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TRÁFICO INTERNO DE CATIVOS: O PREÇO DAS MÃES ESCRAVAS E SUA PROLE

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Academic year: 2021

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TRÁFICO INTERNO DE CATIVOS:

O PREÇO DAS MÃES ESCRAVAS E SUA PROLE

José Flávio Motta1

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho insere-se em uma linha de pesquisa que tem sido conduzida no âmbito do N.E.H.D. – Núcleo de Estudos em

História Demográfica da FEA/USP, e cujo objetivo é o levantamento e análise das escrituras de venda de escravos (ver Motta, Marcondes, 1997a; 1997b). Desta feita, estaremos compulsando um total de onze livros notariais dedicados primordialmente ao registro das aludidas transações, cada um deles com cerca de cinqüenta folhas manuscritas2.

Dois desses livros referem-se a Guaratinguetá e os outros nove a Silveiras, ambas localidades valeparaibanas paulistas. Os documentos atinentes a Guaratinguetá cobrem, respectivamente, os períodos de 15 de dezembro de 1872 a 2 de novembro de 1874 e de 18 de janeiro de 1878 a 26 de dezembro de 1879. No caso de Silveiras, os nove livros compõem uma seqüência ininterrupta: a primeira escritura lançada tem a data de 4 de dezembro de 1867 e a última vai datada aos 4 de abril de 1884.

De outra parte, os procedimentos aqui contemplados colo-cam-se como um primeiro passo em direção a um estudo mais abran-gente dos preços dos escravos transacionados em conjunto com um ou mais familiares. Nossa atenção estará centrada nas cativas comercia-lizadas juntamente com seus filhos, também escravos, ou naquelas que, após a Lei do Ventre Livre, foram vendidas “acompanhadas” de

1 Professor da FEA/USP e membro do N.E.H.D. – Núcleo de Estudos em História

Demográfica (FEA/USP).

2 Ainda que esses livros fossem destinados, em princípio, como se lê no termo de abertura de um deles, unicamente ao lançamento das “escrituras de compras, vendas, trocas e de dação in solutum de escravos que tiverem de serem passadas pelo segundo Tabelião desta cidade”, tais registros viram-se, aqui e ali,

entremea-dos por outros, o mais das vezes “papéis de liberdade”, mas havendo até mesmo o assentamento de uma “escritura de doação de uma parte de terras”.

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seus filhos ingênuos, havendo ainda casos em que a prole era consti-tuída tanto por crianças cativas como por ingênuas. Em todas as vendas consideradas nenhum outro indivíduo integrava as transações além das aludidas mães e sua prole. Deixaremos, pois, para uma oportunidade futura, por exemplo, o exame das escrituras envolvendo casais escravos, com ou sem filhos, fossem estes últimos igualmente cativos ou não.

Por fim, o caráter exploratório do exercício ao qual proce-demos neste trabalho acarreta duas características adicionais passí-veis de serem atribuídas ao texto, as quais cabe referir de imediato: de um lado, a exposição assume os traços de um relatório em que se explicita o próprio andamento da pesquisa, descrevendo-se os diversos procedimentos adotados; de outro, não nos preocupamos em manter qualquer diálogo com a historiografia, não obstante sejam vários os estudos, quer embasados na mesma fonte documental que utilizamos, quer dedicados à questão do preço dos escravos, em especial daqueles vivenciando relações de natureza familiar. Ambas as características mencionadas, é evidente, imprimem ao texto que se segue a qualifica-ção de “versão preliminar”.

2 O BANCO DE DADOS “DE REFERÊNCIA”

À medida que percorríamos as mais de 500 escrituras constantes dos 11 livros compulsados, selecionando aquelas em que se transacionavam cativos juntamente com seus familiares, compúnha-mos igualmente um banco de dados concernente aos escravos que, vendidos isoladamente, eram solteiros ou sobre os quais não se infor-mava o estado conjugal – entre estes últimos, via de regra, encontra-vam-se os cativos com 14 ou menos anos de idade. Esse banco de dados contém, além da localidade, mês e ano em que se registrou a transação, as seguintes informações sobre os escravos: idade, sexo, estado conju-gal, origem, naturalidade, cor, caracteres físicos, atividade produtiva, forma prévia de aquisição e preço. A partir dos livros notariais referi-dos, coletaram-se tais informes para 301 cativos, sendo 165 homens (54,8%) e 136 mulheres (45,2%). Destas três centenas de indivíduos, 243 (80,7%) eram solteiros e, dentre os 58 sobre os quais não se explicitava o estado conjugal, 43 (14,3% do total) possuíam idade inferior a 15 anos. Na Tabela 1 fornecemos a distribuição das

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transa-ções de venda desses 301 escravos de acordo com o período em que ocorreram e segundo o sexo dos cativos vendidos. Com a exceção dos primeiro e último períodos, os demais correspondem aos diversos anos contemplados. O ano de 1867 foi juntado a 1868 porque seus registros iniciam-se – no primeiro livro que dispomos para Silveiras – apenas em dezembro; já 1884 foi somado a 1883 tendo em vista que seus lançamentos encerram-se – no derradeiro livro disponível para Silvei-ras – em inícios do mês de abril.

Tabela 1

BANCO DE DADOS DE “REFERÊNCIA” NÚMERO DE ESCRAVOS TRANSACIONADOS

POR PERÍODO, SEGUNDO SEXO

Período Total Homens Mulheres

1867/68 20 16 4 1869 15 8 7 1870 19 11 8 1871 8 3 5 1872 14 9 5 1873 32 21 11 1874 37 23 14 1875 21 10 11 1876 15 8 7 1877 14 9 5 1878 41 18 23 1879 22 12 10 1880 12 3 9 1881 16 7 9 1882 10 5 5 1883/84 5 2 3

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Como seria o esperado, os anos em que foi possível contar com os dados de ambas as localidades contempladas neste estudo apresentaram um maior número de observações (isto ocorreu espe-cialmente em 1873, 1874, 1878 e 1879). Por outro lado, depreende-se da Tabela 1 que as vendas dos homens e mulheres que compõem nosso banco de dados “de referência” não se distribuíram de maneira equi-valente ao longo do tempo. Assim, observamos que mais de três quintos (61,2%) dos cativos do sexo masculino foram transacionados no período de 1867 a 1875, enquanto a maioria (52,2%) das mulheres foi vendida entre os anos de 1876 a 1884.

Para termos uma idéia da evolução dos preços desses escravos, selecionamos a faixa etária dos 15 aos 39 anos, calculando os preços médios segundo o sexo e de acordo com quatro subperíodos. A faixa etária em questão abrange cerca de dois terços dos informes de nosso banco de dados: 113 (68,5%) dos 165 cativos homens e 89 (65,4%) das 136 escravas. O resultado de nossos cálculos vai apresen-tado a seguir, na Tabela 2.

Verificamos que os preços médios mostraram-se crescen-tes entre os três primeiros subperíodos contemplados. No caso dos homens, a variação foi de +17,0% entre 1867/71 e 1872/5 e de +18,6% entre 1872/5 e 1876/9; para as mulheres, os porcentuais correlatos alçaram-se a +1,2% e +23,4%. Esse comportamento dos preços rever-te-se entre 1876/9 e 1880/4: a queda é da ordem de -17,7% para as

Tabela 2

BANCO DE DADOS “DE REFERÊNCIA”

PREÇOS MÉDIOS, EM MIL-RÉIS, DOS ESCRAVOS TRANSACIONADOS NA FAIXA ETÁRIA DOS 15 AOS 39 ANOS,

POR PERÍODO E SEGUNDO O SEXO

Período Homens Mulheres

Número Preço médio Número Preço médio

1867/71 26 1.479 11 1.089

1872/75 37 1.731 27 1.102

1876/79 37 2.053 31 1.360

1880/84 13 1.585 20 1.119

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escravas e de -22,8% para os cativos do sexo masculino3. Com base

nessa evolução, a diferença entre os preços médios de homens e mulheres, sempre favorável aos primeiros, atingiu, respectivamente nos quatro subperíodos, as seguintes cifras: 35,8%, 57,1%, 51,0% e 41,6%. Os informes constantes da Tabela 2 deverão, é claro, ser necessariamente considerados na conformação do conjunto de preços “de referência” que compararemos com os preços dos indivíduos comercializados juntamente com suas famílias.

3 AS MÃES ESCRAVAS E SUA PROLE

Aos 10 de janeiro de 1874 foi feito, em Silveiras, o lança-mento de uma “escritura de venda de uma escrava”. João Ferreira da

Encarnação vendia para João Cyrino da Silva a cativa

“de nome Rita, idade de vinte e nove anos, natural deste termo, preta, solteira e roceira, ... com todos os seus achaques novos e velhos ... pela quantia de um conto de réis à vista”4.

Cerca de um mês e meio depois, entretanto, registrava-se a revogação daquela venda. Do assentamento datado aos 24 de feve-reiro de 1874, consta o seguinte:

“e pelo mesmo João Ferreira da Encarnação, como outorgante, me foi dito ... que pela presen-te escritura revoga ... a escritura de venda por ele feita ao mesmo João Cyrino da Silva em dez de janeiro do corrente ano da escrava de nome Rita ... por ter o outorgante deixado de mencio-nar ser essa escrava mãe de dois filhos menores e como tal, na forma da lei, não poder fazer a venda separando a mãe de seus filhos”. 3 Tomando, por exemplo, a evolução da inflação brasileira consoante o índice

calculado por Mircea Buescu, observamos uma variação de preços da ordem de +14,4% entre 1867 e 1879 e de +18,7% entre 1867 e 1884 (cf. Buescu, 1973, p. 223).

4 Neste e nos demais casos de transcrições de excertos da documentação por nós trabalhada, mantivemos a pontuação utilizada nos manuscritos, porém atualiza-mos a ortografia.

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De fato, em 1869 estabelecera-se uma legislação proibitiva da separação de cônjuges escravos e igualmente da de pais e filhos menores de quinze anos, preocupação que se fez presente também no texto da Lei do Ventre Livre, de 1871. Não obstante, quantas possibi-lidades não se oferecem à interpretação do estudioso por trás daquele

“deixado de mencionar”?! Quantos elementos não estariam a compor

a explicação da revogação da venda da cativa Rita? No nosso caso específico, perguntamo-nos: em que medida a existência dos dois filhos menores afetaria o preço pelo qual a referida escrava havia sido transacionada? Afinal, a própria recusa de alguma das partes em renegociar o valor anteriormente ajustado poderia ser motivo para o cancelamento da transação5.

Ocorre-nos pergunta análoga quando lemos a escritura registrada aos 20 de maio de 1880. Àquela data, em Silveiras, Thomaz Monteiro da Silva vendeu a João Leite Simões, morador em Queluz,

“uma escrava de nome Justina, idade trinta e cinco anos mais ou menos, de cor parda solteira e crioula ... por preço de um conto e duzentos mil réis à vista”.

Próximo ao encerramento do assento, o Tabelião observa:

“Em tempo a dita escrava deixa em poder do vendedor uma filha de nome Olympia, ingê-nua, por ficar desta data em diante liberta”.

Houvera Olympia acompanhado sua mãe, qual o efeito sobre o preço de venda de Justina?

Com o intuito de examinarmos os preços de venda das mães cativas transacionadas juntamente com sua prole, levantamos 5 Lembremos sempre que o elenco de possibilidades deve contemplar igualmente o “lado” do escravo. Não diretamente verificável no caso de Rita, tal “lado” é evidenciado na venda de Luzia, também lançada em Silveiras e envolvendo, ao que tudo indica, uma vez mais o mesmo João Cyrino da Silva. Trata-se, aos 31 de maio de 1878, da “escritura de desfazimento ... que fazem João Cyrino da Silva e João José Raimundo”, na qual se lê: “(...) E por eles me foi dito ... que eles estão de acordo recíproco de desfazer, como de fato desfazido tem, a escritura passada neste livro a folha treze verso, pelo motivo de não querer a escrava Luzia servir ao mesmo João Cyrino da Silva; e assim revogam a dita escritura, ficando de nenhum efeito a venda e compra”.

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um conjunto formado por 37 escrituras, sendo duas delas concernentes a uma mesma escrava, de nome Saturnina. Esta cativa foi vendida com sua filha Maria, também escrava, em junho de 1871 e, posteriormente, em novembro daquele mesmo ano, revendida, uma vez mais com Maria e, desta feita, levando “um filho recém-nascido nas condições da Lei” de 28 de setembro de 1871. O valor da transação, que se

igualara a 1.150 mil-réis em junho, elevou-se a 1.300 mil-réis em novembro.

Essas 37 escrituras distribuem-se da seguinte forma: • 14 casos de vendas de mães cativas juntamente com seus

filhos, também escravos (12 dessas mães eram solteiras e, para as outras duas, não constava da documentação o informe acerca do estado conjugal);

• 20 casos de vendas de mães cativas acompanhadas de seus filhos ingênuos (uma viúva, 18 solteiras e uma para a qual não se dispôs desse informe);

• 3 casos de vendas de cativas solteiras juntamente com seus filhos, também escravos e acompanhadas igualmen-te por filhos ingênuos6.

3.1 Os casos de mães escravas vendidas com filhos também cativos

A Tabela 3 traz arrolados, em suas três primeiras colunas, em ordem cronológica, os 14 casos de vendas de mães e filhos escravos. Informamos seus nomes, idades e o preço pelo qual se concretizou o negócio. Esse preço, invariavelmente, referiu-se ao conjunto formado por mães e filhos. Duas dessas transações envolviam duas crianças; nas demais, as mães eram acompanhadas por um único filho. O bebê Galdino, comercializado em setembro de 1869, foi a criança de menor idade (4 meses); a mais velha foi o menino Antônio, vendido com 11 6 Em todos esses 37 lançamentos, repitamos, as vendas referem-se exclusivamente às aludidas mães cativas e sua prole. Assim sendo, nosso universo seria aumentado se incluíssemos também as transações em que escravas e seus filhos eram vendidos junto com outros cativos, sem indicação de relações familiares entre eles. Não incluímos tais casos, ao menos por hora, pois os valores dessas transações envol-vendo vários indivíduos eram informados, amiúde, apenas para o conjunto vendi-do.

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anos em março de 1876. Entre as mães, as mais jovens tinham 18 anos (Maria, solteira, progenitora de Galdino; e Justa, cujo estado conjugal não constava da escritura, vendida em dezembro de 1872 juntamente com seu filho Ignácio, de 3 anos). Já as mais velhas dentre as mães consideradas tinham 40 anos de idade. Eram três: Fortunata, Esco-lástica e Luíza, vendidas, respectivamente, em maio de 1868, abril de 1872 e março de 1876.

Na comparação entre os preços verificados nessas 14 tran-sações e os preços das vendas de cativos que compunham nosso banco de dados “de referência” adotamos os seguintes critérios:

• Tendo em vista as diferenças observadas nos preços de escravos segundo o sexo, os preços das mães foram com-parados apenas com os preços das mulheres que compu-nham nosso banco de dados “de referência”; no caso das crianças – meninas e meninos – foram considerados, quando existentes, os preços constantes de nosso banco de dados, obedecida igualmente a distinção de sexo; • Com relação às idades, a imprecisão pareceu-nos ser

usual nos manuscritos. Foram inúmeros os casos em que a idade nas escrituras era acompanhada da expressão

“mais ou menos” ou, ainda, informada dentro de um

intervalo de possibilidades (por exemplo, “de vinte para vinte e cinco anos”). Optamos por buscar pelas idades no

banco de dados de maneira a conformar sempre um intervalo de sete anos, centrado na idade da mãe escrava ou de seus filhos. Assim, por exemplo, uma mãe com 25 anos teve seu preço comparado com os de mulheres cativas com idades maiores do que 21 e menores do que 28 anos.

• No que respeita aos períodos, o comportamento dos preços dos escravos entre 1867 e 1884 – cf. Tabela 2 – levou-nos a restringir a comparação realizada a interva-los temporais de no máximo três anos. Dessa forma, por exemplo, o preço verificado numa transação ocorrida em qualquer mês de 1871 foi comparado aos preços das vendas – integrantes do banco de dados “de referência” – efetuadas em 1870, 1871 e 1872.

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Tabela 3

PREÇOS DAS MÃES CATIVAS VENDIDAS COM FILHOS TAMBÉM ESCRAVOS

COMPARADOS AO BANCO DE DADOS “DE REFERÊNCIA”

Mês/Ano

Mães Filhos Banco de dados de “referência”

Nome Idade Preço Obser-vações médiaIdade médioPreço Menor preço preçoMaior

•maio/1868 Fortunata 40 1.000 1 40,0 350 350 350 Constança 4 3 6,0 553 360 700 •setembro/1869 Maria 18 1.400 3 18,0 1.167 1.000 1.300 Galdino 4 (meses) 0 – – – – •maio/1870 Rita 20 1.600 4 20,3 1.075 1.000 1.200 Laurentina 1 0 – – – – •outubro/1870 Marcolina 26 1.400 3 24,0 1.260 1.100 1.380 Maria 10 5 11,4 1.025 500 1.225 •junho/1871 Saturnina 25 1.150 6 23,7 1.163 800 1.380 Maria 18 (meses) 0 – – – – •agosto/1871 Henriqueta 25 1.100 6 23,7 1.163 800 1.380 Roque 2 1 5,0 700 700 700 •abril/1872 Escolástica 40 300 1 40,0 600 600 600 Caetana 4 0 – – – – •dezembro/1872 Justa 18 1.250 7 16,4 914 600 1.200 Ignácio 3 1 5,0 700 700 700 •outubro/1873 Manoela 25 1.200 6 25,5 1.000 800 1.200 Maria 8 4 8,8 663 400 900 Quirino 4 1 7,0 800 800 800 •abril/1875 Bárbara 33 1.500 3 32,3 1.467 1.300 1.600 Eufrosina 7 4 7,8 725 400 1.000 •setembro/1875 Maria 23 3.000 5 24,8 1.140 900 1.400 Delina 9 5 8,4 820 400 1.200 Rosa 7 4 7,8 725 400 1.000 •novembro/1875 Adriana 37 1.000 2 36,5 1.150 800 1.500 José 6 2 8,0 700 600 800 •março/1876 Luíza 40 2.000 1 39,0 800 800 800 Antônio 11 2 8,5 700 600 800 •junho/1878 Felizarda 35 1.400 2 35,5 1.100 800 1.400 Silvério 7 1 8,0 800 800 800

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A aplicação desses critérios ao nosso banco de dados pos-sibilitou a construção das cinco últimas colunas da Tabela 3. Para cada um dos cativos que compunham as 14 famílias em questão, procura-mos levantar um conjunto de preços “de referência”. Informaprocura-mos, então, para cada indivíduo, o número encontrado desses preços “de referência”, a idade média dos escravos vendidos por esses preços, bem como a média, o menor e o maior dentre tais preços. Em especial no caso das crianças, o número de observações resultante de nossa busca foi extremamente reduzido. Como seria o esperado, quanto menor a idade do cativo, menor a chance de ele ser vendido isoladamente – inclusive tendo em vista a já referida legislação proibitiva da separação entre pais e filhos – e, portanto, aparecer compondo nosso banco de dados “de referência”. Por isso, nos casos de Galdino (de 4 meses de idade), Laurentina (com 1 ano), Maria (filha de Saturnina, com 1 ano e meio), exatamente as três menores crianças, não conseguimos levan-tar nenhum preço referencial. O maior número de preços referenciais obtidos nos casos dos filhos escravos foi 5, para as duas meninas mais velhas (Maria, filha de Marcolina, com 10 anos; e Delina, com 9 anos de idade).

Para as mães, sempre foi possível encontrar ao menos um preço referencial. Todavia, para três delas não foi possível ir além disso (Fortunata, Escolástica e Luíza, justamente as de idades mais avan-çadas). No máximo, obtivemos 7 preços (caso de Justa, vendida em dezembro de 1872), e por três vezes conseguimos 6 preços (Saturnina, Henriqueta e Manoela). Esses reduzidos números de observações, é evidente, impõem redobrada cautela no que tange às inferências que possamos vir a fazer com base em nossos dados. De outra parte, estimulam-nos a continuar envidando esforços no sentido de alargar cada vez mais o universo das escrituras de vendas de cativos que compõe nossa base de informações.

Considerando tão-somente os preços referenciais levanta-dos para as mães, verificamos que, para 10 dentre elas (71,4%) o preço de venda foi superior ao preço médio calculado com fundamento em nosso banco de dados. E para 9 dentre essas 10 mães, seu preço foi igual ou superior ao maior preço por nós obtido (última coluna da Tabela 3). Esse resultado não é surpreendente pois, afinal, os filhos dessas escravas certamente estariam contribuindo na estipulação do preço da venda. Isto claramente é visualizado na venda de Maria (23 anos), em setembro de 1875, juntamente com suas filhas Delina (9

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anos) e Rosa (7 anos), pelo preço de três contos de réis, quando o preço médio referencial para o caso de Maria havia atingido a cifra de 1.140 mil-réis, e o maior preço alçara-se a 1.400 mil-réis. Surpreendente é o preço alcançado na venda, registrada em abril de 1872, de Escolástica (uma negra cozinheira de 40 anos, natural de Bananal) e de sua filha Caetana (4 anos), comercializadas por apenas 300 mil-réis, sendo igual ao dobro deste valor o preço médio referencial – correspondente, cabe frisar, a uma única observação – para o caso dessa mãe.

Se somarmos os preços médios referenciais calculados para mães e filhos, nas 10 transações com respeito às quais conseguimos levantar esses preços para umas e outros, observamos o seguinte. Por 7 vezes, o preço da venda de mães e filhos foi inferior à soma dos preços médios referenciais respectivos, de mulheres e crianças. Foi o que aconteceu, em junho de 1878, na venda de Felizarda (35 anos) e seu filho Silvério (7 anos), concretizada por 1.400 mil-réis. Os preços médios referenciais para mãe e filho foram, respectivamente, iguais a 1.100 mil-réis e 800 mil-réis – cabe frisar, uma vez mais, com tão-so-mente duas e uma observações –. Será que, nesses casos, a venda “em família” implicaria que os preços possíveis de serem obtidos tenderiam a ser menores vis-à-vis a venda dos cativos isoladamente? Talvez.

Porém, em pelo menos três outras transações verificamos o contrário, como em março de 1876, quando Luíza (40 anos) e seu filho Antônio (11 anos) foram vendidos por dois contos de réis e mesmo a soma dos maiores preços referenciais não foi além da casa dos 1.600 mil-réis. 3.2 Os casos de mães escravas vendidas com filhos ingênuos

Foram 20 as escrituras de venda de cativos em que era transacionada uma única mulher, “acompanhada” por um ou mais

filhos ingênuos nascidos na vigência da Lei do Ventre Livre. Todos esses casos são por nós apresentados nas Tabelas 4 e 5 que se seguem. Duas dessas mães possuíam dois filhos (Theresa, vendida em maio de 1878, e Eleutéria, comercializada em fevereiro de 1883), sendo as demais acompanhadas por apenas uma criança. A idade desses 22 ingênuos, não informada para 7 deles, atingiu no máximo 10 anos (o menino Cândido, um dos dois filhos de Eleutéria); o rebento de Rozária, escrava vendida em junho de 1882, recém-nascido e “ainda não batizado”, foi a criança com menor idade. Entre as mães, a mais

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acompanhada de sua filha Jenuveva, de 8 anos. As mães mais jovens foram Sabina (16 anos) e Justina (17 anos), transacionadas respecti-vamente em novembro de 1876 e novembro de 1880, acompanhadas pelos filhos Olympia (3 anos) e Artur (2 anos).

Tabela 4

PREÇOS DAS MÃES CATIVAS VENDIDAS COM FILHOS INGÊNUOS COMPARADOS AO BANCO DE DADOS “DE REFERÊNCIA”

(casos de preços superiores à média “de referência”)

Mês/Ano

Mães Filhos Banco de dados de “referência” Nome Idade Preço Obser-vações médiaIdade médioPreço Menorpreço Maiorpreço

•abril/1874 Fortunata 25 1.200 5 25,8 1.040 900 1.200 Pedro 1 (mês) •Novembro/1876 Sabina 16 1.400 12 15,7 1.242 700 1.550 Olympia 3 •setembro/1877 Joana 21 1.400 10 20,7 1.390 1.200 1.550 Sebastiana 9 (meses) •maio/1878 Theresa 30 1.500 1 28,0 1.400 1.400 1.400 Claudino – Gregório – •maio/1878 Alice 29 1.600 2 27,0 1.425 1.400 1.450 Maria 2 •agosto/1879 Gertrudes 22 1.400 12 21,4 1.375 1.200 1.600 Sebastião 3 •dezembro/1879 Ricarda 26 1.500 5 25,2 1.420 1.200 1.600 Marcolino – •novembro/1880 Justina 17 1.400 11 16,9 1.255 800 1.600 Artur 2

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Tabela 5

PREÇOS DAS MÃES CATIVAS VENDIDAS COM FILHOS INGÊNUOS COMPARADOS AO BANCO DE DADOS “DE REFERÊNCIA” (casos de preços inferiores à média “de referência” e casos para os quais

não havia observações no banco de dados “de referência”)

Mês/Ano

Mães Filhos Banco de dados de “referência”

Nome Idade Preço Obser-vações médiaIdade médioPreço Menorpreço Maiorpreço

PREÇOS INFERIORES À MÉDIA “DE REFERÊNCIA”

•outubro/1877 Perpétua 24 1.300 7 23,4 1.386 1.200 1.500 Marcolina 6 (meses) •fevereiro/1878 Victorina 24 1.400 8 23,6 1.406 1.200 1.600 Manoela – •abril/1879 Virgínia 24 650 8 23,1 1.375 1.200 1.600 Benedicto 1 (mês) •janeiro/1880 Joana 28 1.000 4 27,3 1.388 1.100 1.600 Maria – •abril/1880 Maria 25 1.200 5 25,2 1.410 1.200 1.600 Sara – •janeiro/1881 Catarina 22 1.200 4 21,3 1.275 1.200 1.400 Pedro – •novembro/1881 Clara 29 800 2 31,0 1.350 1.100 1.600 Josefa 4 •julho/1882 Rita 22 1.000 3 21,3 1.300 1.200 1.400 Quintino 2

INEXISTÊNCIA DE CASOS “DE REFERÊNCIA”

•maio/1881

Hilária 48 1.150 0 – – – –

Jenuveva 8

•junho/1882

Rozária 30 1.000 0 – – – –

“ainda não batizado” nascido

recém-•fevereiro/1883 Eleutéria 30 1.400 0 – – – – Bernarda 8 Cândido 10 •dezembro/1883 Luzia 30 1.400 0 – – – – Josephina 3

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Tais crianças não eram, formalmente, vendidas com suas mães. Não obstante, constam dos assentamentos expressões como as seguintes: “e com o direito para o outorgado [comprador] chamá-la [à ingênua] de serviço conforme determinado pela Lei”; “ficando o direi-to do oudirei-torgado [comprador] de audirei-torizar-se do favor da Lei de 28 de setembro de 1871”; “transpassa toda a posse, jus e domínio que tinha na dita escrava e filho ingênuo, para que ele comprador tome posse da referida escrava e filho ingênuo”; “e pelo comprador foi dito que aceitava esta escritura de venda e se dá por empossado da referida escrava e filho”. Do mesmo modo, quando o vendedor era representado por um procurador, a situação do ingênuo era devidamente explicitada na procuração, em geral transcrita logo em seqüência ao lançamento da escritura. Por exemplo, na venda de Alice (29 anos), em maio de 1878, o vendedor (da capital da Província) outorgava ao procurador poderes para “vender a escrava ... bem como o direito aos serviços de sua filha menor a pardinha Maria”.

A busca de preços referenciais em nosso banco de dados viu-se prejudicada no que respeita às 22 crianças ingênuas, mesmo para aquelas (15) acerca das quais possuíamos o informe da idade. Essa impossibilidade, que nos impediu de somar preços referenciais de mães e filhos – tal como fizéramos para escravas e seus rebentos também cativos –, era, não obstante, esperada, pois apenas eventual-mente os intervalos etários considerados contemplariam simultanea-mente crianças ingênuas e escravas. Assim sendo, as cinco últimas colunas das Tabelas 4 e 5 foram por nós construídas a partir tão-so-mente das mães. Na primeira destas duas tabelas apresentamos os 8 casos em que os preços de venda dessas cativas “acompanhadas” por

seus filhos ingênuos foram maiores do que as médias dos preços observados em nosso banco de dados “de referência”. Já na Tabela 5 fornecemos os também 8 casos em que essas médias superaram os ditos preços de venda; arrolamos, ademais, nessa mesma tabela, as 4 situações para as quais não foi possível levantar nenhuma observação referencial.

Na leitura da Tabela 4 podemos perceber que, embora os preços de venda sejam, em todos as transações lá contempladas, superiores às médias dos preços referenciais, apenas por duas vezes as vendas foram realizadas por valores que sobrepujaram os maiores preços de referência. Ambas as escrituras em questão foram lançadas em maio de 1878. Em uma delas, Theresa, solteira, preta, natural de

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Lorena, com 30 anos de idade e de serviço doméstico, era acompanhada por dois filhos – Claudino e Gregório – dos quais não sabemos a idade; seu comprador, de Silveiras, pagou 1.500 mil-réis, quando o maior preço de referência alçou-se a 1.400 mil-réis. Theresa, conforme consta do documento compulsado, “foi adjudicada em execução de sentença”,

o que poderia quiçá estar afetando o valor do negócio.

Indepen-dentemente deste último informe, porém, seria plausível, de um lado, sugerir que a presença dos dois ingênuos justificaria a diferença de preços verificada; de outro, todavia, há que apontar ter sido esta venda, na Tabela 4, aquela à qual correspondeu o menor número de observa-ções em nosso banco de dados (apenas uma).

A outra escritura de maio de 1878 concerne a uma transa-ção para a qual também levantamos um reduzido número de observa-ções “de referência”: dois casos. Estes dois preços, no entanto, foram bastante próximos (1.400 mil-réis e 1.450 mil-réis), ao passo que a escrava Alice (solteira, preta, natural do Maranhão, com 29 anos, de serviço doméstico e acompanhada da “pardinha Maria”, de 2 anos de

idade) foi comercializada por 1.600 mil-réis.

Não detectamos, de outra parte, uma relação mais precisa entre a idade do ingênuo e os preços comparados. Por exemplo, supondo que, em abril de 1874, a presença de Pedro (1 mês de idade) tenha sido a responsável pelo preço de Fortunata igualar-se ao maior preço referencial (1.200 mil-réis), efeito semelhante não decorreu da presença da menina Olympia (3 anos de idade), cuja mãe – Sabina – foi vendida em novembro de 1876 por 1.400 mil-réis, sendo neste caso o maior preço de referência igual a 1.500 mil-réis. De forma similar, o preço de venda de Joana, em setembro de 1877 (1.400 mil-réis), acompanhada da filha Sebastiana, de 9 meses, destoa do preço médio referencial (1.390 mil-réis) tanto quanto o preço de venda de Gertru-des em agosto de 1879 (também 1.400 mil-réis), acompanhada do filho Sebastião, de 3 anos de idade, afasta-se da respectiva média “de referência” (1.375 mil-réis).

O que nos pareceu se colocar com um pouco mais de nitidez foi uma certa correspondência entre a passagem do tempo e as inci-dências relativas de casos de preços superiores ou inferiores à média referencial. De fato, todas as escrituras dispostas na Tabela 4 foram registradas entre abril de 1874 e novembro de 1880. Na Tabela 5, consideradas as 8 primeiras transações nela incluídas, nas quais os preços de venda foram inferiores à média dos informes de nosso banco

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de dados, as datas dos lançamentos vão de outubro de 1877 a julho de 1882. Por fim, inclusive tendo em vista a própria diminuição observa-da do número de compras e venobserva-das de cativos quando se avança pela década de 1880, todos os quatro casos para os quais não foi possível qualquer comparação com o nosso banco de dados referiram-se a assentamentos datados entre maio de 1881 e dezembro de 1883.

Observando mais detidamente as 8 primeiras transações listadas na Tabela 5, percebemos que 4 dos preços de venda foram inferiores aos menores preços referenciais. Por duas vezes, as escravas em questão foram comercializadas por valores que se igualaram aos menores preços “de referência”. Por fim, corroborando a corres-pondência referida no parágrafo anterior, os demais dois casos, para os quais os preços de venda superaram os menores preços referenciais, foram justamente os dois primeiros em termos cronológicos: outubro de 1877, quando Perpétua é vendida acompanhada de sua filha Mar-colina, com 6 meses de vida, e fevereiro de 1878, mês e ano em que se vendeu a cativa Victorina, que levou junto consigo a filha Manoela. Esta última venda, cabe ressaltar, registrada em Guaratinguetá, foi objeto de uma escritura de aditamento, lançada quase um ano após feito o negócio, pelo seguinte motivo:

“por esquecimento deixou [o outorgante vende-dor] de declarar ao passar aquela escritura que acompanhava a dita escrava Victorina, a ingê-nua sua filha de nome Manoela, falta que sana pela presente, ratificando em tudo o mais aque-la venda”.

Igualmente lançada em Guaratinguetá, a comercialização de Virgínia, ocorrida em abril de 1879, chama a atenção pelo baixo preço ajustado (650 mil-réis), perto de metade do menor preço (1.200 mil-réis) dentre as 8 observações referenciais respectivas levantadas em nosso banco de dados. Virgínia era uma cativa crioula, de 24 anos, solteira, preta, de serviços domésticos e natural daquela mesma loca-lidade; seu filho Benedicto possuía tão-somente 1 mês de vida. O segundo preço mais baixo verificado na Tabela 5 foi o de Clara, crioula de 29 anos, natural de Cunha e vendida em Silveiras acompanhada de sua filha Josefa, de 4 anos de idade. Do documento concernente a esta última transação consta que

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“a ingênua Josefa não foi matriculada até esta data por isso que o seu senhor foi multado e ainda não foram despachados os papéis pelo Doutor Presidente da Província”.

3.3 Os casos de mães escravas vendidas com filhos também cativos e acompanhadas igualmente por filhos ingênuos

A Tabela 6 compõe-se das três únicas escrituras, encontra-das nos 11 livros notariais que compulsamos, nas quais eram transa-cionadas exclusivamente mães e filhos escravos, acompanhados ou-trossim por crianças ingênuas. Em novembro de 1871, Saturnina e sua filha Maria foram vendidas, sendo que dita mãe levava também um rebento ingênuo recém-nascido. Em outubro de 1876, Carolina e seus filhos cativos Henrique e Benedicto eram objeto da escritura, na qual se fazia referência a Francisco, ingênuo de 1 ano de idade. Finalmente, em outubro de 1878, Mariana foi vendida com seu filho de 11 anos (José) e acompanhada de sua filha Maria, com 6 meses de vida.

No caso de Saturnina, o preço de venda (1.300 mil-réis) foi superior ao preço médio referencial (1.163 mil-réis), porém inferior ao maior preço levantado em nosso banco de dados (1.380 mil-réis). Na venda de Mariana, obtivemos preços de referência igualmente para seu filho José, e mesmo a soma dos menores preços de referência para mãe e filho (1.200 mil-réis + 800 mil-réis) já produz um resultado maior do que o valor consignado na escritura (1.800 mil-réis). A transação envolvendo Carolina e seus filhos foi a mais cara de todas as consideradas neste estudo (5 contos de réis). Para este caso, encon-tramos preços referenciais tanto para a mãe como para os dois filhos escravos com ela vendidos. Ao contrário da venda de Mariana, desta feita, mesmo somando os maiores preços “de referência” do banco de dados (1.600 mil-réis + 800 mil-réis + 800 mil-réis) atingimos um valor bastante aquém do verificado na escritura.

Inviável, pois, avançarmos qualquer afirmativa mais cate-górica com base nos dados da Tabela 6. Não obstante, lembremos que a primeira das transações apresentadas nessa tabela refere-se a uma cativa da qual já tratáramos anteriormente, na Tabela 3. Saturnina fora vendida, junto com a filha Maria, em junho de 1871, por 1.150

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mil-réis, sendo agora, em novembro de 1871, revendidas por 1.300 mil-réis. Em junho, José Gonçalves França, morador de Cunha, as vendera a José Bernardino de Carvalho, de Silveiras, que, em novem-bro, as repassou para Antônio Olinto de Carvalho, também morador de Silveiras. Entre os dois eventos, impossível não notarmos que a grande alteração se radica no aparecimento do ingênuo recém-nascido, à qual se poderia atribuir, ao menos em parte, a variação observada nos preços ajustados para as duas transações.

Tabela 6

PREÇOS DAS MÃES CATIVAS VENDIDAS COM FILHOS ESCRAVOS E INGÊNUOS

COMPARADOS AO BANCO DE DADOS “DE REFERÊNCIA”

Mês/Ano

Mães Filhos Banco de dados de “referência” Nome Idade Preço Obser-vações médiaIdade médioPreço Menorpreço Maiorpreço

•novembro/1871 Saturnina 25 1.300 6 23,7 1.163 800 1.380 filha escrava Maria 2 0 – – – – filho ingênuo “recém-nascido” •outubro/1876 Carolina 32 5.000 2 33,5 1.550 1.500 1.600 filhos escravos Henrique 9 2 8,5 700 600 800 Benedicto 6 2 8,5 700 600 800 filho ingênuo Francisco 1 •outubro/1878 Mariana 26 1.800 6 25,2 1.425 1.200 1.600 filho escravo José 11 6 12,5 1.817 800 2.200 filha ingênua Maria 6 (meses)

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Propusemos neste trabalho uma aproximação ao estudo dos preços dos escravos que, juntamente com seus familiares, viram-se objeto do tráfico interno de cativos. Dedicamo-nos, por hora, tão-so-mente às transações envolvendo exclusivatão-so-mente mães cativas e sua prole, sendo estes filhos escravos ou ingênuos. O procedimento com-parativo adotado demandou a construção de um banco de dados alimentado pelos informes extraídos de escrituras de vendas nas quais se transacionavam cativos isolados, via de regra com o atributo “sol-teiros” declarado na documentação.

Nossa fonte foram 11 livros notariais concernentes às localidades valeparaibanas paulistas de Guaratinguetá e a Silveiras, contendo lançamentos datados de dezembro de 1867 a abril de 1884. Com base em tais livros, examinamos 37 casos de comercialização de mães escravas e seus filhos, bem como compusemos um banco consti-tuído por dados de 301 cativos. A comparação que então empreende-mos realizou-se, para a maior parte dos casos, fundada em reduzido número de observações. Isto, em boa medida, por conta dos critérios adotados, que implicaram trabalhar, segundo o sexo dos escravos, com intervalos ditados pelos períodos em que se deram as vendas e pelas idades dos indivíduos vendidos. Este fato aponta, de imediato, para a necessidade de continuarmos direcionando nossos esforços no sentido de ampliarmos o universo de pesquisa, de um lado adicionando mais casos de vendas de cativos com seus familiares e, de outro, procedendo ao incremento das observações constantes do banco de dados referen-cial.

Não obstante a limitação explicitada, observamos, para a maioria das mães cativas comercializadas com filhos também escravos, nos casos em que levantamos preços referenciais para mães e filhos, que a venda “em família” ocorreu a preços menores do que a soma dos preços médios referenciais. Um volume maior de informações seria, no que respeita a esta inferência, fundamental para corroborar uma eventual tendência de preços mais altos obtidos nas transações envol-vendo cativas desacompanhadas de filhos pequenos.

De outra parte, verificamos que a freqüência de preços iguais ou superiores aos maiores preços referenciais encontrados para as mães foi mais elevada nos casos em que os filhos eram escravos (9

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ocorrências num total de 14, isto é, 64,3%) vis-à-vis as transações em

que havia menção apenas a crianças ingênuas (2 em 16 casos, vale dizer, 12,5%). É possível que essa distinção reflita a maior idade média das crianças cativas (superior a 5 anos) em comparação às ingênuas (inferior a 2 anos, computadas as crianças para as quais possuíamos o informe da idade dentre as 16 vendas aludidas). É também possível sugerir que a venda de crianças escravas alcançasse maiores preços que os valores atribuídos aos serviços de crianças ingênuas, serviços estes cujo horizonte temporal era, em princípio, menor.

Por fim, com relação às mães acompanhadas por filhos ingênuos, percebemos que, com a passagem dos anos, os casos de venda por preços superiores às médias “de referência” foram dando lugar às transações por preços inferiores às ditas médias. Neste movimento, é viável aventarmos que a avaliação dos serviços prestados pelos ingê-nuos seguia a mesma tendência declinante verificada nos preços dos escravos entre a segunda metade dos anos 1870 e os primeiros anos da década subseqüente.

5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BUESCU, M. 300 anos de inflação. Rio de Janeiro: APEC, 1973.

MOTTA, J. F., MARCONDES, R. L. Escrituras de venda de escravos (Guaratinguetá, 1872-4/1878-9). In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA POLÍTICA, 2, 1997, São Paulo. Anais... São Paulo:

PUC-SP/Sociedade Brasileira de Economia Política (SEP), 1997a, v. 3, p. 336-348.

MOTTA, J. F., MARCONDES, R. L. Nota sobre o comércio de escravos no Vale do Paraíba: Silveiras na década de 1870. São Paulo: NEHD/

FEA/USP, 1997b, 20p. (Mimeogr.). (Trabalho apresentado no V Congresso Afro-Brasileiro, promovido pelo Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO) e pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), em Salvador, de 17 a 20 de agosto de 1997).

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