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Reflexões acerca da interdisciplinaridade na pesquisa científica em meio ambiente

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Academic year: 2021

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(1)Revista de Educação Vol. XI, Nº. 11, Ano 2008. Fabiana Barbi Faculdade Anhanguera de Jundiaí fabianabarbi@yahoo.com.br. REFLEXÕES ACERCA DA INTERDISCIPLINARIDADE NA PESQUISA CIENTÍFICA EM MEIO AMBIENTE. RESUMO A ciência ambiental procura entender como o sistema humano atua sobre o ambiente e como este responde sobre o primeiro. Seu objetivo é produzir um novo olhar sobre a relação sociedadenatureza. O desafio interdisciplinar que se coloca é a aproximação das ciências da vida e as ciências sociais, e das ciências da vida e as ciências da terra e naturais. A idéia de ciência ambiental envolve uma crítica à excessiva especialização disciplinar e à conseqüente fragmentação do conhecimento. Este artigo pretende expor uma reflexão acerca das dificuldades de aproximação das ciências da vida e das ciências humanas e sociais, o que constitui o grande desafio interdisciplinar. A primeira dificuldade para tanto se encontra na definição de um objeto de pesquisa interdisciplinar. Um outro ponto complicador se dá na formação das equipes de pesquisa interdisciplinares. As barreiras teórico-metodológicas enfrentadas por essas equipes constituem o último obstáculo analisado no caminho da ciência ambiental. Palavras-Chave: Interdisciplinaridade, pesquisa científica, metodologia, meio ambiente, ciência ambiental.. ABSTRACT. Anhanguera Educacional S.A. Correspondência/Contato Alameda Maria Tereza, 2000 Valinhos, São Paulo CEP. 13.278-181 rc.ipade@unianhanguera.edu.br Coordenação Instituto de Pesquisas Acadêmicas e Desenvolvimento Educacional - IPADE. The environmental science aims to understand how the human system acts upon the environment and how this one answers back. It searches to produce a new look upon the relation society-nature. The interdisciplinary challenge that it is placed is the approach of life sciences to the social sciences and of life sciences to the land and natural sciences. The idea of an environmental science involves some critics to the extreme disciplinary specialization and to the consequent fragmentation of the knowledge. This article aims to show a reflection upon the difficulties of approaching life sciences to human and social sciences, which constitutes the great interdisciplinary challenge. The first difficulty for such is on the definition of an interdisciplinary research object. Another difficulty is on the formation of interdisciplinary research teams. The theoretical-methodological barriers faced by these teams constitute the last obstacle analyzed on the way of the environmental science. Keywords: Interdisciplinarity, scientific research, methodology, environment, environmental science.. Artigo Original Recebido em: 09/06/2008 Avaliado em: 01/08/2008 Publicação: 13 de outubro de 2008 109.

(2) 110. Reflexões acerca da interdisciplinaridade na pesquisa científica em meio ambiente. 1.. INTRODUÇÃO Ao longo dos anos, é possível perceber um movimento de especialização cada vez maior no campo científico. Novas disciplinas e áreas de estudo surgem com o objetivo de compreender com maior precisão o mundo complexo em que vivemos. Grandes personalidades como Leonardo da Vinci, que teve méritos como pintor, escultor, arquiteto, engenheiro, cientista e inventor, já não existem mais. Hoje, ao invés de acumular saberes em diferentes áreas, a lógica caminha para uma especialização mais intensa, porém, numa mesma área de conhecimento. Em termos weberianos, o mundo foi desencantado. Não há forças misteriosas incalculáveis, já não precisamos recorrer aos meios mágicos para dominar ou implorar aos espíritos, como fazia o selvagem, para quem esses poderes misteriosos existiam. Podemos dominar todas as coisas pelo cálculo, que em conjunto com os meios técnicos realizam o serviço. Esta é a racionalização intelectualista, criada pela ciência e pela tecnologia orientada cientificamente. A ciência é uma vocação organizada em disciplinas especiais a serviço do auto-esclarecimento e conhecimento dos fatos inter-relacionados; ter vocação íntima para ciência é na verdade apaixonar-se pela especialização (WEBER, 1979). Tal movimento é visto por alguns estudiosos como sinal de maturidade da ciência, sendo que esta apenas avançou devido à especialização das áreas do conhecimento. No entanto, isso pode ser, para outros, sinal de patologia. Para Dahrendorf (1997), a especialização nas Ciências Sociais apesar de ter contribuído para o progresso do conhecimento, foi também a origem da rigidez e do paroquialismo departamentais, que viriam a fragilizá-las. Alguns temas, como meio ambiente, suscitam um grande número de indagações, extremamente diversas em seu conteúdo, e fazem por isso apelo à participação de múltiplas disciplinas pertencentes a quase todas as grandes áreas de investigação científica. A ciência ambiental entra em cena, na tentativa de entender como o sistema humano atua sobre o ambiente e como este responde sobre o primeiro. Seu objetivo é produzir um novo olhar sobre a relação sociedade-natureza. O desafio interdisciplinar que se coloca é a aproximação das ciências da vida e as ciências sociais, e das ciências da vida e as ciências da terra e naturais. Sem dúvida, a idéia de ciência ambiental envolve uma crítica à excessiva especialização disciplinar e à conseqüente fragmentação do conhecimento (ABRAMOVAY, 2002).. Revista de Educação • Vol. XI, Nº. 11, Ano 2008 • p. 109-118.

(3) Fabiana Barbi. A imagem de interdisciplinaridade que se busca não é a mesma que se tinha de Leonardo da Vinci e dos demais renascentistas, mas ainda está em construção e se apresenta como um desafio para os cientistas que se ocupam das questões ambientais. Mas, por que é tão difícil aproximar as ciências da vida das humanas e sociais? Este artigo pretende expor uma reflexão acerca dessas dificuldades. A primeira delas se encontra na definição de um objeto de pesquisa interdisciplinar. Um segundo ponto complicador se dá na formação das equipes de pesquisa interdisciplinares. As barreiras teórico-metodológicas enfrentadas por essas equipes constituem o último obstáculo analisado no caminho da ciência ambiental. Não tivemos a ambição de promover uma análise completa nem alcançar conclusões definitivas, mas sim promover uma reflexão sobre um tema que é comum àqueles que compartilham do desejo de ajudar a produzir avanços em pesquisas sobre meio ambiente.. 2. MEIO AMBIENTE COMO OBJETO DE PESQUISA Ao propormos uma reflexão sobre interdisciplinaridade em meio ambiente, dois conceitos não podem deixar de ser explicados: o de meio ambiente e o de problemática ambiental. E é nesse ponto que se encontra a primeira pedra no caminho tortuoso da interdisciplinaridade. As dificuldades para a definição do termo ‘meio ambiente’ como objeto científico podem ser assim colocadas: a) É um termo polissêmico, já apropriado por alguns setores científicos e tecnológicos com sentidos diferentes; b) É recente, assim como a tomada de consciência em relação aos problemas ambientais; c) É uma idéia mutável no espaço e no tempo, os componentes do meio ambiente evoluem ao longo do tempo; d) É uma noção complexa, envolve fenômenos difíceis de definir e avaliar sob o ângulo técnico e científico (JOLLIVET; PAVÉ, 1992/1996). Ainda assim, esses autores propuseram a seguinte definição: O meio ambiente constitui o conjunto de meios naturais ou artificializados da ecosfera onde o homem se instalou e que ele explora, que ele administra, bem como o conjunto dos meios não submetidos à ação antrópica e que são considerados necessários a sua sobrevivência. Esses meios são caracterizados por sua geometria, seus componentes físicos, químicos, biológicos e humanos e pela distribuição espacial desses componentes; pelos processos de transformação, de ação ou de interação envolvendo esses componentes e condicionando sua mudança no espaço e no tempo; por suas múltiplas dependências com relação às ações humanas; e por sua importância tendo em vista o desenvolvimento das sociedades humanas. (JOLLIVET; PAVÉ, 1992/1996, p. 63).. Revista de Educação • Vol. XI, Nº. 11, Ano 2008 • p. 109-118. 111.

(4) 112. Reflexões acerca da interdisciplinaridade na pesquisa científica em meio ambiente. Essa definição está baseada na idéia que o meio ambiente que nos interessa é aquele relacionado ao homem, às sociedades humanas. O meio ambiente é visto como um conjunto de componentes físico-químicos e biológicos, associados a um conjunto de fatores sócio-culturais, suscetíveis de afetar (direta- ou indiretamente, a curto, médio ou longo prazos) os seres vivos e as atividades humanas na ecosfera (VIEIRA, 1993). Para definir meio ambiente, a adoção do enfoque sistêmico é bastante utilizada, designando o termo em questão não tanto um “objeto”, mas uma “relação”. Por sistema, de maneira geral, entende-se o conjunto de elementos, dotado de uma fronteira, que mantém relações entre si constituindo a estrutura do sistema, que pode mudar com o tempo. Avançando nesse sentido, um sistema humano ou social é um conjunto de indivíduos humanos inter-relacionados e ao meio ambiente acoplado a ele denominamos ambiente humano. O sistema formado conjuntamente por todos os ambientes humanos e todos os subsistemas da ecosfera que estão acoplados a eles constitui o meio ambiente. Por essa definição entende-se que o meio ambiente é um ambiente humano em escala global. Esse constitui o objeto da chamada ciência ambiental. Nenhuma ciência já constituída pode abarcar sozinha tal objeto em sua inteireza (AÍMOLA, 2002). Por exemplo, a ecologia aborda a relação entre os organismos e as coisas, e sua relação entre si, e a relação humana e as coisas e os seres vivos, mas não chega a tratar das relações entre os próprios homens, o que é feito pelas ciências sociais. Pela sua complexidade, o meio ambiente não se enquadra em nenhuma categoria de objeto de pesquisa de nenhuma das disciplinas já constituídas. Em decorrência dessa definição de meio ambiente, a problemática ambiental vem a ser a expressão dos desequilíbrios de natureza sistêmica induzidos pela ação humana sobre a dinâmica de funcionamento dos sistemas eco-sociais. Tais desequilíbrios comprometeriam as precondições de sobrevivência da espécie, numa escala planetária. Assim, a problemática ambiental diz respeito não tanto às transformações do meio em si, mas aos feedbacks dessas transformações sobre a dinâmica de evolução e adaptação das comunidades humanas. Para uma análise adequada da problemática ambiental é necessário transcender o nível da percepção de suas repercussões no domínio dos fenômenos biofísicos e bioquímicos, exigindo o tratamento das características de um longo processo de interações entre fatores geo-bio-físicos e sócio-culturais (VIEIRA, 1993).. Revista de Educação • Vol. XI, Nº. 11, Ano 2008 • p. 109-118.

(5) Fabiana Barbi. A ciência só avança a partir da existência de problemas. A problemática ambiental apresentada é o que nutre a ciência ambiental, isto é, entender como o sistema humano atua sobre o ambiente e como este responde sobre o primeiro é o que caracteriza tal ciência. A partir das definições de meio ambiente e problemática ambiental é possível configurar um projeto possível para o desenvolvimento da ciência ambiental. Trata-se de um movimento no sentido da integração das disciplinas.. 3. INTERDISCIPLINARIDADE EM MEIO AMBIENTE A tal interdisciplinaridade em meio ambiente é vista como um processo de conhecimento que busca estabelecer cortes transversais na compreensão e explicação do contexto do ensino e da pesquisa visando captar as multicausalidades e as relações de interdependência dos processos de ordem natural e social que determinam as estruturas e mudanças socioambientais (JOLLIVET; PAVÉ, 1992/1996). Nesse sentido, a perspectiva interdisciplinar enfatiza a importância dos processos sociais que determinam as formas de apropriação da natureza e suas transformações através da participação social na gestão dos recursos ambientais, levando em conta a dimensão evolutiva no sentido mais amplo, incluindo as conexões entre as diversidades biológica e cultural, assim como as práticas dos diversos atores sociais, e o impacto da sua relação com o meio ambiente. (JACOBI, 2000). Assim, a interdisciplinaridade deve ser encarada como: a) A participação de várias disciplinas num campo comum de pesquisa; e b) O trabalho de pesquisa realizado em comum por várias disciplinas (JOLLIVET; PAVÉ, 1992/1996). Isso não quer dizer, porém, que o trabalho mono disciplinar não tenha importância nesse contexto. O meio ambiente pode ser encarado como um simples domínio de aplicação dos conhecimentos já adquiridos. Nesse caso, as disciplinas se apóiam sobre seus próprios procedimentos de pesquisa para enunciarem as problemáticas ambientais julgadas pertinentes a uma abordagem rigorosa das questões ambientais. Por outro lado, a pesquisa em meio ambiente pode trazer novidades, pode ser que novos objetos de estudo tenham a propriedade de transformar as ciências. De uma maneira recíproca, as pesquisas ambientais gerando novas problemáticas poderão con-. Revista de Educação • Vol. XI, Nº. 11, Ano 2008 • p. 109-118. 113.

(6) 114. Reflexões acerca da interdisciplinaridade na pesquisa científica em meio ambiente. tribuir para o desenvolvimento metodológico e teórico dessas disciplinas (JOLLIVET; PAVÉ, 1992/1996). Encontra-se, nesse ponto, outro fator que pode dificultar o trabalho interdisciplinar, pois fica evidente que esse tipo de atividade não pode ser realizada por apenas um pesquisador. Assim, torna-se necessária a formação de equipes que contem com pesquisadores de diversas áreas do conhecimento e, que no interior de um Programa de Pesquisa se ocupem de estudar esse objeto sob vários ângulos, tratando com rigor as bases teóricas para tanto. No entanto, a ambição de fazer cantar em uníssono as ciências naturais e sociais é constantemente frustrada, pois, segundo Latour (2006), agimos como se as disciplinas, “organizadas em territórios”, pudessem colaborar à moda de micro-reinos ou como cidades-estado da Itália antiga. O problema existente na formação de equipes multidisciplinares é o de ver os experts, cada qual em seu território, tomarem seus préjulgamentos e os de seu vizinho como evidências indiscutíveis. A solução desse problema para o autor vem com a possibilidade de se avivar as diferenças entre duas associações, duas proposições; sua mensagem é não deixar que as disciplinas formem territórios próprios e sim submetê-las à prova que as atravessa todas, sejam elas naturais ou humanas, obrigando-as a distinguir o que elas acreditavam pertencer à natureza do que elas descobrem não ser mais que um encaixe de preconceitos profissionais. Não há interdisciplinaridade se forem mantidos tais territórios. Dessa forma, a construção de relações interdisciplinares trata de transcender às limitações de um padrão de mera justaposição “em mosaico” de saberes especializados, rumo a um patamar superior de sistematização teórica e metodológica. Para isso, a construção e teste de teorias gerais não abole, mas pressupõe – superando – o acervo crescente de teorias pontuais e de porte médio disponíveis atualmente. O caminho rumo à interdisciplinaridade segue no sentido de conciliar a mobilização dos recursos tradicionais e do ângulo de visão típicos de cada disciplina especializada, com um processo de adaptação coordenada de suas categorias de análise e técnicas específicas de investigação (VIEIRA; MAIMON, 1993).. 4. CIÊNCIAS DA VIDA VERSUS CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS Ao tentar aproximar as ciências, vê-se como desafio conciliar a exigência real de formular problemas científicos relativos ao meio ambiente com a obrigação de respeitar a. Revista de Educação • Vol. XI, Nº. 11, Ano 2008 • p. 109-118.

(7) Fabiana Barbi. originalidade eventual das questões geradas pela emergência dos problemas ambientais, seja ela temática, metodológica ou teórica. Assim, ao relacionar as questões ambientais a problemas, métodos e procedimentos já conhecidos, os conhecimentos adquiridos numa disciplina se tornam independentes dos objetivos perseguidos. Um outro caminho a seguir seria a adoção de um ponto de vista particular na abordagem dos problemas ambientais, um ponto de vista novo àqueles que contribuíram para fundamentar as diferentes disciplinas envolvidas. Nesse caso, a ciência ambiental passa a contar com um campo de pesquisa próprio. Mesmo que as diferentes disciplinas se ajustem a seu modo, todas contarão com uma problemática compartilhada, aquela que pode ser derivada de um ponto de vista comum (JOLLIVET; PAVÉ, 1992/1996). Tanto as ciências da vida quanto as sociais já se apropriaram da problemática ambiental sob seu ponto de vista próprio. A construção de uma nova ciência, da ciência ambiental pressupõe que a junção entre as ciências da vida e humanas e sociais dê origem a métodos, teorias, conceitos, abordagens e, sobretudo a problemas científicos diferentes dos que a compartimentação científica convencional é capaz de produzir. (ABRAMOVAY, 2002). O problema é que diferentes disciplinas normalmente possuem diferente léxico, diferentes maneiras de pensar, e diferentes padrões de pensamento. Por essa razão, é necessário algum tempo até que se construam pontes. Nos últimos anos, tem se percebido que o aumento na confiança e respeito mútuo difundiu a cooperação e colaboração entre cientistas sociais e naturais envolvidos no estudo de problemas ambientais. Isso é percebido também, devido à abertura de novas instituições, sociedades e revistas (DASGUPTA et al., 2000). Como vimos, a dimensão humana ocupa uma posição central, na medida em que a noção de meio ambiente sobre a qual trabalhamos é considerada relativa ao homem e às sociedades humanas. Torna-se evidente que as ciências humanas e sociais estão diretamente imbricadas neste debate. A inclusão das ciências sociais nas discussões sobre meio ambiente foi lenta, porém a antropologia e a sociologia são fundamentais para a compreensão das relações entre a sociedade e a natureza (DIEGUES, 2004).. Revista de Educação • Vol. XI, Nº. 11, Ano 2008 • p. 109-118. 115.

(8) 116. Reflexões acerca da interdisciplinaridade na pesquisa científica em meio ambiente. Assim, para alguns autores (VIEIRA, 1993; FOLKE et al., 1998; DIEGUES, 2004), o centro de gravidade do projeto de integração das ciências ambientais deve recair nas ciências humanas e sociais. Há uma certa mobilização de pesquisadores em torno da constituição de um novo campo de conhecimento – as ciências sociais do ambiente – como um esforço de entendimento e confrontação antecipativo-preventiva dos problemas socioambientais. Uma das questões mais instigantes em torno da problemática ambiental se encontra no reconhecimento da importância crucial das variáveis psico-sociológicas, sócio-culturais e político-institucionais envolvidas na gestão preventiva dos problemas do meio ambiente (VIEIRA, 1993). A ‘disputa’ entre a ciência social e natural não tem utilidade para alguns autores (FOLKE et al., 1998). Eles preferem falar sobre as relações entre as instituições e o domínio biofísico. Instituições, aqui, são limites humanamente projetados que moldam a interação dos homens e a maneira pela qual as sociedades se desenvolvem ao longo do tempo. Elas ligam a sociedade à natureza e têm potencial para coordenar os sistemas humanos e naturais de uma maneira complementar para objetivos ecológicos e humanos em longo prazo. Há uma natureza co-evolucionária para o “ajuste” (fit) entre as instituições e o seu meio ambiente. Por isso, não é interessante separar a sociedade da natureza e nem é útil a disputa entre as ciências. Todavia, tanto as instituições quanto o domínio biofísico encontram-se em constante mudança, são sistemas dinâmicos que se relacionam permanentemente. Entender os padrões e as interações desses sistemas, através das escalas espacial e temporal, é crucial para reduzir o desajuste (misfit) entre ecossistemas e instituições. Para tanto, alguns autores propuseram o agrupamento de questões que emergiram da consideração de problemas concretos (JOLLIVET; PAVÉ, 1992/1996). Assim, três grupos de questões foram identificados, referentes a: recursos naturais – diversidade (biológica); grandes equilíbrios planetários e ambiente de vida e saúde. Os problemas ligados ao desenvolvimento das sociedades humanas constituem o pano de fundo de todas elas. Progressivamente são estabelecidas pontes entre esses três grandes grupos de questões, contribuindo para a emergência de um projeto comum.. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Apesar de nosso conhecimento ser parcial, fragmentário, pois a ciência não permite conhecer o todo do qual fomos desprovidos pelo avanço da especialização, tanto a im-. Revista de Educação • Vol. XI, Nº. 11, Ano 2008 • p. 109-118.

(9) Fabiana Barbi. portância quanto a necessidade da prática interdisciplinar em meio ambiente já parecem ter atingido um consenso. O passo seguinte avança na direção de como efetivamente realizar esse trabalho interdisciplinar. Existem dificuldades para se definir meio ambiente como objeto de pesquisa científica. Vimos que nenhuma ciência já consolidada se ocupa em estudá-lo em sua inteireza. Assim, o meio ambiente tal qual o definimos é objeto específico de uma nova ciência que está em construção, a ciência ambiental. Outra dificuldade apresentada se refere à execução do trabalho interdisciplinar, o qual conta com a participação de pesquisadores especialistas que trazem pontos de vista complementares sobre determinado problema ou realidade. Tal atividade não representa um simples somatório, mas a recriação e reconstrução do saber. Em ciência ambiental, o movimento de reintegração dos pontos de vista faz emergir novos pontos de vista que não pertencem a nenhuma das especialidades, mas que só são possíveis a partir delas. A esse respeito, cursos de graduação e pós-graduação em ciência ambiental podem contribuir para o processo de formação de profissionais que apesar da especialização, têm a oportunidade de exercitar a interdisciplinaridade em projetos e pesquisa, junto com outros profissionais. Por fim, a última dificuldade da qual tratamos: a aproximação das ciências da vida das humanas e sociais. Nos debates estabelecidos entre essas ciências, com o objetivo de alcançar um conhecimento mais abrangente e profundo, cada disciplina mantém sua identidade, conserva sua metodologia e observa os limites de sua área. Mas, há um intercâmbio de hipóteses e a elaboração de conclusões que podem induzir uma ação comum e concertada. Na prática interdisciplinar a tensão que se estabelece entre a visão do especialista e a busca da interdisciplinaridade pode produzir resultados altamente positivos, mas, também pode gerar enunciados vagos e superficiais. Somente a integração ativa e contínua da equipe de pesquisa pode superar essa dicotomia de especialização versus generalização, procurando conciliar, em cada etapa, especialidade e universalidade, unidade e diversidade.. REFERÊNCIAS ABRAMOVAY, R. (Org.) Construindo a Ciência Ambiental. São Paulo: Annablume – FAPESP, 2002, p. 153-173.. Revista de Educação • Vol. XI, Nº. 11, Ano 2008 • p. 109-118. 117.

(10) 118. Reflexões acerca da interdisciplinaridade na pesquisa científica em meio ambiente. AÍMOLA, L. A. Complexidade socioambiental, auto-organização e interdisciplinaridade. In: DAHRENDORF, R. Após 1989 – Moral, Revolução e Sociedade Civil. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997. DASGUPTA, P.; LEVIN S.; LUBCHENCO J. Economic Pathways to Ecological Sustainability: Challenges for the New Millennium. In: BioScience, v. 50, n. 4, 2000, p. 339-345. DIEGUES, A. C. As ciências sociais são imprescindíveis para o entendimento do meio ambiente. In: USP Online, São Paulo. Disponível em: <http://www2.usp.br/canalacontece/frame.php?canal=../canalacontece/&conteudo=../busca. php?key=diegues>. Acesso em: 19 jul. 2004, entrevista concedida a Ligia Carriel. FOLKE, C. et al. The problem of Fit between Ecosystems and Institutions. IHPD Working Papers. 1998. n. 2. International Human Dimensions Program on Global Environmental Change, Bonn, Germany. Disponível em: <http://www.uni-bonn.de/ihdp>. Acesso em: 18 jun. 2004. JACOBI, P. R. (Org.) Ciência Ambiental: os desafios da interdisciplinaridade. São Paulo: Annablume – FAPESP, 2000. JOLLIVET, M.; PAVÉ, A. O meio ambiente: questões e perspectivas para a pesquisa. In: VIEIRA, P. F.; WEBER, J. (Orgs.) Gestão de recursos naturais renováveis e desenvolvimento – Novos desafios para a pesquisa ambiental. São Paulo: Cortez Editora, p. 53-111, 1992/1996. LATOUR, B. Vous avez dit pluridisciplinaire? In: Chroniques d'un amateur de science, Paris, Presses de l'Ecole des Mines de Paris, 2006. VIEIRA, P. F.; MAIMON, D. (Orgs.) As Ciências Sociais e a Questão Ambiental: Rumo à Interdisciplinaridade. APED e UFPa, 1993. VIEIRA, P. F. Ciências Sociais do Ambiente no Brasil: Subsídios para a definição de uma política de fomento. In: VIEIRA, P. F.; MAIMON, D. (Orgs.) As Ciências Sociais e a Questão Ambiental: Rumo à Interdisciplinaridade. APED e UFPa, p. 17-43, 1993. WEBER, M. A ciência como vocação. Ensaios de Sociologia. Rio de Janeiro: Rahar Editores, 1979.. Revista de Educação • Vol. XI, Nº. 11, Ano 2008 • p. 109-118.

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