalíptico da

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"imagem idolatrada da besta, que ganha vida" (significando o se deixar "encorajar e

vivificar" por aquilo que é falto de "essência"), ou o tema mitológico de Medusa, cujo olhar torna as pessoas estátuas (isto é, objetos "feitos por

mãos"); significando um efeito hipnótico que torna as pessoas sombras de si mesmas porque refletidoras de uma forma sombria ou "acidental" de conhecimento; um efeito hipnótico cuja expressão política ou massificada é a "obrigação de comprar e vender com o sinal da besta"

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(a tirania vista desde um ponto de vista espiritual).

O se tornar uma sombra de si mesmo pelo impacto do

acidente separado da essência ("efeito-medusa") lembra o preceito de etiqueta segundo o qual "aquele que não sai do lugar-comum [a Medusa

figurativa] força os outros a se sentir míseros".

Antes de examinar o que o fenômeno da pseudo-iniciação significa mais detidamente, talvez alguns exemplos

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Um primeiro exemplo é que o fenômeno do "espiritismo" se notabilizou por propor

narrativas sobre a vida no "além", ou em outros

"planetas", que são

ofensivamente banais, como meras sombras-repetições da vida terrestre ordinária; dando à impressão terrestre-ordinária das coisas (acidente) a

aparência de algo que não supõe um fundo mais

universal, ou um vínculo subjacente com algo que ultrapassa o ordinariamente imaginável (esse "algo" corresponde à essência).

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Esse mesmo padrão, no

espiritismo, se repete quando os espíritas confundem a

noção dos resíduos psíquicos imateriais de falecidos

(acidente), correspondendo ao que os gregos antigos

chamavam de

"metempsicose"; com o

próprio "eu" de falecidos para além da vida terrestre

(essência), correspondendo ao que os gregos chamavam

"transmigração".

Um segundo exemplo é a

teologia de Gregório Palamas (séc. XIV), prevalente entre "ortodoxos orientais", segundo

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a qual a inteligência humana tem acesso à "energia divina incriada" (correspondendo à manifestação e ao acidente), mas não tem acesso à

"essência divina". A

valorização da manifestação (acidente), em detrimento de uma essência obscurecida, é basicamente o principal traço do existencialismo, de cuja escola o marxismo é uma espécie; assim restando tanto mais compreensível a

incorporação do marxismo em um país "ortodoxo" como a Rússia. Ademais (e na esteira disso), um pastor anglicano chamado Gyordano

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Montenegro Brasilino deu-me o parecer de que (na sua

opinião) a doutrina eucarística calvinista, que supõe a

"presença espiritual" e não a "presença real" de Cristo, guarda uma "semelhança estrutural" com a doutrina palamista.

Há ainda o exemplo de certos opinadores públicos soi-disant tradicionalistas, os quais,

pressionados a admitir um vínculo subjacente e

necessário entre dogma

(essência) e moral (acidente), isto é, pressionados a admitir que dogma e moral são termos

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relativos, como "pai" e "filho", ou "grande" e "pequeno", ou "agente" e "paciente", e, portanto, mutuamente prolongados um no outro (porque necessariamente

sugerindo um o outro); negam essa relação entre dogma e moral de modo simples. Essa relação entre "dogma" e

"moral", no entanto, não apenas está dada na Carta a Flaviano (Papa Leão I, ensino "ex cathedra"), quando esta fala das testemunhas terrestres de 1 João 5:8 "sendo um"; em particular o "espírito da

santificação" e a "água do batismo" (o chamado

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"sacramento da fé"); mas está dada no fato de as “três

testemunhas” ou princípios da purificação religiosa (quais descritos na epístola bíblica), "espírito", "água" e "sangue", corresponderem seguramente à tripartição dos catecismos em doutrina "dogmática",

"sacramental" e "moral".

Assim, existe entre o domínio dogmático e o domínio moral a mesma relação, um similar paralelismo, que existe entre um objeto e o seu reflexo no espelho. O desvio dogmático que separa da Igreja

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pecado que separa da Igreja a algum desvio dogmático. O desvio dogmático em potência que não separa da Igreja

("heresia material")

corresponde a uma condição moral degenerativa ou ao menos desvantajosa "em ato" (ou "de imediato"), conquanto secundária em importância, por conta de uma inversão analógica; como aquela pela qual uma imagem no espelho apresenta um dizer invertido. Na mesma esteira, o desvio moral em ato que não aparta da Igreja corresponde a um desvio dogmático "em

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A esse respeito é significativo ou destacadamente inteligível que; a moral seja um domínio mais potencial que o domínio dogmático; e tenha a moral um seu aspecto comparativamente "em ato" que é relativo a um aspecto dogmático

comparativamente "em

potência". Isso sugere, note-se, que essa simultaneidade de "ato" e "potência" diz de uma mesma coisa vista desde dois planos distintos.

O paralelismo é intrincado, mas suficientemente claro; a relação entre os termos

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"dogma" e "moral" também, adicionando subsidiariamente à definição solene da Carta a Flaviano.

Ora, o fato de que os

"tradicionalistas" que rejeitam esse ensino infalível o façam, tem certa continuidade com o fato de que eles se indignem com certas teses, baseados precisamente na ideia da autossuficiência e

independência da "impressão" (acidente) em relação à

"concepção" (essência). Por exemplo, se alguém disser aos tais que os símbolos

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compasso têm certa

continuidade doutrinal com as noções católicas sobre o

batismo e sobre a função do batismo (qual indicado no fato de que o batismo também

supõe um simbolismo geométrico, por exemplo presente nos batistérios tradicionais em forma octogonal etc.), os "tradicionalistas" vão estereotípica ou

provavelmente tomar essa afirmação como herética. A maçonaria manipula de muitos modos noções cristãs, incluso por ser uma tradição ocidental, notoriamente tomando o motif

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da ordem monástica dos

Templários, entre outros. Qual é, pois, a diferença específica (em termos de ocasião para ofensa) entre, de um lado, se indignar que alguém alegue que a maçonaria discute uma doutrina sacramental de modo mais ou menos direto; e, de outro, se indignar que alguém alegue que os protestantes (que não são católicos) discutem uma doutrina

sacramental? E se alguém se indigna com a primeira

alegação, e não a segunda, essa diferença ocorre em função do que, senão da impressão ou do sentimento

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(acidente), em detrimento da concepção (essência), assim negando a "acidente" e

"essência" um vínculo subjacente, e mesmo

confundindo de modo idólatra o que é "feito por mãos"

(acidente) com o que não é (essência)?

Isso permite perceber por

que o vínculo entre fé e moral é negado: o hábito

existencialista de separar e negar o vínculo subjacente entre acidente e essência é tão arraigado entre alguns que pedir para se o deixar de fazer em um caso particular soa no

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mais alto grau como uma

indiscrição, se é que o pedido soa de todo compreensível. O obscurecimento pseudo-iniciático do vínculo entre essência e acidente se

manifesta amplamente.

Por exemplo, no feminismo (mesmo primitivo), porque sucede que a situação a que se endereçou Mary

Wollstonecraft criticamente (Inglaterra do séc. XVIII) não supunha uma intervenção

"comissivo-tirânica" da classe masculina sobre a classe

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supunha uma espécie de

abandono e não cultivação; e a autora parece mais se ressentir (em certos pontos),

inadvertidamente, do papel degenerativo, vazio e sombrio que as mulheres haviam

assumido (acidente e "efeito-medusa"), do que de alguma formulação pedagógica

abundantemente administrada e impingida às mulheres

(essência); sendo significativo, a esse respeito, a tese de ares aristotélicos segundo a qual a tirania consiste precisamente em tentar disfarçar o se estar de mãos vazias. A solução feminista histórica parece ter

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sido tornar as mulheres mais parecidas com os homens (o que inclui o desenvolvimento feminista mais recente da promoção indiscriminada do lesbianismo), desembocando corroborativamente na

ideologia identitária

contemporânea, que faz das mulheres, dos negros etc., desde o seu tratamento

midiático, pouco mais do que "personas" políticas e lugares-comuns em forma humana. Algo análogo se passa com a crítica que certos opinadores fazem da Igreja Pós-Concílio Vaticano II, por exemplo o

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documentário "Scandal in the Vatican"; o qual conclui dos escândalos de abuso sexual e pedofilia pelos clérigos pós-conciliares; não que se deveria voltar a uma moralidade sadia tradicional, e sim que a vida celibatária e casta é inviável, e os clérigos devem tomar

esposas para não se tornar desviantes. A solução para a falta da vida consagrada

(essência) é aboli-la de vez para que ela não desemboque nos escândalos (acidente). Entre os exemplos destacados está o terem os conservadores dos Estados Unidos da

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América erigido a "liberdade", sobretudo religiosa (acidente), quando menos como lema ordinário, à condição de supremo valor político ou concernente à promoção do bem comum (essência); o que forçosamente anatematiza o catolicismo "de facto" e

naturalmente tende a o alijar de qualquer respeitabilidade secular íntegra,

comprometendo a sua

liberdade de existir; já que o catolicismo supõe a

anatematização de todas as religiões não católicas, e portanto a desaprovação

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no catolicismo não é possível tomar a "moralidade natural" (acidente) como substituidora suficiente da profissão

dogmática (essência); motivo pelo qual Santo Tomás de Aquino, em comentário a

Romanos 2:14, critica como de ares pelagianos (ou heréticos) a ideia hoje usual de que São Paulo fala de um gentio

seguindo a "lei natural" salvífica sem a conversão. Propõe Santo Tomás, no lugar disso, a ideia de que São Paulo simplesmente fala de um

gentio recém-convertido, socorrido pelas graças da

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do que leva à salvação. O “catolicismo permitido” (alheio às controvérsias teológicas trazidas por tradicionalistas como os

Irmãos Dimond com retidão), em conclusão, é apenas um catolicismo "feito por mãos". Talvez o exemplo atual mais emblemático do

obscurecimento do vínculo entre essência e acidente seja a tendência da New Age,

expressa em um estudioso famoso (e prestigioso) como Graham Hancock, de estudar sítios arqueológicos; como se a posse dos resíduos de

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civilizações antigas (acidente) fosse uma gratificação da alma suficiente ou representasse um substituto suficiente (enquanto gratificação) da reconstituição de tais civilizações (essência). Esse abrir mão de uma

gratificação intelectual, em prol de uma gratificação

relativa a um efeito psíquico, é propriamente o que se pode chamar "xamanismo"; e sucede que o Sr. Hancock é conhecido ativista em favor do benefício de ritos literalmente administrados por xamãs, os quais ritos incluem a ingestão de substâncias alucinógenas.

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O que essas tendências de modo geral assinalam é precisamente um estado de "decomposição" civilizacional, no qual se tem acesso apenas ao que é acidental, a "ruínas arqueológicas".

É disso que fala o monólogo inicial do filme "O Senhor dos Anéis", dito pela personagem elfa (os elfos representam as pessoas contemplativas ou dedicadas à intelecção), Galadriel: "O mundo está mudado. Eu sinto-o na água. Eu sinto-o na terra. Eu cheiro-o ncheiro-o ar. Muitcheiro-o dcheiro-o que havia está perdido, porque ninguém

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agora vive que o lembra." São palavras que assombram.

Na tradição hindu o "olfato" não se associa ao elemento natural do ar, mas sim à água. É o "tato" que naturalmente guarda uma associação

simbólico-metafísica com o "ar". A água (olfato)

corresponde, no simbolismo hindu dos cinco elementos, ao domínio da atividade

econômica (enquanto o ar corresponde ao domínio da "atividade contemplativa"), atividade econômica que tem como um dos aspectos

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midiático ou público. Ao

alegar, pois, que fareja “no ar” (não sente com o tato) o

obscurecimento do que fora conhecido, Galadriel sugere que a percepção do que é

próprio da vida contemplativa passou a ser acirradamente mais dependente do que

subsiste como exterioridade ou cristalização midiática residual (acidente), em oposição ao que subsiste como conhecimento carregado e não potencial (essência).

Eu observei que o

obscurecimento do vínculo entre essência e acidente se

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expressa na dualidade do fruto do conhecimento do bem e do mal, o fruto proibido no

paraíso. Ora, quando Adão e Eva provaram o fruto os seus olhos foram abertos e eles

perceberam a si mesmos como nus, por isso eles coseram

folhas de figueira e fizeram para si aventais (versão bíblica Douay-Rheims). O "avental" sugere uma atividade ou

indústria (acidente), além de ser um objeto "feito por

mãos". O "fruto proibido" é a separação dual do que estava unido na "árvore da vida", a saber, essência e acidente. O fruto sagrado corresponde ao

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"figo"; de modo que os aventais com folhas de

figueira são uma continuação acidental do figo.

Essência e acidente correspondem a "ato" e "potência", ou "ápice" e "gestação"; os quais por sua vez correspondem a

"masculino" e "feminino". A separação entre essência e acidente, assim,

desembocando no abrir de olhos que alertou para a própria nudez, significa também que Adão e Eva perceberam a condição sexuada de um modo mais

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pejorativo, sem a percepção imediata de uma unidade

subjacente entre o masculino e o feminino. Os aventais

suavizam isso, e são um meio de sugerir a condição não decaída. Essa diferença entre ver algo desde um ponto de vista mais elevado, e ver desde um ponto de vista mais

decaído, corresponde, por exemplo, ao fato de que um mesmo termo, "plenitude", pode significar "inteireza", de um lado, e "copiosidade", do outro. O primeiro é um sentido mais qualitativo e "interno", o segundo um sentido mais

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mesma dualidade se expressa na passagem bíblica sobre o "jovem rico" que possuía

muitas virtudes (copiosidade) mas se recusou a ver a unidade subjacente entre elas e a

pobreza (inteireza ou plenitude).

Se os aventais cobrem o que torna cada sexo separado, de certo modo isso sugere que o "figo" é precisamente aquilo que é coberto, porque deixou de ser "uno". A palavra "figo" guarda uma conotação

etimológica de "órgão sexual feminino" (e portanto, de "órgão sexual sem

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qualificação"), por isso a palavra de origem grega "sicofanta" significa,

etimologicamente, "aquele que faz um gesto indecente de dar uma figa".

O ponto é que a unidade subjacente entre essência e acidente passou a ter de ser intermediada por aquilo que é "feito por mãos", algo

acidental, e o se gratificar com o que pertence a essa unidade passou a supor um esforço ("suor da fronte", Gênesis 3:19).

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44

Assim, embora aquilo que é "feito por mãos" suponha uma condição degenerativa ou

decaída, não supõe, entretanto, algo inequivocamente

maligno. Com efeito, aquilo que é "feito por mãos"

corresponde ao "domínio

psíquico", que é propriamente o que o batismo na água

simboliza. Os

sacramentários recomendam que o padre marque (com um sopro) a água preparada para o batismo com a letra grega

"psi" (Ψ – ψ), donde vem

"psique". O batismo ("água" e avental) faz a

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terreno ou sensível ("sangue" e folha de figueira) e o mundo celeste ou suprassensível ("espírito" e figo); por isso "espírito", "água" e "sangue" (1 João 5:8) são princípios do testemunho, ou são

"testemunhas".

Ora, sucede que as chamadas "duas testemunhas

apocalípticas" que profetizam durante a hegemonia secular da "Grande Cidade"

apocalíptica, correspondem a "espírito" (que se associa ao domínio suprassensível) e "sangue" (que se associa ao domínio sensível). O terceiro

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termo ("água") corresponde à própria Grande Cidade, a explicação disso requerendo certo recuo.

A Grande Cidade, também descrita como "a Meretriz Babilônia sentada sobre a besta", possui dois nomes, "Sodoma" e "Egito". Esses nomes degenerativos sugerem expressões degeneradas,

respectivamente; do papel do sacerdote, que deveria buscar uma gratificação intelectual elevada, e do papel do nobre, que deveria disponibilizar uma gratificação intelectual

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dizer, enquanto o

sacerdote entende, o nobre se faz entender. Sodoma e Egito, assim, são imagens sombrias ou acidentais do "espírito" (sacerdote) e do "sangue" (nobre), um par que também correspondem a "luz" e

"calor".

Existe uma outra

correspondência dos dois nomes da Grande Cidade, a saber, "pseudo-iniciação" (Sodoma), que é uma forma pejorativa ou falsa de

gratificação sagrada; e

"contra-iniciação" (Egito), que é a negação máxima de toda

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pretensão a uma gratificação sagrada, isto é, se trata dum "ceticismo" (análogo ao do faraó de Êxodo) boicotador de todo princípio, que por isso mesmo permanece mais discreto em relação ao olhar público do que a "pseudo-iniciação". O psiquiatra Andrew Lobaczewski

acidentalmente topou com essas duas categorias

(propostas por René Guénon), no livro "Ponerologia:

Psicopatas no Poder", já que a pseudo-iniciação (Sodoma) guarda certa correspondência com o "colaborador histérico" da "patocracia" (o governo

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patológico); enquanto a contra-iniciação (Egito)

guarda certa correspondência com o "psicopata". Existe algo de tenebroso e temível na

filosofia política do Dr. Lobaczewski justamente porque ele enxerga esses agentes da patocracia não como fenômenos cósmicos, que têm um papel sagrado a desempenhar na ordem total das coisas, embora se

associem a uma destacada desordem desde um ponto de vista mais baixo; a promoção da exclusividade deste ponto de vista inferior sendo

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efeito que esses agentes maléficos intencionam

produzir. No caso, tomar um fenômeno cósmico por um fenômeno sobretudo

psiquiátrico-político (a política aí entendida em um sentido não religioso), é precisamente uma expressão do tomar o que é acidental em um sentido que supõe o obscurecimento do vínculo entre acidente e

essência. Para falar de modo figurativo ou analógico,

quando o Dr. Lobaczewski vê os agentes patocratas ele vê "fantasmas" ou "aparições" hipnóticos (metempsicose) sem um vínculo subjacente

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com o "eu" dos falecidos (transmigração). A ponerologia, consequentemente, é uma expressão da hegemonia existencialista ou pseudo-iniciática no mundo

contemporâneo. Esta última afirmação não significa,

entretanto, que o próprio Dr. Lobaczewski se enquadre na condição precisa de

"colaborador histérico", uma vez que entre o domínio do conhecimento cosmológico e o domínio ponerológico (isto é, psiquiátrico-político) há uma correspondência, não uma coincidência; o primeiro

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domínio compreende e ultrapassa o segundo.

Tampouco é a minha intenção negar ao Dr. Lobaczewski e à sua pesquisa cheia de

sacrifícios um mérito fora do comum.

As categorias da "pseudo-iniciação" (Sodoma) e da "contra-iniciação" (Egito), também correspondem,

respectivamente, ao tema das "duas torres", em O Senhor dos Aneis, a saber, "a torre de Isengard" e "a torre de

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53

O fato de que a Grande Cidade é una com dois nomes, e as testemunhas são não apenas distintas conceitualmente, mas também apartadas

substancialmente, significa um contexto em que não é

possível dar ao mundo secular uma feição sadia estável por conta da necessidade

premente, por conta de uma tensão ou divisão entre o inteligível ("espírito" e

concepção) e o ininteligível ("sangue" e impressão). Essa tensão é uma gestação e

desvelamento cujo freio ou cuja rejeição desemboca precisamente na

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indulgência da Meretriz

(Grande Cidade), a qual julga que pode descansar desse esforço mesmo sentada sobre as instáveis "muitas águas" (a "besta") que terminam por ressentidamente mortificá-la (essa mortificação

representa o efeito dissipativo natural de retorno contra a coesão intelectual de fachada, pretendida). As duas

testemunhas são o tormento dos "habitantes da terra" porque elas assinalam que concepção e impressão, essência e acidente, são distintos e também

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em vez de substancialmente idênticos; ou,

consequentemente, em vez de assinaladores de uma

estabilidade externa. Essa realidade é uma expressão figurativa do dizer evangélico "O meu reino não é deste

mundo" (João 18:36).

A Grande Cidade é o alívio dos habitantes da terra porque ela alega que concepção e impressão, ou essência e

acidente, são o mesmo, isto é, se está em uma condição

paradisíaca. A Grande Cidade representa a auto-indulgência existencialista em favor do

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56

acidental como substituto

suficiente do essencial, as duas testemunhas representam a mortificação e confissão da precariedade do "acidente" (qual significado pelas

testemunhas se vestirem com panos de sacos), elas

representam a necessidade do contínuo desvelar do elo

subjacente entre acidente e essência; esforço esse que requer uma instabilidade no domínio secular, ou das aparências, que parece

excessivamente pesado aos "habitantes da terra".

(57)

57

A relação entre a Grande

Cidade e as duas testemunhas é um tanto mais intrincada do que até aqui referido. Sucede que as duas testemunhas são o princípio movente da Grande Cidade, assim como a essência é o princípio do acidente,

assim como a ortodoxia é (de certo modo) o princípio da

heterodoxia. De outro lado, é o desvio contínuo da Grande

Cidade que dá às testemunhas matéria sombria ou acidental com que desvelar um fundo concepcional. O que ocorre entre as duas testemunhas e a Grande Cidade é uma "dança da morte". Um dos sentidos

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que subjazem ao motif

artístico-alegórico da "dança da morte", durante o Outono da Idade Média, talvez seja precisamente este: o caráter degenerativo ou relativo a uma instabilidade secular, daquele período, assinalando um fundo sagrado, uma ordem

subjacente.

As duas testemunhas operam "na barriga da besta" (uma

alusão ao profeta Jonas), como São Pedro e São Paulo atuam desde a "Babilônia" (1 Pedro 5:13), a saber, Roma Pagã. A besta apocalíptica representa a pretensão da suficiência da

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59

impressão ou instinto

(acidente), em detrimento da concepção ou intelecção

(essência). O resultado da "dança da morte" é que a atuação das testemunhas, mesmo "divididas",

desemboca na suficiente concentração concepcional. Para melhor explicar a ideia do que motiva a contínua

concentração concepcional, ou para fins de metáfora: o

Patriarca Santo Atanásio de Alexandria foi acusado numa corte judicial, pelo partido da heresia ariana (séc. IV), de haver matado um clérigo

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60

também foi acusado de ter realizado feitiçarias com a mão do cadáver. Quando

Atanásio conseguiu apresentar diante da corte o homem, vivo e bem, que Atanásio teria

supostamente assassinado, a reação dos arianos não foi dar o braço a torcer; mas se diz que os seus acusadores

alegaram com intensa indignação que Atanásio, sendo um feiticeiro, havia

ressurreto Arsênio por meio de bruxaria. Esse é o tipo de

acusação pela qual as pessoas não costumam esperar; e

equivale ao que em inglês se chama "double down", "o

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61

dobro ou nada". Em vez de desistir de propor a

coincidência substancial entre "concepção" e "impressão", a Grande Cidade, similarmente, aumenta a aposta contra as duas testemunhas toda vez, como um viciado em jogo, forçando as duas testemunhas a continuar a se esforçar por servir de oposição à Grande Cidade.

O sentimento de admiração ante essa ousadia da Grande Cidade corresponde ao

"espanto" hipnótico que a Meretriz Apocalíptica

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incitam nas pessoas. Essa é a mesma admiração que o "anel de Sauron" incita no seu

portador, um fascínio ante uma demonstração de poder, poder de um tipo tanto mais sedutor quanto mais apartado em

aparência de um vínculo subjacente com o que "não é feito por mãos". Essa

admiração, ou os agentes que se associam a ela, representam os "xamãs" substituindo o

clérigo na arena pública. A esse respeito o exemplo do partido contrário a Atanásio é particularmente feliz, porque o "xamã" se notabiliza por

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detrimento de transmitir um conhecimento. O que lhe falta em substância, é compensado por suas faculdades teatrais, que podem incluir a

capacidade de se indignar e alegadamente se bater pela verdade e a justiça com

comoventes apelos. O xamã não é insincero no sentido ordinário da palavra.

Ao chegar no limite da

concentração concepcional (ao fim do período de cerca de três anos e meio, metade de sete, este um número que indica "completude" e que é dividido em paralelismo com as

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testemunhas) as duas

testemunhas morrem e jazem sobre as ruas da Grande

Cidade durante cerca de três dias e meio. Esse paralelo dos períodos significa que aquelas concepções acumuladas pelas testemunhas durante a sua pregação são injetadas, de modo condensado, na cidade; durante a exposição dos seus corpos mortos; como o grão de trigo que precisa morrer para dar muito fruto (João 12:25). A morte das testemunhas

significa que não é necessário mais elas procurarem uma unidade subjacente entre impressão e concepção; isso,

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ao mesmo tempo que as faz semelhantes e incorporáveis à Cidade, num primeiro

momento, também significa que existe um limite depois do qual a aposta da Grande

Cidade não pode ser renovada, como um apostador que

perdesse tudo após apostar todas as fichas em um lance infeliz.

A décima parte da Grande Cidade cai ou desmorona no terremoto (Apocalipse 11:13) como expressão dessa

incompletude no seu se manifestar (só é possível

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a ressurreição das

testemunhas; porque o número "dez" representa completude no domínio da manifestação. As duas testemunhas, uma vez ressurretas ou alçadas ao plano celeste, se tornam finalmente distintas e simultaneamente partícipes da mesma

substância suprassensível. Isso permite que a Grande Cidade se torne a "terceira

testemunha" terrestre a fazer com que os "habitantes da terra" temam e deem glória a Deus, a saber, a "água", o

domínio psíquico que serve de intermediário entre o domínio concepcional ou

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suprassensível ("espírito") e o domínio da impressão ou

sensível ("sangue").

Tudo que é "feito por mãos", como a Cidade associada às muitas águas, pode

corresponder ao domínio psíquico. Também a água, como visto. A Grande Cidade, portanto, é uma expressão do domínio psíquico mais

"acidental" do que "natural", ou cujo vínculo subjacente com a essência foi mais

profundamente obscurecido. Assim, é a influência de fator "natural", o terremoto, que restabelece esse vínculo.

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Um outro ponto é que a influência das testemunhas sobre os "habitantes da terra" após a sua ressurreição

significa que, desde que uma pessoa tenha passado pela concentração concepcional de modo suficiente, qualquer matéria particular pode ser usada comunicativamente como meio de se expressar plenamente. Por exemplo, há coisas valiosas e de efeito avassalador que são

comunicadas de modo sutil e a despeito da aparência vulgar, a despeito do conteúdo ordinário na sua superfície. Isso é uma

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das coisas que significa a luta vitoriosa de Sansão usando apenas uma queixada de jumento, contra mil filisteus (essa metáfora é sugerida na bula papal "Mira Circa Nos", 1228 A.D., que canonizou São Francisco de Assis). Alguns santos católicos profetizaram a respeito do "Grande

Monarca", um líder cristão que no final dos tempos restaurará a cristandade no mundo todo desde uma situação de

apostasia quase universal; esse fenômeno guardando nítida relação com o presente

assunto. Ademais, essa profecia, pela pena de São

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Luiz Montfort, fala a respeito de um papel destacado da

atuação da Virgem Maria, que tem o título de "Cidade

Mística de Deus". A Virgem Maria, sob o aspecto de ser um instrumento humilde, que por isso mesmo tanto mais

expressa a glória divina,

guarda certa correspondência com a queixada de jumento. Essas considerações, a respeito de cuja extensividade eu peço desculpas, não apenas

expressam o fenômeno da "pseudo-iniciação", como também expressam a sua

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como o aspecto acidental do real pode se destacar, e como tem de se destacar em relação ao que é essencial na esteira de ser o que é. Assim, a pseudo-iniciação não é um fenômeno inequivocamente maligno, como o número da besta também não é (666, um número triangular que

enquanto tal expressa o auge e também o encerramento

cíclico da própria

degeneração). Ele significa o crescimento do domínio

psíquico ou a multiplicidade sem centro ou sem um vínculo subjacente aparente com o

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"essencial", significa as "muitas águas".

Diante do fenômeno da "abominação da desolação" (Mateus 24), que é um nome para a pseudo-iniciação, é dito por Cristo que os que estão na Judeia devem fugir para as montanhas; o que está no telhado não deve descer para tomar o que quer que seja da casa; e o que está no campo não deve voltar para tomar o seu casaco. Esses três objetos, "Judeia", "casa" e "casaco", correspondem ao domínio psíquico, são objetos "feitos por mãos"; mas em diferentes

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escalas. Isso sugere diferentes expressões de uma mesma degeneração ou decomposição do que é relativo ao domínio psíquico, desde aquilo que é menos inteligível porque mais complexo e abrangente

("Judeia") até aquilo que é mais grosseiro, familiar e

direto ("casaco"). Todos esses objetos "feitos por mãos" estão infectados e exigem "apartar", quando da ascensão

degenerativa da Grande

Cidade. O lamento por aqueles que estiverem carregando

criança (gestação) quando desses dias de fuga; significa, em parte, que a pessoa cujo

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esforço de receber a transmissão religiosa (o

esforço das duas testemunhas) estiver ainda muito incipiente, vai ter esse esforço tanto mais vulnerável e posto em perigo pelos apelos hipnóticos da Grande Cidade. Aquele cuja fuga "se dá no sábado" parece ser o indivíduo imerso na

circunstância de mais enganoso "descanso e

estabilidade" ou "completude" (o sábado é o sétimo dia);

aquele cuja fuga se dá "no inverno" parece ser o

indivíduo imerso na

circunstância de sutileza máxima da degeneração.

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Essas observações sobre a pseudo-iniciação, assim, bastem como sugestão do assunto.

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Capítulo II - Olavo de Carvalho e o tema do

expletivo

Na tarefa de demonstrar a minha tese sobre a filosofia olavista me parece útil

mencionar que, meses antes da publicação do livro do Sr.

Ronald Robson (e do meu

conhecer a imagem da capa do livro), eu havia escrito e

publicado um texto crítico ao "Elementos da filosofia de Olavo de Carvalho" (Ronald Robson); e nesse texto eu mencionara que a filosofia olavista se associa ao

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simbolismo do "mar noturno". Tanto a "luz lunar" quanto o "mar noturno" são expressões acidentais ou indiretas do sol (porque o mar noturno se diz que acumula de modo máximo o calor solar). A luz lunar

representa o domínio

"racional-cerebral", o mar noturno o domínio das

sensações ou dos sentidos. Coincidentemente, o livro de Ronald Robson tem na capa, conforme descobri surpreso, precisamente a imagem de um mar em um período

crepuscular ou no princípio da noite.

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Com o simbolismo, que é a realidade mesma, a

realidade mesma se diz. Consequentemente, pode parecer quase vão dizer qualquer coisa, se o efeito é confirmar o que é sempre confirmado. Por exemplo, e semelhantemente ao caso da capa do livro: eu publicara um texto explicando que o papado é um fenômeno "aquático", na esteira de considerações como as que constam mais acima, significando uma

intermediação psíquica e central ("Cidade Sagrada") como o batismo. Alguém me

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perguntou se ao dizer isso eu me baseara em Santo

Antônio de Pádua, um franciscano e doutor que dissera exatamente a mesma coisa sobre o papado. A

resposta foi "não", eu não tinha a menor ideia de tal coincidência.

O símbolo está impresso nas coisas. Mas é necessário sair da posse "instintiva" dos

símbolos para uma posse mais consciente, em particular no caso presente.

Ora, um sinal simbólico significativo a respeito da

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filosofia de Olavo de Carvalho se expressa por meio de certa tendência ao "instinto", como oposto à "consciência", no lidar eticamente com o que é expletivo. Por exemplo, na página 30 de "Conhecimento por presença" diz o autor (Ronald Robson): "Entre a visão divina própria do demônio e a cegueira

demoníaca inerente a Deus, o ser humano vacila em meio à ausência às vezes fria, às vezes morna, que o separa do ideal e ao mesmo tempo o anuncia." Um expletivo é uma palavra na qual a definição ordinária, o conteúdo semântico principal,

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"vai para a reserva", por assim dizer, é trocado (sem deixar de ser sugerido como sombra) por uma definição acidental.

Assim, quando se diz "Macacos me mordam!", "macacos" é aí expletivo, porque a definição ordinária de "macaco" não é o que se quer dizer.

O Sr. Robson usou o vocábulo "Deus" como expletivo nessa passagem; mais significativo ainda, o uso expletivo desse nome sagrado é a primeira menção a Deus em todo o livro, tornando a intenção expletiva tanto mais enfática.

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A doutrina católica proíbe que se faça isso (essa é a violação do Segundo Mandamento); qual visto, por exemplo, em que um autor renomado de doutrina moral, o Frei Luiz de Granada, expressa esse

Mandamento na fórmula segundo a qual o nome sagrado deve ser usado "apenas com devoção e afeição".

Não é a minha intenção; seja corroborar essa última

observação com fontes ou autoridades (que existem sem escassez); seja transformar o presente estudo em uma

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pregação ordinária; a intenção é, antes, examinar por que

estas duas possibilidades estão fadadas, desde a probabilidade aparente, ao absoluto fracasso em convencer ou demover o meio olavista, para não falar do próprio Olavo de Carvalho. O fracasso provável delas não é aparente senão em um

sentido "instintivo".

Para desenvolver o assunto é preciso falar do que é o

"expletivo" considerado em si mesmo. Ele pode ser

considerado a expressão linguística do acidente se destacando em relação à

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essência, ou se distanciando da essência. Como nos festivais carnavalescos da antiguidade, em que se tratava de "inverter" a ordem "natural" das coisas de modo extraordinário,

substituindo a natureza por aquilo "feito por mãos", qual simbolizado pelas "máscaras" que são feitas pela mão. A linguagem expletiva tem algo a respeito de si que é

carnavalesco e uma exploração "extraordinária" da linguagem. Não se pode viver em um

contínuo e ordinário carnaval; também, uma pessoa não

consegue se comunicar apenas por meio de expletivos,

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embora nas tiranias a

linguagem expletiva cresça de modo extraordinário para que a linguagem não sirva para condenar a má conduta do tirano (essa sugestão está suficiente na Política, de Aristóteles).

Acaso essas considerações

significam, por exemplo, que o palavrão (um expletivo por definição) é sempre

inadequado? Ora, se o

expletivo guarda paralelismo com a situação carnavalesca, a qual acontece a despeito de ser extraordinária, dizer que o

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para se incorporar à linguagem seria o mesmo que julgar que a qualidade "carnavalesca" não pode ser descrita ou sugerida de maneira nenhuma. Estar imerso em uma situação

carnavalesca sem ser capaz de a expressar verbalmente

sugere uma situação de

prevalência das duas noções de Bruno Tolentino (que são propriedades da tirania), "mundo como ideia"

(correspondendo ao auto-engano ou à superstição) e "mundo como rapto"

(correspondendo a um sentimentalismo ou

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obscurecimento acirrador do "aqui e agora").

Se pode dizer que assim como o coser os aventais "feitos por mão", da parte de Adão e Eva, lhes propiciou o amenizar a sensação de "mundo como rapto" da própria nudez, trazendo como contrapeso a insuficiência do avental em restaurar a condição anterior à Queda (isso corresponde a

"mundo como ideia"); o uso de palavrão pode em algumas

situações (a título de resistência primitiva ou incipiente) amenizar a

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como ideia" e "mundo como rapto", que são dois lados da mesma moeda. Por exemplo, no filme "Anaconda 2 - A Caçada Pela Orquídea

Sangrenta" (2004), cujo motif ofídio baste para sugerir a história edênica; o capitão do navio que transporta os

cientistas-pesquisadores pela selva, Bill Johnson (um

veterano militar), tem ele de alojar essas pessoas no seu barco velho e de pouco valor. Além disso, tem ele de ceder o próprio quarto a uma

pesquisadora destacadamente atraente (essa qualidade dela o próprio filme destaca)

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chamada Sam Rogers. A situação é carnavalesca: o

Capitão Johnson tem de correr riscos extraordinários por uma rota perigosa

(vulnerabilidade); tem de

acomodar estranhos, de modo que ele não sabe bem o que esperar deles

(vulnerabilidade); e tem de ceder o próprio quarto a uma mulher atraente

(vulnerabilidade), nisso

necessariamente precipitando uma familiaridade com pessoa do sexo oposto

(vulnerabilidade) que vai continuamente constatar os traços furrecas do seu navio

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sem confortos

(vulnerabilidade). A vulnerabilidade alheia é indecente (ou pode ser

associada de algum modo ao indecente), porque precipita no sentimento excessivo de poder sobre o outro, e o poder se associa à gratificação

excessiva.

"Compreensivelmente", a

reação do Capitão Johnson foi expressar a situação com um expletivo ou palavrão

carregado do se ressentir ele da situação, quando ele diz a Sam Rogers "Se você precisar de alguma coisa... azar o seu!"

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("If you need anything... you're shit out of luck!"). Essa grosseria parece não ter uma razão de ser, a princípio, e sem dúvida supõe um mal sentimento que deve ser evitado, mas se pode

argumentar que, ao sugerir o embaraço da situação, o

expletivo cristalizou a

possibilidade de refletir sobre a situação desde uma posição menos confusa. O expletivo não é uma explicação pronta e acabada, ou suficiente, mas ele cria a possibilidade de um

recuo, conquanto

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a uma condição degenerada; como a Grande Cidade

colabora a seu modo com as duas testemunhas. Mateus 18:7: "Ai do mundo por causa de escândalos. Porque é

necessário que escândalos venham: mas de todo modo ai daquele homem pelo qual o escândalo vem."

Aí está, de algum modo, a chave para entender por que a reação olavista previsível à admoestação sobre o Segundo Mandamento é provavelmente infrutífera: os nomes sagrados, bem como o Mandamento

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são tomados como termos expletivos, não como termos ordinários. A distância normal, ou a perspectiva normal, entre o termo ordinário e o termo expletivo, foram obscurecidas; de modo que o esforço por superar essa condição

degenerativa, desde o ponto de vista olavista, só pode ser

confuso e incipiente, só pode estar amparado de impressões primitivas.

O Sr. Robson não sugere de modo suficiente a consciência de que a linguagem que ele usa supõe uma condição

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acidental e não ordinária, de modo que ele não percebe em que medida a sua linguagem exemplifica como funcionam as categorias de "mundo como ideia" e "mundo como rapto"; exatamente como o súdito de uma tirania não percebe como é não viver em uma tirania. A "expletivação" da

linguagem sagrada, que é por sinal uma propriedade da tirania, torna a linguagem sagrada um corpo de "lugares comuns" que tornam as

pessoas "míseras" ou

"estátuas" (efeito-medusa), correspondendo à obrigação de

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ter a marca da besta para

"comprar e vender". A lógica interna do discurso olavista toma por ordinário um

"contínuo carnaval".

Aqui não se trata de atribuir essa condição degenerativa ao meio social olavista apenas, e não à sociedade

contemporânea de modo geral; se trata apenas de notar a

expressão disso na teoria olavista.

René Guénon fala de como autores espíritas não

conseguem distinguir entre o "imaginável" (correspondendo

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ao sensível) e o "concebível" (correspondendo ao

suprassensível), em livros espíritas em que se descreve a vida em outros "planetas" e "dimensões". As formas "alienígenas" de vida são

apenas variações, de duvidosa criatividade, do modo de vida terrestre, banal. Assim, os espíritas não parecem

conseguir conceber ou admitir a possibilidade de seres vivos cujo modo de ser não é

contínuo com a percepção humana ordinária, seres vivos hipotéticos, por exemplo, que não perceberíamos como seres vivos se topássemos com eles,

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ou cujo modo de ser fosse tão estranho ao modo humano de apreender que seria impossível notá-los.

Isso tudo é análogo a como no olavismo o dogma é

apreendido. É como se o dogma fosse um ser vivente cujo modo de ser é tão

estranho ao modo olavista de apreender, que os dois cruzam caminho sem a percepção

correspondente, "and none is the wiser".

O que o Sr. Robson chama "a visão divina própria do

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demoníaca inerente a Deus" guarda correspondência, respectivamente, com as

categorias de Bruno Tolentino, "mundo como ideia" e "mundo como rapto".

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Capítulo III - Um estudo teológico da teoria dos quatro

discursos

Diz o Sr. Robson (página 100, "Conhecimento por

presença"): "(...) a vontade, livre, necessita perceber a distância entre norma abstrata e a situação concreta

específica, e as mediações entre uma e outra, tão sutis e de uma variedade que dá boa imagem do que seja o infinito, jamais acharão plena

expressão em códigos de lei escrita. Quando uma pessoa passa a acreditar que tudo que

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tem de fazer para ser livre e boa é cumprir uma série de regras prescritivas, está morta e acabada em sua vontade, é escrava de um Outro que promete benevolência e equanimidade, mas serve apenas embotamento de consciência."

Essa tensão entre "verdade" e "vontade" guarda também certa correspondência com a dualidade ou bifurcação de Bruno Tolentino, a saber, "mundo como ideia e mundo como rapto". Na página 64 diz o Sr. Robson: "Essa

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homem por estágios de

personalidade cada vez mais elevados] necessita de um motor: é a vontade, a vontade que afirma a verdade,

precisamente porque a verdade independe da vontade."

Nesse caso "verdade" e "vontade" correspondem,

respectivamente, a "luz lunar" e "mar noturno". Existe um hiato entre esses dois aspectos da natureza, embora ambos se diz que reflitam algo do sol; a lua a luz fria ou reflexa, o mar o calor acumulado. Enquanto a "verdade" é "imóvel" (luz

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em tentativa corroboração da verdade (mar noturno).

A independência entre "verdade" e "vontade" é sugerida pelo Sr. Robson como paralela,

respectivamente, ao hiato entre "norma abstrata" e "situação concreta específica"; o

primeiro par sendo o aspecto "essencial", o segundo o

aspecto "substancial" da

questão. Isso pode ser indicado de modo simbólico: "verdade" e "vontade" (polo essencial) correspondem a "luz lunar" e "calor do mar noturno",

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"situação concreta específica" (polo substancial)

correspondem a "lua separada da luz" e "mar noturno

separado do calor". A

dificuldade que ele examina em se fazer uma intermediação entre "verdade" e "vontade", ou "norma abstrata" e

"situação concreta", também corresponde à oposição que ele irá mais tarde notar e rejeitar (página 193) entre "idealismo" ("inflação" do sujeito) e "realismo"

("inflação" do objeto) quais defendidos modernamente. No par "verdade" e "vontade", o elemento subjetivo

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corresponde à vontade, o elemento objetivo à verdade. No par "norma abstrata" e

"situação concreta" o elemento subjetivo corresponde à norma abstrata, o elemento objetivo à situação concreta. No primeiro par (verdade e vontade) o Sr. Robson sugere a predileção pela atuação do sujeito

(vontade). No segundo par (norma abstrata e situação concreta específica) o Sr. Robson sugere a predileção pela atuação do objeto

(situação concreta).

Consequentemente, a sua

própria formulação descritiva inicial (os dois pares iniciais),

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com o respectivo problema da dificuldade de uma

intermediação, sugere certa afinidade com os pontos de vista que mais adiante ele há de retratar como supersticiosos ("idealismo" e "realismo")

associáveis a uma oposição carecedora de uma

intermediação devida. Essa afinidade não demonstra um erro ou contradição da parte dele, mas é um sinal retórico de uma resolução por se

endereçar a um assunto primeiro desde o aspecto

acidental ou "expletivo", desde a impressão.

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Uma maneira de exemplificar isso de modo mais palpável é com dois exemplos, em

relação ao Segundo

Mandamento. O primeiro eu tomo do opinador público chamado "Conde Loppeux", mas não no sentido de sugerir que ele fale pelo meio olavista (afinal, se eu não posso bancar o Pierre Viret, que ao menos eu não irrite as pessoas como o cafajeste do bar). O segundo de um aluno de Olavo de Carvalho, o Sr. Jelcimar Rouver Júnior.

Quando eu expliquei ao "Conde Loppeux" que, de

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acordo com o Catecismo de Baltimore (um manual usado nos EUA pela Igreja Romana), o Segundo Mandamento

impõe a proibição de se usar o nome de Deus ou de coisas sagradas para expressar

surpresa ou raiva; por conta de um mal entendido (por não achar a fonte etc.), ele

primeiro concluiu da citação por mim dada que eu a tinha inventado pura e

simplesmente. Quando ele eventualmente percebeu que a citação era verídica, e

contrastando com a reação inicial de incredulidade suscitada, ele basicamente

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propôs que a proibição vale para os Estados Unidos

apenas, e seguramente diz respeito às peculiaridades linguísticas daquele país. Assim, ele tomou o meu entendimento como um mau cálculo (nas palavras de

Ronald Robson) da "distância entre norma abstrata e a

situação concreta específica", e como uma admissão de

"regras prescritivas"

desembocando em uma forma de "escravidão" e

"embotamento".

Em paralelismo a isso, o Sr. Jelcimar, verossimilmente

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tomando como contexto certa discussão de texto meu, propôs a ideia de que o uso de

palavrões parece adequado ao meio brasileiro por causa do sensualismo vulgar reinante, a saber, o palavrão na linguagem brasileira dissipa certa

inconsistência existencial, certa afetação. A discussão a respeito tem a ver com a tese (por mim traga) de que a

etiqueta guarda certa

continuidade com o preceito religioso, por exemplo porque tanto a religião quanto a

etiqueta têm por efeito visado a assunção de

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(não no sentido de vaidade, e sim em um sentido mais

elevado). Consequentemente, a discussão do palavrão, a respeito de etiqueta, deveria ser discussão relativa (como a religião) ao que independe de tempo e lugar. A resposta do Sr. Jelcimar a essa abordagem, como visto, foi paralela a do Conde Loppeux: fazer o

preceito descer ao que

depende de tempo e lugar. Essa abordagem em relação a preceitos ou normas abstratas consiste precisamente em "começar pelo acidental". Se trata de um método, o qual é

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cristalizado na Teoria dos Quatro Discursos. De acordo com essa teoria do filósofo Olavo de Carvalho, atribuída a Aristóteles; conforme o Sr. Robson elabora; a ordem da sucessão dos discursos

acompanha uma crescente escala de credibilidade, do discurso poético ao discurso analítico, passando pelos

discursos retórico e dialético. Também, a formulação

cognitivo-cultural, de um dado ou fenômeno, primeiro se

apresenta como "fantasia" ou "possibilidade" (poesia);

depois como verossimilhança ou apelo retórico (retórica);

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depois como superposição de proposições desveladora de um objeto complexo na ordem do conhecer (dialética); por fim, como exposição

demonstrativa transparente (lógica).

Dessa teoria decorre a

constatação de que o Segundo Mandamento é visto de modo "expletivo" (em vez de uma norma imediatamente

obrigante); desde a expectativa ordinária; porque é visto como "fantasia" ou "mera

possibilidade". Sugerir a um olavista a imediata admissão e aplicação desse preceito, por

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meio de uma citação doutrinal; soa tão extravagante quanto alegar que você é um príncipe dinamarquês chamado Hamlet e as pessoas o tratam como maluco por causa de uma atmosfera tirânica e de perigosa intriga política. Existe certo aspecto do fenômeno da linguagem expletiva que é, como já sugerido, a simultaneidade correlativa entre "impressão" (correspondendo a "mundo como ideia") e "sentimento" (correspondendo a "mundo como rapto"). O orientalista Sir John Woodroffe, usando

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uma linguagem kantiana, chama essa experiência de "impressão sem concepção". Na linguagem expletiva (por exemplo, "Se você precisar de alguma coisa... azar o seu!") o aspecto eidético é primitivo ou insuficiente demais para ser associado a uma concepção no sentido ordinário. Em outras palavras, na linguagem

expletiva não se sabe direito o que se está dizendo. Isso

corresponde à superstição de "mundo como ideia"; às

tendências pejorativas logico-matematizantes de autores excêntricos como Otto

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discute em detalhe); e ao caráter de obstáculo relativo que o transcendentalismo de Edmund Husserl atribui aos "dados objetivos", que são precisamente o que Sir Woodroffe chamaria

"impressões sem concepção". Parece, na esteira disso, que discurso poético e discurso analítico (ou lógico),

correspondem,

respectivamente, a "mundo como rapto" e "mundo como ideia". Isso é visto no fato de a filosofia de Olavo de Carvalho associar o discurso analítico, por excelência (na prática), ao

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hiato e àquilo de restrito alcance. É essa, inclusive, matéria para certa "disputa" entre Olavo e o Sr. Robson, em que o último parece se bater um pouco mais pela utilidade ou valor do estudo lógico.

O caráter inicial do discurso poético (na sua

correspondência com a

inermedade da experiência de "mundo como rapto") pode ser ilustrado pelo sentimento de Olavo no escrito "O trauma da emergência da razão", citado pelo Sr. Robson: "Nunca estamos perfeitamente

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adequados à razão; ela nunca é adequada para compreender nenhum caso singular. E muito menos o nosso. A razão é a cruz que o homem carrega." O discurso poético é

correlativo com o discurso analítico, assim como "mundo como rapto" e "mundo como ideia" são correlativos, duas faces da mesma moeda. Isso não significa que o discurso poético e o discurso analítico sejam equivalentes, quais presentemente entendidos, porque, como Olavo de Carvalho bem explica, eles têm finalidades distintas. De

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outro lado, porque o discurso analítico, desde o ponto de vista olavista, é sempre

caracterizado como carregado, na prática, de um hiato e de uma insuficiência ou restrição (que são acidentais à certeza lógica enquanto tal); esse aspecto tem necessariamente de acometer o discurso

poético, ainda que isso aconteça de uma maneira

analógica, como oposta a uma maneira coincidente. Nos dois casos se trata de que os

discursos se carregam marginalmente (isto é, em parte) de uma "impressão sem concepção", ou se

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caracterizam marginalmente por um vazio concepcional. Ora, se o vazio concepcional está dado no próprio discurso de base que fundamenta as possibilidades exploradas por toda a progressão crescente; e se está dado por definição; todo o esquema da progressão supõe um caráter pejorativo ou insuficiente; e esse caráter, sendo associável à cultura; tem de ser associável à tirania, que é o vazio concepcional

expresso no domínio político-cultural. A teoria dos quatro discursos é uma justificação ex

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post facto de uma condição civilizacional tirânica.

Na progressão dos discursos a dupla "discurso poético" e "discurso lógico" guarda certa correspondência com a dupla "discurso retórico" e "discurso dialético"; em que a noção de "mundo como ideia"

corresponde a "discurso

lógico" e a "discurso retórico"; enquanto a noção de "mundo como rapto" corresponde a "discurso poético" e a

"discurso dialético". Tanto no discurso retórico quanto no discurso lógico se fixa

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