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Desigualdade inter e intra-municipal e a vulnerabilidade frente à violência urbana no contexto metropolitano de Campinas, SP

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Desigualdade inter e intra-municipal e a vulnerabilidade frente à

violência urbana no contexto metropolitano de Campinas, SP

Tirza Aidar♦

Resumo

Utilizando como recorte a Região Metropolitana de Campinas, este trabalho tem como objetivo contribuir para um melhor entendimento da configuração espacial da vitimização frente à violência urbana, através da discussão sobre a adequação e aplicabilidade empírica dos conceitos de desigualdade e de vulnerabilidade sócio-demográfica, pressupondo que, para o enfrentamento das diversidades, além das possibilidades materiais os indivíduos contam com facilidades (ou constrangimentos) relativas ao grupo sócio-espacial em que vivem.

As informações baseiam-se no sistema de informação de mortalidade (SIM/MS e Secretaria de Saúde do Município de Campinas) e nos dados do censo demográfico de 2000. Como indicador de desigualdade utilizou-se o Índice de L-Theil, passível de ser desmembrado em desigualdade inter e intra-municipal. Com relação aos índices de vulnerabilidade, considerou-se a estratificação do município de Campinas em zonas de vulnerabilidade sócio-demográfica, identificadas por Cunha et alli (2004) segundo indicadores sobre Capital Físico, Humano e Social, obtidos para quarenta e nove áreas de ponderação censitárias analisadas, para as quais também foram calculadas taxas de homicídio segundo residência das vítimas.

Trabalho apresentado no XV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em Caxambú, MG – Brasil, de 18 a 22 de setembro de 2006.

Parte deste estudo foi apresentado no XXV Congresso da ALAS, em Porto Alegre, RS, Brasil, em agosto de 2005, sob o título “Vulnerabilidade social e mortalidade por causas violentas no contexto metropolitano: o

caso de Campinas, Brazil”, e integra o projeto "Dinâmica intrametropolitana e vulnerabilidade

sócio-demográfica nas metrópoles do interior paulista", desenvolvido no Núcleo de Estudos de População (Nepo) da Unicamp, com o apoio da Fapesp e Cnpq.

Demógrafa, pesquisadora do Núcleo de Estudos de População e professora no departamento de Demografia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, ambos da UNICAMP, Campinas-SP.

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Desigualdade inter e intra-municipal e a vulnerabilidade frente à

violência urbana no contexto metropolitano de Campinas, SP

Tirza Aidar♦

1. Introdução

As mortes por causas externas1 atingiram cerca de dois milhões de pessoas entre 1980

e 2000 no Brasil, quando a taxa de mortalidade por homicídios aumentou em 130%, sendo responsável por aproximadamente 600 mil mortes no período, dois terços destas ocorridas na década de 90 (Waiselfisz e Athias, 2005). Entre 1991 e 2000, a mortalidade por homicídios passou de 20,9 para 27,0 óbitos por 100 mil habitantes, e para a população de 15 a 24 anos os valores foram de 35,2 a 52,1, respectivamente, menores somente da

Colômbia e da Costa Rica, segundo ranking da Unesco2.

O crescimento da criminalidade não é um fenômeno exclusivamente brasileiro, porém, como destaca Minayo (1994), é preciso considerar as características específicas de cada sociedade antes de relacionar a violência vivenciada hoje no Brasil àquela observada em outros países. Se o olhar recai sobre a mortalidade por homicídios, as diferenças não são irrelevantes; ao contrário, são altamente significativas. Dentre os países Latino Americanos, em 2000, as taxas variaram de 65 homicídios por 100 mil habitantes, na Colômbia, a pouco

mais de 5 na Argentina e Chile em 20003.

Butchart (2002) ressalta que, no caso de comparações entre países a maioria dos estudos evidencia relação inversa entre taxas de homicídio e o produto interno bruto per

capta. Entretanto, tal relação nem sempre é comprovada e, o mesmo autor encontra

resultados mais consistentes em trabalhos que consideram indicadores de desigualdades internas: quanto maior a desigualdade econômica dentro dos países, maior é a taxa de homicídios entre jovens e crianças.

Trabalho apresentado no XV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em Caxambú, MG – Brasil, de 18 a 22 de setembro de 2006.

Versão modificada e atualizada do trabalho “Vulnerabilidade social e mortalidade por causas violentas no

contexto metropolitano: o caso de Campinas, Brazil”, apresentado no XXV Congresso da ALAS, em Porto

Alegre, RS, Brasil, em agosto de 2005.

Este estudo foi desenvolvido no âmbito do projeto "Dinâmica intrametropolitana e vulnerabilidade sócio-demográfica nas metrópoles do interior paulista", desenvolvido no Núcleo de Estudos de População (Nepo) da Unicamp, com o apoio da Fapesp e Cnpq.

Demógrafa, pesquisadora do Núcleo de Estudos de População e professora no departamento de Demografia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, ambos da UNICAMP, Campinas-SP.

1 Na classificação internacional de causas de morte e de doenças, as causas externas são consideradas pela Organização Mundial da Saúde como “causas violentas”, em contraposição às demais que levam os indivíduos a adoecer e morrer (Mello Jorge, 1998).

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Em 2000 a taxa de homicídios no Brasil só foi menor que a da Colômbia onde, em 1998, esta taxa foi de 60 por 100 mil hab.. Em 2000 a taxa de mortalidade por homicídios no Estado de São Paulo foi de 42,2 por 100 mil hab., e de 86,6 para população da capital(Pesquisa da UNESCO, que envolveu 60 países, divulgada no Jornal Follha de São Paulo, 2002).

3 Demographic Yearbook (http://unstats.un.org/unsd/demographic/products/dyb/dyb2.htm) em 11/07/2005; e Organización Panamericana de al Salud ( http://www.paho.org/english/ad/dpc/nc/violence-graphs.htm) em

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Durante os anos 80 e início dos 90, com concentração em estudos comparativos entre capitais e regiões metropolitanas, a literatura brasileira apresentava como hipóteses explicativas fatores relativos à pobreza, rápida concentração populacional, ao processo desordenado de ocupação dos espaços urbanos, ao desemprego e presença do crime organizado (Rolnik, 1999; Adorno, 1993; Zaluar et al., 1994). Entretanto, apesar destes fatores serem avaliados, muitas vezes, separadamente, tornou-se praticamente consenso que nenhum deles é capaz de explicar isoladamente e de forma constante para as diversas regiões e períodos, o aumento da mortalidade por homicídios na década de 90; ou mesmo a sua mais recente interiorização, se estendendo para além dos grandes municípios ou daqueles com altos índices de desigualdades sociais (Adorno e Cardia, 2002; Lima, 2005).

Simultaneamente à deterioração da qualidade de vida e à segregação sócio-espacial de

determinados grupos populacionais, entre outros fatores apontados por diversos autores4,

salienta-se o importante papel da expansão do crime organizado, em especial do narcotráfico, diante da fragilidade institucional para a repressão e prevenção da criminalidade (Adorno e Cardia, 2002; Zaluar, 1994 e 1999).

Trabalho realizado para o estado de Pernambuco, Nordeste brasileiro (Lima et al, 2005), conclui que os índices médios de pobreza e escolaridade dos municípios se relacionam de forma inversa com as taxas de homicídios, sendo que indicadores de desigualdade intra-municipal não apresentam relação significativa. Os autores discutem a possibilidade de que o próprio tráfico de drogas, gerador de violência, tenha participação ativa na melhoria dos indicadores (médios) de renda e escolaridade de alguns municípios.

Com informações sobre residência das vítimas e indicadores sócio-demográficos, georeferenciados segundo áreas de abrangência das unidades de saúde do Município de Campinas, Aidar (2003a) encontra relação entre os índices de mortalidade por agressões e a proporção de crianças e jovens fora da escola e de responsáveis pelos domicílios com baixa escolaridade. Tal relação, entretanto, é menos evidente no início dos anos 90 e não aparece como significativa quando da análise inter-municipal, considerando a Região Metropolitana de Campinas. Ou seja, as associações variam com o tempo e a depender da unidade de análise utilizada (intra ou inter-municipal).

Adicionada à complexidade do fenômeno, a dimensão e a diversidade do território brasileiro impossibilitam que resultados obtidos em estudos localizados para algum estado ou região possam ser generalizados. Neste sentido, são fundamentais o desenvolvimento, aprofundamento e divulgação de pesquisas que focalizem diferentes regiões e as diversas formas de desagregação espacial. .

Utilizando como recorte a Região Metropolitana de Campinas (RMC), o presente trabalho analisa a configuração sócio-espacial da vitimização frente à violência e sua relação com indicadores sobre desigualdade e vulnerabilidade sócio-demográfica. Partindo-se do pressuposto de que para o enfrentamento das diversidades, além das possibilidades materiais, os indivíduos contam com facilidades (ou constrangimentos) relativas ao grupo sócio-espacial em que vivem, a análise empírica incorpora resultados iniciais relativos à construção do conceito de "vulnerabilidade social" apresentada em Cunha et al. (2004). Embora ainda em construção, tal conceito tem a vantagem, frente aos indicadores de pobreza, de considerar diversas dimensões incluindo “(...) elementos ligados tanto às

4 Gawryszewski, 2002; Freitas et al., 2000; Akerman e Bousquat, 1999; Barata et. al., 1999; Drumond Jr. e Barros, 1999; Lima e Ximenes, 1998.

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4

características próprias dos indivíduos ou famílias, como seus bens e características sócio-demográficas, quanto àquelas relativas ao meio social onde esses estão inseridos”. (Cunha

et al., 2004: p 4). Esta abordagem busca aprofundar análises dos fenômenos sócio-demográficos e disponibilizar conhecimentos e evidências que subsidiem o planejamento e gestão de políticas públicas.

Neste sentido, com uma perspectiva demográfica pretende-se contribuir com a discussão sobre a complexa inter-relação entre fatores predominantemente estruturais e a evolução da violência urbana no Brasil.

2. Material e Métodos

O Censo Demográfico de 2000 (IBGE), o O Sistema de Informação de Mortalidade (SIM-DATASUS) e o Banco de Óbitos de Campinas (Secretaria Municipal de Saúde) formam o conjunto de fontes de dados socioeconômicos e demográficos e sobre mortalidade violenta, reconhecidamente de qualidade e boa cobertura para o estado de SP.

Os índices de violência foram avaliados através das taxas de mortalidade por agressões (óbitos para cada 100.000 habitantes), segundo local de residência. Neste sentido foi necessário considerar a qualidade das informações da causa básica do óbito, pois ao se desagregarem as causas externas em subgrupos, observam-se diferenças, muitas vezes relevantes, entre períodos e regiões na proporção de mortes classificadas como “eventos com intenção ignorada” (Souza e Minayo, 1994; Aidar, 2003b).

Sendo assim, e partindo-se do princípio que qualquer agressão que resulte em morte é reflexo de comportamentos e vivências violentas, as causas classificadas como “agressões com intenção ignorada” foram incorporadas às demais agressões (homicídios – códigos X85 a Y34 da CID10).

Para possibilitar a análise intra-urbana no município de Campinas, foi necessário compatibilizar as unidades geográficas disponíveis nos dados de mortalidade e demográficos. Com o auxílio de recursos computacionais e sobreposição de mapas, o local de residência das vítimas de agressão foi associado aos setores censitários (1314) e agrupamentos destes, 49 Áreas de Ponderação (AP), assim denominados pelo IBGE (Quadro 1 em anexo). O processo acima foi realizado para os anos de 1999, 2000 e 2001, e a taxa de mortalidade foi contabilizada pela razão entre a média do número de óbitos dos 3 anos e a população (vezes 100 mil habitantes).

O tratamento dos dados e construção das informações georeferenciadas foram efetuadas com os softwares SAS (Statistical Analysis System, for Windows V8) e ArcView GIS 3.3, respectivamente.

Como indicador da desigualdade dos espaços urbanos, decidiu-se pela utilização do Índice de Theil (Hoffmann e Leoni, 1998), por possibilitar a representação das desigualdades entre e dentro dos sub-espaços que compõem a unidade geográfica em questão. Em outras palavras, é possível determinar a contribuição da desigualdade de cada sub-espaço e da desigualdade entre estes, no índice de desigualdade geral dos espaços urbanos5.

5 Como igualdade, entende-se que todos os elementos de uma mesma unidade de análise (espaços urbanos, neste caso) assumam valores próximos da média da variável considerada, independente do valor da mesma.

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Embora se reconheça que a renda não descreve isoladamente a complexa composição dos diversos fatores relacionados à “qualidade e condições de vida”, por motivos

operacionais a renda domiciliar per capita e a renda do chefe do domicílio6, foram

selecionadas como base da mensuração das desigualdades socioeconômicas entre e dentro dos espaços urbanos.

A decomposição da desigualdade foi obtida para cada município da RMC, e cada área de ponderação do município sede. Os setores censitários representaram as unidades espaciais internas aos municípios e às AP de Campinas.

Como aproximação do conceito “vulnerabilidade social”, lançou-se mão dos indicadores sintéticos relativos a três dimensões, quais sejam, Capital Físico, Capital Humano e Capital Social. Tais indicadores, obtidos por Cunha et al. (2004) para as AP’s de Campinas, se basearam em informações secundárias que se aproximassem da classificação sugerida por Kaztman et al. (1999:10 e 11 – apud Cunha et al., 2004), como descrito abaixo.

A dimensão Capital Físico inclui as condições disponíveis para o atendimento de necessidades básicas de bem-estar, como características físicas de moradia e “posse de bens

duráveis importantes para a reprodução social”, além do capital financeiro, incluindo

poupança, crédito, seguros, etc. Como Capital Humano deve se considerar o trabalho e, como estratégia de aumentar seu valor agregado, o investimento em saúde, educação e qualificação profissional. A terceira dimensão, o Capital Social, apresenta maior complexidade de definição conceitual e de verificação empírica, pois incorpora aspectos muitas vezes subjetivos e dinâmicos como o acesso a bens, serviços e informações através de redes de apoio e reciprocidade existentes na comunidade, família, associações e/ou agremiações trabalhistas, religiosas, etc.

Baseada na avaliação das potencialidades das informações censitárias, a construção empírica dessas dimensões, desenvolvida por Cunha et al. (2004), buscou contribuir com a discussão conceitual e sobre a aplicabilidade destes conceitos para descrever e entender os diferenciais sócio-espaciais da metrópole. As três dimensões foram então construídas através de análise fatorial considerando informações censitárias, descritas na Tabela 1 em anexo.

• Capital físico, com 11 variáveis: Densidade de Moradores por Cômodo (DensCom); % chefes de família (ou individuais) com renda de “0 a 2 SM” (RenChF2); % pessoas morando em domicílios do tipo "casa" (TipoCasa); % pessoas morando em domicílios do tipo "cômodo" (TipoCom); % pessoas morando em domicílios "próprios em aquisição" (CondPropAquis); % pessoas morando em domicílios "alugados" (CondAlugado); % pessoas morando em domicílios sem canalização de água (AguaNCanal); % pessoas morando em domicílios sem banheiro (S/Banheiro); % pessoas morando em domicílios com 2 ou mais banheiros (2+Banheiros); % pessoas morando em domicílios sem rede geral de esgoto (S/RedeEsg); % pessoas morando em domicílios sem coleta de lixo (S/ColetaLixo).

6 Como ressalta Hoffmann (2004): “Justifica-se considerar o domicílio como unidade de análise, já que é nessa esfera que são tomadas as decisões relativas tanto ao consumo quanto à participação na atividade econômica de seus membros, que é a principal fonte de renda para a maioria dos domicílios.”

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• Capital humano, com 3 variáveis: % pessoas analfabetas com 15 anos ou mais de idade (PessAnalf15); % chefes de família (ou individuais) com menos de 4 anos de escolaridade (EscChF4); Razão de Dependência (Pop. “0 a 14” + “65 ou mais” / Pop. “15 a 64” anos) (RDEP);

• Capital Social, com 6 variáveis: % chefes de família (ou individuais) femininos, com “10 a 19” anos (ChFfem20); Tamanho Médio da Família “principal” (TamFam); % pessoas sendo agregados da família (OutAgreg); % pessoas, com mais de 14 anos, ocupadas sem carteira de trabalho assinada (S/Carteira); % crianças de 7 a 14 anos que não freqüentam escola ou creche (N/FreqEsc); % famílias com renda não proveniente do trabalho (FamRendNT).

Para avaliar a significância estatística das associações entre os indicadores, foram feitas análises de correlação e de regressão múltipla. Quanto à última, a escolha do melhor conjunto de variáveis para descrever a variabilidade observada entre os índices de violência nos diversos subespaços foi feita através do procedimento “stepwise”. Neste procedimento as possibilidades de entrada e saída das variáveis “independentes” são estatisticamente comparadas num processo iterativo que finaliza quando nenhuma variável adicional agrega qualidade aos parâmetros do modelo. Desta forma, buscou-se avaliar a importância de determinados fatores e como estes se intercorrelacionam / interagem no sentido de minimizar, ou não, a vulnerabilidade frente à violência urbana.

3. Resultados

3.1 Municípios da Região Metropolitana de Campinas

A configuração dos espaços mais violentos na Região Metropolitana de Campinas mostra o eixo Campinas – Monte Mor como sendo o mais crítico (Figura 1). Não é à toa que, dentre os 19 municípios, quatro têm sido apontados entre os mais violentos do Estado de São Paulo, apresentando taxas de mortalidade por agressões superiores a 50 por 100 mil habitantes (Tabela 1).

Comparando as taxas de mortalidade com o Índice de Theil, calculado segundo a variável renda domiciliar per capita, observa-se que os municípios com maior desigualdade não são, necessariamente, os mais violentos, à exceção de Campinas, que se coloca em primeiro lugar quanto à desigualdade e em quarto mais violento.

Os demais municípios com altos índices de violência, Cosmópolis, Hortolândia, Monte Mor e Sumaré, apresentam baixa desigualdade, mas destacam-se entre aqueles com menor renda per capita e alto índice de intensidade de pobreza (Tabela 1). Suas características são de cidades-dormitório, onde a população de baixa renda tem em Campinas acesso ao trabalho, em geral de baixa remuneração. A mão-de-obra qualificada das indústrias dessas cidades, em geral, é composta por residentes em Campinas, sendo que a infra-estrutura urbana não atende todas as necessidades da população (Cano e Brandão, 2002; Baeninger, 2001).

Em geral, os índices de violência apresentam relação significativa e inversa com a desigualdade mensurada pela renda dos chefes dos domicílios, em especial àquela relativa à

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heterogeneidade dentro dos setores censitários. Ou seja, os municípios menos violentos são aqueles mais homogêneos quanto à renda dentro dos setores censitários. Exceções aparecem em Campinas e Vinhedo que, ao contrário dos índices de violência, se assemelham quanto à maior desigualdade geral, e entre setores censitários, e aos bons indicadores sócio-demográficos.

Os resultados obtidos no primeiro modelo de regressão (Tabela 2) indica que a intensidade da pobreza, entre aqueles com renda domiciliar per capta abaixo de R$ 75,50, têm forte correlação positiva com os índices de violência dos municípios da RMC,

contribuindo com 72% para a qualidade do ajuste, que alcançou um R2 igual a 70,9 %. O

segundo indicador selecionado se trata da desigualdade interna aos setores censitários, com 15,8% de contribuição, e o terceiro foi a proporção da população alfabetizada, com 12,4% de contribuição, ambos com relação negativa com as taxas de mortalidade por agressões.

Figura 1

Taxa de mortalidade por agressões (por 100 mil) dos municípios da Região Metropolitana de Campinas, 2000.

Fonte: SEADE. Tabulações e digitalizações próprias.

O melhor modelo foi aquele ajustado para os municípios do entorno da RMC, alcançando 76,2% de possibilidade em descrever a variação dos índices de violência com as mesmas variáveis, sendo a desigualdade geral responsável por 24% da qualidade do ajuste, ainda com relação negativa.

Ou seja, quando o município sede é incluído na análise, as variáveis selecionadas são as mesmas, com exceção da desigualdade interna aos setores censitários passa a ter maior relevância no sentido de “proteção” quanto à violência.

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Tabela 1

Taxa de mortalidade por agressões, indicador de desigualdade (Theil) e outros indicadores selecionados. Municípios da Região Metropolitana de Campinas, 2000.

per capita Americana 15,3 0,384 0,318 0,256 0,061 1,92 473,23 43,7 95,6 12,8 Artur Nogueira 18,1 0,344 0,314 0,255 0,059 6,01 315,94 44,8 90,9 26,5 Campinas 50,1 0,523 0,387 0,245 0,142 1,50 614,86 50,1 95,0 15,5 Cosmópolis 36,1 0,341 0,302 0,281 0,022 2,13 302,06 52,6 93,0 19,1 Engenheiro Coelho 19,9 0,384 0,329 0,273 0,056 4,07 297,55 38,0 87,9 27,4 Holambra 0,0 0,467 0,447 0,369 0,078 2,77 474,51 36,4 92,0 20,7 Hortolândia 57,7 0,298 0,219 0,188 0,031 6,80 259,10 48,7 92,4 20,0 Indaiatuba 21,8 0,443 0,335 0,276 0,058 4,27 444,93 43,4 93,7 17,8 Itatiba 8,6 0,415 0,347 0,298 0,049 3,11 430,40 34,2 93,4 16,2 Jaguariúna 20,3 0,445 0,345 0,301 0,044 2,66 398,13 44,1 92,5 16,8 Monte Mor 58,9 0,390 0,300 0,261 0,040 4,30 258,31 46,9 89,6 20,2 Nova Odessa 26,1 0,327 0,275 0,250 0,025 2,37 341,40 38,0 94,4 16,4 Paulínia 23,4 0,432 0,273 0,241 0,032 3,80 503,34 38,1 93,9 13,7 Pedreira 14,2 0,351 0,282 0,241 0,040 2,59 363,83 37,7 93,0 29,8

Santa Bárbara d'Oeste 21,8 0,298 0,249 0,214 0,036 1,77 325,31 41,4 93,7 13,5

Santo Antônio de Posse 33,1 0,459 0,335 0,295 0,041 2,65 319,23 34,7 88,6 31,0

Sumaré 63,5 0,317 0,258 0,216 0,042 3,92 291,61 51,8 92,1 18,6

Valinhos 4,8 0,443 0,352 0,296 0,056 2,25 569,31 26,4 94,4 13,4

Vinhedo 8,5 0,469 0,411 0,294 0,117 3,85 627,47 42,4 94,1 15,0

Correlação com a taxa de

mortalidade por agressões 1,00 -0,30 -0,52* -0,63* -0,14 0,29 -0,47* 0,71* -0,22 0,08

Fontes: SEADE e Censo Demográfico 2000 – Tabulações próprias. (1) Atlas de Desenvolvimento Humano/PNUD/IPEA/FJP - 2003.

(1) IP: diferença da renda domiciliar per capita média dos indivíduos pobres (renda domiciliar per capita inferior à R$ 75,50) do valor de R$ 75,50, divido por R$ 75.50 e multiplicado por 100.

(* ) Estatísticamente significativo ao nível de signifcância de 5%

Intensidade da pobreza[1] % de Jovens de 11 a 17 anos fora da escola % de Alfab. na pop. com + de 15 anos Índice de Theil

Renda dom. Renda do Chefe do dom. Geral Intra

setores Entre setores Município Mortes por

agressão por 100 mil hab. Taxa de cresc. anual (%) 1991 – 2000 Média da renda domiciliar per capita

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Tabela 2

Melhores modelos para a taxa de mortalidade por causas violentas e indicadores sócio-demográficos e de desigualdade. Coeficientes estimados e R2.

Municípios da região Metropolitana de Campinas, 2000.

Coef. Ajuste % Coef. Ajuste (1) Parcial do R2 (1) Parcial

R2 - parâmetro para avaliar a qualidade do ajuste do modelo 70,9 100,0 76,2 100,0 Desigualdade da renda dos chefes de domicílios (L-Theil) -165,03** 18,3 24,0

Taxa anual de crescimento populacional (%) Média da renda domiciliar per capta

Intensidade da Pobreza (2) 1,48** 51,0 71,9 1,230** 47,0 61,7

% de população com mais de 15 anos Alfabetizadas -2,68* 8,8 12,4 -2,94* 10,9 14,3 % de jovens entre 11 e 17 anos, inclusive, fora da escola.

Fonte: Censo demográfico de 2000. Sistema de Informações de Mortalidade /MS. Tabulações NEPO/UNICAMP. (1) As estrelas indicam o nível de significância dos coeficientes estimados: (*) 5% e (**) 1%.

(2) Diferença relativa da renda domiciliar per capita média dos indivíduos pobres (renda inferior à R$ 75,50) do valor de R$ 75,50, divido por R$ 75.50 e multiplicado por 100.

Parâmetros estimados para os modelos selecionados pelo procedimento "Stepwise"

Variáveis independentes incluídas na análise

Desigualdade dentro dos setores censitários da renda dos

chefes de domicílios (L-Theil) -199,19* 11,2

% Todos os Municípios Exceto Campinas

Desigualdade entre os setores censitários da renda dos chefes de domicílios (L-Theil)

15,8

3.2 Campinas: análise dos subespaços urbanos

A referência espacial revela uma concentração das áreas (AP’s) mais violentas na região sul e sudoeste do município de Campinas (Figura 2), regiões com grande número de ocupações irregulares e população vivendo em locais sem infra-estrutura e acesso a

serviços básicos de qualidade7.

Na região central, predominantemente urbana e com alto adensamento populacional, a presença de locais valorizados e com melhor infra-estrutura urbana, contrasta com regiões (bolsões) de pobreza e maiores índices de mortes violentas, como o Jardim Campineiro e Jardim São Marcos (AP 09), o Parque São Quirino (AP 34), o Jardim Itatiaia (AP 21) e Paranapanema (AP 41).

As regiões norte e nordeste, não apresentam uma característica de urbanização única, com espaços recentes de ocupação e alguns já consolidados, apresentando, em alguns pontos, crescimento urbano acompanhado de favelas e, em outros, regiões de alto valor imobiliário com condomínios fechados, além de incluírem grande parte da área rural do município.

7 Destaca-se nessa região o Jardim Florence (AP 26), Região dos DICs (AP 01, 07 e 31), Cidade Satélite Íris (AP 25) e Jardim Campo Belo (AP 46), e as ocupações Parque Oziel e Monte Cristo (AP 33) e Vila Vitória (AP 26).

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Figura 2

Distribuição das Áreas de Ponderação (AP’s) segundo taxa de mortalidade por agressões. Campinas, 2000.

Fonte: Secretaria Municipal de Saúde e Censo Demográfico 2000/IBGE. Tabulações e digitalizações próprias.

Comparando indicadores sócio-demográficos calculados para quatro grupos de Áreas de Ponderação (AP), baseados nas taxas de mortalidade por causas violentas, observa-se mais uma vez que os espaços urbanos onde a população mais sofre com perdas fatais são aqueles com concentração de domicílios com baixa renda, adultos com menor escolaridade, jovens com menor chance de freqüentar uma escola de qualidade. Conseqüentemente, são justamente nestes locais onde vivem jovens e adultos com menor oportunidade de conseguirem qualificação adequada e boa colocação no mercado de trabalho (Tabela 3).

Quanto à desigualdade, mensurada pelo Índice de Theil a partir da renda domiciliar

per capita, a relação não é evidente. Embora com diferenças mínimas, o grupo II é aquele

com maior desigualdade. A maioria das áreas desse grupo localiza-se na região central e no norte de Campinas, caracterizadas pela convivência de domicílios de alto padrão socioeconômico, incluindo condomínios fechados, com grupos populacionais morando de forma bastante precária.

Analisando o Gráfico 1, verificam-se algumas peculiares. Há algum indício de que a relação entre a desigualdade e a taxa de mortalidade por homicídios seja inversa, principalmente ao se eliminar da análise as áreas 09, 26, 33 e 46. Tais áreas possuem as maiores taxas de mortalidade, índice de desigualdade mediano e população predominantemente de baixa renda. Já a AP 08 (do grupo II – Tabela 3), também destacada no Gráfico 1 e localizada a noroeste do município, apresenta alta taxa de desigualdade, baixo índice de violência e indicadores socioeconômicos intermediários.

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Da mesma forma do procedimento da análise intermunicipal, a decomposição do Índice de Theil se deu através da variável renda mensal dos responsáveis dos domicílios particulares permanentes, calculadas para os setores censitários, que por sua vez foram agrupados em Áreas de Ponderação. Portanto, para cada área foram considerados os indicadores de desigualdade entre e dentro dos setores censitários que a compõe.

Tabela 3

Indicadores selecionados e Índice de Theil para a renda domiciliar per capita, segundo agrupamento das Áreas de Ponderação (AP) baseado nas taxas de mortalidade por causas violentas. Campinas, 2000.

G1 G2 G3 G4

Número de AP´s 12 12 12 13

Número de setores censitários 325 352 300 337

População residente em domicílios particulares permanentes 203.783 235.735 237.605 282.381 Taxa de mortalidade por agressões (por 100 mil hab.) 14,4 32,4 46,2 89,4 Valor mínimo (máximo) das taxas de mortalidade por agressões das

AP's 7,6 (21,3) 22,1 (36,4) 38,4 (57,7) 60,4 (148,7)

% de setores onde ocorreu homicídios 8,3% 16,5% 26,9% 30,3%

% de população residente em setores com homicídios 9,2% 20,8% 30,5% 35,6%

Média dos anos de estudos 10,9 9,7 7,9 6,9

% de população com 15 anos ou mais não alfabetizados 1,0 1,6 2,3 6,5 Frequenta escola particular (% da pop de 11 a 17 anos) 41,0 26,4 8,1 5,9 Frequenta escola pública (% da pop de 11 a 17 anos) 54,6 66,3 83,9 80,8 Não frequenta a escola (% da pop de 11 a 17 anos) 4,3 7,4 7,9 13,4 Média da renda domiciliar per capta 1.242,23 907,53 448,27 365,87 Mediana da renda domiciliar per capta 750,00 496,33 300,00 209,40 Número médio de moradores por banheiro nos domicílios. 1,7 2,0 2,8 3,0 Desigualdade quanto à renda domiciliar per capta (Theil) 0,409 0,440 0,327 0,399 Fonte: Censo Demográco de 2000 (IBGE) e Sistema de Informção de Mortalidade (Sec. De Saúde de Campinas). Tabulações NEPO/UNICAMP.

Indicadores selecionados

Agrupamento das AP's segundo índices de violência

Análise exploratória preliminar revela que a desigualdade interna aos setores censitários apresenta maior relação com a violência do que os diferenciais entre os setores. Como exemplo, temos, por um lado, a região Sul que contém a maioria das AP’s no grupo mais violento e homogêneos quanto à pobreza e carências em geral e, por outro lado, as áreas localizadas na região central do município são as mais desiguais e nem sempre violentas.

Buscando resumir e compreender as inter-relações entre os diversos fatores, a Tabela 4 mostra os resultados obtidos para os dois modelos ajustados nessa análise intra-municipal. No primeiro caso foram considerados os indicadores de desigualdade e variáveis relativas à renda média dos domicílios e seus responsáveis, o índice da intensidade da pobreza dentre os mais carentes, a escolaridade dos adultos e o acesso à escola dos jovens de 11 a 17 anos. O melhor modelo selecionado pelo procedimento estatístico alcançou um

R2 igual a 68,5% (qualidade do ajuste), com a inclusão das variáveis “desigualdade da

(13)

jovens de 11 a 17 anos fora da escola”, responsável por nada menos que 95,9% da

qualidade do modelo.

Gráfico 1

Relação entre Índice de Theil (variável renda domiciliar per capita) e Taxa de Mortalidade por agressões (por 100 mil), das Áreas de Ponderação. Campinas, 2000.

0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 0 20 40 60 80 100 120 140 160

Taxa de Mortali dade

Ín d ice de T h eil Fonte: Censo Demográfico 2000 e SEADE.

Tabela 4

Melhores modelos para a taxa de mortalidade por causas violentas e indicadores sócio-demográficos, de desigualdade e vulnerabilidade social.

Coeficientes estimados e R2. Áreas de ponderação do Município de Campinas, 2000. 09 26 46 08 33 Coeficiente Ajuste (1) Parcial Modelo 1 - Ajuste R2 = 68,5% 68,5 100

Desiguadade da renda dos chefes de domicílios (L-Theil 1) -65,26* 2,8 4,1 Desigualdade dentro dos setores censitários. Renda dos chefes de domicílios (L-Theil 2)

Desigualdade entre os setores censitários. Renda dos chefes de domicílios (L-Theil 3) (%) da desigualdade dentro dos setores censitários, com relação ao ídice geral (2/3). Média da renda domiciliar per capta

Média de anos de estudo da população com 15 anos ou mais Intensidade da Pobreza (2)

% de população com mais de 15 anos Alfabetizadas

(%) de jovens entre 11 e 17 anos, inclusive, fora da escola 2,87** 65,7 95,9 Modelo 2 - Ajuste R2

= 66,8% 66,8 100

Desiguadade da renda dos chefes de domicílios (L-Theil 1) -68,27* 3,0 4,5 Desigualdade dentro dos setores censitários. Renda dos chefes de domicílios (L-Theil 2)

Desigualdade entre os setores censitários. Renda dos chefes de domicílios (L-Theil 3) (%) da desigualdade dentro dos setores censitários, com relação ao ídice geral (2/3). Média da renda domiciliar per capta

Média de anos de estudo da população com 15 anos ou mais Intensidade da Pobreza (2)

Capital Físico (Fator 1) -"Padrão de ocupação periférico" Capital Físico (Fator 2) -"Deficiência de infra-estrutura domiciliar"

Capital Humano (Fator 1) -"Carência de potencial humano" 64,93** 59,4 88,9

Capital Social (Fator 1) -"Desproteção social" 49,81* 4,5 6,7

Capital Social (Fator 2) -"Estratégia familiar de proteção social"

Fonte: Censo demográfico de 2000. Sistema de Informações de Mortalidade /MS. Tabulações NEPO/UNICAMP. (1) As estrelas indicam o nível de significância dos coeficientes estimados: (*) 5% e (**) 1%.

(2) Diferença relativa da renda domiciliar per capita média dos indivíduos pobres (renda inferior à R$ 75,50) do valor de R$ 75,50, divido por R$ 75.50 e multiplicado por 100.

Taxa de mortalidade por agressões - Variável dependente

% Variáveis independentes incluídas na análise

(14)

14

Além dos indicadores de desigualdade, do índice da intensidade da pobreza e informações sobre a renda média e escolaridade dos adultos, o segundo modelo incorporou cinco indicadores sintéticos, relativos à composição da “vulnerabilidade social” (Quadro 2

em anexo). Neste caso, o melhor ajuste alcançou um R2 de 65,7% , para o qual o fator

“Carência de Potencial Humano” contribuiu com 88,9% da qualidade do ajuste, seguido do indicador “Desproteção Social”, com 6,7% e a “desigualdade da renda média dos chefes

de domicílios” com 4,5 de contribuição e, mais uma vez, no sentido inverso (Tabela 4).

4. Discussão e considerações finais

Sede da região oficializada como Região Metropolitana em 2000, Campinas apresenta-se, desde os anos 70, como um dos maiores e mais dinâmicos centros industriais do país. O alcance desse status significou também a incorporação de problemas comuns aos grandes centros urbanos, com grande parte de sua população de cerca de um milhão de habitantes sofrendo por condições de moradia, desemprego e empobrecimento (Cunha e Oliveira, 2001; Hogan et al., 2001; Caiado, 1998).

É nesse contexto que a taxa de mortalidade por homicídios em Campinas passou de 28,8 para 70,6 por 100 mil habitantes entre 1991 e 2000 (144,9% de crescimento). Para a população entre 15 e 24 anos a variação foi de 174,5%, passando de 56,9 a 156,3 mortes para cada 100 mil jovens (Aidar, 2003b).

Na comparação entre os municípios da RMC, a sede apresenta a maior desigualdade entre os setores censitários, expressando a grande segregação espacial de grupos sociais. Esse resultado está em consonância com o processo de metropolização regional, que inclui a expansão da mancha urbana para além das áreas centrais de Campinas atingindo as divisas de alguns municípios do entorno, “(...)sinalizando uma intensificação das relações

inter-municipais e o aumento da verticalização e da favelização ocorrido no período [1991

a 2000]” (NEPO, 2004: “Mancha Urbana Metropolitana).

Tais especificidades reforçam a importância da desigualdade interna aos subespaços como proteção social, quando Campinas é incorporada ao modelo (Tabela 3). Se, por um lado, não há evidência de que as diferenças entre os setores interfiram na vulnerabilidade frente à violência urbana, por outro lado a heterogeneidade interna a esses espaços, adicionada a um menor nível de pobreza e maior escolaridade da população adulta – fatores mais relevantes no modelo estatístico-, acaba por “proteger” a população da morte violenta.

Embora com menos relevância estatística, a desigualdade apresenta mesmo sentido negativo de associação com taxa de mortalidade por agressões, quando da análise comparativa entre as áreas de ponderação do município de Campinas. Neste caso, as informações sobre a renda média e intensidade da pobreza deram lugar ao conceito mais

(15)

amplo e multidimensional sobre “vulnerabilidade social”, como variáveis mais importantes para modelar a variação dos índices de mortes violentas. Os indicadores com maior associação são relativos ao Capital Humano, onde a qualificação dos adultos responsáveis por famílias e a razão de dependência são variáveis importantes. Com menor contribuição ao segundo modelo, mas nem por isso menos relevante, foi selecionado também o indicador sintético sobre a dimensão “Capital Social”, que inclui o acesso a uma educação de qualidade para as crianças de 7 a 11 anos e ao emprego formal para aqueles com mais de 14 anos.

Embora tenha sido utilizada uma construção preliminar através de dados secundários produzidos para outros fins, os resultados revelam a potencialidade do conceito “vulnerabilidade social” e suas dimensões para se entender a configuração espacial da violência na metrópole.

Neste sentido, vale a pena investir nesta abordagem construindo análises mais aprofundadas sobre os conceitos aqui utilizados (desigualdade e vulnerabilidade social), e sobre o processo de constituição dos espaços urbanos no âmbito da região metropolitana. Em ambos os casos, desconsiderando sempre que possível os limites administrativos e incorporando informações mais detalhadas sobre as vocações produtivas, acesso ao mercado de trabalho e serviços, essenciais para fortalecer as possibilidades dos indivíduos, famílias e /ou grupos sociais responderem às adversidades encontradas.

Além disso, no caso das mortes violentas é importante considerar a entrada e “configuração espacial” do crime organizado -e lucrativo-, como o tráfico de drogas, armas e roubo de cargas, que, como ressalta Lima (2005) em sua pesquisa em Pernambuco, não se relaciona com a pobreza. De fato, nos anos 80 e início dos 90, os municípios mais atingidos pelos homicídios na RMC eram os maiores e mais dinâmicos. (Aidar, 2003).

Finalmente, vale destacar que o acesso à educação de qualidade mostra-se, ainda, variável importante como aproximação e síntese das estruturas de oportunidades oferecidas aos adultos, jovens e crianças, no passado ou no presente.

5. Referências Bibliográficas

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(19)

ANEXO

Quadro 1

Localização do endereço de residência das vitimas. Campinas, 2000.

1999 2000 2001

Ruas localizadas 310 338 350

Setores Censitários localizados

manualmente 107 134 96

Localizados através das

Favelas/Ocupações 34 22 23 Total de localizados 451 (79,1%) 491 (91,9%) 453 (78,4%) Total de óbitos 570 539 576

Fonte: Secretaria Municipal de Saúde. Tabulações próprias

Quadro 2

Demonstrativo dos resultados das análises fatoriais das três dimensões consideradas na construção de indicadores de “vulnerabilidade social”

Fator

Variáveis 1 2 Variáveis 1 Variáveis 1 2

DensCom 0,719 0,643 PessAnalf15 0,974 ChFfem20 0,806 0,185

RenChF2 0,677 0,634 EscChF4 0,970 TamFam 0,632 -0,334

TipoCasa 0,923 0,010 RDEP 0,909 OutAgreg -0,102 0,815

TipoCom 0,122 0,785 S/Carteira 0,838 0,015

%Variância

CondPropAqu. 0,209 0,100 Explicada N/FreqEsc 0,799 0,237

CondAlugado -0,867 -0,216 FamRendNT -0,245 -0,641 AguaNCanal 0,087 0,778 %Variância 2+Banheiros -0,589 -0,556 Explicada S/RedeEsg 0,388 0,679 S/ColetaLixo 0,431 0,404 %Variância Explicada

Padrão Deficiência Carência Desproteção Estratégia

Interpretação de na Infra-estrutura de Social familiar

sugerida Ocup. Domiciliar Potencial de

dos fatores Perifé-rico Humano Proteção

social Capital Social Capital Físico 33,27 30,26 90,53 41,63 20,66 Fatores Fatores Capital Humano

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