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Supervisão Clínica em Tratamento de Feridas: a procura da Qualidade

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Academic year: 2021

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Supervisão Clínica em Tratamento de

Feridas: a procura da Qualidade

Carlos Mateus

Enfermeiro Graduado,

PGR Tratamentos de Feridas e Viabilidade Tecidular, Mestre em Nutrição Clínica

Centro de Saúde de Pêro Pinheiro

Resumo

Em alguns países da Europa, nomeadamente no Reino Unido, o termo Supervisão Clínica faz parte da linguagem diária dos enfermeiros, começando agora a ser utilizado no nosso país. As recentes reestruturações dos modelos de gestão dos serviços de saúde preconizam a procura de elevados patamares de prestação de cuidados de qualidade, para os quais a supervisão clínica constitui um paradigma essencial.

Na procura dessa qualidade, a utilização de práticas baseadas na evidência constitui um alicerce ao qual o tratamento de feridas não pode ficar alheio. Sabendo que muitas das práticas nesta área se encontram ainda baseadas no empirismo, a supervisão clínica, efectuada por profissionais qualificados, poderá contribuir para atingir desempenhos de excelência nos cuidados prestados ao doente com ferida.

Abstract

In some European countries, like the United Kingdom, the term Clinical Supervision is part of the daily nurse’s language. It is now starting to be used in our country. The recent reorganizations of health services management models praise the search of high standards of quality care, for which the clinical supervision constitutes an essential paradigm.

Searching this quality, the use of evidence-based practice constitutes a basis, which wound care must be aware. Knowing that many of the practices in this area still established in empirical methods, the clinical supervision, made by qualified professionals, would be able to contribute to reach performances of high standard cares given to the people with wounds.

Introdução

O tratamento de feridas é uma das actividades incontornáveis na prestação de cuidados de enfermagem em Cuidados de Saúde Primários. A formação básica nesta área é

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considerada necessária mas, normalmente, não é suficiente para assegurar cuidados de elevada qualidade. A crescente complexidade inerente ao tratamento de feridas, cada vez mais suportada pela evidência científica, tem ultrapassado o empirismo destas práticas, permitindo um incremento da qualidade, baseado na melhoria dos padrões de cuidados.

Por outro lado, as recentes reformas administrativas dos serviços de saúde a que temos assistido têm implicado reestruturações dos modelos de gestão, introduzindo conceitos como o controlo de custos e a racionalidade económica do sistema de saúde. A estes conceitos não fica alheio o tratamento de feridas. De facto, a racionalização de custos, baseada nos conceitos de custo-eficácia e custo-efectividade, implica a necessidade de ajustes que permitam aos profissionais atingir um elevado patamar de desempenho. Esta melhoria do desempenho deverá ser, necessariamente, baseada na formação, apoio, orientação das práticas e no desenvolvimento de competências, aspectos que constituem objectivos da supervisão clínica de enfermagem.

O Conceito de Supervisão Clínica em Enfermagem:

O termo supervisão tem como base as palavras latinas “super” que significa “sobre” e

“vídeo” com o significado de “eu vejo”. A sua forma literal pode ser interpretada como

inspecção. A visão tradicional deste termo encontra-se associada a ideias como a observação e fiscalização do trabalho realizado por outro (de forma mais ou menos autoritária), baseada num modelo de gestão vertical.

Existem várias definições do conceito de Supervisão preconizadas por diversos autores, mas destacaria a preconizada pelo National Health Service (NHS) Executive, em 1993, citado por Sloan (1999: 525), que define a Supervisão Clínica de Enfermagem como:

“A term used to describe a formal process of professional support and learning which enables individual practitioners to develop knowledge and competence, assume responsibility for their own practice and enhance consumer protection and safety of care in complex clinical situations. It is central to the process of learning and to the expansion of the scope of practice and should be seen as a means of encouraging self assessment and analytical and reflective skills.”

Com base nesta definição é possível perceber que o conceito de Supervisão Clínica suporta a prática, proporcionando aos profissionais uma forma de desenvolver conhecimentos e competências, aumentando a qualidade dos cuidados ao utente, através de práticas reflexivas orientadas por um profissional qualificado.

Efectuada uma revisão da literatura internacional constata-se que o termo supervisão clínica é uma terminologia corrente em contextos de saúde. No entanto, sendo um sistema recente, encontra ainda algumas reacções à mudança. Smith (2001) reconhece que a Supervisão Clínica começa a ser aceite pelos enfermeiros pelas suas vantagens e pela necessidade de uma aprendizagem ao longo da vida, apesar de poder ser compreendida como um sistema ameaçador, ao ser adoptado. Por outro lado, Girot (2001) declara que a Supervisão Clínica deve desempenhar um papel activo no desenvolvimento de uma cultura de aprendizagem, relembrado aos enfermeiros a

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necessidade da adequação dos conhecimentos, perícias e competências para aplicar na prática.

Este conceito de desenvolvimento profissional contínuo e o processo de aprendizagem ao longo da vida, também se encontra espelhado em Portugal. No nosso país a Ordem dos Enfermeiros encontra-se consciente da importância que o processo de supervisão clínica poderá ter a nível do desenvolvimento da profissão de enfermagem orientada para a excelência dos cuidados. Por essa razão na Assembleia-Geral de 17 de Março 2007 foi apresentada, e aprovada pelos membros, uma proposta de Modelo de Desenvolvimento Profissional dos Enfermeiros onde é salientado o processo de tutoria e supervisão clínica bem como a sua fundamentação. A própria auto-regulação da profissão de enfermagem, instituída pelo Estatuto da Ordem dos Enfermeiros, constitui uma garantia da qualidade dos cuidados através de várias condições, incluindo a monitorização e desenvolvimento da prática.

A Qualidade dos Cuidados e a Supervisão Clínica

O documento “Indicadores e Critérios de Qualidade de Exercício Profissional”, publicado em 2001 pelo Conselho de Enfermagem da Ordem dos Enfermeiros, explicita no seu ponto 3, os enunciados descritivos da qualidade do exercício profissional. Lendo atentamente estes enunciados podemos verificar que no ponto 3.6., são consagrados os elementos importantes face à organização dos cuidados de enfermagem, que reflectem muitos dos aspectos relativos à supervisão clínica. Neste ponto é ressalvada a “existência de uma política de formação contínua dos enfermeiros, promotora do desenvolvimento profissional e da qualidade”, que, como vimos, é um dos pressupostos da supervisão clínica.

A necessidade de implementar sistemas de qualidade tem desenvolvido novos modelos de gestão em saúde, que dão os primeiros passos no nosso país. O sistema de Clinical Governance, fomentado no Reino Unido pelo NHS desde 1998, procura garantir que as instituições de saúde sejam responsáveis por uma melhoria contínua da qualidade, mantendo elevados padrões de qualidade dos cuidados (Baker, 2000). Inerente a este sistema encontra-se a supervisão clínica, sendo suportada pelo Nursing Midwifery Council a ideia de que a supervisão clínica é uma parte importante da Clinical Governance (Wood, 2004: 151). Este sistema pressupõe um conjunto de valores culturais e de requisitos estruturais e organizativos indispensáveis para o sucesso deste padrão de boas práticas, nomeadamente uma cultura de aprendizagem, participativa e proactiva.

A supervisão clínica é, assim, uma ferramenta fundamental, centrada na formação e no desenvolvimento pessoal e profissional, como forma de promover a qualidade dos cuidados, exigida nos novos modelos de gestão da saúde, mas que necessita de alguma adaptação cultural por parte dos enfermeiros.

A supervisão no tratamento de feridas

O tratamento de feridas é primordialmente um papel da enfermagem. Mas, para evidenciar este papel, os enfermeiros devem demonstrar que possuem conhecimentos,

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perícia e competências consistentes. Os recentes avanços no conhecimento sobre a fisiopatologia das feridas, bem como o aumento dos produtos e tratamentos disponíveis, são aspectos significativos que sustentam a necessidade de uma formação contínua. A supervisão clínica em tratamento de feridas deverá considerar estes aspectos assegurando e incorporando esta informação, através de uma análise crítica e de reflexões sobre a prática. A supervisão deve assim proporcionar formas de desenvolvimento pessoal e profissional dos outros enfermeiros, que deverão incluir, segundo Newton (1999: 52):

Identificação de critérios (padrões) de cuidados de enfermagem, de forma a realçar aspectos onde será necessário a mudança de práticas.

Diagnosticar os conhecimentos dos enfermeiros acerca do tratamento de feridas, na perspectiva de orientar futuras formações e treino.

Fazer a auditoria das práticas em tratamento de feridas.

Avaliar a aptidão dos enfermeiros, identificando práticas que possam revelar falta de conhecimento, técnica ou confiança.

Validar acções de formação nesta área, assegurando que estas asseguram as necessidades de aprendizagem.

Este papel de supervisão é assumido em países como o Reino Unido por enfermeiros especialistas nesta área, os Tissue Viability Specialist Nurse’s. No nosso país ainda não existe este ramo de especialidade, pelo que esse papel terá de ser assumido por outros enfermeiros especialistas ou por peritos na área do tratamento de feridas, sendo necessário criara modelos de certificação para estes últimos.

Existem vários modelos de Supervisão Clínica criados nas últimas duas décadas. Um dos modelos mais simples na sua estrutura e forma é o de Nicklin. Este autor defende um modelo desenvolvido num ciclo de seis etapas:

PROCESSO DE SUPERVISÃO CLÍNICA

Análise objectiva das práticas

Apreciação de situações-problema (competências clínicas, gestão de cuidados, relações com os colegas); Identificação do problema Clarificação das áreas dos problemas identificados;

Contextualização Estruturação de objectivos no contexto das práticas que salvaguardem as expectativas, obrigações e aspirações da instituição, dos utentes, da profissão e do próprio profissional;

Planeamento Acordo para uma acção realista e específica num determinado período de tempo;

Implementação Implementação das acções planeadas;

Avaliação Avaliação dos resultados e do processo de supervisão;

Adaptado de Sloan (1999) segundo fonte de: Nicklin (1997)

Segundo Sloan (1999: 528) este modelo aponta os aspectos da supervisão gerencial, educacional e de elemento de suporte, sendo, como refere Abreu (2002: 55), um modelo “profundamente direccionado para a prática clínica na sua globalidade e não apenas

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para as dimensões emocionais”. Por esse facto poderá ser um modelo que facilmente se adequa à supervisão em tratamento de feridas.

Conclusão

A supervisão clínica é um método de dar suporte à enfermagem clínica através da troca de experiências, aprendizagem contínua e do desenvolvimento de práticas estruturadas e orientadas, com o objectivo de melhorar a qualidade dos cuidados e a segurança do cliente. Assegurar que o tratamento de feridas se baseie em boas práticas, constitui um desafio em que a supervisão clínica poderá contribuir para a melhoria dos padrões de qualidade dos cuidados em enfermagem.

A formação nos cursos de base é deficiente e a que é efectuada em contexto de trabalho é muitas vezes escassa e inconsistente. É incontestável a necessidade de criar uma cultura de aprendizagem contínua na enfermagem portuguesa. Por esse facto, a formação pós-graduada em tratamento de feridas poderá constituir uma via para a formação de supervisores clínicos nesta área do conhecimento.

Bibliografia

ABBOTT, S.; Dawson, L.; Hutt, J., British Journal of Community Nursing, 2006. Aug. 11(8) p. 346-48.

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ABREU, W. C. – Supervisão Clínica em Enfermagem: Pensar as Práticas, Gerir a Formação e Promover a Qualidade. Sinais Vitais. 2002, nº 45, pp. 53-57.

BAKER, M – Making Sense of the NHS White Papers. 2000, 2ª ed. UK Radcliffe Press, Ltd

GIROT, E – Nurse Education in the New Millennium. British Journal of Perioperative Nursing, 2001, nº 11 (8), p. 352-361.

NEWTON, Heather – Improving wound care through clinical governance. Nursing Standard. 1999, Abr. nº 29 (Vol.13), p. 51-56.

ORDEM DOS ENFERMEIROS – Proposta de modelo de desenvolvimento profissional –

Especialização em Enfermagem. Lisboa 14 de Fevereiro 2007.

ORDEM DOS ENFERMEIROS – Padrões de Qualidade dos Cuidados de Enfermagem. Lisboa, 2001,

Conselho de Enfermagem da OE – Documento de Trabalho.

SLOAN, Graham - Understanding clinical supervision from a nursing perspective. British Journal of Nursing (Mark Allen Publishing). 1999, Apr 22-Mar, nº 12; Vol. 8 (8), pp. 524-529.

SMITH, D. – Introducing Clinical Supervision: the pitfalls and problems. British Journal of

Perioperative Nursing, 2001. Oct. nº 11(Vol.10), p. 436-41.

WOOD, Janet – Clinical Supervision. British Journal of Perioperative Nursing. 2004. nº 4 (Vol.14), p. 151-156.

Referências

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